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15 de janeiro de 2014

O MACHADO SANGRENTO (The Yellow Tomahawk) – WESTERN PRÓ-ÍNDIO COM RORY CALHOUN


Lesley Selander
Lesley Selander já havia dirigido mais de cem filmes em sua carreira, a quase totalidade deles westerns B, quando dirigiu “O Machado Sangrento” (The Yellow Tomahawk), em 1954. A história é de autoria de Harold Jack Bloom, que no ano anterior havia escrito “O Preço de um Homem” (The Naked Spur), a obra-prima de Anthony Mann. O roteiro coube a Richard Alan Simmons e certamente este deve ter sido o faroeste mais importante de Selander no aspecto sociológico pois trata de um tema bastante em voga no início da década de 50: a revisão da questão indígena. Produção de baixo orçamento com a economia saltando aos olhos em cada sequência de ação e filme destinado a um público mais preocupado com cavalgadas, lutas e tiros, este western com Rory Calhoun leva inevitavelmente o espectador a refletir sobre a célebre frase do General Sheridan “O único índio bom é o índio morto”.


Acima Rory Calhoun e Lee Van Cleef;
abaixo Warner Anderson.
Retaliação Cheyenne - Em “O Machado Sangrento” Adam Reed (Rory Calhoun) é um batedor do Exército que tem amizade com o chefe Cheyenne Faca de Fogo (Lee Van Cleef). O Exército pretende construir um novo forte no Wyoming, em uma região ainda dominada pelos Cheyennes, e Faca de Fogo avisa ao amigo branco que o massacre de Sand Creek será vingado em todas as ocasiões possíveis. Em Sand Creek ocorreu um dos mais atrozes e covardes massacres da História estadunidenses, quando tropas norte-americanas mataram e mutilaram quase duas centenas de índios Cheyennes, a maior parte deles mulheres e crianças. A retaliação torna-se questão de honra para Faca de Fogo que manda um recado ao Major Ives, a quem trata por ‘Açougueiro’ e para quem envia o ameaçador machado amarelo cujo significado é a morte próxima. Faca de Fogo sabe que o pelotão incumbido de construir a nova fortificação, sob o comando do Major Ives (Warner Anderson), é presa fácil para ele e para os bravos sob seu comando. Adam Reed tenta mostrar ao oficial o risco da missão praticamente suicida, mas o Major Ives quer se projetar junto a seus superiores e matar quantos índios puder, a exemplo do que fizera o Coronel John Chivington em Sand Creek. O Major confessa a Adam Reed que possui sangue índio e acredita que combatendo e matando índios conseguirá esconder suas origens. Tal fato explica psicologicamente o ódio brutal que o Major Ives tem pelos nativos, a quem chama de ‘destruidores supremos’ e que o leva a uma empreitada desastrosa deixando sua tropa à mercê dos índios. Soldados e suas esposas são dizimados, o que revolta Adam e seu amigo Tonio (Noah Beery Jr.). Mesmo sendo amigo de Faca de Fogo, Adam decide enfrentá-lo para evitar que mais mortes de brancos venham a ocorrer e armado com um arco que Faca de Fogo lhe presenteara, Adam flecha mortalmente o adversário que disparara um rifle contra ele.

Acima Rita Moreno e Noah Beery Jr.;
abaixo Peggie Castle.
Homens brancos inescrupulosos - Transformar tema de tamanha relevância em um filme modesto e interessante não é uma tarefa fácil e até que Leslie Selander consegue satisfatoriamente apontar o lado tenebroso da história que por décadas o cinema se esforçou para mistificar ao glorificar Custer e outros ilustres militares. Inteiramente a favor dos índios, “O Machado Sangrento” tem outro personagem branco sem escrúpulos que é um garimpeiro chamado Sawyer (Peter Graves). Para ficar com o ouro conseguido em sociedade, Sawyer não hesita em assassinar seus dois companheiros, tentando imputar os crimes aos índios. Por outro lado a pequena Urso de Mel (Rita Moreno) é toda inocência em sua paixão por Tonio que leva algum tempo para descobrir a delicadeza e beleza da índia. Urso de Mel que é Nez Perce odeia os Cheyennes devido à violência dessa nação que devastou os Nez Perce. O branco mau (Sawyer) é morto e o branco bom (Tonio) se miscigena com a índia pura. Outro adendo à história é a presença de Katherine Bohlen (Peggie Castle), mulher vinda do Leste e noiva de um tenente a quem abandona diante do perigo iminente representado pelo ataque Cheyenne. Diferentemente de Urso de Mel, a bostoniana Katherine é volúvel e exibe prazerosamente sua nudez num lago para Adam Reed, por quem se sente atraída. O filme sugere ainda que amizade de Adam com os índios contribuiu para fazer dele um bom homem branco, amizade que Adam sacrifica em nome de evitar as mortes das duas mulheres, de Tonio e do Major Ives.

Acima o chefe Faca de Fogo (Lee Van Cleef)
 em confronto contra Adam Reed (Rory
Calhoun), no centro; abaixo o índio flechado
pelo amigo batedor.
Lee Van Cleef em início de carreira - Filmado em econômico preto e branco, a produção ter levado a equipe para a região de Kanab, em Utah, atesta a intenção de fugir das conhecidas paisagens comuns de Alabama Hills, Corriganville e Iverson Ranch, dando maior originalidade ao filme. E Rory Calhoun, um dos mais destacados cowboys dos anos 50, interpreta seu personagem a contento, dentro da suas características, enquanto o ótimo Noah Beery Jr. vive o eterno tipo simpático tantas vezes levado à tela. Lee Van Cleef nos primeiros anos de sua carreira já havia morrido (sido morto, melhor dizendo) inúmeras vezes no cinema, uma delas no clássico “Matar ou Morrer”. Ator com facilidade para interpretar personagens multirraciais, Lee Van Cleef sequer imaginava que na década seguinte seria tão requisitado para filmar nos Estados Unidos e na Europa, não mais como coadjuvante. Rita Moreno adorável como sempre não consegue fazer suspeitar a grande atriz dramática que viria ser culminando com “Amor, Sublime Amor”, que lhe valeu um Oscar de Atriz Coadjuvante. E não custa lembrar que Rita tem em sua estante, ao lado do Oscar, também os prêmios Grammy (música), Emmy (televisão) e Tony (teatro), portanto um talento completo, a pequena portorriquenha. O personagem mais intenso de “O Machado Sangrento” é o Major Ivens, mais perturbado que intrépido e que proporciona boa interpretação ao ator Warner Anderson. Peter Graves discreto, assim como um quase irreconhecível Walter Reed como geógrafo. Note-se a presença do ainda jovem James Best e do veterano Ned Glass, este na tela por menos de um minuto. Ned Glass fez companhia a Rita Moreno em “Amor, Sublime amor”, em destacada participação. A loura Peggie Castle desfila suas curvas pouco acentuadas numa calça escura justíssima como pretensa mulher fatal.

‘Da lêndea nasce o piolho’ - Longe de ser um grande filme, “O Machado Sangrento” merece ser visto, especialmente por se distanciar da média dos westerns B que sempre foram parcimoniosos em focalizar temas mais polêmicos. Assim como diz o provérbio ‘água mole em pedra dura...’ foi partindo de “Flechas de Fogo” e “A Passagem do Diabo” que se chegou a “O Pequeno Grande Homem”, passando, é claro por pequenos filmes como este “O Machado Sangrento” de Lesley Selander. Se o gênero western não conseguiu reparar o genocídio perpetrado na História norte-americana com o quase total extermínio dos índios, ao menos fez com que ninguém mais desconhecesse a verdade dos fatos. A brutalidade do homem branco vestido, com a galante túnica azul escura, e que tem seu expoente na figura do psicopata George Armstrong Custer, não mais foi mistificada. E frases como “Maldito seja aquele que simpatiza com os índios! Eu cheguei para matar índios e acredito que seja certo e honrado usar de qualquer meio para matar índios. Matar e escalpelar a todos, grandes e pequenos. Da lêndea nasce o piolho”. O autor da frase é justamente o Coronel John Chivington, comandante do massacre de Sand Creek.


Acima Noah Beery Jr. e Rory Calhoun.

Acima Noah Beery Jr. cavalga com Rita Moreno; abaixo à esquerda Walter
Reed com um teodolito e à direita James Best atingido mortalmente por uma flecha.

Peter Graves aponta o revólver para Rory Calhoun; abaixo Calhoun com
Peggie Castle e com Warner Anderson.

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