69 anos pode ser considerada uma idade
avançada para exercer certas profissões, entre elas a de diretor de cinema. Em
1954 Allan Dwan estava com essa idade e dirigiu nada menos que três filmes,
todos movimentados westerns: o bom “Montana, Terra do Ódio” (Cattle Queen of
Montana), o excelente “Homens Indomáveis” (Silver Lode) e o menos conhecido “Sob
a Lei da Chibata” (Passion). Todos esses filmes foram produzidos por Benedict
Bogeaus em parceria com a RKO Radio Pictures, já nos estertores do estúdio
ainda sob o comando de Howard Hughes que envidava todos os esforços para
liquidá-lo com sua má gestão. Em Hollywood contava-se a piada que Allan Dwan já
dirigia filmes quando foi inventada a luz elétrica, só porque esse canadense
iniciou sua carreira de diretor em 1911, tendo entre seus filmes mais famosos “A
Lei da Fronteira” (Frontier Marshal), com Randolph Scott e “Iwo-Jima, Portal da
Glória”, com John Wayne. Com “Sob a Lei da Chibata” Allan Dwan demonstra sua
inegável competência para dirigir filmes de pequeno orçamento, sem grandes astros
mas com diversos atrativos.
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Cornel Wilde e John Qualen; Rodolfo Acosta à frente de Peter Coe, Lon Chaney Jr. e Zon Murray. |
Vingança
parcial - Quando a Califórnia estava ainda sob domínio mexicano, no
período pré-guerra mexicano-americana em 1846, o grande proprietário de terras
da cidade de Granada, Don Domingo (Richard Hale), pretende se apossar também de
pequenas propriedades. O avô de Don Domingo havia repassado terras, sem
documentação, aos colonos da região e seu ganancioso neto usa da força para
conseguir seu intento. Salvador Sandro (Rodolfo Acosta) é o braço direito de
Don Domingo, liderando um grupo de bandidos que seguem suas ordens. Um dos
pequenos proprietários aterrorizados pelo bando é Gaspar Melo (John Qualen),
pai das gêmeas Rosa e Antonia (Yvonne De Carlo). Rosa teve um filho com Juan
Obreon (Cornel Wilde), vaqueiro que de retorno a Granada quer se casar com ela.
As ameaças de Salvador Sandro são rechaçadas por Gaspar Melo mas este tem sua
hacienda atacada e queimada, sendo morto juntamente com a filha Rosa. Esta
consegue esconder o bebê que é salvo por um casal de camponeses. Juan Obreon
decide vingar-se do bando de assassinos atraindo contra si o Capitão Rodriguez
(Raymond Burr), chefe de polícia de Granada. Obreon consuma parcialmente a
vingança matando quatro dos homens de Salvador Sandro, que a mando de Don
Domingo foge de Granada tentando se refugiar na região da Sierra. Rosa descobre
que seu sobrinho está vivo e a tempo avisa Obreon que havia localizado Sandro
nas montanhas geladas. Obreon alcança Sandro que sofre um acidente mas antes de
falecer confessa ao Capitão Rodriguez toda a trama ordenada por Don Domingo. O
policial promete a Obreon livrá-lo de uma pena maior pelos assassinatos cometidos
e descortina-se a possibilidade de uma nova vida com Obreon e Toña juntos.
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Yvonne De Carlo |
Melodrama
a la Pelmex - O enredo de “Sob a Lei da Chibata” é rotineiro nos
faroestes, diferenciando-se apenas por ser vivido por mexicanos que habitavam a
Califórnia. Mas há na história ingredientes trágicos típicos dos melodramas
produzidos pelo cinema mexicano como as duas irmãs que se enamoram pelo mesmo
homem, sendo uma (Rosa) plácida e de modos discretos e a outra (Toña) o oposto,
ambas interpretadas por Yvonne De Carlo. Rosa é mãe de um bebê que é dado como
morto no incêndio criminoso que vitima a família Melo, com exceção de Toña que
consegue escapar. Desesperado Juan Obreon inicia sua vingança mal se dando
conta que Toña o ama. Obreon mata sucessivamente Castro (Lon Chaney Jr.), Martinez
(Frank DeKova), Colfre (Peter Coe) e Barca (Zon Murray), bandidos que seguem as
ordens de Salvador Sandro, braço direito do inescrupuloso Don Domingo. Entre tantas
mortes e desgraças familiares, “Sob a Lei da Chibata” evita a rivalidade em
relação às irmãs. A radiante e jovial Toña, somente tem despertada sua atração
por Obreon após a morte da irmã Rosa.
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Cornel Wilde e Frank DeKova |
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Rodolfo Acosta acima e abaixo empurrado por Cornel Wilde. |
Agonia
na nevasca - O título nacional faz menção à chibata, sendo que em
apenas uma sequência durante todo o filme é usado um chicote. Obreon se utiliza
de facas para executar seus oponentes, sempre em forma justa de duelo e mesmo
Salvador Sandro deveria morrer dessa maneira. No entanto a trama comum e as
nuances fatídicas são desenvolvidas engenhosamente por Allan Dwan afastando o
tom patético que o filme poderia ter. Duas das mortes dos homens de Salvador Sandro
não são vistas, mas são compensadas pela espetacular luta travada entre Obreon
e Castro, com a morte deste. Menos intensa, mas bem encenada é a morte de Martinez,
com Allan Dwan reservando o melhor do filme para os últimos 20 minutos (o filme
tem 84 minutos de duração), com a fuga do bandido Sandro para a Sierra tomada
pela neve. O diretor cria uma agoniada movimentação com o bandido sendo perseguido
por Obreon que por sua vez é perseguido pelo Capitão Rodriguez e pelo Sargento
Muñoz (Anthony Caruso). A tensão se dá não por uma luta ou troca de tiros mas
sim por Obreon arrastando o corpo enregelado de Sandro para uma cabana próxima
ao túmulo do Bom Samaritano onde o bandido sobrevive o suficiente para
confessar os crimes cometidos. Essa muito boa sequência com o cenário branco e
gelado lembra o antológico final de “Quadrilha Maldita” (Day of the Outlaw), de
André De Toth, de 1959 e também o extraordinário “O Vingador Silencioso” (Il
Grande Silenzio), de Sergio Corbucci, realizado em 1968. Poderia ser melhor
desenvolvida por Allan Dwan a trama paralela da disputa entre o Capitão Rodriguez
e o Sargento Muñoz. Rodriguez foi amigo de Juan Obreon e acredita na nobreza
dos motivos que o leva a se vingar, porém o Sargento a tudo percebe e ironiza o
procedimento tolerante de seu superior. Fica-se a esperar uma traição de Muñoz,
o que afinal não acontece.
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Raymond Burr e Anthony Caruso; Cornel Wilde carregando Rodolfo Acosta. |
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Rodolfo Acosta |
Destaque
para Rodolfo Acosta - Cornel Wilde e Yvonne De Carlo nada
têm que os faça passar por mexicanos e sequer os trajes ajudam muito. Wilde é
bom ator e De Carlo é apenas bonita e simpática, aparecendo em dose dupla para
deleite dos fãs. Yvonne é atriz mais talhada para comédias, como comprovaria
quando o cinema deixou de explorar seus atributos físicos. E para quem já viu
John Qualen interpretar tipos nórdicos tantas vezes no cinema certamente não conterá
o riso ao vê-lo forçar um sotaque mexicano. Raymond Burr está inteiramente
deslocado como o policial condescendente e quem rouba as cenas nas quais
participam são Rodolfo Acosta e Lon Chaney Jr. Em seu segundo ano no cinema
norte-americano, Acosta que era grande nome do cinema mexicano, tem em “Sob a Lei da Chibata” um de seus maiores e melhores
desempenhos nos estúdios de Hollywood. Lon Chaney Jr. com as marcas que o vício
do álcool lhe impôs impressiona fortemente, mais ainda com a esplêndida iluminação
que o cinegrafista John Alton parece fazer questão de lhe reservar. O ótimo
elenco de coadjuvantes tem ainda Anthony Caruso, Richard Hale, John Dierkes e
Alex Montoya em boas participações. Stuart Whitman em início de carreira interpreta
um atrevido vaqueiro mexicano e Clayton Moore, então afastado da série “The
Lone Ranger” faz uma ponta.
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Anthony Caruso e Raymond Burr; Stuart Whitman e Yvonne De Carlo. |
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Cornel Wilde e Lon Chaney Jr.; Cornel Wilde e Frank DeKova. |
Allan
Dwan, diretor que não falha - Filmado em Technicolor, um destaque
de “Sob a Lei da Chibata” é a fotografia de John Alton. Este diretor de
fotografia que após se destacar em dezenas de filmes ‘B’ como o policial-noir “Império
do Crime” passou para as grandes produções entre elas “Entre Deus e o Pecado” e
“Os Irmãos Karamazov”. Western bem feito e interessante por sua ambientação, “Sob
a Lei da Chibata” merece ser visto especialmente para comprovar o talento de
Allan Dwan como dos melhores diretores de westerns de pequeno orçamento.
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Yvonne De Carlo no centro como Toña; nos extremos como Rosa. |
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Zon Murray, Frank DeKova e Lon Chaney Jr.; Rodolfo Acosta e Peter Coe. |
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Cornel Wilde duas vezes com Yvonne De Carlo. |
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A morte de Rodolfo Acosta, vendo-se Cornel Wilde, Yvonne De Carlo, Raymond Burr e Anthony Caruso. |
A cópia de "Sob a Lei da Chibata" foi gentilmente cedida pelo cinéfilo Marcelo Cardoso.
Salve Salve Darci!
ResponderExcluirComo vai? Tudo certo?
Posso ficar um bom tempo sem aparecer por aqui, mas quando venho me delicio.
Sempre um ótimo texto, sempre um "novo" filme! Mais um por sinal que eu não conhecia! DeCarlo está linda nessa interpretação dupla. Curioso ver o logo da RKO em Technicolor, acho que até hoje nunca vi um filme desse estúdio em cores! Ótimo post amigo!
Abraços!
Olá, Jefferson - Que alegria rever o amigo por aqui. Esse filme é em Technicolor, mas o melhor da RKO é mesmo em preto e branco. Cidadão Kane que o diga. Abraço do Darci.
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