A gravação “The Legend of Tom Dooley” feita pelo The Kingston Trio alcançou o 1.º lugar do hit parade norte-americano, isto na terceira semana de 1958. Baseada em um fato real, a canção folclórica despertou grande interesse levando centenas de milhares de pessoas a pesquisar sobre o assunto. A canção vendeu seis milhões de cópias e esse sucesso despertou, como não poderia deixar de ser, o interesse de Hollywood e o produtor Stanley Shpetner escreveu um roteiro pouco ou quase nada fiel ao acontecimento ocorrido em 1866. A Columbia autorizou a filmagem feita às pressas com produção do próprio Shpetner e direção de Ted Post, diretor que dirigira apenas um longa-metragem e numerosos episódios de séries de TV. Para protagonizar Tom Dooley foi escolhido Michael Landon, que vinha de muitos trabalhos para a televisão e alguns poucos longa-metragens. “Assassino Covarde” foi lançado em julho de 1959 e em 12 de setembro desse mesmo ano ia ao ar o primeiro episódio da série “Bonanza” e, com ela, Michael Landon interpretando ‘Little Joe Cartwright’ viraria uma das grandes estrelas da televisão. Apesar do sucesso da gravação “The Legend of Tom Dooley”, o longa-metragem não teve a mesma sorte que o disco, sendo relegado a programas ‘double feature’, ou seja, para cinemas que exibiam programas duplos.
Enforcamento injusto - A Guerra de Secessão havia terminado mas três soldados confederados ignoravam o fim do conflito e prosseguiam nas guerrilhas. Ao emboscar uma diligência conduzida por soldados nortistas os sulistas acabam matando alguns passageiros. Os três rebeldes são Tom Dooley (Michael Landon), ‘Country Boy’ (Richard Rust) e Abel (Dee Pollack), sendo que este último foi ferido gravemente durante o assalto. O incidente ocorre próximo de Wilkes County, onde Tom Dolley morava antes de ir para a guerra e, ao invés de fugir, Dooley insiste em rever sua namorada Laura Foster (Jo Morrow). Abel necessita de socorro médico e o xerife do lugar é avisado e forma uma patrulha para capturar o trio de confederados que são perseguidos. Abel não resiste e falece mas ‘Country Boy’ consegue escapar enquanto Tom Dooley é preso. Escapando da cadeia com a ajuda de ‘Country Boy’, Tom planeja fugir com Laura mas esta é vigiada por Charlie Grayson (Jack Hogan), que é um inconformado pretendente de Laura que o rejeita. Ocorre um confronto entre Tom e Grayson durante o qual Laura é morta ao tentar defender Tom. ‘Country Boy’ troca tiros com Grayson e ambos morrem após o que a patrulha prende Tom Dooley que é acusado da morte de Laura e em seguida é enforcado.
![]() |
Michael Landon; Michael Landon e Jo Morrow |
Coerente história irreal - “Matar ou Morrer” (High Noon), como se sabe, deve muito por ter se tornado um western clássico à edição que lhe deu o andamento perfeito. Realizado às pressas e sem pretensão alguma de vir a ser um grande filme, “Assassino Covarde” não teve preocupação maior com a edição e provavelmente foi filmado a la ‘one take only’, ou seja, apenas uma tomada para baratear a produção. O resultado final, no entanto, foi surpreendentemente bom e, do início ao fim, captura a atenção do espectador, isto mesmo com o ‘spoiler’ (antecipação do final) causado pela letra da canção “The Legend of Tom Dooley” ouvida intermitentemente durante o filme. “Assassino Covarde” é desses filmes que nem se percebe que chega ao final por seu ritmo envolvente. A história é narrada com coerência mesmo no momento em que ocorre a reviravolta da libertação de Dooley por ‘Country Boy’, este se fazendo passar por soldado do Exército da União, por sinal esta é uma das melhores sequências de “Assassino Covarde”. Outros excelentes momentos deste western são as mortes de Abel e a de um outro soldado confederado morto por engano. Sequênciaa apenas não superiores à espetacular luta travada entre Dooley e Charlie Grayson, uma das melhores já vistas em westerns. Uma pena que não haja referência a quem teriam sido os dublês responsáveis pelo excelente trabalho dirigido por Ted Post. As sequências de troca de tiros são igualmente ótimas e convincentes, sendo necessário enfatizar que “Assassino Covarde” é um western-B que pode até ser confundido com um episódio de série de TV.
Luta renhida entre os dublês de Michael Landon e Jack Hogan
À espera de novo filme para Tom Dooley - Se há uma queixa a ser feita em relação a “Assassino Covarde” é o fato de passar longe da verdadeira história de Tom Dooley, deixando de apresentar personagens importantes como as primas de Laura Foster, Anne Foster Melton e Pauline Foster, vitais para melhor compreensão da razão de o enforcamento de Tom Dooley ter provocado a comoção que causou à época. Poderia ter uma trama mais alongada, assim como mencionar os diversos julgamentos pelos quais Dooley passou mas que não caberiam num filme de 79 minutos com limitado orçamento. E, apesar da repercusão e interesse causados pelo sucesso da gravação do The Kingston Trio e consequentes buscas por documentos que evidenciassem ser Tom Dooley o verdadeiro assassino, até hoje Hollywood não se dispôs a produzir um filme à altura da importãncia do acontecimento. Isso apenas valoriza ainda mais “Assassino Covarde”, mesmo com os erros factuais. Considere-se que a intenção da Columbia era apenas a de faturar e ao mesmo tempo brindar o público com um filme que narrasse a tragédia de Tom Dooley, mostrando-o como vítima de uma situação que poderia ter sido evitada. E por que não, se Billy the Kid era reiteradamente mostrado nas telas como herói? Passaram-se décadas até o cinema mostrar personagens históricos de forma realística.
Armas do pós-Guerra Civil - A série “Gunsmoke” é reconhecidamente uma das melhores produzidas pela TV no gênero western e Ted Post dirigiu nada menos que 55 episódios das aventuras do marshal Matt Dillon com ‘Doc’, Chester, Festus e a inesquecível Kitty. Boa parte das sequências de “Assassino Covarde” foram filmadas na cidade cenográfica da CBS-Columbia, facilmente reconhecida por quem assistia ou assiste “Gunsmoke”, especialmente a notória escada que levava ao consultório de ‘Doc’ e que é o mesmo consultório do médico que atende o confederado Abel, companheiro de Tom Dooley. Como a ação de “Assassino Covarde” transcorre em 1865, ano do fim da Guerra Civil, são utilizados neste western Colts Peacemakers e rifles de repetição, armas cujas fabricação se deram anos depois. Esse é um detalhe comum a muitos faroestes, erros cometidos pela produção que acredita que o espectador não levará em conta. Ocorrem em grandes produções e tornam-se pequenos pecados em filmes como este de Ted Post.
Destinos diferentes - Michael Landon não era, em 1959, um rosto desconhecido no cinema e na TV, tendo atuado com destaque em “I Was a Teenager Werewolf”, clássico B filmado em 1957 no qual Landon é transformado num lobisomem. E é ele o protagonista de “Assassino Covarde”, com atuação apenas regular. O grande destaque do elenco fica com Richard Rust, como seu companheiro confederado ‘Country Boy’. Rust atua com a intensidade necessária, sendo humano e cínico conforme a sequência exigia. Enquanto Michael Landon cresceu na carreira, primeiro como ‘Little Joe Cartwright’ na série “Bonanza” e posteriormente tornando-se milionário como produtor da série “Os Pioneiros”, Richard Rust se viu relegado a papéis sem maior destaque em filmes. Um bom momento de Rust no cinema foi quando interpretou um dos bandidos em “Cavalgada Trágica” (Comanche Station), da série Randolph Scott-Budd Boetticher. Uma curiosidade é que Landon (nascido em 1936) e Rust (nascido em1935) tinham quase a mesma idade quando filmaram “Assassino Covarde” e ambos viriam a falecer ainda jovens, Landon em 1991 aos 54 anos e Richard Rust em 1994, aos 59 anos. Jo Morrow interpreta Laura Foster sem nenhum brilho, demonstrando pouco talento interpretativo. Completam o bom elenco com algum destaque Ken Lynch, Ralph Moody e Jack Hogan.
Amigo de Clint Eastwood - O diretor Ted Post dirigiu Clint Eastwood em 24 episódios da série “Rawhide” e como Clint não se esquecia dos amigos, quando se tornou um dos homens mais poderosos de Hollywood, deu oportunidade a Post para dirigi-lo no ótimo “A Marca da Forca” (Hang ‘em High), em 1968, produzida pela Malpaso. E Ted Post voltou a dirigir Eastwood em 1973 em “Magnum 44” (Magnum Force), um dos grandes sucessos de bilheteria de Eastwood como Harry Callahan. O título original “The Legend of Tom Dooley” recebeu no Brasil o absurdo título de “Assassino Covarde”, em nada condizente com a história, já que Tom Dooley não era covarde e nunca ficou provado que tivesse matado Laura Foster. Ainda que neste western ele seja mostrado com a faca que acidentalmente matou a namorada, isso não fica claro o suficiente nas imagens. Independentemente da falta de acurácia e de Michael Landon nada se esforçar para mostrar um Tom Dooley mais sincero e sofrido, “Assassino Covarde” é um excelente western que merece ser visto.