No início da década de 50 os grandes
estúdios começaram a sentir o impacto da televisão, a nova mídia que chegara
para vencer o cinema numa luta desigual. Restou aos estúdios, que perdiam
dinheiro com as salas exibidoras cada vez mais vazias, explorar o novo filão
que, afinal de contas, também exibia filmes e criava astros e estrelas. A
Warner Bros. foi o primeiro dos grandes estúdios a produzir filmes para a
televisão apresentando-os no programa intitulado ‘Warner Brothers Presents’.
Esse programa semanal exibido pela Rede ABC revezava a cada semana as séries
feitas para a TV intituladas “Casablanca”, “Kings Row” e a série western “Cheyenne” estrelada por um ator tão alto quanto pouco conhecido, que atendia
por Clint Walker. O primeiro episódio de “Cheyenne” foi ao ar em 13 de setembro
de 1955. Coincidentemente, três dias antes a Rede CBS havia estreado uma outra
série western cujo astro era o igualmente grandalhão James Arness. Essa série
era “Gunsmoke”.
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Poster do faroeste "Covil do Diabo" e cena da estréia de Clint Walker no cinema, segurando Huntz Hall dos Bowery Boys e com Laurette Luez ao lado. |
Cheyenne era ¼ Cherokee - Em 1947 Raoul Walsh dirigiu para a
Warner Bros. o western “Covil do Diabo” (Cheyenne), com Dennis Morgan e Jane
Wyman. Esse filme roteirizado por Alan Le May serviu de base para a criação do
personagem ‘Cheyenne Bodie’, que viria a ser o herói solitário da série
produzida pela Warner Bros. Cheyenne Bodie era um homem branco cujos pais haviam
sido mortos pelos cheyennes e que foi pelos índios criado aprendendo o estilo de
vida dos nativos. Curiosamente o protagonista Clint Walker tinha descendência
indígena uma vez que um de seus avós era Cherokee. Nascido em 1927, em
Illinois, Clint Walker (que possuía uma irmã gêmea) tentou fraudar a idade
quando tinha 16 anos para lutar na II Guerra Mundial, sendo descoberto e não
participando do conflito mundial. Clint walker fez um pouco de tudo na vida
sendo desde lenhador, carpinteiro, vaqueiro, vendedor e finalmente ator,
estreando como uma espécie de Tarzan, num dos últimos filmes da série “Os Anjos
da Cara Suja”. Em seguida foi apresentado pelo ator Henry Wilcoxon a Cecil B.
DeMille, obtendo uma pequena participação em “Os Dez Mandamentos”. Depois disso
foi contratado pela Warner Bros. para ser o mocinho da nova série de TV
“Cheyenne”.
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L.Q. Jones, o sidekick que não deu certo. |
Inquieto herói solitário - Para produtor executivo da série
“Cheyenne” foi designado William T. Orr, e os episódios teriam uma hora de
duração, filmados em preto e branco. O primeiro episódio, exibido em 13/9/1955,
foi “Mountain Fortress”, tendo no elenco, além de Clint Walker, James
Garner, Robert J. Wilke, Ann Robinson e L.Q. Jones. Como todo herói, Cheyenne
Bodie teria um sidekick e ele era chamado ‘Smitty Smith’ e interpretado por L.Q. Jones.
Como no entanto as histórias da série não tinham conexão uma com as outras, o
personagem 'Smitty Smith' desapareceu depois de três episódios. O período em que
Cheyenne Bodie cavalgava era o pós-Guerra Civil e num episódio ele aparecia
como xerife, na outra como rancheiro, ou batedor do Exército, ou batedor de
caravanas, ou homem da fronteira, mas sempre sozinho. Quem o acompanhava em
todas as aventuras eram seus ideais de respeito à lei e à ordem, fazendo ele
próprio justiça se assim fosse necessário, mas dentro das normas estritas de lealdade e honestidade. Cheyenne arriscava a própria vida para defender os oprimidos pelos
homens maus, o que acontecia em todo o Velho Oeste.
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Clint Walker em cenas de episódios de "Cheyenne" com Marie Windsor (acima); com Penny Edwards; e com Sally Kellerman (abaixo); na foto maior Clint Walker no set de filmagens ao lado de seu dublê Clyde Howdy que usava o tempo todo botas especiais para quase atingir a altura do astro da série. |
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Clint Walker, que se atreveu a enfrentar os irmãos Warner. |
Luta contra Jack Warner - Um episódio da série “Cheyenne”
levava seis dias para ser produzido, sendo apresentado a cada três semanas. Quando
a Warner Bros. percebeu que a audiência de “Cheyenne” era muito maior que as
audiências das séries “Casablanca” e “Kings Row”, o estúdio cancelou estas duas
séries e passou a produzir outras duas séries westerns para revezar com
“Cheyenne”. Essas novas séries foram, primeiro “Sugarfoot”, com Will Hutchins e
mais tarde “Bronco”, com Ty Hardin, ambas as séries conquistaram também boas audiências,
ficando atrás de “Cheyenne” que era uma das campeãs do instituto de pesquisa
Nielsen Ratings. Tudo ia bem até que se manifestou a ganância do estúdio
dirigido por Jack Warner que se recusou a rever o contrato de Clint Walker. Em
1955 o ator assinara um longo contrato pelo qual receberia 175 dólares por
semana e que devido ao sucesso da série chegou a 1.250 dólares semanais.
Acontece que uma cláusula do contrato obrigava Clint a dividir com o estúdio
50% de qualquer trabalho que viesse a fazer como ator fora da série, desde publicidade e até
mesmo gravações de músicas como cantor que ele nem era. Dessa forma eram
tratados os artistas pelos chefões dos estúdios e alguns deles enfrentavam
tipos como os mesquinhos irmãos Warner. Clint Walker foi um deles e desafiou
os patrões afastando-se da série e ficando sem trabalhar até que o contrato
fosse revisto e as cláusulas que o prejudicavam fossem eliminadas. Em 1958,
após três temporadas de sucesso, a série “Cheyenne” deixou de ser produzida por
alguns meses pois Clint Walker sabia o quanto valia.
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Cheyenne visita Bronco Layne e é visitado por Sugarfoot. |
“The Cheyenne Show” - Como em 1958 a série “Cheyenne”
era exibida alternadamente com “Sugarfoot” e “Bronco”, a ABC passou a reprisar episódios
antigos de “Cheyenne” enquanto Clint Walker estava afastado. Quem não gostou
nada foi o público que entulhou de reclamações a caixa postal da ABC. A rede
então pressionou a Warner Bros. que se viu obrigada a rever o contrato com
Clint Walker que acabou vencendo a batalha e voltando a interpretar Cheyenne
Bodie. A partir daí, com a liberdade conquistada, Clint Walker passou a
aparecer mais no cinema, com westerns como “Rifle de 15 Tiros”, “A Lei do Mais
Valente” e “Ouro que o Destino Carrega”, todos dirigidos por Gordon Douglas. As
três séries “Cheyenne”, “Sugarfoot” e “Bronco” aumentavam a alegria dos
telespectadores quando os protagonistas de cada série participavam como
convidados de episódios dos dois outros heróis. “Bronco” era praticamente um clone
de “Cheyenne” e a audiência sempre subia quando aconteciam esses ‘encontros’ e com
isso o programa nunca saía da lista dos 20 mais assistidos da TV
norte-americana. Inicialmente chamado de “Warner Brothers Presents”, o programa
passou a se intitular “The Cheyenne Show”.
Brigas de cachorros grandes - Ocupando o horário das 19h30 às 20h30,
a série “Cheyenne” foi exibida de 1955 até 1959 às terças-feiras; de 1959 a
1962 passou para as segundas-feiras; no último ano de exibição, de abril a
setembro de 1963 o programa era exibido às sextas-feiras, sempre no mesmo
horário. Fazia-se piada em Hollywood com o fato de em praticamente todos os
episódios, por uma razão ou por outra, ou mesmo sem razão alguma, Clint Walker
tirar a camisa e aparecer com o dorso nu. Fortíssimo que era, o personagem
Cheyenne evitava até onde podia fazer uso de seus músculos, mas mesmo assim
sempre encontrava bandidos desatinados dispostos a enfrentá-lo. Entre os que
deram trabalho a Cheyenne estavam os também enormes Mickey Simpson, Lane
Chandler, Don Megowan, Peter Witney, Leo Gordon e Dan Haggerty. Esses bandidões
só sossegavam depois de quase estrangulados por uma gravata ou por um mortal
cruzado aplicados por Cheyenne Bodie. Clint Walker teve que esperar até 1966,
quando se encontrou com Lee Marvin em “Os Doze Condenados” para beijar o chão após
ser vencido por Lee, obedecendo ao roteiro daquele filme.
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Cheyenne em edição brasileira da EBAL. |
Cheyenne nas histórias em quadrinhos - Como não podia deixar de ocorrer, o herói Cheyenne
Bodie foi levado para os quadrinhos, sendo publicadas 25 edições com as
aventuras de ‘Cheyenne’ com belas capas com o fotogênico Clint Walker. No
Brasil quem publicou as aventuras de ‘Cheyenne’ foi a Editora Brasil-América, a
saudosa EBAL do Rei dos Quadrinhos Brasileiros Adolfo Aizen. A música-tema de “Cheyenne”, de autoria de
William Lava não chegou a se tornar tão conhecida como outros temas de séries
westerns de TV. O compositor Stan Jones ("Riders in the Sky") foi responsável pela trilha musical da
série. Tanto “Sugarfoot” quanto “Bronco” começaram a ser produzidos depois e
foram canceladas antes de “Cheyenne” que nos oito anos em que a série foi
exibida teve 107 episódios. Quando as histórias das três séries passaram a ficar
muito parecidas e repetitivas, a audiência começou a cair levando ao inevitável
cancelamento das séries. A década de 60 não seria tão promissora para as séries
westerns na TV e muitas séries clássicas deixaram de ser produzidas, entre elas
“Cheyenne”. Algumas temporadas desta série foram lançadas em DVD nos Estados
Unidos, enquanto a fatia nostálgica do público brasileiro aguarda que o mesmo
ocorra por aqui.
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Para agradar as fãs e também alguns marmanjos, a produção obrigava Clint Walker a aparecer sem camisa em quase todos os episódios. |
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Acima os cowboys da TV Wayde Preston, Clint Walker, Will Hutchins, James Garner e no centro o produtor William T. Orr; abaixo James 'Bret Maverick' Garner e Clint 'Cheyenne' Walker; à esquerda um já idoso Clint Walker. |
Tenho varias dvds de seriados da tv e ainda não sei porquê, não os vi. Cheyenne é um deles. Li muita revista deste seriado, quando criança. Já vi alguns filmes com o Clint Walker e gostei especialmente de dois deles, ambos em preto e branco: O Rifle de 15 Tiros e O Ouro que o Destino Carrega, este com o Roger Moore, ainda não famoso e ainda não James Bond.
ResponderExcluirApesar do Clint Walker não ter sido considerado um ator de primeira linha, no mínimo ele era de primeira grandeza pela sua estatura.
Acho que agora vou ver este seriado.
Joailton-Caruaru
Vc deveria assistir, sem demora, qualquer filme e/ou seriado com Clint Walker... Ele era um ator que (considerando seu físico e sua interpretação) era um ator que convencia como paladino do velho Oeste... ao contrário de outros atores bem mais conhecidos e/ou com participação em filmes famosos...! Clint Walker, diante de suas qualidades físicas, deveria ter sido mais bem aproveitado pelos estúdios de filmagem...!
ExcluirCom um olhar feminino reparei nas fotos de Clint Walker sem camisa. Percebei o motivo! É de agradar aos olhos!
ResponderExcluirAgora... quanto ao seriado... eu não me lembro de tê-lo assistido, mas sabia da existência dele. E cheguei a ter uma das revistas na mão.
Muito bom o teu artigo. Eu assisti a muitos filmes de faroestes, e gostaria de ver mais artigos sobre os seriados do mesmo gênero, que também foram a base para eu adquirir o gosto por filmes de mocinhos e bandidos no oeste.
Um grande abraço!
Janete, com esta postagem chega a onze o número de matérias dedicadas às séries de TV. Sei que toda uma geração começou a gostar de faroestes assistindo essas séries. Que ainda são muito assistidas. Um abraço do Darci.
ResponderExcluirPrezado Darci,
ResponderExcluirA série para a TV "Cheyenne" foi uma das melhores da sua época que, inclusive, usava os roteiros dos antigos westerns da Warner Bros. e os adaptavam para os episódios, também, incluindo algumas cenas daqueles filmes. Aqui no Brasil foi exibida nas sextas-feiras alternando com "Maverick" e depois "Bronco Laine", creio que foi na TV TUPI (rede de Assis Chateaubriand).
O gigante Clint Walker tinha um tipo perfeito para westerns, falava pouco e agia muito. Os westerns que ele fez para o cinema como “O Rifle de 15 Tiros”, “A Lei do Mais Valente”, “Ouro Que o Destino Carrega”, “Satã, o Urso Cinzento” e especiais para TV (“Yuma”, “The Bounty Man e “Hardcase”) foram acima da média. É pena que não lhe dessem mais oportunidades.
O site www.clintwalker.com operado por ele e sua esposa, tem muitas informações.
O bandidão Leo Gordon também escreveu vários roteiros para “Cheyenne” e “Maverick”.
Mario Peixoto Alves
Prezado Mário. Suas palavras e seus comentários são perfeitos e refletem o que sempre pensei a respeito de Clint Walker... Por exemplo, "... tinha um tipo perfeito para westerns, falava pouco e agia muito... É pena que não lhe dessem mais oportunidades"!!! Em filmes como Os Doze Condenados, p. ex., ele deveria ter sido o protagonista, ou seja, deveria ter sido como escolhido para interpretar a personagem principal...!!! Parabéns pelos excelentes comentários e abraços.
ExcluirOlá, Mário - Parece que você era fã das séries westrns de TV quando elas eram exibidas por aqui. Por coincidência, no vídeo da postagem há um clip apresentando a abertura do episódio "The Trap", baseado em história escrita por Leo Gordon. - Um abraço do Darci
ResponderExcluirMuito bom o texto. Tenho alguns episódios de Cheyenne e também o filme Yuma. Gosto do Clint Walker.
ResponderExcluirParabéns pelo excelente BLOG!