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21 de abril de 2011

BURL IVES, ARREBATADOR EM "DA TERRA NASCEM OS HOMENS"


Um grande filme é composto de grandes sequências, o que não falta em “Da Terra Nascem os Homens” (The Big Country). Uma dessas, sequências, verdadeiramente inesquecível, fez com que as platéias ficassem arrebatadas com aquele pouco conhecido ator em cena. O nome dele era Burl Ives que adentra o resplandecente salão da casa principal da fazenda do adulado ‘major’ proprietário de terras interpretado por Charles Bickford, onde transcorre um elegante baile. Um a um os pares vão parando de dançar, assim como a música também silencia. Todos, então, olham para aquela homem rude, vestido com simplicidade e que com coragem e personalidade, fitando diretamente nos olhos o todo poderoso dono da casa, o afronta dizendo-lhe coisas que ele jamais esperava ouvir, especialmente dentro da sua própria casa. A atuação do rotundo ator valeu-lhe um Oscar como Melhor Ator Coadjuvante. Burl Ives estava com 49 anos e era um veterano do rádio, do teatro, da televisão e no cinema já havia feito meia dúzia de filmes.

Burle Icle Ivanhoe Ives nasceu em 1909, em Hunt City, Illinois e aos quatro anos fez, cantando, sua primeira apresentação pública. Mais tarde, demonstrando enorme talento para a música, aprendeu a tocar banjo, o qual só deixava de lado para atuar como fullback no time de football da universidade onde estudava. A música falou mais alto e aos 21 anos Burl tocava guitarra e cantava pelas ruas conhecidas canções folclóricas. Passou a cantar no rádio e a gravar folk songs, fazendo amizade com os famosos cantores folks Woody Guthrie e Pete Seeger. Em 1945 Burl Ives estreou no cinema interpretando um cowboy-cantor no filme “Smoky”, estrelado por Fred MacMurray. Em 1950, em seu quinto filme, Burl atuou no western “Serras Sangrentas” (Sierra), em que o mocinho foi Audie Murphy. Serras sangrentas eram as colinas de Hollywood, onde vivia-se o período mais negro da história do cinema norte-americano e o senador Joseph McCarthy comandava a odiosa caça às bruxas. Os suspeitos de simpatia pelo comunismo era convocados a depor na famosa comissão organizada pelo senado para expurgar o cinema dos inconvenientes que tinham ideologia diferente da permitida. A música folclórica, de aparente inocência, trazia subliminares mensagens sociais, isto quando não cantava diretamente o sofrimento que o capitalismo impunha ao povo menos afortunado. E Burl Ives foi convocado pela patrulha anticomunista. A princípio negou-se a relatar nomes de possíveis simpatizantes do comunismo, sendo então colocado na lista negra de Hollywood e impedido de atuar no cinema, do qual ficou longe por quase cinco anos. Diante das dificuldades que o cercaram, Burl Ives decidiu “cooperar” com o comitê, dando seu depoimento aos homens de McCarthy. Taxativamente disse que não era membro do Partido Comunista, mas que participou, juntamente com Pete Seeger de algumas reuniões com membros de sindicatos. Ives completou: “Vocês sabem quem meus amigos são. Se quiserem saber se eles são ou não comunistas, perguntem, a eles.” As bruxas estavam mesmo era atrás de Pete Seeger e, após o depoimento de Burl Ives, Seeger rompeu sua amizade com o amigo, que passou a considerar um delator. Todos os demais cantores de folk songs também romperam relações com Ives, para quem as portas do cinema se reabriram enquanto Seeger e outros ex-amigos se afastavam. 40 anos depois desses fatos, Burl Ives e Pete Seeger voltaram a cantar juntos num concerto beneficente em Nova York. Os anos da caça às bruxas eram apenas uma triste lembrança.

Enquanto esteve longe do cinema, Burl Ives passou a fazer teatro e impressionou os críticos e o público com sua criação como Big Daddy Pollitt na peça de Tennessee Williams intitulada “Gata em Teto de Zinco Quente”. Ainda na Broadway, Burl Ives participou de outro grande sucesso que foi a montagem de “Paint Your Wagon”, que seria levada ao cinema em 1969 com Lee Marvin e Clint Eastwood com o título de “Aventureiros do Ouro”. Burl Ives aproximou-se cada vez mais da música country, tornando-se um conhecido menestrel com seus 130 kg de peso e uma incomparável voz que fez dele um cantor de enorme sucesso. Gravou dezenas de discos e vendeu milhões de cópias de seus álbuns cujas canções abrangiam a maravilhosa vastidão da country-music. A música era a principal ocupação de Burl Ives que gravava e se apresentava incessantemente. Mas Burl retornou ao cinema em 1955 sob a direção de Elia Kazan (também acusado de delator) em “Vidas Amargas” (East of Eden), filme em atuava o jovem James Dean. Sua grande atuação nesse filme não passou despercebida a ninguém e o cantor-ator começou a receber cada vez mais convites para filmar, podendo até escolher os filmes em que queria atuar. Quando “Gata em Teto de Zinco Quente” foi levada para o cinema, Paul Newman e Elizabeth Taylor sabiam que teriam que enfrentar diante das câmeras um ator da envergadura (física e técnica) do grande Burl Ives. Em “Desejo”, ao lado de Sofia Loren, Burl Ives teve outra atuação não menos que magnífica como o pai que descobre que sua jovem esposa (Sofia Loren) o trai com seu próprio filho (Anthony Perkins). A seguir veio então “Da Terra Nascem os Homens”.
William Wyler sempre foi um excepcional diretor de atores. E Willy deu a Burl Ives a oportunidade de interpretar Rufus Hannassey, personagem com o qual pode extravassar todo seu imenso talento. A referida cena do baile é emblemática na carreira de Burl Ives pois todos os presentes naquele set de filmagem escutaram seu monólogo em profundo e respeitoso silêncio. Gregory Peck, Carroll Baker, Charlton Heston, Jean Smmons, Charles Bickford e mais duas dúzias de atores e outros tantos técnicos sabiam que estavam tendo a rara oportunidade de assistir a uma atuação merecedora de um Oscar, que de fato Burl Ives recebeu por essa interpretação. A seguir Ives atuou sob a direção de André De Toth e ao lado de Robert Ryan no excelente “A Quadrilha Maldita” (Day of the Outlaw). Depois de deixar sua marca indelével no cinema com os poucos filmes em que atuou, Burl Ives não encontrou mais filmes onde seu imenso corpanzil e talento ainda maior pudessem ter o merecido espaço. Continuou a trabalhar, no cinema e na TV, dos quais foi se afastando pouco a pouco para dedicar-se mais à música.

Burl Ives em vários momentos de "Da Terra Nascem os Homens".
Na foto abaixo entre Chuck Connors e Gregory Peck.

 No final de sua carreira Burl Ives havia gravado aproximadamente cem álbuns, alguns deles verdadeiramente clássicos. Ouvi-lo cantar "Juanita" ou recriar maravilhosamente "Mexicali Rose", dão uma amostra da arte desse incomparável abrdo. A voz melíflua de Burl Ives pode, ainda, ser ouvida em incontáveis narrações para documentários, mas nada que se comparasse à sua presença simpática no palco ou na TV. Apreciador inveterado de cachimbos e charutos, Burl Ives contraiu câncer na garganta e, após várias cirurugias, faleceu aos 85 anos, em 1995. Mas a cada vez que se revê "Da terra nascem os Homens" é impossível não se emocionar com o grande e inesquecível ator Burl Ives.

5 comentários:

  1. Ja falei por demais e inumeras vezes, em outros topicos, a respeito desta obra que, para mim é o faroeste mais completo já feito. Da terra Nascem os Homens é algo que, para se ter alguma imitação, irá precisar novamente de toda mesma equipe de sua confecção e mais algumas muitas outras coisas, fato impossível totalmente de vir a ocorrer.
    No entanto, jamais falei com ressalvas deste fabuloso interprete Burl Yves, ator com quem vi apenas quatro filmes e que desconhecia seu lado musico.
    O vi em Serras Sangrentas, agarrado àquele violão e cantando como um passarinho. Imaginava estar o mesmo fazendo dublagem de algum cantor, haja visto desconhecer, como citei, esta caracteristica no enorme ator.
    E fico engrandecido, eu, apreciador de tudo de bom que o cinema já me deu, de ficar sabedor de mais esta proeza do ator, uma vez seu premio no filme ser algo à parte, ou seja, merecidissima vitória sobre seus concorrentes.
    Até parecia um prologo, quero dizer, seu papel muitissimo parecido em Gata em Teto de Zinco Quente, como se uma preparação para interpretar o chefe do clã Hannassey desta magnifica pelicula.
    E ele tinha de se encaixar muito bem na historia daquela pelicula, já que todos atores têm papeis dinâmicos e bem construidos, enquanto ele, pai do bom Chuck Connors, se não bem interpretado, iria ficar aquém até do filho.
    Porém o talento do grande ator falou altissimo e ele fez aquela interpretação digna do premio que lhe caiu nas mãos.
    jurandir_lima@bol.com.br

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  2. Só me recordo de três filmes com Burl Ives. Porém sempre o achei um excelente ator. No incomparável "Da terra nascem os homens" ele é inesquecível.
    Eu desconhecia seu lado cantor, e só muito recentemente notei que a música "ninety nine", tema de abertura do filme Gun Glory (A arma de um bravo) é interpretada por ele.

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  3. Faroeste 5 estrelas, um dos melhores da história do cinema.
    Atuação impactante de Burl Ives, incluindo a cena antológica
    que interrompe a festa do proprietário milionário...

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  4. Faroeste 5 estrelas, um dos melhores da história do cinema.
    Atuação impactante de Burl Ives, incluindo a cena antológica
    que interrompe a festa do proprietário milionário...

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  5. Detalhe: Começou no cinema em 2 filmes dirigidos por Louis King, irmão de ninguém menos que mestre Henry King. Sua estréia no adorável "Furacão Negro" ("Smoky", 1946) é de encher os olhos e, ainda mais, os ouvidos e a alma. O filme foi um dos mais lucrativos da Fox naquele ano. Aquele abraço!

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