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José Fernandes de Campos |
Gloriosos tempos do MAM e do MIS - Cinéfilos há muitos espalhados pelo
Brasil afora. Poucos, no entanto, tiveram o privilégio de conviver com a melhor
geração de críticos de cinema do Brasil que foi aquela reunida no Rio de Janeiro
na década de 60. Eram tempos do 'Caderno B' do Jornal do Brasil, reduto dos mais importantes críticos brasileiros de então, jornal que só
encontrava rival em importância no Correio da Manhã no qual pontificava o crítico Antônio Moniz Viana no comando do Conselho de Críticos daquele noticioso. Com essa extraordinária geração nasceram as inesquecíveis publicações 'Filme Cultura' e 'Guia de Filmes' editadas pelo INC (Instituto Nacional de Cinema).
Em outros Estados, com inevitável inveja, ouvia-se falar das disputadas sessões de cinema do Museu de
Arte Moderna (MAM) e do Museu da Imagem e do Som (MIS). E sabia-se que em
reuniões informais em bares da Zona Sul podia-se discutir cinema com Paulo
Francis, Ruy Castro, Gomes de Mattos, José Lino Grunewald, Paulo Perdigão,
Sérgio Augusto e Valério Andrade, entre outros. Pois uma dessas privilegiadas
pessoas que viveram aqueles tempos e conviveram com aqueles escritores e jornalistas é o carioca José Fernandes de
Campos, apaixonado pelo Botafogo de Futebol e Regatas e por cinema.
Professores especiais - O Botafogo entrou na vida de José
Fernandes quando ele ainda era criança. O cinema, para valer, demorou um pouco
mais, na adolescência, o que levou o muito jovem José Fernandes a fazer cursos
de Crítica e de Cinema. Seus professores eram nada menos que Paulo Perdigão, José
Carlos Avellar, Salvyano Cavalcanti de Paiva e José Carlos Monteiro. A paixão
pela 7.ª Arte só fazia crescer e alguns números explicam melhor o quanto José
Fernandes ama o cinema: ele possui 1.500 LPs de trilhas sonoras (e ainda muitos
CDs); em suas estantes estão centenas de livros sobre cinema, entre eles, encadernadas, as preciosas coleções de 'Filme Cultura' e' Guia de Filmes'; seus DVDs
beiram ou passam dos dois mil. Entre os DVDs, mais de 300 são muito especiais
pois são do gênero western. Desnecessário dizer que Paulo Perdigão e outros
críticos-professores ajudaram José Fernandes a conhecer mais profundamente os
faroestes, aos quais assiste há quase 60 anos.
O difícil limite de dez faroestes - Pois com toda essa bagagem José
Fernandes de Campos é assíduo leitor deste blog, o que muito honra este espaço.
Como não poderia deixar de ser, WESTERNCINEMANIA solicitou a José Fernandes que
relacionasse seu Top-Ten Westerns, o que ele prontamente atendeu. José
Fernandes explicou que listou seus filmes por ordem de ano de produção porque, segundo
ele, é impossível dizer que um dos filmes seja inferior aos demais. José Fernandes
relacionou ainda uma segunda lista que ele chama de ‘segundo escalão’, dos quais
dois faroestes poderiam estar incluídos no seu Top-Ten. São eles “Pacto de
Justiça” e “O Homem dos Olhos Frios”. José Fernandes de Campos fez breves
comentários acerca dos faroestes que mais admira e como ele mesmo diria, ‘chega
de papo’ e vamos à lista:
Os
Brutos Também Amam (Shane) 1953 – George Stevens – O
maior western de todos os tempos. Falar sobre este filme mereceria um artigo
sobre ele. Um clássico que dia a dia melhora quando se assiste. A fotografia
(ganhadora do Oscar) é soberba e a trilha que acompanha o filme é digna de
estar entre as melhores do cinema. Nunca o cinema mostrou a renúncia (Shane) a
idolatria (de Wilde), a amizade (Van Heflin), a conformidade (Jean Arthur), o
orgulho (Elisha Cook Jr.) a intolerância (Emile Meyer) e a maldade (Palance,
inesquecível) como este western. Para se rever de seis em seis meses e
descobrir tantas nuances que George Stevens nos colocou na tela.
No
Tempo das Diligências (Stagecoach), 1939 – John Ford – Aqui
começou o western na minha opinião. Uma estória com os personagens vivendo cada
um seu drama, é levada às telas em forma de western num estudo psicológico dos
personagens (viajando juntos em uma diligência) de uma forma natural e muito
mais simples do que os filmes de Bergman e Visconti. O ataque dos índios à
diligência é algo filmado com as técnicas da época que realmente você sente
dentro de si toda a angústia dos passageiros. Falar do elenco é perder tempo
pois todos estão excepcionais. E a fotografia e as locações, é algo
inesquecível.
Consciências
Mortas (The Ox-Bow Incident), 1943 – William A. Wellman
– A intolerância vista no velho oeste pelas mãos de um diretor sempre
profissional e tido como um mero artesão. Só mesmo o homem dos olhos frios
(Henry Fonda) para passar ao espectador toda a dor e drama pela forma da morte
dos cowboys. O terror e a ironia tomam conta da tela em cima de um
roteiro impecável de Lamar Trotti. Do elenco não falo, pois só assisti-los em
cena já é gratificante.
Paixão
dos Fortes (My Darling Clementine), 1946 – John Ford
– Eis o mestre John Ford outra vez. O encontro de Wyatt Earp (um Fonda extraordinário)
com Doc Holliday (um Victor Mature controlado) para um duelo final no ‘OK Corral’ é mostrado de uma forma romanceada e sem muito sangue. Um dos mais sensíveis
westerns do mestre e um clássico de todos os tempos. O que chama atenção é a
riqueza de detalhes com que o roteiro foi elaborado. Um filme que até hoje sempre revejo.
Rio
Vermelho (Red River), 1948 – Howard Hawks – Surge John Wayne, o
maior de todos. Rude, austero, valentão e humano na cena final. Isto é o que
chamamos de um verdadeiro western. Não sei como Montgomery Cliff foi escalado
para o papel, mas convenhamos está perfeito como o protetor do império de
Wayne. Um clássico a trilha de Dimitri Tiomkin e o que falar das locações. O
tempo passa e você não sente a longa duração.
Matar
ou Morrer (High Noon), 1952 – Fred Zinnemann – Inesquecível sobre
todos os aspectos a seleção do elenco e a forma como Gary Cooper compôs seu
personagem. O filme apresentado em tempo real faz com que sigamos a aflição do
xerife com a total covardia e inércia dos habitantes da cidade. A partir do
momento que os vilões entram na cidade, temos dez minutos de pura ação que só
seriam repetidos no final de “Open Range”. (Pacto de Justiça). A beleza de Grace
Kelly e a presença de Katy Jurado ajudam ainda mais você a apreciar este drama
sobre a dor da consciência. A música de abertura cantada por Tex Ritter se
tornou um marco.
Rastros
de Ódio (The Searchers), 1956 – John Ford – Ei-los outra vez,
Ford/Wayne em uma obra prima sobre todos os aspectos. A procura de Wayne por
sua sobrinha (Natalie Wood) é uma aventura que dura anos e que irá mudar
totalmente a idéia de um homem. Fotografia, cenários, roteiro são tão perfeitos
que você aceita os momentos cômicos e piegas do filme. Ação, violência,
sensibilidade e brutalidade se unem para compor um filme inesquecível que se
acaba de uma forma única, simplesmente com a porta fechada e a figura única e
inesquecível do maior cowboy de todos os tempos.
O
Homem que Matou o Facínora (The Man Who Shot Liberty Valance), 1962 – John Ford
– Até hoje está marcada na minha mente a entrada de
Lee Marvin no filme. Mais um clássico do cinema western que fez escola e
ensinou a muitos diretores como fazer de um roteiro simples uma das melhores
estórias já contadas no gênero. A célebre frase que James Stewart fala no final
do filme já se tornou um clássico na cinematografia. O filme é mais
narrativa do que a interpretação dos principais do elenco, mas você jamais se
esquecerá de Lee Marvin. Só assistindo.
Meu
Ódio Será sua Herança (The Wild Bunch), 1969 – Sam Peckinpah
– Um bando de foras-da-lei vêem seu
tempo passar e mesmo assim continuam a lutar pelo que melhor sabem fazer. A
ética está prestes a conduzi-los a outro caminho, mas nada dá certo. Nesta busca
só resta voltar a fazer o melhor que sabem. Do destino ninguém foge. Meu Deus,
o que falar de um filme, onde é impossível você achar um defeito
cinematográfico. Nunca um elenco (todos) esteve tão impecável. Nunca a ação
esteve presente com tanta intensidade. Nunca os diálogos foram tão ferinos.
Nunca a brilhante trilha sonora de Fielding esteve tão presente em cena (a
despedida do bando do vilarejo é inesquecível). Nunca uma edição foi de primeira
classe e nunca o cinema retratou uma violência desenfreada e com tanto realismo
como neste clássico americano. Um filme indispensável a todos os cinéfilos de
um modo em geral.
Os
Imperdoáveis (Unforgiven), 1992 – Clint Eastwood –
‘Ô vida miserável que levo. Em memória da
minha mulher tenho que continuar a vivê-la’ pensa Eastwood mas o destino o
persegue e ele vai ter que retornar à sua vida do passado em busca de tornar
melhor a sua vida e de seus filhos. A velhice chega mas os canalhas continuam.
Clint Eastwood construiu o melhor western moderno de todos os tempos, numa
época que o gênero estava morto e esquecido pelas platéias. A hipocrisia luta
com a moralidade e a morte ronda todos os momentos na tela. Um elenco
impecável: Hackman ganhou Oscar; Richard Harris um hipócrita total; Morgan
Freeman notável ainda acreditando na amizade e na justiça. Um filme cheio de
Oscars e com uma estória única no gênero. Simplesmente poderoso.
Pacto
de Justiça (Open Range), 2003 – Kevin Costner – O último grande
western feito pelo cinema. Mais uma vez Costner se mostra perfeito no gênero.
Nasceu para fazer western (vejam seus filmes anteriores) e de suas mãos nasceu
a maior homenagem que ele poderia dar a um ator magnífico em todos os gêneros
que é Robert Duvall. Todos os clichês do western estão presentes neste filme.
Cada fotograma leva você a um filme que você já assistiu mas com as técnicas do
cinema atual você pode desfrutar com maior impacto todas as cenas. A partir da
cena do chocolate dado de presente, prepare seu espírito, suas emoções pois
você verá uma das melhores sequências de duelo (se assim podemos dizer) do
cinema. As cenas com Annette Bening são de um lirismo puro e você sente que o
mais rude dos homens pode se tornar uma pessoa lúcida. As cenas de Costner com
Bening são de um amor sincero. Um filme a ser descoberto pelos cinéfilos.
O
Homem dos Olhos Frios (The Tin Star), 1957 – Anthony Mann –
Cada vez que revejo este filme mais o admiro. Para mim é o western de Mann.
Mais uma vez a presença de Henry Fonda rouba um filme. E o que falar do
inesquecível maníaco de “Psicose”, Anthony Perkins, fazendo um papel perfeito
em todos os sentidos. Mais uma vez o gênero western mostra que é possível mudar
o rumo da sua vida quando você encontra um amor em sua vida. Este é
outro filme que eu poderia escrever muito, mas falar sobre a relação
amizade/inocência/amor é o suficiente. Procurem este filme de qualquer maneira
e não deixem de assistir. É um brilhante a ser lapidado.
OUTROS
FAROESTES FAVORITOS DE JOSÉ FERNANDES
Sem Lei e Sem Alma (Gunfight at the OK Corral), 1957 –
John Sturges
Estigma da Crueldade (The Bravados), 1958 – Henry King
Minha Vontade é Lei (Warlock), 1959 – Edward Dmytryk
Onde Começa o Inferno (Rio Bravo), 1959 – Howard Hawks
A Face Oculta (One-Eyed Jacks), 1960 – Marlon Brando
Sete Homens e Um
Destino (The Magnificent Seven), 1960 – John Sturges
A Noite da Emboscada (The Stalking Moon), 1969 – Robert Mulligan
Josey Wales, o Fora-da-Lei (Outlaw Josey Wales), 1976 – Clint Eastwood
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José Fernandes de Campos à frente de sua coleção de long-playings, a maior parte dela contendo trilhas sonoras de filmes. |