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7 de dezembro de 2012

JAMES STEWART, LEW WASSERMAN E O WESTERN QUE MUDOU HOLLYWOOD


Quem foi o homem mais importante dos bastidores de Hollywood? Quem se habilitar a responder a essa pergunta certamente vai citar Louis B. Mayer, ou Jack Warner, ou Darryl F. Zanuck, quem sabe Harry Cohn ou até mesmo Carl Laemmle. Poderão ser lembrados outros nomes mas dificilmente alguém responderá que o homem mais importante dos bastidores da capital do cinema foi Lew Wasserman. E muitos perguntarão “Quem foi Lew Wasserman?” Esse nome quase desconhecido para muitos era considerado o verdadeiro “Rei de Hollywood” e o último dos grandes moguls do universo cinematográfico. Presidente da MCA (Music Corporation of America), empresa que agenciava artistas, um dos clientes de Lew Wasserman era James Stewart. Juntos Wasserman e Stewart deram um cheque-mate nos donos dos estúdios, justamente com o western “Winchester 73”, mudando radicalmente o sistema de se fazer cinema.

Cena de "Meu Amigo Harvey"
James Stewart com o coelho Harvey - Em 1950 James Stewart estava com 42 anos de idade e há 15 anos no cinema. Esteve preso sob contrato com a Metro-Goldwyn-Mayer que o cedia por empréstimo aos demais estúdios. Depois de muitos sucessos parecia que a carreira de James Stewart entraria inapelavelmente em declínio devido à idade e ele chegou até a cogitar deixar de ser ator. Quem demoveu Stewart da ideia foi Lionel Barrymore, que lhe disse que a profissão de ator de cinema era nobre e que em nenhuma outra se poderia levar tanta emoção e alegria às pessoas do mundo inteiro. James Stewart havia começado sua carreira de ator na Broadway, atuando em diversas montagens. Em 1947 Stewart decidiu retornar aos palcos, substituindo o ator Frank Fay na peça “Harvey”, que estava em cartaz desde 1944. Frank Fay havia sido marido de Barbara Stanwyck e após ser substituído por James Stewart as comparações entre os dois foram inevitáveis, mas o certo é que o sucesso da peça não só continuou como aumentou muito pois o público queria ver o famoso ator de “Do Mundo Nada Se Leva” no palco. “Harvey” permaneceu em cartaz até 1949, totalizando 1.775 apresentações, um sucesso absoluto. A título de comparação vale lembrar que a sempre lembrada montagem “Uma Rua Chamada Pecado”, dirigida por Eliza Kazan e com Marlon Brando como Stanley Kowalski teve 855 apresentações nos dois anos em que foi exibida na Broadway. A peça “Harvey”, como não poderia deixar de ser, passou a ser cobiçada para virar filme.

Ronald Reagan e Lew Wasserman
O genro de Louis B. Mayer - Quem acabou comprando (por 150 mil dólares) os direitos de “Harvey” para o cinema foi William Goetz, ex-produtor da Metro e por acaso genro de Louis B. Mayer. Goetz decidiu se desgarrar do jugo do sogro indo ser chefe de produção da Universal. Wiliam Goetz procurou Wasserman na MCA para contratar James Stewart para estrelar “Harvey”. Lew Wasserman começou a ficar famoso ao conseguiru o melhor contrato de Hollywood para um cliente da MCA chamado Ronald Reagan. Lew convenceu Jack Warner que Reagan seria o novo Errol Flynn e conseguiu para o futuro presidente dos EUA um contrato cujas cifras nem Errol Flynn e mais James Cagney e Bette Davis, os maiores nomes do estúdio, atingiriam mesmo juntos. Lew Wasserman era praticamente imbatível na argumentação, fosse com quem fosse, mesmo os sovinas Tio Patinhas que comandavam os estúdios. O dono da MCA tinha ideias revolucionárias para seus clientes, especialmente para aqueles como James Stewart que já não estavam mais presos aos estúdios pelos terríveis contratos de sete anos. Como é sabido, um ator assinava contrato com o estúdio por um determinado salário semanal e devia fazer tudo que o estúdio exigisse. Se o astro ou estrela desse muito lucro para o estúdio até seria possível um pequeno aumento de salário. Esse era o método dos moguls da Metro, da Warner, da Columbia, da Fox, da Universal, da RKO e até mesmo da pequena Republic Pictures que por anos explorou John Wayne.

James Stewart e Anthony Mann (sentados).
Anthony Mann, o diretor certo - As tratativas entre Goetz, o homem forte da Universal e Lew Wasserman para levar “Meu Amigo Harvey” (título em Português) ao cinema chegaram a um acordo depois que Wassserman impôs as seguintes condições: James Stewart estrelaria “Meu Amigo Harvey” para o estúdio e mais um outro filme, recebendo por “Harvey” módicos 200 mil dólares e mais 50% do lucro bruto de cada filme. Nenhuma novidade em um ator receber porcentagem sobre os lucros de um filme, o que já havia ocorrido antes com alguns poucos atores. A diferença estava justamente entre receber lucro bruto e lucro líquido, este último calculado após todas as despesas que o estúdio tinha com o filme e que geralmente resultavam em minguados centavos para os atores. Goetz e a Universal aceitaram a proposta de Lew Wasserman que ainda continha cláusulas que previam o direito de James Stewart escolher o diretor e aprovar os principais coadjuvantes para os dois filmes. O primeiro deles a ser rodado foi “Winchester 73” e James Stewart aprovou o nome do pouco conhecido Anthony Mann, isto após assistir em exibição privada “O Caminho do Diabo” (Devil’s Doorway), western que ainda não havia sido lançado. Por sinal nem mesmo “Flechas de Fogo” (Broken Arrow) havia sido lançado ainda. Esses dois filmes foram lançados depois de “Winchester 73”.

James Stewart numa cena de "Winchester 73",
 filme que o transformou em milionário.
James Stewart, o milionário - Nunca James Stewart poderia imaginar o acerto de suas duas decisões, deixar Lew Wasserman orientar os detalhes financeiros do contrato de dois filmes e escolher Anthony Mann para dirigi-lo num faroeste. O roteiro de Borden Chase baseado numa história de Stuart N. Lake já havia passado por inúmeras mãos em diversos estúdios, entre eles a própria MGM. Ninguém se interessou em rodar um western com aquele roteiro. Dore Schary, então chefe de produção da MGM chegou a dizer que “ninguém iria se interessar em ver um filme sobre dois irmãos que disputam um rifle”. Com “Winchester 73” Anthony Mann realizou um grande clássico e mais que isso, deu uma nova dimensão à carreira de James Stewart como ator, arrancando dele uma inimaginável atuação. O outro acerto de James Stewart aumentou consideravelmente sua conta bancária, ele que havia deixado de ser o mais cobiçado solteirão de Hollywood em 1949. “Winchester 73” custou 918 mil dólares e rendeu dois milhões de dólares no primeiro ano de exibição. “Meu Amigo Harvey” não fez o sucesso esperado mas chegou ao milhão e meio de dólares arrecadados nas bilheterias, tendo custado perto de um milhão. Trocando em miúdos bastante graúdos, Lew Wasserman possibilitou que James Stewart ganhasse com esses dois filmes mais de um milhão de dólares, computados os 200 mil de salário recebido por “Meu Amigo Harvey”. Nenhum outro ator havia se tornado milionário tão rapidamente.

Acima Lew Wasserman e seu sócio Jules Stein;
abaixo Louis B. Mayer e dois contratados que deram
muito dinheiro à Metro: Mickey Rooney e Judy Garland.
A destruição do antigo sistema - Hollywood entrou em convulsão a partir de “Winchester 73” e dos ganhos de James Stewart. Outros astros e estrelas não mais queriam assinar contrato com os estúdios, indo fazer fila na porta da MCA querendo ser representados por Lew Wasserman. A lição foi aprendida rapidamente e atores e atrizes que tinham seus contratos terminados se recusavam a assinar novos contratos, preferindo o modelo do acordo Stewart-Wasserman-Universal. Assim passaram a fazer Gary Cooper, Glenn Ford, John Wayne, William Holden, Marlon Brando e muitos outros. Os donos dos estúdios declararam Lew Wasserman e James Stewart como os principais responsáveis pelo que estava acontecendo. Louis B. Mayer foi mais longe e afirmou que Wasserman e Stewart deram início à destruição do sistema hollydiano de produção. E o furioso Louis B. Mayer voltou sua ira em direção a seu genro William Goetz, retirando o nome de Goetz do seu testamento. Acabara-se a escravidão de três décadas do ‘Seven Years Contract’ e os atores passaram a ganhar fortunas com os novos pequenos contratos que faziam com os estúdios ou com os produtores independentes. Clark Gable e Tyrone Power foram dois dos que ficaram ricos após serem agenciados pela MCA. E nenhuma outra agência tinha mais clientes que a MCA de Lew Wasserman, que acabou comprando a Universal International Pictures. Essa aquisição acordou o governo norte-americano para o verdadeiro trust que se desenhava em Hollywood e tirou um pouco do poder de Lew Wasserman.

O “Rei de Hollywood” - James Stewart fez 23 filmes na década de 50 e nenhum outro ator além dele teve uma sucessão tão prodigiosa de filmes clássicos, alguns deles obras-primas indiscutíveis. São dessa fase os três filmes com Hitchcock, os cinco faroestes com Anthony Mann (e de quebra mais três não-westerns) e “Anatomia de um Crime”. Ninguém ganhou mais dinheiro que James Stewart nos anos 50, nem mesmo John Wayne, Gary Cooper ou Marlon Brando. Anthony Mann, por sua vez tornou-se o diretor mais importante para o gênero western naquela década. E o odiado Lew Wassermann viu, um a um, os grandes chefões dos estúdios serem substituídos após perderem o poder, poder que passou a se concentrar em grande parte em suas próprias mãos. Não sem razão Lew Wasserman passou a ser tratado como “O Rei de Hollywood”, sendo cortejado por presidentes, políticos, empresários, grandes personalidades e por toda Hollywood. E não é que quase tudo começou com aquela Winchester 73...

Lew Wasserman com os amigos Nancy e Ronald Reagan.




2 comentários:

  1. Excelente matéria, Darci. Gosto, muito dos filmes de James Stewart, westerns ou não, sobretudo os de Mann e de Hitchcock. O final foi a cereja do bolo: “e pensar que tudo começou com aquela winchester 73”. Sempre que lemos sobre os homens fortes do cinema americano, entendemos um pouco melhor boa parte dos motivos da hegemonia do mesmo. Às vezes ficamos muito chateados com eles, por seu pragmatismo e senso de resultados, a prejudicar muitas vezes a qualidade, mas não podemos negar que eles foram muito importantes para fazer do cinema mundial o que ele é, falando, digamos, cumulativamente.

    Abraço!

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  2. Olá, Vinicius - O público geralmente vê o cinema como entretenimento; chefes de estúdio e produtores entendem que cinema é um negócio como outro qualquer. Pouco importa a estes últimos se o cinema é também uma forma de expressão artística e se os projetos resultarem em filmes artísticos isso é apenas um bônus. Como você disse, esse pragmatismo mais prejudica do que ajuda, mas a lista de diretores que justificaram o cinema ser chamado de sétima arte é bastante grande. Só discordo de você nessa tal 'cereja do bolo' que hoje é considerada por muitos o melhor filme de todos os tempos. - Um abraço do Darci.

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