UMA REVISTA ELETRÔNICA QUE FOCALIZA O GÊNERO WESTERN

31 de maio de 2011

"SHENANDOAH", JAMES STEWART UM PATRIARCA NA GUERRA CIVIL


William K. Everson em seu magnífico livro “Hollywood Western” observou que os westerns teriam sido muito melhores se não houvesse John Ford. Everson completa afirmando que a inevitável comparação com os westerns de Ford tornam qualquer filme menor. O ideal então seria assistir aos westerns esquecendo de John Ford, mas como fazer isso quando deliberadamente um filme procura ser parecido com os filmes do Mestre das Pradarias? É o caso de “Shenandoah”, dirigido por Andrew V. McLaglen, diretor que cresceu nos sets de filmagens em que seu pai, Victor McLaglen, atuava sob as ordens de Ford. E como seria bom se McLaglen tivesse absorvido bastante mais da influência de John Ford e presenteado o gênero com outros filmes como “Shenandoah”, que afinal acabou sendo o melhor de seus filmes.

A INDESEJÁVEL GUERRA - “Shenandoah” conta a história de Charlie Anderson (James Stewart), patriarca viúvo e fazendeiro no Vale de Shenandoah, no Estado da Virginia. Embora se escute na sua propriedade os tiros de canhão cada vez mais próximos, Anderson entende que essa guerra nada tem a ver com a sua vida e as vidas de seus filhos, uma moça e seis rapazes, eles com idade para ir para a frente de batalha. Alguns dos filhos até demonstram o desejo de lutar pelo Sul, mas o autoritário Charlie Anderson doutrina os filhos para que estes pensem como ele. Anderson pensa diferente da maioria dos sulistas e sequer possui escravos, uma das causas da fratricida guerra da qual ele não quer participar. Com sua fazenda praticamente cercada pelas batalhas é inevitável que a guerra interfira na vida de Anderson, primeiro vendo Boy (Phillip Alford), seu filho caçula, ser equivocadamente preso como rebelde pelas tropas yankees. Anderson e quatro de seus filhos saem à procura de Boy chegando a enfrentar um pelotão nortista que conduz um trem de prisioneiros. James (Patrick Wayne), o filho casado de Anderson, permanece na fazenda e é morto juntamente com a esposa por um grupo de saqueadores. Outro filho é morto quase que acidentalmente por um inexperiente soldado rebelde de 16 anos. Desolado Charlie Anderson retorna para sua casa e vê a família reduzida com as mortes ocorridas, ainda que Boy, que havia escapado da prisão, retorne ferido para diminuir a dor do patriarca.


UMA “AMERICANA” DE McLAGLEN - “Shenandoah” foi produzido para ser lançado em 1965, ano em que se comemorou o centenário do fim da sangrenta Guerra Civil norte-americana, ocorrido com a rendição sulista em 9 de abril de 1865. Como não poderia deixar de ser o filme demonstra a inutilidade da guerra e, mais que isso, a destruição de famílias inteiras, mesmo daquelas que ideologicamente não aceitavam a divisão do país com o consequente conflito. Andrew V. McLaglen realizou um filme com toques de sentimentalismo sem esquecer de momentos de comédia, estes proporcionados pelo pouco engraçado Philip Alford, o Boy e pelo hilário Pastor Bjoerling (Denver Pyle) Na linha de Ford é explorada a beleza da paisagem com a cinematografia de William H. Clothier, ainda que as locações tenham ocorrido em Thousand Oaks, na Califórnia e não no cenário natural da Virginia. A família sempre reunida, a obediência à liderança paterna e a presença forte da igreja na comunidade criam a atmosfera própria para o desenvolvimento do roteiro de James Lee Barrett. E o tema musical com a canção tradicional “Oh Shenandoah” completa o belo quadro dessa verdadeira Americana, apropriadíssima para o filme-libelo que “Shenandoah” pretendeu ser. O que faltou então para que o western de McLaglen fosse uma obra-prima? Faltou justamente a magia de John Ford, sempre inserida naturalmente em seus filmes. James Stewart tem dois momentos discursivos, um perfeito, junto ao túmulo de sua falecida esposa Martha; o segundo, claramente forçado, quando da morte de seu filho Jacob pelo rebelde adolescente. Incapaz de entender porque havia disparado contra Jacob, as palavras de James Stewart para o jovem rebelde soam inconsequentes.

UM FILME DE JAMES STEWART – Verdadeiro tour-de-force para o veterano James Stewart, “Shenandoah” proporciona a ele outra grande atuação em um faroeste. Paralelamente aos acontecimentos da Guerra Civil o personagem vivido por James Stewart passa da arrogância à humildade diante das tragédias das batalhas que acabam por atingi-lo. E entre essa mudança surge o homem duro, quase cruel, muito próximo dos personagens que Stewart viveu nos westerns de Anthony Mann. As sequências todas do filme são construídas para James Stewart, pouco sobrando para a quase inexpressividade de seus filhos no filme (Patrick Wayne, Glenn Corbett, Charles Robinson, Tim McIntire, Jim McMullan e Phillip Alford). Saem-se melhor a filha Rosemary Forsyth (Jennie) e Doug McClure (Tenente Sam). Surpreendentemente bem está George Kennedy como o Coronel Fairchild. Em papéis menores os Paul Fix, James Best e Strother Martin. Destaque para o excelente Denver Pyle como o irritadiço Pastor Bjoerling.


REGULARIDADE NO WESTERN - Andrew V. McLaglen viria a ser o mais ativo diretor de westerns dos anos 60 e 70, dirigindo John Wayne em quatro oportunidades. Graças a esse menosprezado diretor e à regularidade com que dirigia, nunca faltava um faroeste para alegria dos fãs do gênero, ainda que sua mão fosse um tanto quanto pesada. E “Shenandoah” é, como foi dito, seu melhor trabalho, sem esquecer do também excelente “Desbravado o Oeste”. Seus filmes traziam no elenco gente como o Duke, Kirk Douglas, Richard Widmark, Dean Martin, Robert Mitchum e James Stewart. O que mais poderiam querer aqueles eternos westernmaníacos, não é mesmo?

5 comentários:

  1. Gostei do layout com o Jack Palance.
    Já viu um documentário do Peter Bogdanovich sobre o John Ford? Muito bom.


    O Falcão Maltês

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  2. James Stewart tinha exatamente 57 anos quando fez esta pelicula. Uma idade perfeita para interpretar um pai de família da qualidade e comportamento como o seu. Zelar por sua prole nunca foi uma excessão quando se refere a um patriarca zeloso pelo que tem 66/67. O achei ótimo, embora, neste instante eu adorasse reve-lo para melhor falar sobre ele.
    No entanto, acredito no discernimento de nosso redator quando cita esta fita como o melhor trabalho de Laglen, um aluno muito observador de Ford, já que podemos ver em seus filmes muitas tiradas utilizadas pelo velho diretor em seus filmes, como; as linhas comicas de seus filmes, as brigas com vários participantes terminando tudo num verdadeiro amontoado de pasmaceira. Também as fotografias, que Laglen parecia exigir que seus filmes tivessem e que muito se parecem com as do Monumental Valley, onde a velha raposa fazia suas grandes cenas.
    Não o acho um mau aluno, muito ao contrário. O filho de Vitor nos deu boas alegria em fitas bem elaboradas e marcadas com sua marca e com muitas extrações de tudo o que participou na infancia, vendo o mestre fazer seus filmes.
    Desbravando o Oeste é muito bom, Quando um homem é Homem segue muito a linha Depois do Vendaval, O Preço de um Covarde é, para mim, seu melhor trabalho (porém preciso rever Shenandoah) e Chisun segue sua linha forte.
    Gosto de seu estilo de fazer faroestes. Teve um bom mestre e nunca se mostrou um aluno relapso.
    jurandir_lima@bol.com.br

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  3. aonde posso conseguir comprar juma copia desse filme??

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  4. Um western prá ninguém botar defeito. A influência fordiana é evidente, no entanto isso não tira o mérito desta Obra-Prima de Andrew W.McLaglen(sem dúvida o seu melhor filme). Expressivo roteiro. Nota 10.

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  5. Olá, Darci!
    Mais um western brilhante deste grande discípulo de John Ford. As semelhanças deste filme com "Como Era Verde o Meu Vale" são muitas, a começar pelo patriarca (James Stewart fazendo as vezes de Donald Crisp) que exige respeito e oração à mesa antes da refeição com a numerosa família. Com o decorrer do filme esta mesma família começa a ruir com os infortúnios da vida, no caso de Shenandoah, a Guerra Civil Americana. Assim como o grande campeão do Oscar de 1941, o melhor filme de Ford, e outros tantos dos seus, um filme que exala sensibilidade, feito para e com o coração. Gostei de ver ao final da resenha você classificar "Desbravando o oeste" como EXCELENTE. Esta sempre foi minha opinião sobre aquele notável épico de McLaglen, filme que alguns críticos desmerecem por meio de patéticos e infelizes comentários.
    Aquele abraço!

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