George Marshall jovem e idoso |
Historias reais ou não tendo como pano
de fundo a Guerra de Secessão, Cavalaria contra índios, heroísmo de um ou mais
soldados ou de todo um regimento e defesa de forte sitiado por índios, isso
tudo já havia sido levado à tela incontáveis vezes por Hollywood. Vez ou outra
alguma mulher se destacava em uma historia escapando de ser apenas um
complemento romântico e até pegando em armas. Nada porém que chegue perto de “O
Renegado do Forte Petticoat”, western em que as mulheres é que formam um
pequeno e destemido exército defendendo-se numa espécie de ‘Álamo’ feminino.
Nem o autor da historia original (C. William Harrison) ou o roteirista (Walter
Doninger) demonstraram através de seus trabalhos maior afinidade com o
faroeste, daí a surpresa maior desta emocionante e insólita aventura dirigida por George Marshall. Este veterano diretor, que iniciou sua carreira em 1916,
passou por diversos gêneros de filmes até que em 1939 chamou a atenção com o
hoje clássico “Atire a Primeira Pedra” (Destry Rides Again), mesclando com
maestria ação, romance e comédia. A seguir Marshall dirigiu mais alguns
faroestes mas nunca se tornou um especialista no gênero. Mesmo assim Marshall
foi designado para dirigir um dos segmentos mais difíceis do épico “A Conquista
do Oeste” (How the West Was Won), o segmento intitulado ‘A Estrada de Ferro’.
George Marshall já havia dirigido Audie Murphy no ótimo “Antro da Perdição”,
justamente uma refilmagem de “Atire a Primeira Pedra”, mas foi com “O Renegado
do Forte Petticoat” que realizou um dos melhores westerns estrelados por Audie
Murphy.
Audie Murphy |
O
heroico desertor de dois exércitos - Durante a Guerra Civil um Coronel do
Exército da União, comandante do Forte Petticoat, ordena o massacre de Sand
Creek, no Colorado. O Tenente Frank Hewitt tenta a todo custo evitar a ação de
seu comandante mas o extermínio dos Cheyennes acontece. O Tenente Hewitt (Audie
Murphy) é texano e, tendo recebido voz de prisão por criticar seu tresloucado
superior, deserta do Forte e ruma para Jonesville, sua cidade no Texas, tencionando
avisar a população que os Comanches atacarão os brancos após o massacre no
Colorado. Nessa cidade texana restam apenas velhos, mulheres e crianças uma vez
que os homens estão todos no Exército Confederado. Hewitt é mal recebido porque
é considerado traidor por defender o Norte e usar a desprezível farda azul
inimiga. Hewitt decide levar as mulheres até uma missão abandonada para evitar
que elas sejam vítimas do iminente ataque Comanche. Relutantes elas acabam
acompanhando Hewitt que na missão as treina com seus conhecimentos militares
ensinando-as a atirar e até mesmo técnicas de combate corpo-a-corpo. Três
bandidos ficam sabendo que as mulheres estão na missão e decidem tirar proveito
das mesmas considerando-as indefesas. São, no entanto rechaçados por elas,
afastam-se e são emboscados pelos comanches, a quem contam que na missão há
mulheres e ouro. Os Comanches atacam a missão e bravamente o exército feminino
se defende liderado pelo Tenente Hewitt secundado pela Sargento Hannah Lacey.
Após uma violenta batalha onde ocorrem muitas baixas entre as mulheres, Hewitt
captura o feiticeiro Comanche e isto faz com que os supersticiosos guerreiros
índios batam em retirada.
Audie Murphy entre Kathryn Grant Patricia Tiernan |
Mulheres
lutando e amando - “O Renegado do Forte Petticoat” é um
daqueles filmes que se assiste com prazer do começo ao fim e ainda se lamenta
quando termina. Muita ação de excelente qualidade com pequeno show dos stuntmen
Charles Horvath, Al Wyatt Sr. e Jack N. Young. Como Evelyn Finley foi
creditada no elenco, muito provavelmente ela tenha dublado algumas mulheres em sequências
de lutas. Sim, porque as mulheres fazem de tudo neste western, inclusive duas
delas (Kathryn Grant e Patricia Tiernan) disputam o amor de Murphy. A historia
pode soar inverossímil, assim como o desfecho, quando tudo parecia perdido com
os índios cada vez mais ferozes dentro da missão, mas a simpatia irradiada pelo
exército de saias minimiza esses aspectos discutíveis.
Hope Emerson e Peggy Maley; Peggy maley e Audie Murphy |
Charles Horvath e Willard W. Willingham |
Comanches
supersticiosos - O roteiro foi bastante feliz ao situar a historia no
período da Guerra Civil e colocando o Tenente Hewitt como desertor de ambos os
lados. E mais ainda por ser ele um texano e também por a ação se passar numa
missão abandonada, certamente uma referência ao Álamo onde houve a heroica e
conhecida resistência. Sem nenhum pudor foi ainda inserido na historia o
massacre de Sand Creek lembrando a que ponto pode chegar a insanidade de um
oficial neurótico, contestado, é certo pelo Tenente Hewitt. Para um western
rodado em 1957, quando o revisionismo era ainda incipiente, é bastante louvável
esse achado do roteiro. Por outro lado, se os Cheyennes foram dizimados no
Colorado, os Comanches no Texas são mostrados como impiedosos e só não ocorreu
um segundo massacre no filme, o das mulheres que se encontravam na missão,
devido à superstição dos Comanches, o que não deixa de ser uma solução
inteligente. Até porque não haveria como a Cavalaria tocar sua corneta e
arremeter contra os índios uma vez que havia uma guerra se desenvolvendo e
praticamente todos os soldados dela participando.
Foto da missão com Audie Murphy e as defensoras, lembrando o Álamo |
Audie Murphy na defesa da missão sitiada |
Audie
Murphy, astro único entre as mulheres - Este western foi produzido pela
associação de Audie Murphy com Harry Joe Brown, o produtor mais conhecido por
sua parceria com Randolph Scott. Faroeste quase inteiramente rodado no Arizona,
em belíssimas locações, deixa um pouco a desejar quanto à preocupação com a
autenticidade, a começar pela farda de Audie Murphy cujo modelo não era ainda
usado durante a Guerra de Secessão, bem como alguns fuzis utilizados nas
sequências de batalha. Sem falar nos penteados de algumas das ‘soldados’ que
jamais poderiam se manter tão bem arrumados naquela situação em que salvar a vida
era a prioridade. Mas num filme movimentado e emocionante como este, quem vai
se preocupar com esses detalhes, até porque não é uma superprodução e sim um
faroeste com orçamento médio e no qual Murphy é a única grande estrela. Das
duas ou três dezenas de mulheres que contracenam com o ator nenhuma era estrela
capaz de atrair maior público. O mesmo vale para os coadjuvantes masculinos,
muito bons por sinal, mas apenas isso. Mesmo assim não se pode dizer que Audie
Murphy carrega o filme sozinho porque entre ‘seus homens’, como ele chama o
exército de saias estão as ótimas Hope Emerson, Jeanette Nolan e a boa surpresa
que é Peggy Maley.
Hope Emerson e Audie Murphy; abaixo Jeanette Nolan |
A
gigante ‘Sargento Lacey’ - Confesso que não sou o maior fã de
Audie Murphy e isso tem ficado patente nas inúmeras resenhas nas quais não raro
lembro das limitações interpretativas do pequeno ator. E Audie possui muitos
defensores não só de seus faroestes, alguns de fato muito bons, mas também dele
dele como intérprete. Em “O Renegado do Forte Petticoat” Audie se sai
esplendidamente, ele que nasceu no Texas assim como o Tenente Frank Hewitt da
historia. Audie é discreto como soldado, enérgico como líder das mulheres e tímido o
suficiente quando é disputado por duas soldados. Ray Teal, James Griffith e
Nestor Paiva, nenhum deles um vilão do porte de Dan Duryea, por exemplo, formam
um trio de bandidos assustadores pela frieza e maldade. John Dierkes tem uma
pequena participação e Sean McClory não desaponta como o texano covarde. Entre
as muitas mulheres deste faroeste o destaque fica, como não poderia deixar de
ser para Hope Emerson, a ‘Sergeant Lacey’, ela que do alto dos seus 1,88m impõe
respeito e é muito engraçada. A ótima Jeanette Nolan desta vez como uma
fanática religiosa que irrita a todos na missão. Kathyn Grayson (esposa de Bing
Crosby na vida real) e Jeff Donnell desperdiçam os dois melhores papeis
femininos permitindo que Peggy Maley se destaque como a saloon girl de coração
de ouro.
Diversão
garantida - Distante das tantas historias com os costumeiros enredos,
“O Renegado do Forte Petticoat” merecia ser muito melhor lembrado na filmografia
de Audie Murphy. E é um ponto alto na carreira do diretor George Marshall,
mesmo tendo sido produzido para os saudosos programas duplos dos antigos
cinemas de bairro e do interior. Diversão garantida para quem gosta do gênero,
mesmo aqueles que não estão entre os maiores fãs de Audie Murphy.
Acima e abaixo dois belíssimos trabalhos de arte para promover "O Renegado do Forte Petticoat" |