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18 de março de 2011

RICHARD BOONE, VILÃO CRUEL E AMEDRONTADOR

Richard Boone foi um dos grandes bandidos do cinema, com sua cara de poucos amigos e modos nada educados, deixando uma marca bastante forte nos filmes em que atuou, grande parte deles westerns. Richard Allen Boone nasceu em Los Angeles, Califórnia, em 18 de junho de 1917 e era descendente do pioneiro Daniel Boone, talvez por isso sua mocidade tenha sido tão agitada como foi. Como aluno não conseguiu ser muito bem sucedido pois ao invés de cursar as aulas na famosa Stanford University, preferia praticar boxe no ginásio da Universidade. Briguento, ele dava mais socos fora que dentro do ringue, o que acabou lhe custando a expulsão da centenária escola. O diretor da Stanford até recomendou a Dick que tentasse o pugilismo profissional, o que chegou a acontecer, porém sem muito êxito. Dick decidiu então partir para outras ocupações totalmente estranhas entre si. Trabalhou em campos de petróleo, foi pintor e chegou até a escrever contos de ação, os pulps. Nesta última atividade o jovem Boone demonstrava uma certa sensibilidade artística que viria a ser deixada de lado temporariamente pois o mundo estava em guerra. Durante quatro anos Richard foi canhoneiro da Marinha combatendo os japs na II Guerra Mundial. Quando o conflito terminou, Boone não retornou para a Califórnia, indo para a Costa Leste e, em Nova York, ingressou no Actors Studio para estudar Arte Dramática. Já em 1947 estreava na Broadway numa encenação de “Medéia”, interpretada por Judith Anderson. O teatro para ele foi um estágio para chegar ao cinema, onde estreou em Até o Último Homem (Halls of Montezuma), estrelado por Richard Widmark e com a participação de dois atores também iniciantes, Walter [Jack] Palance e Robert Wagner. A seguir Richard Boone atuou no musical Minha Cara Metade (com Betty Grable), A Raposa do Deserto (com James Mason) e Montanhas Ardentes (outra vez com seu xará Widmark). Esses filmes ajudaram a delinear o tipo durão com feição ameaçadora e incapaz de sorrir, tipo que seria visto ao longo de sua brilhante carreira em não faltaram faroestes onde quase sempre era o odiado bandido.

Foi em 1952 que Richard Boone atuou em um western pela primeira vez, dirigido por Delmer Daves e intitulado Fugindo do Inferno (Return of the Texan) e estrelado por Dale Robertson, ator que como Boone, também foi um ex-boxeador. Richard continuou no gênero western com o A Lei do Chicote (Kangaroo), filmado na Austrália com cangurus e aborígenes substituindo gados e índios. Contrastando com a paisagem australiana e com a beleza de Maureen O’Hara, o filme mostrou um cruel e assustador Richard Boone. Da Austrália para os Pampas argentinos, Boone aproveitou para ficar um pouco do lado da lei na caça sem tréguas a Rory Calhoun em O Gaúcho (Way of a Gaucho), em que a mocinha era a linda Gene Tierney. Mesmo após tantos filmes o nome de Boone sequer apareceu nos créditos em O Soldado da Rainha (Pony Soldier), com o Polícia Montada Tyrone Power. A qualidade dos filmes que Boone participou foi melhorando pouco a pouco e teve destaque em Os Saltimbancos, de Elia Kazan e em O Manto Sagrado, em que interpretou Poncius Pilatos. Richard foi um policial em Sombras da Loucura (Vicki), com elenco liderado pelas belas Jeanne Crain e Jean Peters. Veio então a fase de seguidos westerns na carreira de Richard Boone: Cidade do Mal (City of Bad Men), que mistura faroeste com boxe, com o mocinho Dale Robertson e o bandido John Ringo interpretado por Boone, ambos, como já foi dito, ex-boxeurs. Corações Divididos (Siege at Red River), apesar do título nacional não indicar, é um western, raro na carreira do galã Van Johnson que como confederado se defronta com o renegado Boone. Ainda tendo a Guerra de Secessão como pano de fundo Richard Boone atuou em Vingança Terrível (The Raid), completando um valorizado elenco com Lee Marvin e Van Heflin. Covil de Feras (Robber’s Roost) foi um faroeste estrelado por George Montgomery que procura o último dos três bandidos que mataram sua esposa e o vilão, claro, é Boone. Em Arizona Violento (Ten Wanted Men), Randolph Scott se defronta com Richard Boone que contrata os dez bandidos do título original.


Boone com Jeanne Crain em "Homem Sem Rumo"
Homem Sem Rumo (Man Without a Star) foi verdadeiramente o primeiro grande western da carreira de Boone, dirigido pelo célebre King Vidor e com roteiro de Borden Chase, contando com um elenco de categoria que liderado por Kirk Douglas e com Claire Trevor, os coadjuvantes Jack Elam e Jay C. Flippen, o novato William Campbell e a fulgurante beleza de Jeanne Crain. A lascividade de Homem Sem Rumo chega a lembrar Duelo ao Sol, do mesmo King Vidor, e as estupendas atuações de Douglas e Boone fizeram com que o filme resultasse num vigoroso faroeste. A cena final com os dois grandes atores lutando nas cercas de arame farpado é um dos grandes momentos do western no cinema.


Com Maureen O'Sullivan e Randolph Scott em "Resgate de Bandoleiros"
Boone tinha um vozeirão que impressionava e foi o narrador de A Grande Chantagem (The Big Knife), filme de Robert Aldrich, com Jack Palance que denuncia o lado obscuro e podre do mundo do cinema. O próximo western de Richard Boone seria Crimes Vingados (Star in the Dust), com John Agar e a bela loira Mamie Van Doren. Richard Boone era especialista em papéis de homens violentos e atuou em diversos policiais e dramas noir, mas saia-se excepcionalmente bem em faroestes como em Resgate de Bandoleiros (The Tall T), um dos pequenos clássicos dirigidos por Budd Boetticher com produção da ‘Ranown’ (associação dos produtores Randolph Scott com Harry Joe Brown). Com orçamento diminuto e com roteiro de Burt Kennedy, Boetticher antecipou o rompimento com o puritanismo de Hollywood, mostrando uma declarada e estranha atração entre Pat Brennan (Scott) e Frank Usher (Boone), isto dois anos antes do famoso Minha Vontade é Lei (Warlock).


De 1957 a 1963 Richard Boone dedicou-se quase que inteiramente à televisão como o inesquecível Paladin da série O Paladino do Oeste (Have a Gun, Will Travel). Essa série foi produzida pela CBS e o primeiro episódio foi ao ar em 14 de setembro de 1957, encerrando-se em 21 de setembro com o último dos 156 episódios. Durante praticamente todo esse tempo O Paladino do Oeste esteve entre as dez séries de maior audiência, com enorme popularidade também no Brasil. A principal razão desse sucesso era devida à magnífica elaboração da personagem que Boone criou, ou seja, um pistoleiro elegante, charmoso e erudito que alugava seus serviços apenas para as causas que considerava justas. Conhecido apenas por Paladin, sabia-se que era um ex-oficial do Exército da União, desgostoso com o desfecho da Guerra Civil e especialista em quase todo tipo de armas. Sua refinada cultura era simbolizada pelo peão branco do xadrez, encontrado em seu cinturão e rifle, bem como no cartão de visitas que aterrorizava os badmen. Entre os diversos diretores da série estiveram Ida Lupino e Andrew V. McLaglen, sendo que o próprio Boone dirigiu diversos episódios. Na parte musical brilharam os nomes famosos de Bernard Herrmann e de Jerry Goldsmith. A canção-tema era cantada por Johnny Western.


General Sam Houston em "O Álamo"
Nesse período, devido à força da televisão, Boone transformou-se em grande atração, seu salário para participar em filmes aumentou bastante, assim como a qualidade dos papéis que lhe eram oferecidos. John Wayne o chamou para ser o General Sam Houston na superprodução O Álamo. Richard Boone deveria receber 100 mil dólares por sua participação no filme, mas devido às dificuldades financeiras que envolveram esse épico, Boone disse a John Wayne que não queria receber nada, contentando-se com o casaco de couro que usou no filme. Não é necessário dizer que nasceu ali uma imorredoura amizade. Richard Boone foi o primeiro nome do elenco de Um Estrondo de Tambores (A Thunder of Drums), do especialista Joseph M. Newman, em que interpretou um oficial da Cavalaria matador de índios. Se a intenção de John Ford tivesse dado certo, Richard Boone e Anthony Quinn teriam feito os principais papéis dos chefes indígenas em Crepúsculo de uma Raça (Cheyenne Autumn), mas eram atores de muito prestígio e caros demais, sendo substituídos pelos mexicanos Gilbert Roland e Ricardo Montalbán. Ao invés de filmar com John Ford, Richard Boone acabou trabalhando em Rio Conchos, western em que a maior atração é o duelo de interpretações entre Boone e Edmond O’Brien. Saindo um pouco dos faroestes, Richard Boone defrontou-se com Charlton Heston no drama histórico O senhor da Guerra (The War Lord). Em 1967 Boone teria a oportunidade de proporcionar uma das melhores interpretações de sua carreira, no magnífico western Hombre. Richard Boone chefia uma quadrilha que embosca uma diligência que conduz os mais variados tipos de pessoas, entre elas um soberbo Paul Newman como branco criado pelos índios. Um filmaço dirigido por Martin Ritt e Richard Boone em uma de suas mais fascinantes e detestáveis atuações.

O mestre da crueldade em "Hombre"
Richard Boone atuou ao lado de Marlon Brando em A Noite do Dia Seguinte, filme em que Brando despediu o diretor e pediu a Boone que terminasse a película. Apareceu depois ao lado de Kirk Douglas em Movidos pelo Ódio, dirigido por Elia Kazan. Sob a direção de John Huston atuou em Carta ao Kremlin na agradável companhia da linda sueca Bibi Andersson. Nesse tempo Boone já havia encerrado a série de TV Hec Ramsey que obteve ótima aceitação da crítica mas que teve apenas dez episódios. Filmando em Israel, Richard Boone teve o papel principal em um western bastante curioso intitulado Madron. Nesse filme Boone interpreta um velho pistoleiro que ajuda uma freira sobrevivente de um trem massacrado por índios. A freira foi interpretada por Leslie Caron. Com o amigo John Wayne, Richard Boone atuou em Jake o Grandão (Big Jake) e naquele que foi a despedida das telas do grande Duke, O Último Pistoleiro (The Shootist). Defrontando-se com J.B. Books (Wayne), Sweeney (Boone) este alveja Books, recebendo em seguida três tiros de Books (foto abaixo), mesmo escondendo-se atrás de uma mesa de saloon, numa sequência inesquecível deste inevitavelmente triste western dirigido por Don Siegel. Em 1977 Richard Boone foi filmar na Itália com o diretor Gianfranco Parolini, hoje cultuado ídolo de Quentin Tarantino. O spaghetti-western chamou-se A Arma Divina (Diamante Lobo), e Boone teve a companhia dos também desgarrados Lee Van Cleef e Jack Palance. Interpretou depois o personagem Lash Canino em A Arte de Matar, de Michael Winner, refilmagem do clássico noir À Beira do Abismo (The Big Sleep), com Robert Mitchum e James Stewart. Em 1979 participou de uma comédia dramática chamada Morte no Inverno (Winter Kills), mais lembrada pelo elenco liderado por Jeff Bridges e composto por John Huston, Eli Wallach, Sterling Hayden, Toshiro Mifune, Ralph Meeker, Anthony Perkins, Sterling Hayden, Dorothy Malone e outros grandes artistas que deram ao cinema momentos gloriosos, como fazia o próprio Richard Boone.

Baleado por John Wayne em "O Último Pistoleiro"
Richard Boone teve a honra de despedir-se do cinema ao lado de Toshiro Mifune no filme The Bushido Blade, rodado em 1980. Nos últimos anos de sua vida Boone tornou-se professor de Arte Dramática numa Universidade da Flórida, justamente ele que havia sido expulso da Universidade que cursou quando jovem. Richard Boone, que era primo do cantor Pat Boone, foi casado três vezes, tendo vivido por 30 anos com sua última esposa, que ficou ao seu lado até sua morte, em 10 de janeiro de 1981, aos 63 anos, vítima de um câncer na garganta. O cinema e a TV perdiam Richard Boone, um ator inesquecível que se tornou um modelo de vilão cinematográfico e um dos mais importantes homens maus do faroeste.


Um comentário:

  1. The whole site is beautifully done ... with excellent photos.
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