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26 de abril de 2018

OS ÚLTIMOS MACHÕES (THE LAST HARD MEN) – ANDREW V. McLAGLEN EM MOMENTO DE SAM PECKINPAH



Acima o escritor Brian Garfield;
abaixo Andrew V. McLaglen
Ainda rapazola, Andrew V. McLaglen acompanhava o pai Victor McLaglen quando este era dirigido por John Ford, como em “A Patrulha Perdida”, “O Delator” e “A Queridinha do Vovô”. Chegou a ser assistente de direção (não creditado) em “Depois do Vendaval” e certamente muito aprendeu com o Mestre das Pradarias, tentando demonstrar isso em seus filmes. Com o tocante “Shenandoah” McLaglen chegou bem próximo de Ford e assim como o grande diretor dirigiu John Wayne diversas vezes. Certamente McLaglen gostaria de ter o Duke no elenco de “Os Últimos Machões”, o que não foi possível porque Wayne nesse mesmo ano de 1976 se despedia do cinema com o clássico “O Último Pistoleiro” (The Shootist). Charlton Heston foi então contratado para interpretar um velho ex-xerife aposentado, personagem perfeito para Wayne e bastante parecido com o ‘John B. Books’ do western de Don Siegel. Este faroeste com o horroroso título nacional “Os Últimos Machões” baseou-se em história do prolífico Brian Garfield, autor que ficaria mais rico e conhecido escrevendo a série “Desejo de Matar”, sendo o roteiro de autoria de Guerdon Trueblood. Como a tendência nos anos 70 era a de realizar filmes cada vez mais violentos, Andrew V. McLaglen entendeu que chegara a hora de se aproximar do estilo de Sam Peckinpah, o diretor que mudou o jeito de se fazer western com “Meu Ódio Será Sua Herança” (The Wild Bunch).


James Coburn e Charlton Heston
Vingador obsessivo - Prisioneiros da prisão de Yuma trabalham na construção de uma ferrovia quando conseguem escapar liderados pelo mestiço Zach Provo (James Coburn). Provo tem em mente um único objetivo que é se vingar do ex-homem da lei e agora aposentado Sam Burgade (Charlton Heston) que não só o prendera como teria matado sua esposa. Ao tomar conhecimento que o mestiço se evadiu e lidera o bando que o segue, Burgade forja a entrega de um carregamento valioso para atrai-los, mas Provo conhece bem o ex-xerife e não cai na armadilha. Ao invés disso sequestra Susan Burgade (Barbara Hershey), a jovem filha de Sam levando-a para um local que conhece bem e onde pretende capturar o ex-xerife para executar sua vingança torturando-o até a morte. Alguns dos fugitivos liderados por Provo tentam violentar Susan, o que Provo não permite pois como parte de sua retaliação quer que Sam assista ao estupro quando este ocorrer. Na busca por Susan o ex-xerife é acompanhado por Hal Brickman (Christopher Mitchum), namorado da jovem e mantidos à distância por Provo ambos presenciam Susan ser currada. Sam e Hal conseguem eliminar os demais bandidos, com o ex-xerife e o mestiço se enfrentando ao final numa luta brutal. Quando o fim de Sam parecia inevitável Susan alveja Provo matando-o.

James Coburn e John Quade;
abaixo Coburn e Larry Wilcox
Vingança bem temperada - O maior defeito de “Os Últimos Machões” não é a excessiva violência como apontaram alguns críticos que detestaram este western de Andrew V. McLaglen. À medida que o filme se desenvolve tudo se torna previsível e fica-se com a impressão que o autor da história mesclou “Os Profissionais” (The Professionals) com “A Noite da Emboscada” (The Stalking Moon) situando a ação durante a transição do Velho Oeste para a civilização que chegava, como ocorre no já referido “Meu Ódio Será Sua Herança”. O aposentado ex-xerife Sam Burgade é um personagem anacrônico que duvida da eficiência da tecnologia que chega com o novo século (o filme se passa na primeira década do século XX) e que vê sua filha ser raptada pelo mestiço que só pensa em vingança. O resultado é um faroeste que impressiona mais pela brutalidade que por seu enredo propriamente com o heterogêneo bando de fugitivos comportando racismo, selvageria e, como contraponto, inocência. Liderados pelo frio e engenhoso mestiço Provo há um mexicano (Jorge Rivero), um negro (Thalmus Rasulala), o racista (Robert Donner), o jovem ingênuo (Larry Wilcox) e os dois homens ávidos por satisfazer o reprimido desejo sexual após as temporadas passadas em Yuma (John Quade e Morgan Pauli). Com esses ingredientes é temperada a narrativa que tem como tema principal a bem esquematizada vingança.

James Coburn e Charlton Heston; Jorge Rivero com James Coburn

A suprema humilhação - Ninguém interpretava no cinema um personagem com maior dignidade que Charlton Heston como já se viu tantas e tantas vezes. Essa altivez reaparece na pele do velho homem da lei e é testada pelo bandido mestiço que, como parte da vingança, quer também humilhá-lo o que acontece na sequência mais chocante do filme.  Burgade deveria ver sua filha ser perseguida e estuprada e quer o mestiço que o Burgade nesse momento tente uma reação mostrando sua posição para assim ser alvejado. Este luta para reagir mas é contido com um golpe na cabeça desferido pelo mais racional jovem namorado de Susan e Burgade acaba não presenciando então o desfecho da curra como desejava o implacável mestiço. A razão de tanto ódio por parte de Probo é justificada pela morte de sua esposa, morte essa atribuída a Sam Burgade e da qual o próprio Burgade não tem total certeza. A certa altura Probo diz: “Não se morre por uma mulher, mas mata-se por ela”, não só orientando seus homens mas esclarecendo sua cega determinação.

Barbara Hershey; Larry Wilcox com Barbara Hershey

Violência geradora de violência - Não incomum em westerns é a simbiose entre personagens com o pacato tornando-se violento por força das circunstâncias e com o contato com tipos bárbaros. A ferocidade do mestiço é transferida para Burgade que reage com igual crueldade ateando fogo no pé da elevação onde os bandidos se refugiaram. Um deles morre queimado e o instinto bestial domina Burgade também cego de ódio pelo que sua filha passou nas mãos dos degenerados. Em tempos de Vietnã outros filmes igualmente procuraram justificar a crueldade de ambas as partes como que a defender a intervenção norte-americana. E esta história não deixa de ser um microcosmo de uma guerra. O western de McLaglen não poupou a violência que não é gratuita pois segue num crescendo com o insensível mestiço. Brutalidade filmada com competência pelo diretor que curiosamente não fez uso de cenas de nudez, isto considerando que a atriz seviciada no filme é Barbara Hershey.

James Coburn e Barbara Hershey

Charlton Heston
Heston em segundo plano - James Coburn domina inteiramente o filme como o psicótico mas sempre ardiloso mestiço. Simpático na maioria de seus filmes, com laivos de peculiar cinismo, este excelente ator compõe um personagem bastante assustador sem desabar na caricatura. O experiente Charlton Heston bem sabia que vilões se tornam atração maior que os heróis e pouco se esforça para se impor, mais ainda quando em cena com Coburn. A personagem de Susan merecia uma atriz mais nova que Barbara Hershey não devidamente aproveitada na característica que esbanja com perfeição, a sensualidade. Apenas em uma única sequência, quando dominada por James Coburn o olhar de Barbara denuncia o quanto mais poderia render com um script moldado mais cuidadosamente para ela. John Quade, presença constante nos filmes de Clint Eastwood, é a figura mais forte entre os muitos coadjuvantes, sobressaindo também Sam Gilman em rápida aparição. Christopher Mitchum mostra que o DNA do pai não foi suficiente para fazer dele um tipo igualmente impressionável. Atores que então se destacavam na televisão como Michael Parks e Larry Wilcox comparecem, ambos desperdiçando bons papéis. O posudo mexicano Jorge Rivero faz parte do grupo dos sete bandidos liderados pelo impiedoso personagem de James Coburn.

Andrew V. McLaglen
Diretor de 15 westerns - Este filme apresenta um fato curioso que é ter sua trilha sonora musical atribuída a Jerry Goldsmith sem que este tenha, de fato, composto material novo e sim se aproveitando de composições feitas para outros filme. Sem ser creditado, Leonard Rosenman foi o responsável por alguns entrechos musicais, entre eles aquele que encerra “Os Últimos Machões”, que melhor caberia em um western spaghetti. A bonita cinematografia é do quase desconhecido Duke Callaghan e a excelente direção de arte coube a Edward Carfagno, veterano de épicos como “Ben-Hur”, “Quo-Vadis” e “Júlio César”. Este foi o último western de Andrew V. McLaglen para o cinema, ele que ainda filmaria “Os Cavaleiros das Sombras” (The Shadow Riders), com Tom Selleck e Sam Elliott para a TV. Não pode ser esquecido seu trabalho para a televisão, tendo dirigido, entre outras séries, 96 episódios de “Gunsmoke” e 116 de “O Paladino do Oeste”. Com 15 westerns em sua filmografia McLaglen merece o respeito dos fãs do gênero pois fez alguns faroestes muito bons e encerra “Os Últimos Machões” não desaponta.