Lesley Selander |
Lesley Selander já havia dirigido mais
de cem filmes em sua carreira, a quase totalidade deles westerns B, quando
dirigiu “O Machado Sangrento” (The Yellow Tomahawk), em 1954. A história é de
autoria de Harold Jack Bloom, que no ano anterior havia escrito “O Preço de um
Homem” (The Naked Spur), a obra-prima de Anthony Mann. O roteiro coube a
Richard Alan Simmons e certamente este deve ter sido o faroeste mais importante
de Selander no aspecto sociológico pois trata de um tema bastante em voga no
início da década de 50: a revisão da questão indígena. Produção de baixo
orçamento com a economia saltando aos olhos em cada sequência de ação e filme
destinado a um público mais preocupado com cavalgadas, lutas e tiros, este
western com Rory Calhoun leva inevitavelmente o espectador a refletir sobre a
célebre frase do General Sheridan “O
único índio bom é o índio morto”.
Acima Rory Calhoun e Lee Van Cleef; abaixo Warner Anderson. |
Retaliação
Cheyenne - Em “O Machado Sangrento” Adam Reed (Rory Calhoun) é um
batedor do Exército que tem amizade com o chefe Cheyenne Faca de Fogo (Lee Van
Cleef). O Exército pretende construir um novo forte no Wyoming, em uma região
ainda dominada pelos Cheyennes, e Faca de Fogo avisa ao amigo branco que o
massacre de Sand Creek será vingado em todas as ocasiões possíveis. Em Sand
Creek ocorreu um dos mais atrozes e covardes massacres da História
estadunidenses, quando tropas norte-americanas mataram e mutilaram quase duas
centenas de índios Cheyennes, a maior parte deles mulheres e crianças. A
retaliação torna-se questão de honra para Faca de Fogo que manda um recado ao
Major Ives, a quem trata por ‘Açougueiro’ e para quem envia o ameaçador machado
amarelo cujo significado é a morte próxima. Faca de Fogo sabe que o pelotão
incumbido de construir a nova fortificação, sob o comando do Major Ives (Warner
Anderson), é presa fácil para ele e para os bravos sob seu comando. Adam Reed
tenta mostrar ao oficial o risco da missão praticamente suicida, mas o Major
Ives quer se projetar junto a seus superiores e matar quantos índios puder, a
exemplo do que fizera o Coronel John Chivington em Sand Creek. O Major confessa
a Adam Reed que possui sangue índio e acredita que combatendo e matando índios
conseguirá esconder suas origens. Tal fato explica psicologicamente o ódio
brutal que o Major Ives tem pelos nativos, a quem chama de ‘destruidores
supremos’ e que o leva a uma empreitada desastrosa deixando sua tropa à mercê
dos índios. Soldados e suas esposas são dizimados, o que revolta Adam e seu
amigo Tonio (Noah Beery Jr.). Mesmo sendo amigo de Faca de Fogo, Adam decide
enfrentá-lo para evitar que mais mortes de brancos venham a ocorrer e armado
com um arco que Faca de Fogo lhe presenteara, Adam flecha mortalmente o
adversário que disparara um rifle contra ele.
Acima Rita Moreno e Noah Beery Jr.; abaixo Peggie Castle. |
Homens
brancos inescrupulosos - Transformar tema de tamanha
relevância em um filme modesto e interessante não é uma tarefa fácil e até que
Leslie Selander consegue satisfatoriamente apontar o lado tenebroso da história
que por décadas o cinema se esforçou para mistificar ao glorificar Custer e outros
ilustres militares. Inteiramente a favor dos índios, “O Machado Sangrento” tem
outro personagem branco sem escrúpulos que é um garimpeiro chamado Sawyer
(Peter Graves). Para ficar com o ouro conseguido em sociedade, Sawyer não
hesita em assassinar seus dois companheiros, tentando imputar os crimes aos
índios. Por outro lado a pequena Urso de Mel (Rita Moreno) é toda inocência em
sua paixão por Tonio que leva algum tempo para descobrir a delicadeza e beleza
da índia. Urso de Mel que é Nez Perce odeia os Cheyennes devido à violência
dessa nação que devastou os Nez Perce. O branco mau (Sawyer) é morto e o branco
bom (Tonio) se miscigena com a índia pura. Outro adendo à história é a presença
de Katherine Bohlen (Peggie Castle), mulher vinda do Leste e noiva de um
tenente a quem abandona diante do perigo iminente representado pelo ataque
Cheyenne. Diferentemente de Urso de Mel, a bostoniana Katherine é volúvel e
exibe prazerosamente sua nudez num lago para Adam Reed, por quem se sente
atraída. O filme sugere ainda que amizade de Adam com os índios contribuiu para
fazer dele um bom homem branco, amizade que Adam sacrifica em nome de evitar as
mortes das duas mulheres, de Tonio e do Major Ives.
Acima o chefe Faca de Fogo (Lee Van Cleef) em confronto contra Adam Reed (Rory Calhoun), no centro; abaixo o índio flechado pelo amigo batedor. |
Lee
Van Cleef em início de carreira - Filmado em econômico preto e branco,
a produção ter levado a equipe para a região de Kanab, em Utah, atesta a
intenção de fugir das conhecidas paisagens comuns de Alabama Hills,
Corriganville e Iverson Ranch, dando maior originalidade ao filme. E Rory
Calhoun, um dos mais destacados cowboys dos anos 50, interpreta seu personagem
a contento, dentro da suas características, enquanto o ótimo Noah Beery Jr. vive
o eterno tipo simpático tantas vezes levado à tela. Lee Van Cleef nos primeiros
anos de sua carreira já havia morrido (sido morto, melhor dizendo) inúmeras
vezes no cinema, uma delas no clássico “Matar ou Morrer”. Ator com facilidade
para interpretar personagens multirraciais, Lee Van Cleef sequer imaginava que
na década seguinte seria tão requisitado para filmar nos Estados Unidos e na
Europa, não mais como coadjuvante. Rita Moreno adorável como sempre não
consegue fazer suspeitar a grande atriz dramática que viria ser culminando com
“Amor, Sublime Amor”, que lhe valeu um Oscar de Atriz Coadjuvante. E não custa
lembrar que Rita tem em sua estante, ao lado do Oscar, também os prêmios Grammy
(música), Emmy (televisão) e Tony (teatro), portanto um talento completo, a
pequena portorriquenha. O personagem mais intenso de “O Machado Sangrento” é o
Major Ivens, mais perturbado que intrépido e que proporciona boa interpretação
ao ator Warner Anderson. Peter Graves discreto, assim como um quase
irreconhecível Walter Reed como geógrafo. Note-se a presença do ainda jovem
James Best e do veterano Ned Glass, este na tela por menos de um minuto. Ned
Glass fez companhia a Rita Moreno em “Amor, Sublime amor”, em destacada
participação. A loura Peggie Castle desfila suas curvas pouco acentuadas numa
calça escura justíssima como pretensa mulher fatal.
‘Da
lêndea nasce o piolho’ - Longe de ser um grande filme, “O
Machado Sangrento” merece ser visto, especialmente por se distanciar da média
dos westerns B que sempre foram parcimoniosos em focalizar temas mais
polêmicos. Assim como diz o provérbio ‘água mole em pedra dura...’ foi partindo
de “Flechas de Fogo” e “A Passagem do Diabo” que se chegou a “O Pequeno Grande
Homem”, passando, é claro por pequenos filmes como este “O Machado Sangrento”
de Lesley Selander. Se o gênero western não conseguiu reparar o genocídio
perpetrado na História norte-americana com o quase total extermínio dos índios,
ao menos fez com que ninguém mais desconhecesse a verdade dos fatos. A
brutalidade do homem branco vestido, com a galante túnica azul escura, e que
tem seu expoente na figura do psicopata George Armstrong Custer, não mais foi
mistificada. E frases como “Maldito seja aquele que simpatiza com os índios! Eu cheguei para matar índios e acredito que seja certo e honrado usar de qualquer
meio para matar índios. Matar e escalpelar a todos, grandes e pequenos. Da
lêndea nasce o piolho”. O autor da frase é justamente o Coronel John
Chivington, comandante do massacre de Sand Creek.
Acima Noah Beery Jr. e Rory Calhoun. |
Acima Noah Beery Jr. cavalga com Rita Moreno; abaixo à esquerda Walter Reed com um teodolito e à direita James Best atingido mortalmente por uma flecha. |
Peter Graves aponta o revólver para Rory Calhoun; abaixo Calhoun com Peggie Castle e com Warner Anderson. |
onde posso baixar?
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