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2 de abril de 2015

A INDOMÁVEL (THE BALLAD OF JOSIE) – DORIS DAY RETORNA AO VELHO OESTE


Doris Day na fase de seu programa de TV.
Após liderar por quatro anos a lista dos Top-Ten Money Maker Stars de Hollywood (1960, 1962, 1963 e 1964) e ter ficado no 3.º posto em 1961, Doris Day continuou sendo atração das bilheterias dos cinemas em 1965 (2.º lugar) e 1966 (8.º Lugar). Em 1967, depois de oito anos entre os Top-Tens, os filmes de Doris deixaram de atrair o público e sem dúvida isso foi resultado dos filmes menos interessantes que ela passou a fazer. Quem dirigia a carreira de Doris Day era seu marido Marty Melcher que também administrava os polpudos rendimentos da atriz, então a mais bem paga do cinema, ao lado de Elizabeth Taylor. Assim como Melcher reduziu a pó a pequena fortuna ganha pela esposa com filmes e discos, ele fez também péssimas escolhas de roteiros para Doris filmar em 1968, praticamente destruindo a carreira da esposa. Porém a pior das decisões na vida de Doris como atriz foi dela própria ao recusar interpretar Mrs. Robinson, a mulher madura que seduz o jovem universitário (Dustin Hoffman) em “A Primeira Noite de um Homem”. Dóris alegou que jamais faria filmes ‘com conteúdo imoral’. O papel ficou para Anne Bancroft e o filme foi um enorme sucesso de público. Doris viu sua carreira declinar e, de grande nome do cinema, migrou para a televisão com o “The Doris Day Show”, programa semanal que durou cinco temporadas. Difícil dizer qual o pior entre os últimos filmes de Doris Day nos anos de 1967 e 1968, mas certamente não foi “A Indomável” (The Ballad of Josie) implacavelmente massacrado pela crítica.


Acima Doris Day e Teddy Quinn.
Liberação feminina e guerra entre criadores - Em meados dos anos 60 o ‘Women’s Lib’ (Women’s Liberation Moviment) tomava conta dos Estados Unidos com as mulheres reivindicando seus direitos na sociedade norte-americana. O cinema não ficou atrás e foram produzidos filmes como “Bonnie & Clyde” e “Alice não Mora Mais Aqui”. O roteirista Harold Swanton escreveu uma história passada no Wyoming e protagonizada por uma mulher que quase cem anos antes do ‘Women’s Lib’ exemplificava a força da mulher na defesa de seus direitos. Essa mulher é Josie Minck (Doris Day) que fica viúva com um filho pequeno e é ainda acusada de ter matado o marido, um reconhecido bêbado e perturbador da ordem pública. Josie Minck não só é absolvida como decide se tornar rancheira e criadora de... ovelhas. Naquele tempo rancheiros tinham que ser todos homens e criar gado, o que faz com que Josie consiga agrupar um número enorme de inimigos liderados pelo intolerante Arch Ogden (George Kennedy). Por sorte Jason Meredith (Peter Graves) compreende a causa de Josie, assim como o influente promotor Charlie Lord (William Talman), ambos menos eficientes em suas ações que as mulheres da cidade lideradas por Annabelle Pettijohn (Audrey Christie), dona de um pensionato de mulheres da cidade. Ogden tenta dissuadir Josie pela intimidação, mas tudo que consegue é tornar as mulheres politicamente mais fortes e Josie finalmente ser uma criadora de... gado, além de se casar com Jason Meredith.

George Kennedy expressando a filosofia machista.

Doris Day e Peter Graves
O parceiro ideal para comédias - Em sua autobiografia “Her Own Story”, Doris Day afirma que atuou a contragosto em “A Indomável”, pois achava que o personagem pouco tinha a ver com ela. Fica-se a imaginar se Doris houvesse se empenhado ainda mais, como não teria ficado esse western-comédia que é melhor do que as críticas que recebeu. Dirigido por Andrew V. McLaglen, que vinha dos bem sucedidos “Shenandoah” e “Quando um Homem é Homem” (McLintock), vale ressaltar que estes westerns tinham como astros James Stewart e John Wayne, exatamente o que faltou em “A Indomável”, um ator de maior envergadura para atuar ao lado de Doris Day. Peter Graves se esforça para superar suas limitações num personagem feito para James Garner, que possuía maior timing para a comédia, como ficou provado desde a série de TV “Maverick”, até os westerns-comédia dirigidos por Burt Kennedy. Mas a essa altura James Garner, que fizera excelente parceria com Doris Day em duas comédias de sucesso, era já um astro de primeira grandeza e o orçamento de “A Indomável” não comportava a pedida salarial de Garner. O produtor deste filme foi Norman MacDonnell, que deu mais certo como produtor das séries de TV “Gunsmoke” e “O Homem de Virgínia”. O elenco de “A Indomável”, recheado de bons coadjuvantes entre eles George Kennedy (que ganharia um Oscar de Melhor Ator Coadjuvante no ano seguinte por “Rebeldia Indomável”), em muito ajudou a tornar este filme de McLaglen agradável com muitos bons momentos.

Acima William Talman;
abaixo Doris Day.
Um estrategista político - Dividido em dois temas, o dos direitos da mulher e o da guerra entre criadores de gado e ovelha, “A Indomável” pulula entre uma e outra questão, discutindo melhor o primeiro e mais importante tema. Josie Minick tem tudo que uma mulher poderia ter contra si num tempo em que o respeito pelo chamado sexo frágil era menor que aquele que os homens tinham por seus cavalos. Denunciada por assassinato, Josie vê a acusação se transformar em crime culposo pois nunca se havia enforcado uma mulher no Wyoming. E para sorte sua o voto feminino, de suma importância, é motivo de politicagem da pior espécie comandada pela estratégia do perspicaz promotor Charles Lord. A partir daí as coisas parecem melhorar para Josie, mas a arrojada viúva, sempre pronta a comprar mais uma encrenca quer criar ovelhas no Wyoming, onde criadores fazem a própria lei. Há mesmo uma ‘Linha da Morte’ por eles traçada e que, como o próprio nome indica, permite que se mate qualquer ovelha que venha a destruir seus pastos. O filme poderia ter ainda um sabor mais forte se ao invés do pensionato de mulheres, a ‘Female Boarding House’ fosse um típico bordel como havia em toda cidade do Velho Oeste. Sabe-se lá até onde foram respeitados os melindres de Doris Day quanto a essa questão.

Guerra entre criadores; protesto das feministas.

Doris Day
Doris elegante demais - Andrew V. McLaglen conduz a história dentro de suas limitações pois ele está longe de ser, por exemplo, um Henry Hathaway que transformou “Fúria no Alasca” (North to Alaska) num extraordinário western-comédia repleto de ação da melhor qualidade. Há, como nesse filme de Hathaway, uma boa briga entre os grandalhões Peter Graves e George Kennedy e é só no quesito ação. McLaglen tenta impedir que seu filme descambe para a galhofa, isto com pouca ajuda de diálogos mais maliciosos ou corrosivos, ainda assim chega ao fim da história sem, no entanto, provocar boas gargalhadas do espectador. O carisma de Doris Day faz com que ela segure o filme mesmo como uma rancheira elegante demais com uma longa cabeleira (peruca) impecavelmente tratada e calças de fazer inveja à Jane Fonda de “Dívida de Sangue” (Cat Ballou). Com a diferença que Doris estava então com 43 anos de idade.

Doris Day armada para enfrentar os machistas criadores de gado.

William Talman
Último filme de William Talman - Neste que foi seu antepenúltimo filme, Doris Day sequer canta o número musical que tradicionalmente apresentava os créditos de suas comédias. Ouve-se “The Ballad of Josie” na voz de Ron Dante, cantor que fez parte do conjunto The Archies, aquele da série de desenhos da TV e do hit “Sugar Sugar”. Doris atua com a naturalidade de sempre fazendo as caras e bocas tão comuns nas situações em que tem que expressar contrariedade ou mesmo irritação. Impossível é não ter saudade de sua Calamity Jane de 1953. Peter Graves é o sortudo da vez que beija a linda Doris Day. George Kennedy mostra que sabe fazer graça melhor que quando pretende ser sério e o elenco tem ainda os fordianos Harry Carey Jr. e Andy Devine. Paul Fix e Elisabeth Fraser estão entre outros veteranos e David Hartman, Don Stroud e Timothy Scott entre os novos atores. Destaque especialíssimo para William Talman em seu último filme roubando as cenas em que participa. Último filme também do Batman do seriado de 1949, Robert Lowery. Possivelmente as críticas negativas sofridas por “A Indomável” se devam às tantas excelentes comédias e mesmo dramas que pontuaram a bela carreira de Doris Day. Mas se “A Indomável” não chega a empolgar, está longe de decepcionar.

Doris Day bebendo conhaque ao lado de Peter Graves, David Hartman,
George Kennedy, Andy Devine e Guy Raymond.

Pôsteres norte-americano e francês de "A Indomável".


Um comentário:

  1. Não só atores fizeram grande sucesso como muitas atrizes também fizeram. Pena que muitas não eram chamadas para atuarem nos faroestes.

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