UMA REVISTA ELETRÔNICA QUE FOCALIZA O GÊNERO WESTERN

22 de julho de 2018

TOP-TEN WESTERNS DO CINÉFILO SEBÁ SANTOS



Aos sete anos de idade, no Cine Mercurinho em Taubaté, cidade do Vale do Paraíba (São Paulo), Sebastião Santos descobriu as matinês. Passou a gostar tanto de cinema que, quando tinha um dinheirinho a mais, ficava para a sessão seguinte para assistir mais filmes. Adolescente passou a dividir o cinema com tudo aquilo que os jovens praticavam, porém jamais passava uma única semana sem ir ao cinema. Foi nesse tempo que começou a colecionar discos de seus cantores preferidos, entre eles Carlos Galhardo, Nélson Gonçalves, Vicente Celestino e Roberto Carlos que já fazia bastante sucesso. Colecionar era algo que desde cedo atraía Sebastião, que para os amigos era o sorridente Sebá. (Na foto ao lado o Cine Palas, em Taubaté, um dos que Sebá frequentou incontáveis vezes)

Nelson Pecoraro
E veio a década de 80 e com ela a chegada do Video Home System, o popular VHS, que permitiu a Sebá iniciar sua coleção de filmes. Coincidiu com esse momento a aproximação de Sebá com o famoso Clube dos Amigos do Western, criado pelo médico Aulo Barretti e que então se reunia aos sábados no Fotocineclube Bandeirantes, na Rua José Getúlio em São Paulo. Sebá passou não só a frequentar a confraria mas também a adquirir fitas de gêneros que não se encontrava nas locadoras. Eram os faroestes ‘B’, aqueles que ele assistira no Cine Mercurinho e também os saudosos seriados, especialmente os da Republic Pictures. Quem forneceu a Sebá os primeiros faroestes e seriados foi Nélson Pecoraro, que dominava o processo de telecinagem e dessa forma possibilitava a passagem dos filmes em 16mm para as fitas VHS.

Rex Allen
O acervo de Sebá não parava de crescer quando então surgiu o DVD, mídia para a qual a respeitável coleção foi toda transferida. O advento do DVD somado ao domínio da informática-internet possibilitou ao colecionador taubateano ‘baixar’ os filmes, legendá-los e personalizá-los com autoração particular levando seu nome. Hoje Sebá Santos é um dos maiores colecionadores de filmes do Brasil, com um acervo que já ultrapassou os doze mil títulos. Isso mesmo, 12.000 filmes de todos os gêneros mas com um declarado amor pelo faroeste. E não apenas os westerns clássicos ou os queridos ‘Bezinhos’, mas também a fase pioneira do cinema dos tempos de William S. Hart, de quem Sebá tem inúmeros títulos. Entre todos os cowboys, o mocinho preferido de Sebá é Rex Allen, de quem possui a série completa de westerns produzida pela Republic Pictures.  Muito da enorme coleção de Sebá Santos foi por ele exibida no programa “Matinê”, que manteve na TV Cidade, de Taubaté, para gaudio dos muitos fãs de westerns e seriados.

Sebá Santos
Viajando por todo o país por força de sua atividade profissional, Sebá por onde passava encontrava sempre alguma preciosidade que ampliava seu acervo, o mesmo ocorrendo nas suas andanças pelo mundo, ele que gosta muito de viajar. Em sua casa, em meio à sua coleção, o maior problema de Sebá é selecionar quais filmes irá assistir, mas uma coisa é certa: os westerns sempre serão prioridade. Sebá Santos atendeu ao pedido de WESTERNCINEMANIA e relacionou quais os dez westerns que mais aprecia, aqueles que considera os melhores na vastidão do gênero. Eis as preferências do amigo Sebá devidamente por ele comentadas.


1.º) Matar ou Morrer (High Noon), 1952 – Fred Zinnemann


Feito em uma época em que o tradicionalismo estava bem instalado no gênero, com obras de baixo orçamento sendo lançadas aos montes, este longa-metragem mostrou-se revolucionário e controverso por apresentar o que não se esperava. A figura do xerife deixa de ser sinônimo do cara durão, ou qualquer coisa que se resuma a adjetivo, e passa a ser humano. Além de mostrar este lado, o filme ainda oferece como bônus o fato de sua história se passar em tempo real, que apenas aumenta a tensão e a pressão do conflito mental do protagonista. É uma das poucas vezes em que vemos uma abordagem tão distinta e tão realista, se posso dizer, do mito do Faroeste. Positiva ou negativa, tudo que é diferente sempre causa uma impressão. Para alguns esta obra é uma heresia, para outros uma demonstração do melhor que o cinema tem para oferecer. Gary Cooper levou o Oscar por este filme, o primeiro faroeste psicológico filmado em tempo real.

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2.º) Os Brutos Também Amam (Shane), 1953 – George Stevens


Um grande filme que discute o que é ser um pistoleiro, cavalgando sem destino pelas planícies (ao som de uma bela trilha sonora), apresenta-se como espectador alguém totalmente misterioso, na trajetória de Shane (Alan Ladd), que abandona as armas para trabalhar em uma fazenda onde eles proveem seu próprio sustento, mas é obrigado a voltar ao ofício, devido estarem sendo reprimidos por grandes fazendeiros do vale. Faroeste cheio de problemas e foge do estereótipo de herói invencível e autoconfiante encontrado nos filmes do gênero.

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3.º) Sete Homens e Um Destino (The Magnificent Seven), 1960 – John Sturges


Refilmagen de “Os Sete Samurais”, de Akira Kurosawa. A música-tema composta por Elmer Bernstein, primordial, acabou virando jingle de uma marca de cigarros. Mexicanos atacados por bandoleiros contratam sete pistoleiros para defender sua aldeia que era saqueada costumeiramente pelo bando liderado por Calvera. Este filme rendeu mais três versões sempre com o mesmo título. Interpretações magistrais.

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4.º) Duelo de Titãs (Last Train from Gun Hill), 1959 – John Sturges


O xerife de Gun Hill (Kirk Douglas) Matt Morgan, desloca-se ao rancho feudal mais importante da comarca, que é comandado por seu amigo de infância Craig Belden (Anthony Quinn). Procura o assassino de sua esposa, como pista ele tem a sela gravada com as iniciais de seu amigo. Porém não suspeita que o assassino de sua mulher é quem ele menos espera. Interpretação magistral de Kirk Douglas e Anthony Quinn, um colorido sensacional.

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5.º) A Conquista do Oeste (How the West Was Won), 1962 – Henry Hathaway, John Ford, George Marshall


Partindo para uma viagem para o Oeste nos anos 30, a família Prescott vai de encontro a um homem chamado Linus, que os ajuda a lutar contra um grupo de ladrões. Linus casa-se com Eve Prescott e trinta anos depois, vai para uma guerra civil com o filho deles. A irmã de eve, Lily, vai mais para o interior do Oeste e se aventura com um apostador de jogos, indo até São Francisco, em 1880. Imagem para encher os olhos, um dos primeiros filmes filmados em Cinerama (projeção com três projetores de imagem em Cinemascope). Conta a história da colonização dos Estados Unidos. Nas imagens em Blue Ray atual podemos ver a linha divisória da projeção de cada câmera.

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6.º) Josey Wales – O Fora-da-Lei (Outlaw Josey Wales), 1976 – Clint Eastwood


Após ter sua família assassinada pela União, pelo Capitão Terrill, sem poder fazer nada sai em busca de vingança. Wales se junta ao Exército Confederado, mas se recusa a se render quando a guerra termina. Seus amigos soldados entregam as armas e são massacrados por Terrill. Wales, então, atira em alguns homens de Terrill e vai para o Texas, onde tenta recomeçar a vida, mas a recompensa por sua cabeça coloca em perigo a vida dele e sua nova família. Sequência magistral e um dos melhores faroestes feitos na década de 70.

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7.º) Dança com Lobos (Dances with Wolves), 1990 – Kevin Costner


Protagonizado e dirigido por Kevin Costner, o oficial da cavalaria que serviu na Guerra Civil americana John Dunbar decide escolher um lugar para se estabelecer próximo à fronteira, onde se afeiçoa pela tribo dos índios Sioux. No transcorrer do filme ele tenta entender o modo de vida dos Sioux, o homem branco abre mão de sua carreira e vida pregressa para defender aqueles que julga oprimidos. Apesar de ter como herói um caucasiano, que é parte da tal tribo, Dunbar é uma exceção ao sofisma, já que se converte em um deles, entendendo em níveis sentimentais quais são os anseios e qual é a espiritualidade desses. Parte do filme falado na língua indígena, os atores tiveram que estudar para participar desta produção. Belíssima fotografia.

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8.º) Da Terra Nascem os Homens (The Big Country), 1958 – William Wyler


Gregory Peck é um marinheiro da Nova Inglaterra que, aposentado, resolve ir se estabelecer no Oeste, onde se casaria com a filha de um fazendeiro (Carroll Baker). Se torna motivo de escárnio entre os fazendeiros e cowboys da região. Sua noiva decepcionada por achar que seu noivo era um covarde, o repele. Acontece que o homem tem um princípio de vida muito forte: não precisa provar nada para ninguém, a não ser para ele mesmo, e começa um romance com uma moça local que acreditava nele (Jean Simmons). Um dos melhores filmes de westerns já feitos, tem tudo, ação, romance, ganância, inveja, covardia, filme completo, imagens belíssimas, sequência muito boa, etc.

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9.º) Rastros de Ódio (The Searchers), 1956 – John Ford


Ethan Edwards (John Wayne) retornando da guerra, procura sua família no Oeste, tendo sua família sido massacrada pelos Comanches, sua sobrinha sequestrada, parte em busca de vingança contra os índios que exterminaram sua família, ao mesmo tempo que tenta resgatar, com vida, sua sobrinha. Baseado em uma obra de Alan LeMay, é um dos westerns mais clássicos já feitos.

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10.º) Vera Cruz (Vera Cruz), 1954 – Robert Aldrich


Dois pistoleiros americanos viajam para o México no meio da Revolução Mexicana. Eles são contratados para proteger uma representante da nobreza e o tesouro que carrega, de um possível roubo, quando percebem, já estão envolvidos com a guerra. Interpretação magistral de Burt Lancaster e Gary Cooper e com a participação da lindíssima Sarita Montiel, pena que ela não demonstre seus dons artísticos nesse filme (sua voz).


Ao lado das estantes repletas de DVDs estão quadros com os mocinhos
dos westerns B que Sebá tanto admira, entre eles
Rex Allen, Rocky Lane e Durango Kid.

Filmes, filmes e mais filmes, de todos os gêneros na gigantesca
coleção do taubateano Sebá santos.


10 de julho de 2018

NO VELHO COLORADO (THE MAN FROM COLORADO) – GLENN FORD COMO VILÃO DA HISTÓRIA


O sucesso de “Gilda” não só fez de Rita Hayworth a então maior estrela de Hollywood como transformou Glenn Ford no principal galã da Colúmbia, estúdio que o mantinha sob contrato. Aos 31 anos o canadense Ford viu no próximo trabalho que a Colúmbia lhe apresentou um desafio pois teria que interpretar um personagem longe de ser simpático, um homem abominável. Borden Chase havia escrito “Blazing Guns on the Chisholm Trail” que ele mesmo roteirizou para o cinema com o título “Red River” (Rio Vermelho). Em seguida Chase escreveu “The Man from Colorado”, cujos direitos a Columbia adquiriu e Ben Maddow fez o roteiro e que seria o filme estrelado por Glenn Ford. Para dirigir o estúdio chamou Charles Vidor, o húngaro que dirigira “Gilda” e que antes da II Grande Guerra também dirigira Glenn Ford (ao lado de Randolph Scott) em “Império da Desordem” (The Desperadoes), western de 1943. O ator e o diretor estavam brigados devido porque Glenn Ford depôs a favor do chefão da Colúmbia (Harry Cohn) numa ação que Vidor impetrou contra o desbocado ‘mogul’. Charles Vidor iniciou as filmagens e não dirigia a palavra a Glenn Ford, orientando-o através de um assistente. O ator pressionou Harry Cohn e este substituiu Vidor por Henry Levin. O novo diretor era mais conhecido pelos filmes de aventura destinados a um público menos exigente e deu continuidade ao filme iniciado pelo diretor húngaro. Como na história “The Man from Colorado” havia um segundo papel masculino importante, a Colúmbia conseguiu o ‘empréstimo’ de William Holden junto à Paramount. No Brasil o novo western foi lançado como “No Velho Colorado”. (Nas fotos à direita vemos Ben Maddow e Borden Chase; abaixo Henry Levin e Harry Cohn)


Glenn Ford com William Holden na foto
do centro.
Um oficial desvairado – Nos estertores da Guerra Civil um destacamento sulista se rende às tropas da União acenando com uma bandeira branca. O Coronel Owen Devereaux (Glenn Ford) com binóculos é o único a ver o pedido de rendição mas ordena que os confederados sejam dizimados com tiros de canhão, relatando posteriormente seu procedimento em um diário particular. De retorno a Glory Hill, sua cidade, Devereaux que tinha formação como advogado é recebido com festas, honras de herói e é nomeado Juiz Federal, casando-se com Caroline Emmet (Ellen Drew). Seu companheiro no Exército, o Capitão Del Stewart (William Holden) que com ele disputa a simpatia de Caroline, é convidado para ser o Delegado Federal de Glory Hill. Stewart, no entanto, suspeita que Devereaux tenha algum tipo de distúrbio psicológico contraído durante a guerra, o que se confirma com sua primeira decisão como juiz. Chega à corte o caso de diversos ex-soldados que perdem suas possessões de mineração por terem passado mais de três anos a serviço do Exército, do que se aproveita o empresário dono da mineradora Great Star que reivindica junto ao Juiz a posse de toda a área. O Juiz Devereaux segue a lei à risca e dá ganho de causa à empresa, o que revolta os mineradores. Entrementes o ex-soldado Jerico Howard (James Millican) forma um grupo de revoltados, assalta e rouba a Great Star. Em consequência disso alguns mineradores são presos e condenados à forca por Devereaux. Diante da crescente loucura do Juiz, cada vez mais sádico, Stewart deixa o cargo e passa para o lado dos mineradores. Caroline também abandona o marido após descobrir e ler seu diário e, tomado pelo desvario, Devereaux exige que a população de Glory Hill informe onde se escondem os mineradores fugitivos. Ao não ser atendido Devereaux ordena que seja queimada a cidade e num confronto com Jerico ambos sucumbem em meio aos escombros em chamas.

William Holden e Glenn Ford;
Holden e Ellen Drew
O Juiz Devereaux e sua antítese – O roteiro de “No Velho Colorado” só não é perfeito por deixar de discutir mais amplamente a origem do distúrbio de Owen Devereaux que, modernamente, seria diagnosticado como insanidade produzida pela tensão vivida nos campos de batalha. Seja como soldado ou na condição de Juiz, Devereaux é cruel e desumano e sabe-se impotente quanto a essa sua natureza que não o abandona e contra a qual ele não esboça reação, apenas descrevendo-a em seu diário. Como o filme se inicia com o Coronel já exercitando seu desvario ao dizimar um destacamento rendido, imagina-se que sua desordem mental seja fruto da crueldade da guerra. No entanto, após seu retorno à vida civil, casado e empossado num cargo de grande distinção continua ele atormentado pelas contradições de sua personalidade. Borden Chase argutamente coloca ao lado de Devereaux um personagem – Del Stewart – que em tudo dele difere. Stewart é o Capitão íntegro, Delegado escrupuloso e concorrente leal na disputa pelo amor de Caroline, a antítese de Devereaux. As leis ditadas por Washington protegendo o capitalismo é um clamoroso libelo diante de tantas injustiças sociais legitimando a revolta dos mineradores. Aspecto interessante também é o triângulo amoroso que não se define com o casamento de Devereaux com Caroline. O roteiro de Ben Maddow evita os clichês do gênero culminando com o fim trágico não apenas do grande vilão da história bem como o fim de Jerico Howard, o bandido simpático.

Glenn Ford, William Holden
e abaixo James Millican
O talento de Glenn Ford – Filmado inteiramente em Corriganville, em longos 90 dias, prazo mais que extenso para a média das produções norte-americanas, “No Velho Colorado” é um western com pouca ação o que não significa que não prenda a atenção do espectador. A Henry Levin, o mesmo diretor da hoje clássica aventura “Viagem ao Centro da Terra” cabe o mérito de dar ao filme o ritmo ideal com aproveitamento exemplar do ótimo elenco de coadjuvantes. O jovem e então desconhecido Denver Pyle tem boa participação, assim como James Millican e os mais conhecidos Ray Collins e Edgar Buchanan. Ray Teal é o barmen em papel menor que sua presença exige. Ellen Drew é a única personagem feminina de destaque e deixa a desejar com atuação que não empolga. William Holden, que esperaria ainda mais dois anos até atingir plenamente a condição de astro com “Crepúsculo dos Deuses”, vê Glenn Ford demonstrar seu talento nem sempre reconhecido. Ford, que em “Gilda” fez o tipo durão, interpreta esplendidamente o psicopata megalomaníaco e sádico que ao final incendeia parte da cidade. Não se deixe trair pelos títulos (Inglês e nacional) pouco originais pois este é um dos melhores westerns do ano de 1948. Nesse ano foram exibidos o já referido “Rio Vermelho”, “O Tesouro de Sierra Madre” (The Treasure of Sierra Madre) e John Ford nos deu “Sangue de Heróis” (Fort Apache), cujo personagem principal é, igualmente, um oficial irascível e que tem ainda outra coincidência com “No Velho Colorado”: ambos os oficiais psicóticos atendem pelo prenome ‘Owen’.

William Holden e Edgar Buchanan; Holden, Buchanan, Ellen Drew e Glenn Ford

Denver Pyle e Glenn Ford; William Holden e Ray Teal; James Millican