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4 de janeiro de 2020

RESISTÊNCIA HEROICA (ONLY THE VALIANT) – GREGORY PECK E SEUS VALENTES SOLDADOS



Gregory Peck
Gregory Peck não era um homem de meias palavras e em sua biografia escrita por Gary Fishgal contou a este que detestou ter feito “O Ouro de Mackenna” (Mackenna’s Gold), o western realizado em 1969 como superprodução e elenco estelar. No livro Peck diz também que não gostou nada de ter atuado em “Resistência Heroica” e as razões não eram poucas. A começar porque ele vinha de atuar em filmes importantes, como o western “Duelo ao Sol” (Duel in the Sun), enorme êxito de bilheteria ou bem recebidos pela crítica como “O Matador” (The Gunfighter), que se tornaria um clássico no gênero. E Peck foi praticamente obrigado, por razões contratuais, a substituir Gary Cooper que desistiu de interpretar o heroico Capitão deste “Resistência Heroica”. Teve ainda que usar a mesma farda que havia sido utilizada anteriormente por Rod Cameron, ator fortíssimo e mais alto que Peck, sem que a Warner ao menos mandasse ajustar o uniforme de Cavalaria que, nitidamente, parece sobrar em Gregory Peck. Houve também a questão da leading-lady escalada ser a quase desconhecida Barbara Payton, o que muito contrariou o ator acostumado a contracenar com grandes estrelas. E finalmente o fato de ser dirigido por Gordon Douglas, então diretor de pouca expressão. Mesmo a soma de tudo isso não impediu Peck de se empenhar, como de hábito, para propiciar uma convincente interpretação. A produção de “Resistência Heroica” foi de William Cagney, irmão de James Cagney, também associado ao projeto. A historia original foi escrita por Charles Marquis Warren, que mais tarde se tornaria diretor e produtor de westerns para a TV (“Gunsmoke” e “Rawhide”). O roteiro foi elaborado pelos premiados Edmund H. North (“Patton, Rebelde ou Herói?”) e Harry Brown (“Um Lugar ao Sol”).


Gregory Peck
A luta dupla do Capitão Lance - No Forte Winston, o Capitão Richard Lance (Gregory Peck) disputa com o Tenente William Holloway (Gig Young) o amor de Cathy Eversham (Barbara Payton), filha de um veterano capitão. É prisioneiro nesse forte o chefe Apache Tucsos (Michael Ansara), que deve ser levado para o Forte Grant por um grupo de soldados comandado pelo Capitão Lance. Porém o Coronel que comanda o Forte Winston ordena que o Tenente Holloway assuma a missão em lugar do Capitão Lance. A caminho do Forte Grant os Apaches atacam o pequeno destacamento, libertam Tucsos e torturam o Tenente Holloway até a morte. Encontrado pelo batedor Joe Harmony (Jeff Corey), o corpo de Holloway é levado de volta ao Forte Winston. Lá toda a tropa acredita que Lance tenha deliberadamente enviado Holloway para a morte para ficar com Cathy. Os Apaches novamente sob a liderança de Tucsos se mobilizam para um ataque ao Forte Winston pois o  chefe Apache sabe do número reduzido de soldados que compõe a tropa do Forte. O Capitão Lance então sugere e recebe aprovação para uma missão quase suicida que é deter os Apaches no Forte Invincible que foi semidestruído e onde Tucsos foi aprisionado. O Forte Invincible situa-se na única passagem possível para os índios que habitam as Montanhas Flinthead. O Capitão Lance reúne então sete homens, todos com algum tipo de problema pessoal e quase todos com forte antagonismo em relação ao seu modo disciplinador e rígido de agir segundo o regulamento militar. Quando chega ao Forte Invincible a patrulha descobre que não há água e que Tucsos prepara o ataque. Os soldados conseguem se defender mesmo com a perda de quase todo o grupo e um deles é destacado para buscar reforço, que chega ainda em tempo de salvar o Capitão Lance e mais dois de seus homens.

Barbara Payton com Gig Young (acima)
e com Gregory Peck
Produção ‘B’ com roteiro inteligente - Uma das queixas de Gregory Peck em relação a “Resistência Heroica” é que o filme não passava de uma mera produção ‘B’. E isso fica patente com a construção, nos estúdios da Warner Bros., do Forte Invincible e dos paredões rochosos que o cercam, visivelmente com cenários de papel e madeira pintados imitando rochas e pedras. E é nesse cenário que transcorre a segunda parte deste western com as sequências de batalha. Curiosamente, é em meio a esse cenário falso que o filme ganha força graças à boa direção de Gordon Douglas e às ótimas interpretações de Peck e do excelente elenco de apoio. Além disso, a historia de Charles Marquis Warren é engenhosa ao colocar dois oficiais disputando o amor da bela filha de um Capitão e como resultado disso criar um propício clima de motim que acaba não acontecendo. No entanto o roteiro foi infeliz com a sequência bisonha em que a moça é beijada ardentemente numa despedida pelo seu pretendente Tenente Holloway que havia sido preterido por ela em favor do Capitão Lance. Este parte para a missão com alguns de seus comandados dispostos a matá-lo, cada um com sua razão particular. Porém Lance consegue demonstrar coragem e conhecimento militar suficientes para reverter as hostilidades, situação parecida com aquela que seria excepcionalmente bem trabalhada por Robert Aldrich em “Os Doze Condenados”. Há ainda o conflito entre um rebelde sulista que aceitou renegar seu Exército Confederado para se tornar soldado ianque, não faltando o soldado covarde e um cabo bêbado, estereótipos, é certo, mas que funcionam bem nesta aventura militar.

Lon Chaney Jr. e Ward Bond
Os muitos inimigos do rígido Capitão - Inúmeros foram os westerns nos quais um forte é sitiado por índios possibilitando aos soldados provarem sua bravura destacando-se a liderança de um corajoso oficial. “Resistência Heroica” não foge desse clichê mas seu diferencial é o grupo de homens que o Capitão Lance comanda. Há o fanático árabe (Lon Chaney, Jr.) que não esconde o desejo de matar o Capitão, agindo pelo que entende serem desígnios dos céus. A Guerra Civil não foi esquecida e dois soldados (Neville Brand e Steve Brodie), um deles ex-sulista, reavivam as escaramuças seccionistas até que caem prisioneiros dos Apaches sendo, paradoxalmente, amarrados juntos para serem torturados. Os Apaches percebem que ambos são inimigos e, para se divertir, os libertam para que travem luta mortal como se essa violência vingasse as centenas de milhares de vidas que a guerra ceifou de Norte a Sul. O fordiano Ward Bond recria, sem a graça de Victor McLaglen, o soldado bêbado e irresponsável que enche cantis com uísque em lugar da tão preciosa água. O Capitão Lance tem nos homens que lidera inimigos tão ou mais perigosos que os próprios Apaches e Gregory Peck brilha com a dignidade que incute no personagem e que leva o grupo a respeitá-lo no momento decisivo da batalha.

Gregory Peck
Desfecho estranho para um triângulo amoroso - Como em tantos e tantos outros faroestes, mais uma vez Hollywood mostra índios com inteligência e habilidade reduzidas, em outro pecado que o filme contém. Mas não foi esquecida, no entanto, a crueldade dos nativos, quase uma norma do cinema norte-americano como que para justificar a ação exterminadora da Cavalaria e, sabe-se, os apaches eram mesmo cruéis. Pouco convincente também é a construção do triângulo amoroso, ainda que sirva como ponto de partida para o ressentimento da tropa em relação ao Capitão Lance. Rifles de soldados chegam a mirar o Capitão e uma enorme pedra por pouco não o mata de forma nada acidental. Por outro lado Gordon Douglas se mostra criativo ao, com poucos recursos e em um cenário típico de filmes de orçamento limitado, mais lembrando as cavernas dos seriados da Republic e da Universal, desenvolver a emoção necessária tornando este western acima da média.

Lon Chaney Jr.
 e Ward Bond
Fanático Lon Chaney Jr., um árabe fanático - Gregory Peck está excelente, ele que como poucos atores incute integridade a seus personagens. Embora nunca reconhecido como grande ator (chamado até de canastrão por alguns críticos), Peck raramente desaponta. Ward Bond é ótimo quando não excessivo e neste western ele se excede tentando fazer graça, o que não é necessário porque sua maior graça consiste em ser natural. O grande destaque no elenco de apoio é Lon Chaney Jr. como o soldado árabe Kebussyan, brutal e ameaçador, ele Lon Chaney Jr. que interpretou diversos tipos monstruosos nos cinema em filmes de terror, sempre à sombra do nome famoso de seu pai. Jeff Corey merecia maior participação, pequena a exemplo de Gig Young. O sírio de nascimento Michael Ansara, que se notabilizou por interpretar tipos étnicos é o chefe Apache Tucsos, enquanto Neville Brand em sua primeira aparição creditada no cinema já demonstra que viria a ser um dos mais violentos homens maus da tela.

Barbara Payton
A infeliz Barbara Payton - A atriz Barbara Payton, então com 24 anos, preocupou mais a produção quando não estava diante das câmeras por ter mantido durante as filmagens um romance com Gregory Peck. Barbara chegou a ser proibida de sair de seu camarim para não atrapalhar os trabalhos, o que pouco adiantou pois Peck saia de cena e ia direto para o camarim da atriz. Barbara Payton, que teve curta carreira como atriz, foi protagonista de uma das mais tristes historias de Hollywood, indo do cinema para a prostituição no Sunset Boulevard, para as drogas, bebida, escândalos, casamentos tumultuados e finalmente teve morte precoce aos 39 anos de idade. Como atriz pouco talentosa ela jamais chegaria longe, levada que foi ao cinema por sua beleza, de onde saiu em razão de seu comportamento tortuoso.

Western pouco lembrado - Pouco lembrado entre os westerns de Gregory Peck, a ponto de ter sido ignorado na ‘Encyclopedia of Westerns’ de Herb Fagen, “Resistência Heroica” merece ser visto não apenas por entreter o espectador, mas também por reunir um elenco de coadjuvantes dos melhores. Este faroeste é um dos destaques da filmografia cheia de altos e baixos de Gordon Douglas (na foto ao lado).


Pôsteres de "Resistência Heroica"

Barbara Payton, Gregory Peck e Gig Young; Gregory Peck e
Michael Ansara; Ward Bond com Barbara e Gregory ao fundo

Barbara Payton e Gregory Peck em foto para publicidade

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