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29 de outubro de 2019

QUANDO UM HOMEM É UM HOMEM (McLINTOCK!), ÓTIMO WESTERN-COMÉDIA DO DUKE


Acima James Edward
Grant; Duke e Andrew
V. McLaglen durante
as filmagens de
"Depois do Vendaval"

John Wayne vinha de dois trabalhos sob a direção de John Ford: interpretando o General Sherman em “A Conquista do Oeste” (How the West Was Won) e em “O Aventureiro do Pacífico”. No primeiro, o segmento com Ford-Wayne foi o menor e o menos relevante da superprodução em Cinerama que se tornou imenso sucesso de bilheteria; enquanto o segundo foi um rotundo fracasso de público e crítica. Nesse tempo a Batjac, produtora de Wayne, ainda se recuperava do prejuízo com o épico “O Álamo” (The Alamo) quando o Duke decidiu investir quatro milhões de dólares em um western cômico com tema baseado em “A Megera Domada” de William Shakespeare. A história original e o roteiro foram escritos por James Edward Grant, roteirista preferido de Wayne desde “Iwo-Jima, o Portal da Glória” e “Caminhos Ásperos” (Hondo). O título escolhido foi “McLintock!”, que no Brasil se chamou “Quando um Homem é Homem”. A produção executiva ficou a cargo de Michael Wayne, filho do Duke e o elenco teve ainda Patrick Wayne, também filho de John. Boa parte do grande elenco de apoio reunido foi composto por atores que mantinham amizade de longa data com Wayne e que ele ‘convocava’ como espécie de gratidão. Esse lado humano de John Wayne ficou ainda mais patente quando chamou Yvonne De Carlo para um papel importante, ela cujo marido, o stuntman Robert Morgan, perdera uma perna durante as filmagens de “A Conquista do Oeste”, o que trouxe dificuldades financeiras para o casal. Aissa Wayne, filha caçula de Wayne teve também pequena participação nesta que foi uma produção que pode ser chamada de ‘familiar’. Para dirigi-la, outro amigo de Wayne, Andrew V. McLaglen, que vinha trabalhando em séries para a TV e que pela primeira vez dirigiria uma produção de vulto.


Acima Maureen O'Hara e John Wayne;
abaixo Yvonne De Carlo e Wayne
Homem forte e esposa também forte - A história de J.E. Grant é centrada em George Washington McLintock (John Wayne), um barão de gado proprietário de muitas terras e respeitado por todos não apenas por suas posses, mas também por sua coragem, retidão e lealdade. Chamado de ‘G.W.’ pelos amigos e empregados, McLintock vive separado da esposa Katherine Gilhooley McLintock (Maureen O’Hara) com quem sempre viveu às turras. De surpresa Katherine (Kate) reaparece no Rancho McLintock para tratar do divórcio e para requerer a guarda da filha Rebecca (Stefanie Powers), de 17 anos que concluíra estudos no Leste e também retornara para a fazenda do pai. McLintock acabara de empregar a viúva Louise Warren (Yvonne De Carlo) como cozinheira e seu filho Devlin (Patrick Wayne) como ajudante geral. Ao ver a bela Louise na casa, Kate acredita que seu marido tenha interesse nela, o que não é verdade. Por outro lado, Rebecca (Becky) e Devlin se sentem atraídos mutuamente. O ciúme de Kate e suas atitudes intempestivas, somados aos conselhos do comerciante Birnbaum (Jack Kruschen) amigo de G.W., fazem com que ele termine por domar sua esposa com quem retoma o casamento.

John Wayne
Roteiro sob medida para o Duke - James Edward Grant escreveu esta história sob medida para John Wayne e Maureen O’Hara com personagens que em muito lembram aqueles que criaram inesquecivelmente em “Depois do Vendaval”. Grant adicionou ainda uma segunda trama amorosa para que Patrick Wayne pudesse ter uma presença expressiva nesta comédia, isto claramente a pedido de Wayne que tentava impulsionar a carreira de ator do filho Pat. Grant se esmerou para agradar Wayne e o que não falta no roteiro são discursos de G.W. McLintock enaltecendo seu país, falando do capitalismo, das relações patrão-empregados, condenando políticos e estudantes universitários e até se aceitando como ‘reacionário’. Os índios (Comanches) são mostrados como vítimas da política do governo que desrespeita seus direitos e têm assim justificado até mesmo um ataque armado contra o poder instituído e defendido pela Cavalaria. Em nenhum outro western John Wayne pode externar sua filosofia de vida e mesmo sendo um tanto quanto longo e excessivamente discursivo, “Quando um Homem é Homem” é agradável de se assistir porque mescla momentos engraçados com algumas brigas muito boas, e o espectador nunca é tomado pelo tédio durante os 127 minutos deste faroeste.

John Wayne na lama
Enlameados até os ossos - Aproximando-se dos clássicos do pastelão em uma de suas mais elaboradas sequências cômicas, a da luta na lama, quando quase todo o elenco rola uma ribanceira caindo num depósito de lama resultante da extração de minério. Esse episódio se torna ainda mais engraçado quando se sabe o que passou durante as filmagens: os stuntmen queriam ganhar por queda na lama, como se isso fosse altamente arriscado, algo parecido com as perigosas quedas de cavalos que são pagas a cada queda. Irritado com o ‘profissionalismo’ dos dublês, Wayne decidiu ele próprio derrapar pelos seis metros de lama que levavam ao fundo do ‘lago lamacento’ e convenceu Maureen O’Hara a fazê-lo também. Depois deles Strother Martin, Jack Kruschen, Leo Gordon, Gordon Douglas e outros atores chafurdaram na lama resultando num momento impagável do filme. No entanto esse não foi o clímax da aventura, que teve lugar durante a comemoração do ‘4th July’, abrindo espaço para corridas, rodeios e outras provas, mas nada que se compare a sequência final com McLintock perseguindo Kate para mostrar a ela que quando ‘levantar a voz não resolve, a solução é levantar (e descer) o braço’ na recalcitrante e irascível esposa.

A queda de Maureen O'Hara; John Wayne e Maureen O'Hara

Maureen O'Hara;
Yvonne De Carlo e Chuck Roberson
A ciumenta Kate - Se essas sequências resultaram ótimas, menos engraçada é o momento em que os embriagados G.W. e a senhora Warren (Yvonne De Carlo) rolam várias vezes uma escada abaixo sob os olhares de Kate. J.E. Grant não se fez de rogado e perpetrou na história diversas alusões a outros filmes de Wayne, como quando Jerry Van Dyke interpreta um janota que lembra Ken Curtis de “Rastros de Ódio” (The Searchers), cantando e dançando. O janota de Van Dyke não luta contra Patrick Wayne, deixando essa tarefa para Edward Faulkner que leva uma surra de Pat. Um achado do roteiro de Grant foi fazer com que a viúva Warren fique noiva do xerife Lord (Chuck Roberson), arrefecendo assim o ciúme de Kate. Uma pena porque quanto mais ciumenta, mais Maureen torna sua Kate divertida. Muitos são os personagens e cada um deles têm oportunidade de se mostrar engraçado, uns mais, outros menos. Hank Worden, Edgar Buchanan, Chill Wills, Jack Kruschen, Strother Martin, Jerry Van Dyke e até Mari Blanchard e o chinês H.W. Gim fazem graça. Rosto conhecido de muitos westerns de John Ford, o nativo John Stanley consegue falar mais que em todos os muitos filmes dos quais participou, ainda que repetindo sempre duas frases: “Grande festa, McLintock!” e “Onde está o uísque?”

Jerry Van Dyke e Stefanie Powers; Stefanie e Pat Wayne

Maureen O'Hara
Western sem foras-da-lei - Um filme com John Wayne em estado de graça e ainda em boa forma (antes da cirurgia para retirada de um pulmão), com mulheres bonitas como Maureen, Yvonne, Stefanie e Mari Blanchard, atores coadjuvantes transbordando simpatia e situações engraçadas, além de muita troca de sopapos só pode resultar interessante. Curiosamente não há bandidos neste faroeste, isto se considerarmos que os vilões (políticos) não carregam armas, usando a caneta para perpetrar suas vilezas. E “Quando um Homem é Homem” vale mesmo pela reunião de Maureen com o Duke, ela engraçadíssima e bem à vontade como mulher forte que afinal sucumbe a um homem de temperamento ainda mais forte que ela.

Maureen O'Hara

Maureen O'Hara, Andrew V. McLaglen
e John Wayne
A boa fase de McLaglen - Filmado em diversas locações no Arizona, a bonita fotografia é de William B. Clothier, constante na filmografia de Wayne e a música de De Vol não é das mais inspiradas. Quatro canções fazem parte da trilha, todas de autoria de Bill Dunham, nenhuma delas memorável. Wayne chamava o diretor pelo estranho apelido de ‘Andy McSandy’ e quando McLaglen adoeceu por uns dias John Ford apareceu nas locações e dirigiu algumas sequências. O crédito, no entanto, de “Quando um Homem é Homem” ter sido um dos filmes mais queridos de John Wayne é todo de Andrew McLaglen que em seguida dirigiria “Shenandoah”. Quando alguém dizia que “Shenandoah” parecia ser um filme de John Ford, McLaglen exultava de alegria em seus 2,01m de altura, o que fazia o Duke erguer os olhos para falar com ele.

Andrew V. McLaglen e John Wayne

Último filme de Mari Blanchard - John Wayne é sempre John Wayne, mas ao lado de Maureen O’Hara (e dos filhos) o Duke fica ainda melhor. Maureen está hilariante enquanto Yvonne De Carlo não é páreo para a irlandesa. Yvonne se revelaria boa comediante três anos mais tarde na série clássica “Os Monstros” como ‘Lily Munster’. Aos 21 anos de idade Stefanie Powers está à vontade em meio a tantos veteranos, entre eles Strother Martin, Chill Wills, Hank Worden, Jack Kruschen, Edgar Buchanan, Leo Gordon, Michael Pate, Bob Steele, Gordon Jones, Robert Lowery e outros. Uma pena que não foi expandida a parte de Mari Blanchard (na foto ao lado), lindíssima aos 40 anos de idade, e em seu último filme, ela que viria a falecer de câncer aos 47 anos.

Yvonne De Carlo; Mari Blanchard

John Wayne
Western longo mas com muitas risadas - Este filme chegou a ser exibido na TV com 90 minutos, inteiramente mutilado, coisas que aconteciam para fazer os faroestes ‘caber’ nas sessões verpertinas. Assim como “Fúria no Alasca” (North to Alaska) que tem 122 minutos, a metragem de “Quando um Homem é Homem” pode parecer um tanto longa demais, mas a exemplo do western de Henry Hathaway, as gargalhadas são tantas que nem se percebe isso. O site IMDb informa que o orçamento de “Quando um Homem é Homem” foi de dois milhões de dólares, mas biografias de John Wayne (mais críveis) falam em quatro milhões de dólares saídos do bolso do Duke. As bilheterias faturaram dez milhões de dólares o que fez deste faroeste um dos mais rentáveis entre os produzidos pela Batjac.

Maureen O'Hara, John Wayne e Yvonne De Carlo

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