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6 de março de 2015

A MARCA DA FORCA (HANG ‘EM HIGH) – CLINT EASTWOOD JUSTIÇANDO SEUS ALGOZES


Clint Eastwood
A estreia de Clint Eastwood como ator principal em um filme norte-americano, após se tornar conhecido no mundo todo com a Trilogia dos Dólares, revestiu-se de enorme expectativa. O ano era 1967 e entre as muitas propostas recebidas por Clint para filmar (e teria que ser um western, claro) esteve a de liderar o notável elenco da superprodução “O Ouro de Mackenna” (Mackenna’s Gold). Clint, porém tinha outros planos para sua carreira, e o principal desses projetos era ser o produtor de seus próprios filmes. Para isso criou a Malpaso, sua produtora e tinha concepção própria de como ser bem sucedido no cinema. A fórmula, usada com sucesso ao longo das próximas cinco décadas, seria produzir filmes sem orçamentos dispendiosos e realizados dentro ou preferencialmente abaixo dos prazos de filmagem. Clint Eastwood ainda não se propunha a dirigir, mas queria ter total domínio sobre os filmes produzidos pela Malpaso. A United Artists, a quem Clint se associou para a produção e distribuição desse primeiro filme, queria Robert Aldrich ou John Sturges para dirigir o western que se chamaria “Hang ‘Em High”. Os nomes de Aldrich e de Sturges foram vetados por Clint por serem caros demais e também por serem diretores que não aceitariam passivamente as injunções do ator-produtor. Clint chamou então o maleável Ted Post, que havia dirigido o ator em nada menos que 24 episódios da série “Rawhide”. O numeroso elenco de “Hang ‘Em High” foi composto por atores conhecidos mas cujos salários cabiam perfeitamente no orçamento de um milhão e setecentos mil dólares da produção.


A forca, o enforcado e a marca.
Nove homens e um destino - O roteiro de “Hang ‘Em High”, que no Brasil recebeu o título “A Marca da Forca”, foi escrito por Leonard Freeman e Mel Goldberg com a preocupação especial de fazer ‘O Estranho Sem Nome’ falar, ao contrário dos mínimos diálogos que Clint teve nos filmes dirigidos por Sergio Leone. Jed (Jedediah) Cooper (Clint Eastwood) conduz algumas cabeças de gado que acabou de adquirir quando é surpreendido por um grupo de nove vigilantes liderado pelo Capitão Wilson (Ed Begley). Sumariamente julgado no próprio local, Cooper é condenado a ser enforcado, apesar das ponderações de Jenkins (Bob Steele) um dos vigilantes, contrário à execução sem um julgamento legal. Enforcado e deixado para morrer pelos vigilantes que se afastam, Cooper é salvo pelo Marshal Dave Bliss (Ben Johnson) que passava pelo local. Conduzido por Bliss à presença do Juiz Fenton (Pat Hingle), Cooper é inocentado e nomeado Marshal pelo Juiz, que sabe dos bons trabalhos realizados por Cooper quando foi xerife em outra cidade. Ao aceitar o cargo a intenção de Cooper é ver facilitada a vingança que tenciona fazer, ainda que advertido pelo Juiz Fenton para trazer seus nove algozes com vida para serem julgados. Ao final Cooper elimina um a um os vigilantes do Capitão Wilson, exceção feita a Jenkins e ao próprio capitão que comete suicídio enforcando-se para não ser morto pelo implacável vingador.

Clint Eastwood
Western de estilo híbrido - “A Marca da Forca” foi acusado quando de seu lançamento de ser uma tentativa de imitação dos westerns spaghetti que então faziam bastante sucesso no mundo todo. E o público que aguardava ansiosamente esse primeiro filme de Clint após sua fase europeia queria ver em ação um personagem parecido com ‘O Estranho Sem Nome’ da Trilogia dos Dólares. Seria impossível que Clint Eastwood deixasse de sofrer influência de alguém como Sergio Leone e isso acontece, ainda que se perceba a intenção de realizar um western mais ao estilo daqueles que Hollywood produzia há décadas. Ocorre que mesmo os westerns ditos ‘originais’ sofriam um inevitável processo de mudança. “A Marca da Forca” é um filme híbrido ainda sem o estilo próprio que Clint Eastwood imprimiria a seus faroestes seguintes a partir de “O Estranho Sem Nome” (High Plains Drifter), de 1973, dirigido pelo próprio Eastwood. O personagem Jed Cooper, no entanto, antecipa muito da figura mítica interpretada por Eastwood em seus próximos filmes, com sua quase ressurreição após o enforcamento e a vingança fria e organizada. Se o número de homens a serem mortos por vingança parece exagerado, pouco menor era a lista de Randolph Scott em “Sete Homens Sem Destino” (Seven Men from Now).

Tipos bizarros - O que mais afasta “A Marca da Forca” dos westerns spaghetti é seu ritmo compassado, por vezes até arrastado demais. Mas com tantos homens a matar o roteiro não resistiu em criar um tipo como o bandido chamado Reno (Joseph Sirola) com seu tapa-olho que bem poderia ter saído de um western spaghetti. Nessa mesma linha estão o ‘Profeta’ interpretado por um irreconhecível Dennis Hopper, o maçante padre (James MacArthur) e o empolado Francis Elroy Duffy (Michael O’Sullivan). A branda presença de Ben Johnson, a melancolia de Bob Steele e a delicadeza de Inger Stevens formam o contraponto aos personagens bizarros.

James MacArthur e Bruce Dern; Michael O'Sullivan; Joseph Sirola.

Inger Stevens
Calabouço fétido - Tratando de assunto comum a tantos westerns, o enforcamento, “A Marca da Forca” inova ao mostrar o impaciente e inclemente juiz assoberbado com tantos casos a julgar, quase todos levando a um cadafalso múltiplo. Curiosamente, no mesmo ano de 1968 em “O Preço de um Covarde” (Bandolero!), Dean Martin sobe a um cadafalso desse tipo. Sem se pretender revisionista como passaram a ser muitos westerns nos anos 60, a prisão na qual Jed Cooper é encarcerado é um depósito de homens que se espremem em meio à sujeira e mau cheiro insuportável. Nada que lembre as até arejadas cadeias individuais no fundo dos escritórios dos xerifes. Rachel Warren (Inger Stevens) a cada vez que é autorizada a verificar a chegada de um novo preso, tampa o nariz devido à fetidez exalada. Os prisioneiros torcem para que novas execuções aconteçam, forma única de se poder esticar as pernas dentro daquele calabouço repugnante. Outro aspecto que merece ser ressaltado é o perfeito circo montado para a execução, com famílias inteiras chegando de longe para assistir ao evento preparado com esmero pelo sisudo carrasco Schmidt (Bert Freed).

O público assistindo ao evento dos enforcamentos.

Clint Eastwood acima com Arlene
Golonka e abaixo com Inger Stevens.
Turba furiosa - “A Marca da Forca” perde tempo demais com as atribulações do Juiz Fenton, com sua intransigência no cumprimento da Lei e com a intenção de tornar o juiz o personagem-chave do filme, o todo-poderoso homem que determina quem pode ou não sobreviver ou ir para a forca. Esquisito, portanto, que o Capitão Wilson decida sumariamente pela sorte de Jed Cooper, insuflado pela cólera de seus liderados. Somente Jenkins, lembrando Henry Fonda em “Consciências Mortas” (The Ox-Bow Incident) e por que não, o mesmo Fonda em “Doze Homens e uma Sentença”, é sensato e mantém a ponderação sem conseguir convencer os verdugos a cavalo. E nenhum deles mais furioso que o alucinado Miller tão bem interpretado por Bruce Dern. As presenças femininas de “A Marca da Forca” são desiguais pois enquanto Jennifer (Arlene Golonka) é a prostituta que sonha com a possibilidade de um casamento que a livre da vida que leva, a doce viúva Warren é obcecada pela justiça. E é com Rachel Warren que Jed Cooper se envolve amorosamente, Segundo Ted Post, durante as filmagens Clint Eastwood manteve um affair com Arlene Golonska. A sueca Inger Stevens cometeria suicídio em 1970 quando estava com 35 anos de idade.

Clint Eastwood
O magnetismo de Eastwood - Tudo que cercou a reestreia de Clint Eastwood no cinema estadunidense confirmou o carisma adquirido em sua passagem pela Europa. Clint é daqueles atores de quem não se deve esperar nenhum exagero interpretativo e mesmo assim consegue ser bastante convincente. Minimalista em gestos e expressões como Henry Fonda, Clint supera Henry no magnetismo que o torna um ator fascinante como comprovam seus filmes seguintes em gêneros diversos, inclusive a comédia. Uma aura quase ascética é que faz com que Clint possa interpretar personagens misteriosos e indecifráveis, especialmente aqueles de seus westerns (Josey Wales, o apocalíptico Estranho de “O Estranho Sem Nome”, Bill Munny e, mais que todos, o Pregador de “O Cavaleiro Solitário”). Homem do Oeste diferente de todos que o gênero exibiu ao longo de tantas décadas, Clint Eastwood não encontra paralelo em nenhum outro ator de westerns. O início de "A Marca da Forca" parece ter sido extraída de um episódio de "Rawhide", com Clint lembrando o cowboy Rowdy Yates que interpretou por muitos anos.

Bob Steele
Bob Steele entre rostos conhecidos - Pat Hingle é bom ator, mas faltou-lhe veemência e maior expressividade como o Juiz Fenton. Inger Stevens está angelical demais e bem vestida demais. O numeroso elenco de apoio repleto de rostos conhecidos como os dos ótimos Ben Johnson e Charles McGraw bem que mereceriam mais tempo na tela. Bruce Dern é sempre perfeito como homem mau da pior espécie e Ed Begley repete as expressões assustadas e assustadoras usadas nos filmes em que atua. E que alegria ver Bob Steele ter oportunidade de mostrar que sabe atuar, ele mocinho de tantos westerns B e mero figurante em westerns de melhor orçamento. Rodado em locações no Novo México, “A Marca da Forca” teve trilha musical composta pelo acordeonista Dominic Frontiere, que como compositor alterna momentos de Bernard Herrmann com Elmer Bernstein sem nunca deixar de ser apenas Dominic Frontier.

Pat Hingle e Ed Begley


Sucesso de público - Ainda que Ted Post seja o diretor de “A Marca da Forca”, este western deve ser assistido como a primeira experiência de Clint como 'dono' de um filme. Não se enquadra entre seus melhores westerns mas não desaponta, tanto que o público gostou bastante e o filme rendeu em 1968 nada menos que 17 milhões de dólares, dez vezes mais que seu custo. Consagrado ator-diretor, os fãs de westerns lamentam que em sua longa carreira Clint não tenha filmado mais ‘faroestes medianos’ como este. E por ‘mediano’ entenda-se que “A Marca da Forca” está abaixo dos grandes sucessos artísticos que colocaram Clint Eastwood ao lado de Ford, Peckinpah, Mann e, como não, de seu mestre Sergio Leone. 

Na foto à direita em intervalo das filmagens estão Inger Stevens. Clint Eastwood,
Pat Hingle, Ed Begley e Arlene Golonka.

Bruce Dern e Clint Eastwood

Alan Hale Jr., Ben Johnson e Charles McGraw

6 comentários:

  1. Olá, Darci!

    Conheço bastante o tema musical deste filme que tenho em um CD de músicas de westerns, mas ainda não o assisti. Me parece que já lançaram por aqui em DVD. Preciso garantir o meu.

    Pelo jeito, Clint fez bem ao rejeitar "Mackenna's Gold" para realizar este, rs...

    Estou vendo ali a foto de Alan Hale Jr. Acho que um dos únicos, talvez o único, filmes que vi com ele foi "A Invasão das Aranhas Gigantes", de 1975, onde ele interpreta um xerife. Já com Alan Hale, o pai dele, vi mais filmes, incluindo 2 onde ele interpretou o papel de Little John: "Robin Rood" (1922), de Alan Dwan, e "As Aventuras de Robin Hood" (1939), de Michael Curtiz (considero este segundo como o melhor capa-e-espada). Ele faria o mesmo personagem pela 3ª vez em 1950 em "O Cavaleiro de Sherwood", seu último filme.

    Abraço do Thomaz.

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    1. Olá, Thomaz, agora fiquei curioso. Qual seria o melhor capa-e-espada, se 'Robin Hood' é o segundo? Tenho também esse CD que você citou, tem o Clint na capa e é bastante bom como coletânea de temas de westerns spaghetti e originais. Abraço do Darci

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    2. Olá, Darci!

      Você entendeu errado. Eu disse que "As Aventuras de Robin Hood", o segundo filme citado naquele comentário, é o melhor capa-e-espada. É o meu número 1.

      E o meu CD com esses temas de Spaghetti vem com a foto do filme "Trinity Ainda é Meu Nome", com Terence Hill, na capa, e não com o Clint. Aqui está uma foto dele, veja se é o mesmo que o seu: http://userserve-ak.last.fm/serve/500/84898143/O+melhor+do+Bang+Bang++italiana+Bang+bang+a+italiana+1978++Art.jpg

      Abraço!

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  2. Com Alan Hale Jr. também vi "O Matador" e "Homens Indomáveis".

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  3. Prezado Darci,

    Há 47 anos assisti pela primeira vez "A Marca da Forca" (Hang'em High), considerei muito bom e quando revejo mantenho a mesma opinião. A diferença está no ritmo da narrativa e da edição, as quais nos filmes atuais são mais aceleradas ao gosto do público atual.

    Para mim a presença em "cameos" de conhecidos e respeitados atores de westerns como Ben Johnson, Alan hale,Jr., Bob Steele, Bruce Dern, Charles McGraw, Dennis Hopper, L.Q. Jones, Ned Romero e muitos outros citados, foi um grande trunfo para manter ainda mais o interesse no filme.

    Em seguida, Eastwood estrelou outro sucesso "Meu Nome é Coogan" (Coogan' s Bluff) dirigido por Donald Siegel (outro mentor de Eastwood).

    O Diretor Ted Post era o preferido de Eastwood quando atuava na série para TV "Rawhide" (exibida no Brasil pelo extinto canal Retrô), porque lhe dava oportunidade de aprender as técnicas da direção, devido o seu interesse no assunto.

    Ted Post voltou a dirigir Eastwood em "Magnum 44" (Magnum Force) em 1973, o segundo filme da série Dirty Harry, grande sucesso de bilheteria.

    Lembrar que Clint Eastwood era arrasado pelos críticos da ápoca como ator sem expressão que falava pouco porque não tinha capacidade de dialogar etc., enquanto as revistas populares especializadas em filmes o classificavam de o novo Gary Cooper.

    Quanto a Bob Steele, um dos mais queridos cowboys do cinema dos anos '20, '30 e '40 e posteriormente coadjuvante em dezenas de westerns "A" e "B" já havia mostrado que não era somente mais um mocinho de pequenos westerns, mas um ótimo ator como comprovado nos clássicos "Carícia Fatal" (Of Mice and Man), "A Beira do Abismo" (The Big Sleep) e "Um Preço para cada Crime" (The Enforce).

    Bob Steele em uma de suas últimas entrevistas, disse que embora não precisasse financeiramente, aceitava pequenas partes em filmes e shows de TV somente para se manter na ativa.

    Grato,

    Mario Peixoto Alves

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  4. o Clint é tão bom e gênial que nem a forca mata o cara!!blog sensacional!parabéns pelo trabalho!vida longa e felicidades!!Marcos Punch.

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