|
John Wayne e Woody Strode e a cena da carroça em disparada. |
Durante as filmagens de “O Homem que Matou o Facínora” (The
Man Who Shot Liberty Valance) John Ford torturava todos os dias John Wayne
dizendo a ele que Woody Strode era um exemplar cidadão norte-americano pois
havia lutado pela pátria na II Guerra Mundial. Como se sabe, John Wayne lutou
apenas no cinema. E Ford ainda diminuía John Wayne dizendo a ele que Woody
Strode havia sido um dos mais destacados profissionais de American Footbal
atuando pela UCLA, enquanto John Wayne nunca passou de um mero amador. Chegou
um momento em que Wayne se desesperou e, poupando seu mentor, dirigiu sua raiva
e mágoa contra Woody que jamais havia sido descortês com o Duke. Wayne conduzia
uma carroça em velocidade desnecessária e encontrava dificuldade para deter o
cavalo. Woody por precaução tentou tomar as rédeas do Duke e este o afastou bruscamente
com um soco. Quando a carroça enfim parou, Wayne partiu para cima de Woody
Strode que adotou posição clássica de defesa com os punhos fechados. O gigante
negro era ainda maior que o Duke, mais novo e estava em excelente forma física
aos 48 anos de idade. Wayne estava com 55 anos mas bastante fora de forma e não
seria páreo para Strode que fatalmente o machucaria se ambos brigassem para
valer. E uma luta de verdade acarretaria grandes prejuízos à produção pois um
soco de Woody arrebentaria a cara de John Wayne. Mas Woody engoliu a seco os
xingamentos que ouviu de Wayne e mesmo a agressão na carroça. Com isso demonstrou
que era um homem de bom senso, serenidade e extremo profissionalismo. Ford, o
verdadeiro causador do incidente, agradeceu Woody por sua atitude mas anos
depois o ator negro culpou o diretor pelo fato. Em sua carreira como ator Woody
Strode participou de grandes filmes, conviveu com diretores importantes como
Ford e com e atores famosos como Wayne. E isso porque sua compleição física e altivez somadas a seu razoável talento interpretativo, fizeram dele um dos mais requisitados
atores negros de seu tempo.
|
Wayne e Strode. |
|
Atleta do decatlo, Woody arremessa o disco; ao lado a pintura que irritou Hitler. |
Afronta
aos nazistas - Nascido em Los Angeles, em 25 de julho de 1914, Woodrow
Wilson Wolwine Strode, apelidado ‘Woody’, era descendente de índios Blackfoot,
Cherokee e Creek, além de naturalmente ser o que se convencionou chamar de
afro-americano. Essa mistura de raças gerou um jovem fortíssimo, com 1,93m de
altura e uma invejável musculatura, que se destacou nos esportes já na
Jefferson High School, em Los Angeles, na prática de American Footbal. Mais tarde Woody se
destacaria também como atleta de decatlo, com marcas impressionantes nos 100
metros rasos e no salto em distância. Woody Strode adquiriu certa notoriedade quando aos 20 anos de idade venceu um concurso para posar nu para o artista
plástico Howard Stowitts. Os trabalhos de Stowitts foram selecionados para exibição
nos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936. A presença do retrato de um atleta
negro causou constrangimento no Führer e nos demais líderes nazistas e a
exposição foi fechada e só reaberta depois de retirados os quadros retratando o gigante negro. Leni Riefenstahl declarou que aquele corpo (de Woody)
era o mais perfeito físico de um atleta que ela havia visto na vida. Woody
Strode não encontrou dificuldades para chegar à UCLA (Universidade da
Califórnia – Los Angeles) onde se destacou no American Football, terminando por
se profissionalizar e sendo um dos quatro pioneiros atletas negros desse
esporte antes dominado pelos brancos. Com seu porte físico e fama alcançada, Woody Strode foi levado para Hollywood onde seu primeiro trabalho foi como
figurante em “No Tempo das Diligências” (Stagecoach).
|
O jgador de American Football Woody Strode na UCLA. |
|
Woody Strode em"Os Dez Mandamentos" como o rei etíope; à direita como um guarda atrás de Charlton Heston e Martha Scott. |
Dos
ringues para a tela - Em 1941 Woody Strode contraiu
matrimônio com a princesa Luukialuana Kalaeola, descendente da última rainha do
Havaí. Casado e insatisfeito com a falta de oportunidades no cinema Strode
voltou para o futebol americano profissional. A carreira de Woody foi
interrompida quando ele foi convocado pela U.S. Army para lutar na II Grande
Guerra. No retorno do conflito mundial Woody prosseguiu como jogador de futebol
americano atuando também no Canadá, em Calgary. Quando encerrou sua carreira
nesse esporte, Woody que já havia participado de espetáculos de luta-livre,
voltou a atuar, no início dos anos 50, nesses shows que lotavam ginásios
e alcançavam os índices mais elevados na audiência de televisão. Os embates
entre Woody Strode e Gorgeus George são considerados antológicos no gênero. Porém
novamente o cinema atraiu Woody Strode que reapareceu nas telas em “Caçadores
de Leões” (The Lions Hunters), estrelado pelo ‘Bomba’ Johnny Sheffield. Nesse
filme Woody interpreta o africano Walu, o primeiro de uma série de personagens
parecidos que faria a seguir com nomes como ‘Mongo’, ‘Malaka’, ‘Ramo’, ‘Zanguma’,
‘Moor’, Binaburra e ‘Muwango’. Mas Woody teria oportunidades melhores em “Andócles e o
Leão” e em “Demétrius, o Gladiador”, ambos com Victor Mature, sendo notado por
Cecil B. DeMille. O célebre diretor contratou Woody para ser o Rei da Etiópia
em “Os Dez Mandamentos” mas o aproveitou em um segundo papel de menor
importância. Em “O Cálice Sagrado”, o filme que Paul Newman queria esquecer,
Woody Strode teve pequena e também esquecível participação. Antes de terminar a
década de 50 Woody Strode ainda amargaria aparecer em filmes como personagens
bizarros, ele que chegou a ser ‘Lothar’ num filme para a TV que teve Mandrake,
o Mágico como herói. Em 1959 Woody foi 'Toro', um pirata negro em “Corsário sem
Pátria”, dirigido por Anthony Quinn e um soldado em “Os Bravos Morrem de Pé”,
estrelado por Gregory Peck.
|
Acima Woody Strode em sua estréia no cinema em "Caçadores de Leões"; com Gregory Peck em "Os Bravos Morrem de Pé"; abaixo como o pirata 'Toro' em "Corsário Sem Pátria", saltando de um galeão para outro com um pesado fardo. |
|
Woody Strode como Sargento Rutledge. |
Westerns
com John Ford - Nos anos 60 Woody Strode participou de diversos filmes
importantes que o levaram a ser conhecido pelo nome e não apenas lembrado como 'aquele negro forte' de tantos outros trabalhos no cinema. A magnífica sequência começou em 1960 com “Audazes e Malditos” (Sergeant Rutledge), western
de John Ford que Woody protagonizou. No mesmo ano, um dos melhores momentos do
épico “Spartacus” foi a brutal luta entre o gladiador africano Draba
(Woody) contra Spartacus (Kirk Douglas). Ao invés de matar Spartacus, Draba
arremessa seu tridente contra o balcão onde se encontra o Senador e General
Crasso (Laurence Olivier) e seus acompanhantes. Indicado para o prêmio ‘Melhor Ator Coadjuvante’ do
Golden Globe (1961), por sua atuação em “Spartacus”, Woody Strode recebeu, enfim, o
reconhecimento da crítica quanto a seu talento como intérprete. Fazer parte do
grupo de atores preferidos de John Ford é, sem dúvida, uma honra para qualquer intérprete e
Woody Strode atuou sucessivamente em “Terra Bruta” (Two Rode Together) e em “O
Homem que Matou o Facínora” (The Man Who Shot Liberty Valance), ambos de John
Ford. Neste último, que foi a derradeira obra-prima de Ford, Woody Strode
interpreta Pompey, numa atuação tão marcante quanto aquela em que personificou
o Sargento Rutledge. E Woody estaria presente no elenco de “Sete Mulheres”, a despedida
de John Ford do cinema. Entre esses filmes Strode foi Khan, o líder espiritual
de uma tribo na aventura “Os Três Desafios de Tarzan”, em que o Rei das Selvas
é Jock Mahoney. Strode já estivera em outro filme do Rei das Selvas, que foi
“Tarzan e a Tribo Nagasu”, com Gordon Scott.
|
Woody Strode como o envelhecido Pompey e ainda jovem
com Tom Doniphon (John Wayne). |
|
Woody Strode em "Audazes e Malditos" com Jeffrey Hunter e com Carleton Young na foto à direita. |
|
Woody Strode enfrentando dois Tarzans: Gordon Scott e Jock Mahoney, este na foto maior à direita, magérrimo perto dos músculos de Woody. |
|
A espetacular luta dos gladiadores Kirk Douglas e Woody Strode em "Spartacus". |
|
Woody Strode arremessa o tridente em direção à tribuna onde estão Laurence Olivier, John Dall, Nina Foch e Jean Simmons. |
|
"Era Uma Vez no Oeste": Woody Strode e
a irritante gota d'água; e com Jack Elam. |
Destaque
como atirador de flechas - A fantástica década de 60 reservaria
ainda dois filmes memoráveis para Woody Strode, ambos faroestes. Em 1966 Woody
foi um dos quatro especialistas de “Os Profissionais” (The Professionals”, como
o atirador de flechas. Burt Lancaster desafiou inúmeras vezes Woody Strode, durante as filmagens, para
disputar braços-de-ferro tendo perdido todas as disputas e nunca se conformando
com a descomunal força do ator negro. E veio 1968, com Sergio Leone colocando
Woody Strode na deslumbrante sequência inicial de “Era Uma Vez no Oeste” (C’Era
Uma Volta Il West) com Woody como Stone, um dos bandidos que aguardam a chegada
do trem. Depois desse conjunto de westerns Woody Strode poderia ser considerado
o mais importante ator negro dos faroestes, ainda que nunca como ator
principal. O filme seguinte de Woody foi outro western – “Shalako” – com Sean
Connery e Brigitte Bardot encabeçando um grande elenco. Ao lado de Terence Hill
e Bud Spencer, Woody atuou em “A Colina dos Homens Maus” (La Colina degli
Stavali), prosseguindo a fase europeia de sua carreira. Com a dupla
|
Os profissionais Woody Strode, Lee Marvin, Robert Ryan e Burt Lancaster; à esquerda Woody treinando atirar a flecha com pavio incendiário. |
|
Cena de "Shalako" com Sean Connery em luta de lanças com Woody Strode; à direita George Eastman, Terence Hill, Bud Spencer e Woody Strode. |
|
Franco Nero e Woody Strode; abaixo Woody com Henry Silva. |
Fase
europeia - Outros westerns-spaghetti, já nos anos 70, que contaram com
Woody Strode no elenco foram “Keoma”, com Franco Nero; “Chuck Mull, o Homem
Vingança” (Ciakmull – L’Uomo della Vendetta), de Enzo Barboni; “A Crista do
Diabo” (The Deserter), de Burt Kennedy; Gianfranco Parolini dirigiu Woody em
“Noi Siamo Angeli”. Woody que já fora o Rei da Etiópia foi o Rei da Numidia em
“Scipião, o Africano”, comédia histórica italiana em que o africano Scipião é
interpretado por Marcello Mastroianni. Ainda na Europa “Por Ordem da Cosa
Nostra”, filme sobre a máfia teve no elenco Henry Silva e Woody Strode. Em
“Colpo in Canna”, Strode foi o primeiro nome do elenco masculino, contracenando
com Ursula Andress.
|
Woody Strode e Ernest Borgnine em "Marcados pela Vingança". |
Algumas
bombas na filmografia – Retornando a Hollywood, Woody Strode
atuou nos seguintes westerns: “The Gatling Gun”, com Robert Fuller; “Marcados
pela Vingança” (The Revegers), com William Holden e Ernest Borgnine; “The Last Rebel”,
com Joe Namath (ex-jogador de futebol Americano, como Woody Strode).
“Winterhawk” foi um western que passou despercebido nos cinemas mas que tem no
elenco, junto a Woody Strode, os nomes de Denver Pyle, Leif Erickson, Elisha
Cook Jr., L.Q. Jones e Arthur Hunnicutt, conhecidos dos fãs de westerns. Fora
do gênero western Woody Strode apareceu em “Travessia a Cuba”, com Stuart
Whitman e Robert Vaughn e em "Causa Perdida" (Che!) biografia do guerrilheiro argentino protagonizado por Omar Shariff. Apenas para ganhar dinheiro Woody atuou em filmes terríveis como “A Maldição das Aranhas”,
com William Shatner; “Ravagers”, com Ernest Borgnine e Richard Harris; “Jaguar Lives!”, com
Christopher Lee. Por certo estes filmes devem ter deixado Woody com saudade de John Ford, de
Richard Brooks e de Sergio Leone.
|
Woody Strode, o storyteller de "Posse". |
A
morte da sua princesa - Em 1980 Woody Strode passou pela
tristeza de perder sua esposa Luana, com quem esteve casado por 40 anos e com
quem teve dois filhos. Dois anos depois, em 1982, Woody tornou a se casar,
desta vez com Tina, companheira até o fim da vida do ator. Nos anos 80
desapareceram as boas oportunidades em filmes para Woody Strode que participou
de dez películas nessa década. A mais importante delas foi “Cotton Club”, de
Francis Ford Coppola na qual Woody Strode tem um papel menor.
Menos importante mas interessante pelo elenco foi “A Louca Corrida do Ouro”
(Lust in the Dust) western escrachado dirigido por Paul Bartel com o travesti
Divine e mais Henry Silva, Geoffrey Lewis, César Romero e Tab Hunter, com Woody
Strode perdido no meio deles. Em 1992 Strode atuou em “Storyville – Um Jogo
Perigoso”. Em 1993 o diretor negro Mario Van Peebles reuniu um elenco composto
por muitos negros para o faroeste “Posse”, com Woody Strode interpretando o
velho contador de histórias que abre o filme.
|
Woody Strode como o fabricante de caixões em "Rápida e Mortal", (The Quick and the Dead), seu último filme |
|
Woody Strode |
Hall
da Fama dos cinéfilos - O último filme da carreira de Woody
Strode foi o western “Rápida e Mortal” (The Quick and the Dead), com Gene
Hackman, Sharon Stone, Russell Crowe e Leonardo Di Caprio. Woody interpreta o
pistoleiro ‘Charlie Moonlight’ e dá a impressão de estar já doente do câncer do pulmão que
o levaria à morte aos 80 anos em 31 de dezembro de 1994, em Glendora, na Califórnia, onde vivia com a esposa Tina. “Rápida e Mortal” foi
produzido nesse ano e lançado em 1995 quando Woody já era falecido. Em 1992
Woody Strode foi conduzido ao Hall da Fama dos Atletas da Universidade da
Califórnia (UCLA). Um tanto tardiamente, em 2012, foi a vez do Museum of
Western Heritage honrar Woody Strode colocando-o no seu Hall da Fama. Justa
homenagem a um ator que dignificou cada personagem que interpretou,
especialmente o Sargento Rutledge de “Audazes e Malditos”, o gladiador de
“Spartacus” e o negro Pompey, empregado de John Wayne em “O Homem que Matou o Facínora”. Esses três filmes apenas bastariam para colocar Woody Strode no hall da
memória dos verdadeiros cinéfilos.
|
Woody Strode já envelhecido: à direita recebendo homenagem. |
|
Woody Strode teve que se vestir de índio e interpretar guerreiros africanos muitas vezes no cinema. |
|
Woody Strode e Clint Eastwood ainda jovens num episódio de "Rawhide", série de TV estrelada por Eastwood. |
|
Woody Strode em "Gengis Khan" com James Mason na foto à esquerda. |
|
Woody Strode com Omar Shariff e Barbara Luna em "Che!"; com o famoso jogador de futebol americano Joe Namath que tentou sem sucesso a carreira no cinema; à direita Woody em "O Retorno do Corcel Negro". |
|
Woody Strode nos tempos de luta-livre enfrentando Gorgeus George, o mais famoso astro daquele tipo de espetáculo. |
|
Cena de "Spartacus" com Woody pendurado de cabeça para baixo após ser morto pelos nobres romanos. |