Aos quase 60 anos, em 1971/1972, Burt Lancaster surpreendeu o mundo do cinema atuando em três westerns intitulados “Mato em Nome da Lei” (Lawman), “O Retorno de Valdez” (Valdez is Coming) e “A Vingança de Ulzana” (Ulzana’s Raid). Eram tempos em que a presença das forças norte-americanas no Vietnã era fortemente condenada mas encontrava também alguns poucos que tentavam justificá-la. “Mato em Nome da Lei” é uma alegoria àquela guerra ainda que o western de Michael Winner se abstenha de qualquer tipo de julgamento. Justamente por fazer referência indireta à presença de Tio Sam no Vietnã, esse western foi praticamente ignorado quando de seu lançamento, somado ainda à dose elevada de violência e ao uso de características técnicas próprias dos westerns-spaghetti. Hoje, visto à distância daquele momento político e após os tantos filmes em que justiceiros tentam sozinhos implantar a lei e a ordem, “Mato em Nome da Lei” deixa uma impressão bastante melhor que quando de seu lançamento, tempos que alguém já chamou de “os intoxicantes anos 70”.
Lee J. Cobb e Albert Salmi, vítimas de Jared Maddox |
UM HOMEM CONTRA UMA CIDADE - O filme conta a história do Marshall Jared Maddox (Burt Lancaster), inflexível homem da lei que sai de Bannock, cidade onde é a autoridade, em direção Sabbath, cidade dominada pelo fazendeiro Vincent Bronson (Lee J. Cobb). Maddox não tem nenhuma jurisdição em Sabbath, o que não o impede de tentar prender sete homens responsáveis por um assassinato ocorrido lá em Bannock. Bronson e seus homens foram os responsáveis por essa morte quando passaram por Bannock e inconsequentemente dispararam tiros a esmo. O Marshall Maddox quer prender os responsáveis pacificamente contando para isso com a ajuda da autoridade local, o Marshall Cotton Ryan (Robert Ryan). No entanto Cotton é também subordinado a Bronson, assim como praticamente todos na cidade, desde o prefeito, passando pelos comerciantes até chegar aos modestos rancheiros. Sabendo-se ameaçados os homens de Bronson tentam enfrentar Maddox e vão sendo mortos à medida que os enfrentamentos ocorrem, entre eles o filho de Bronson o que o leva cometer suicídio. Apenas um jovem chamado Crowe Wheelright (Richard Jordan) sobrevive, aparentemente porque aceita a intransigente maneira de ser de Maddox.
Sheree North entre R. Ryan e R. Duvall |
WESTERN SEM HOMENS MAUS - Jared Maddox é um homem solitário, triste e taciturno que não admite que um crime fique impune e se necessário executa ele próprio a justiça, sua forma de impor a lei e a ordem. Maddox não é propriamente um justiceiro ou um regulador pois está investido da autoridade nos limites de sua cidade. Fora de sua jurisdição usa o distintivo e a fama de homem frio e sem escrúpulos para se impor. Maddox tem seu próprio código de ética e age movido pela filosofia própria em que uma morte sempre se justifica quando ela ocorre no cumprimento da lei. Diferentemente dos fazendeiros poderosos de outros westerns, Bronson é dotado de equilíbrio e senso de responsabilidade. É um barão de gado que dá liberdade a cada um de seus homens para que decidam quanto ao enfrentamento com Maddox. O mesmo Bronson tem uma ambígua relação com Harvey Stenbaugh, seu braço direito e tenta uma saída menos drástica para o impasse da rendição de seus homens mesmo sabendo que Maddox é impiedoso e inflexível. A chegada de Maddox a Sabbath levou pânico não só aos homens que procurava mas a todos que lá viviam. Ocorre um movimento dos cidadãos que tenciona enfrentar Maddox fazendo uso da desigualdade numérica, mas o Marshall de Bannock os desarma com poucas palavras, com seu olhar e os convence com seu ideal de justiça. A rigor não há homens maus em Sabbath.
ANTECIPANDO OS HERÓIS MODERNOS - Maddox é um personagem incomum nos westerns, mais próximo dos tipos que o cinema criou nos anos 70 como ‘Dirty’ Harry Callahan (Clint Eastwood) e Paul Kersey, o justiceiro interpretado por Charles Bronson em filmes dirigidos pelo mesmo Michael Winner. As mulheres são acidentes na vida desses personagens, assim como para Jared Maddox, representadas em “Mato em Nome da Lei” por Laura Shelby (Sheree North), companheira de uma noite de amor. Laura alimenta a ilusão de acompanhar Maddox mas termina vendo-o assassinar seu marido em fuga no meio da rua principal de Sabbath, com um tiro pelas costas. Essa morte, mais que qualquer outra define Jared Maddox, aquele que não possui nenhum sentimento de piedade e confirma o que lhe disse a própria Laura que ele, Maddox, era um ‘widowmaker’ (fazedor de viúvas). A próxima seria exatamente ela.
Cena violenta do suicídio de Bronson (Lee J. Cobb) |
REUNIÃO DE TALENTOS MADUROS - “Mato em Nome da Lei” tem um elenco excepcional pois somente atores do porte de Lee J. Cobb e Robert Ryan seriam capazes de transformar protótipos como os personagens do barão de gado (Cobb) ou do xerife submisso (Ryan) em seres complexos. O mesmo pode ser dito das ótimas interpretações de Robert Duvall e Albert Salmi. O filme tem a presença da bonita Sheree North que tão poucas oportunidade teve no cinema, uma delas em “O Último Pistoleiro” (The Shootist), de Don Siegel, além de um magnífico elenco de apoio. A lamentar o desperdício de Joseph Wiseman num papel de menor importância e que não foi melhor desenvolvido. Burt Lancaster domina o filme todo criando mais um personagem brutal na sua incontável galeria de tipos fortes vividos no cinema. Lancaster dá a Jared Maddox o olhar triste de um homem sem emoção e sem alegria. Homem que vive para matar. Fortemente influenciado pela estética dos westerns Made-in-Italy, especialmente com o uso por vezes desnecessário de zooms, “Mato em Nome da Lei” tem direção de fotografia de Robert Paynter. Esse cinegrafista se imortalizou por ter sido o responsável pela direção de fotografia no mais famoso clip da história da música que foi “Thriller”, com Michael Jackson. A música é do sempre competente Jerry Fielding, parceiro de Sam Peckinpah em inúmeros filmes, entre eles “Meu Ódio Será Sua Herança”. A magnífica trilogia de faroestes estrelados por Burt Lancaster é completada por “Mato em Nome da Lei”, talvez o menor dos três westerns, mas nunca um western menor.
Não sei, porém não sou de muita concordancia que Mato Em Nome Da Lei seja o menor entre os tres filmes feitos por Lancaster na decada de 70.
ResponderExcluirAo contrário, acho o melhor de todos. Claro que isto é MEU VER, MINHA OPINIÃO, MEU PARECER. Possivelmente por ser os dois outros feitos por Robert Aldrich, diretor o qual nunca levei muita fé. Ele chega a ser ridículo à frente de direções. Acho até que ele, se fez alguma coisa boa na sua cinematografia, o fez porque pegou excelentes roteiros. Nada além disso.
Quanto ao elenco, ou seja, Lee J. Coob e Robert Ryan, principalmente, foi uma escolha acertada de Winner, já que vi Johnnny Reno e O Domador de Cidades, ambos com Dana Andrews e mais um rosário de atores em fim de carreira, tal como em Mato em Nome da Lei, e ali todos estão um desastre só. Ao contrário deste, onde Coob e Ryan dão aula de como se por um filme na linha.
Mato em Nome...é um bom faroeste, com boas interpretações, com direção sem muito a reclamar, apesar de um diretor ingles e dos xiliques de Lancaster, e também por ter no seu elenco nomes de peso, mesmo estando "todos" fora de seu tempo, ou seja, mais para idosos que para rapazes.
jurandir_lima@bol.com.br
Sem dúvida é um dos melhores faroestes psicológicos que assisti, onde de fato não há homens maus como também não há mocinhos - todos os personagens são complexamente humanos. Tudo leva a crer que Jared (Lancaster) tem um passado que sem dúvida o motivou a se tornar o Homem da Lei que é, odiado e temido até pelos mais poderosos, como o personagem do Lee J Coob.
ResponderExcluirTodo o filme lembra uma tragédia grega cujos os personagens só poderiam ser representados por atores mais experientes e maduros, como os próprios Burt Lancaster, Lee. J. Coob, e claro, Robert Ryan, este sempre de inigualável talento e competência que fez muita coisa no cinema americano, e que tinha saido um ano antes de "The Wild Bunch" de Sam Peckinpah. Foi um dos últimos filmes dele e continuou atuando até o seu falecimento em 1973.
Sinceramente não saberia dizer qual dos três westerns citados é o melhor. Até porque são muito diferentes entre si. Talvez, para desempatar a disputa, eu escolhesse a sequência final de "Valdez is Coming", que acho sensacional, para dar-lhe um votinho a mais que os outros. Mas não sei.
ResponderExcluirNa verdade precisaria também rever "Mato em Nome da Lei", que assisti pela primeira vez com 11 anos de idade, no ano de 1978, após meu pai conversar muito com o bilheteiro para permitir que eu entrasse na sessão.
Recordo-me que fiquei muito impressionado com a violência da fita e meu pai pareceu ter se arrependido de levar-me para vê-lo.
Depois disso só o vi de novo por volta de 1985, nos tempos em que o "Corujão" da rede Globo passava só grandes clássicos do cinema.
Ficou-me uma forte impressão, principalmente pelo Lancaster, com um tipo duro que nem granito, como os melhores heróis de westerns devem ser.
Vou procurar vê-lo de novo mas pelo texto do Darci parece que as minhas impressões sobre ele continuarão as mesmas.
Edson Paiva
Um último comentário: com um elenco desses, ainda que o filme não fosse grande coisa, seria assim mesmo obrigatório.
Robert Aldrich foi um dos grandes diretores da sua geração e "A Vingança de Ulzana" está entre seus melhores filmes. Burt Lancaster foi possivelmente o mais completo ator norte-americano e essa equação é fácil: será que Brando, Pacino, Monty Clift fariam "O Pirata Sangrento", "Vera Cuz", "O Leopardo" e "A Embriaguez do Sucesso" melhor que Burt? Além disso ele gostava de fazer westerns...
ResponderExcluirBela provocação, Darci! Creio que Pacino talvez conseguisse. Mas vejamos a interpretação do Lancaster nesse western, "Mato em Nome da Lei".
ResponderExcluirNennhum dos citados conseguiria passar, com a mesma intensidade, aquela autoridade, aquela força que intimida, que impõe temor e respeito.
Aí concordo contigo que Burt Lancaster era mais completo que os demais. Ele podia pular facilmente de um personagem intenso, repleto de vida interior transmitida apenas pelo olhar, como esse xerife ou o presidiário de "O Homem de Alcatraz" para um adorável e leve aventureiro como o de "O Pirata Sangrento" num piscar de olhos.
E não consigo imaginar Al Pacino em roupas de cowboy. De baixinho já bastavam Alan Ladd e Audie Murphy. Creio que Pacino ficaria cômico.
Se bem que Robert de Niro talvez desse conta do recado. Cara, essa sua provocação pode render uma discussão interminável.
Edson Paiva
Tenho uma enorme gratidão por Burt Lancaster já envelhecido
ResponderExcluirvoltar a fazer westerns. Os filmes Mato em Nome da Lei, O
Retorno de Valdez e a Vingança de Ulzana foram um prêmio que
recebemos nos anos setenta, quando o cinema passava por um período que não me agradava. Burt Lancaster era mesmo um ator
completo e muito respeitado. Sua presença nestes filmes para
mim foi o bastante para assistir esses filmes com grande entusiasmo.
Eu só quero assistir o filme. Alguém tem um link para o download?
ResponderExcluirmadays
Burt Lancaster é o Rei de Hollywood, ou foi.
ResponderExcluirNinguém poderia substituir Burt Lancaster, nos filmes que fez.
ResponderExcluirBom trabalho
ResponderExcluir