Após a estréia de “O Álamo” (The
Alamo), em San Antone, no Texas, parte da crítica arrasou o épico dirigido por
John Wayne com frases como: “O mais
dispendioso filme B já feito; B de banal” (Newsweek); “John Wayne quis fazer o maior dos westerns mas o que conseguiu fazer o
pior de todos os westerns” (Time); “Nada
é sério e nada funciona nesse filme que é um modelo de distorção histórica e
vulgarização” (The New Yorker). Contrariando a maioria dos críticos, John
Ford que nunca foi de falar de filmes alheios disparou: “Para mim ‘O Álamo’ é o mais importante filme que já foi feito; este é
o maior filme que eu já assisti; ele vai permanecer para sempre, para todas as
pessoas, todas as famílias”. Tanto os críticos se excederam na contundência
quanto John Ford se deixou levar pela emoção de ver seu amigo e pupilo dirigir
um grande western.
O Generalíssimo Antonio Lopez de Santa Anna (interpretado por Rubens Padilla). |
Pouca
atenção aos fatos históricos - Muitas das críticas sofridas por “O
Álamo” foram em razão da inexatidão de fatos históricos mostrados no filme que
jamais pretendeu ser uma aula de História. Wayne queria, isto sim, realizar um
filme que servisse de exemplo de bravura e amor à pátria a cada
norte-americano, num tempo de guerra fria e às vésperas da eleição presidencial
de 1960. Além de contar a seu modo, e este era seu principal objetivo, esse
importante episódio da história norte-americana ocorrido em 1836. Repleto de
liberdades que irritaram os historiadores, o roteiro de James Edward Grant
reúne no Álamo Davy Crockett (John Wayne) e 27 tennessinianos, Jim Bowie
(Richard Widmark) e 23 voluntários que o obedecem e mais os homens do Coronel
William Barrett Travis (Laurence Harvey), totalizando 185 homens. Comandados
por Travis têm eles a missão de retardar ao máximo possível o avanço das tropas
do Generalíssimo Santa Anna (Rubem Padilla) cujo número era de mais de cinco
mil soldados com artilharia pesada. Os reforços esperados pelos defensores do
Álamo não chegam e ao fim de 13 dias as tropas mexicanas aniquilam o
precário ‘regimento conjunto’ de Travis, Crockett e Bowie. O acontecimento
resultou num filme que foi lançado com duração de 192 minutos e que, ainda no
primeiro ano de exibição, foi reduzido para 161 minutos.
Acima Ken Curtis, Joan O'Brien e Laurence Harvey; abaixo John Wayne como Davy Crockett. |
Roteiro
embaraçoso - Nenhum outro ator havia antes passado a diretor com um
projeto tão ambicioso como “O Álamo” e pode-se dizer que John Wayne saiu-se bem
realizando um filme que é assistido com prazer e mesmo com emoção, isto apesar
de o desfecho da história ser conhecido. A primeira metade de “O Álamo” procura
mostrar as personalidades dos três líderes e as razões que os levaram à missão
suicida de defender a adaptada fortificação. Se a parte inicial não chega a
empolgar, na segunda metade são mostrados os preparativos para o enfrentamento com
excelentes sequências de ação que culminam com a espetacular batalha final. Os
pecados de “O Álamo” devem ser atribuídos especialmente ao roteiro de James
Edward Grant com inúmeras falas sem criatividade e outras excessivamente
discursivas beirando o mais exacerbado e piegas patriotismo. Davy Crockett diz
a Travis que gosta do som da palavra República porque ela é igual a “quando um homem vê os primeiros passos de
um bebê”. Mais tarde Crockett tencionando elevar o moral de seus comandados
exclama em novo discurso que “o preço da
liberdade nunca é barato”. A certa altura o Capitão Dickinson (Ken Curtis)
visivelmente embaraçado comenta que “infeliz
é o homem que não tem uma mulher obediente”. Em meio a um idílio à beira de
um riacho cercado por árvores frondosas, Crockett interrompe uma fala
apaixonada para a namorada Flaca (Linda Crystal), decepcionando a moça ao se
empolgar com novo, extenso e politizado discurso. Mesmo com a enfadonha
discurseira o roteiro de Grant e a direção de Wayne delineiam bem os
personagens principais, especialmente o Coronel Travis (Laurence Harvey), mas o
mesmo não acontece com os personagens Flaca e Smitty (Frankie Avalon). Criada para possibilitar um par romântico para Crockett (John Wayne), a presença de
Flaca não funciona bem, até porque ela aparenta ser mais indicada para namorar
o Capitão Bonham (Patrick Wayne). Fica a impressão que o John Wayne, então com
52 anos, queria demonstrar a viabilidade de seu próprio casamento com a peruana
Pilar Wayne, 29 anos mais nova que ele. Frankie Avalon interpreta um personagem
que de fato existiu na história do Álamo, mas o jovem cantor não consegue em
momento algum convencer como alguém capaz de atos de heroísmo. Apesar desses
pontos fracos, “O Álamo” é repleto de momentos de grande cinema.
Guinn 'Big Boy' Williams e Chill Wills (acima); abaixo a emocionante sequência da decisão de permanecer no sitiado Álamo. |
O
‘método’ John Wayne de dirigir - No documentário de 40 minutos que
acompanha o DVD “O Álamo”, Ken Curtis afirma que John Wayne não sabia dirigir
atores, pedindo a eles que repetissem os conhecidos maneirismos que Wayne usava
à exaustão como ator. Com outras palavras Richard Widmark disse praticamente o
mesmo da técnica de John Wayne para estimular uma interpretação. O que ambos
afirmaram pode ser confirmado com a queixa que Richard Boone fez a John Wayne
durante a primeira cena que rodou sob a direção do Duke, falando do ‘método’ do
diretor. Boone disse: “Você quer que eu
faça a cena exatamente como você faria. Duke, deixe-me fazê-la a meu
modo, pois não sou John Wayne”. Porém o mesmo John Wayne, com a notória
dificuldade que tinha para ser diretor de atores, criou sequências magníficas.
Entre as muitas cenas que merecem ser destacadas estão a partida de mulheres e
crianças antes da batalha final; Jim Bowie recebendo a notícia da morte da
esposa e tendo sua dor desrespeitada por Travis que ignorava o fato; ou ainda a
sequência nada dramática em que o Tenente Finn (Guinn ‘Big Boy’ Williams) tenta
explicar o tamanho do gigantesco canhão recebido pelos mexicanos. A performance
de Guinn é valorizada pela formidável expressão de Laurence Harvey. Nenhuma
sequência porém supera em qualidade o momento em que, mesmo sabendo que nenhuma
chance haveria de sobrevivência, os homens de Crockett e de Jim Bowie se posicionam
ao lado do pesaroso Coronel Travis. Fica-se a imaginar do que John Wayne seria
capaz se fosse melhor diretor.
Duas das mais espetaculares mortes: Ken Curtis preso à paliçada e Guinn 'Big Boy' Williams trespassado por uma espada mexicana. |
Portentoso
trabalho de Cliff Lyons - John Wayne teve a seu lado, como
assistentes de direção Robert Relya e Robert Saunders, mas Wayne deveria mesmo
agradecer e muito a Cliff Lyons, diretor de segunda unidade e responsável
direto pelas memoráveis sequências de batalha e trabalho dos stunmen. Há cenas
em que sete ou oito cavaleiros são derrubados de seus cavalos simultaneamente
numa perigosa e perfeita movimentação. Uma das quedas de cavalo, quando Travis
dispara contra um ousado mexicano que vem num furioso galope em sua direção é
antológica. O cavaleiro é Chuck Hayward (o ‘Good Chuck’) que é derrubado do
cavalo em velocidade num salto verdadeiramente mortal girando no ar 180 graus
antes de cair de costas no solo enquanto sua arma voa alguns metros adiante. E
o show não fica apenas por conta dos dublês pois Cliff Lyons encenou diferentes
mortes para cada um dos atores principais, mortes tão violentas quanto
artísticas. A mais bem encenada dessas mortes é a de Ken Curtis, feita sem
dublê, com o ator ficando pendurado pelas pernas, de cabeça para baixo, na
paliçada do forte. Impressionante também a cena de morte de Guinn ‘Big Boy’
Williams fazendo uso de sua força física. A movimentação das muitas fileiras do
exército mexicano, por vezes formada por dois mil extras em exata sintonia numa
coreografia de admirável visual, deve-se segundo diversas testemunhas a John
Ford. E parecem mesmo essas sequências ter a marca do ‘Pappy’. Além da beleza
plástica desses momentos, importa lembrar que “O Álamo” é dos poucos
westerns em que nenhum animal ou dublê se machucou.
Antológica queda de cavalo executada por Chuck Hayward. |
Davy Crockett derrubando um mexicano; abaixo Crockett e Emil Sand (Wesley Lau). |
Davy
Crockett, um adorador de estrelas - Assim como fazia seu Mestre maior
(John Ford), Wayne criou muitos momentos de humor em “O Álamo”, forma de
atenuar a dramática aproximação da sombra da morte que por treze dias cobria a
fortificação. Quando Jim Bowie recebe a trágica informação da morte da esposa,
a mensagem chega presa a um ‘sombrero voador’, o que já torna a cena engraçada.
E Crockett ironiza comentando que “a
mensagem deve ser rendição do general Santa Anna”. Antes, em San Antone,
Crockett que havia cumprido dois mandatos como Senador da República, diz a
Travis que “um homem tem que fazer muitas coisas para ser eleito para o
Congresso e eu tive que beijar muitas crianças”. Essa mescla de drama e
comédia é constante e mesmo sem ser engraçado, ninguém consegue conter o riso
quando Crockett comenta a um crápula que o ameaça que ele está ali apenas
porque “é de uma linhagem de adoradores
de estrelas”. O humor em “O Álamo” oscila entre o sutil e o grosseiro, isto
quando entra em cena Chill Wills como o tennessiniano Beekeeper. Excessivo e
sem graça, Wills dá saudade de Arthur Hunnicutt, o Davy Crockett de “A Última
Barricada”. Desperdiçado num papel burocrático (Capitão Dickinson), Ken Curtis
poderia fazer rir com a facilidade com que criou personagens como ‘Festus’ de
Gunsmoke. E estranhamente John Wayne não aproveitou melhor o característico tipo
aparvalhado de Hank Worden (Parson).
Coronel William Barrett Travis (Laurence Harvey) defendendo o Álamo. |
Soberbo
Travis, soberbo Laurence Harvey - John Wayne acumulando as funções de
diretor e produtor mostrou-se generoso com os demais atores principais,
especialmente Laurence Harvey. Arrogante, antipático e até desumano, o Travis
de Laurence Harvey é o grande personagem de “O Álamo”, brilhantemente
interpretado pelo ator lituano. Richard Widmark tem seu desempenho limitado
pelo roteiro que não privilegiou o personagem Jim Bowie, ainda que este passe o
filme em constante atrito com Travis. Se Travis é pura jactância e soberba, o Bowie de Widmark poderia ser mais heróico, especialidade do ator. John
Wayne com o gorro de Davy Crockett na cabeça é quase uma figura cômica,
diferente do John Wayne que acostumamos a ver em tantos westerns. Richard Boone
interpreta Sam Houston aparecendo poucos minutos na tela e tendo ainda que ver arruinado seu mais importante momento com o péssimo discurso de Sam Houston em
que pronuncia “Remember the Álamo!”. Joan O’Brien é uma mulher linda e bem
tratada demais para as condições de vida daqueles treze dias de sofrimento e
angústia. Linda Crystal é linda e apenas isso, tornando-se outro mero enfeite
no filme. O ponto alto do elenco é formado pelo segundo time de coadjuvantes,
encabeçado por Denver Pyle, Guinn ‘Big Boy’ Williams e a incrível em sua
autenticidade figura de John Dierkes. Além deles há Jester Hairston como o
negro Jethro que ganha a liberdade e permanece no Álamo. E como agrada ver John Wayne
dar espaço, inclusive com falas, para stuntmen como os dois Chucks (Roberson e
Hayward) e tantos outros dublês. Quem tem a honra de matar John Wayne trespassando-o
com uma lança é Bob Morgan, então marido de Yvonne De Carlo e que perderia uma
perna em “A Conquista do Oeste”.
John Wayne |
O
gigante John Wayne - Através dos anos “O Álamo” de John
Wayne ganhou merecidamente o status de clássico. Esqueceu-se que “O Álamo”
pretendia ser uma metáfora da América (ameaçada na visão política de John Wayne) e isso
fez bem ao filme. Plasticamente irrepreensível, cada fotograma de “O Álamo”
mais parece uma tela de rara beleza, um trabalho inesquecível de William H.
Clothier em conjunto com o diretor Wayne. Emoldurando as imagens está o
inspiradíssimo e tocante escore musical de Dimitri Tiomkin, uma das melhores trilhas musicais do
gênero western. Muitos que viram “O Álamo” com sua duração original de 192
minutos afirmam que o filme melhora ainda mais com as tantas cenas e sequências
inteiras excluídas. Este é um espetáculo que se vê e revê com satisfação não só
pelas muitas histórias de bastidores que o envolvem, mas e principalmente por
suas qualidades muito mais preponderantes que seus defeitos. E o responsável principal pelo filme é John
Wayne que se agigantou no conceito de seus fãs por ter realizado este clássico
épico.
gostaria de ver ! mas não acho em lugar nenhum !
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ResponderExcluirNUNCA DEI MUITA IMPORTÂNCIA PARA A OPINIÃO DE CRÍTICOS E NA RELAÇÃO QUE ELES FAZEM RARAMENTE TEM ALGUM DA MINHA PREFERÊNCIA. DIZER QUE ÁLAMO É UMA MAU FILME É DESCONHECER TOTALMENTE O GÊNERO. O FILME TEM QUALIDADES E ESTÁ ACIMA DA MÉDIA. Nota 9.
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