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10 de julho de 2018

NO VELHO COLORADO (THE MAN FROM COLORADO) – GLENN FORD COMO VILÃO DA HISTÓRIA


O sucesso de “Gilda” não só fez de Rita Hayworth a então maior estrela de Hollywood como transformou Glenn Ford no principal galã da Colúmbia, estúdio que o mantinha sob contrato. Aos 31 anos o canadense Ford viu no próximo trabalho que a Colúmbia lhe apresentou um desafio pois teria que interpretar um personagem longe de ser simpático, um homem abominável. Borden Chase havia escrito “Blazing Guns on the Chisholm Trail” que ele mesmo roteirizou para o cinema com o título “Red River” (Rio Vermelho). Em seguida Chase escreveu “The Man from Colorado”, cujos direitos a Columbia adquiriu e Ben Maddow fez o roteiro e que seria o filme estrelado por Glenn Ford. Para dirigir o estúdio chamou Charles Vidor, o húngaro que dirigira “Gilda” e que antes da II Grande Guerra também dirigira Glenn Ford (ao lado de Randolph Scott) em “Império da Desordem” (The Desperadoes), western de 1943. O ator e o diretor estavam brigados devido porque Glenn Ford depôs a favor do chefão da Colúmbia (Harry Cohn) numa ação que Vidor impetrou contra o desbocado ‘mogul’. Charles Vidor iniciou as filmagens e não dirigia a palavra a Glenn Ford, orientando-o através de um assistente. O ator pressionou Harry Cohn e este substituiu Vidor por Henry Levin. O novo diretor era mais conhecido pelos filmes de aventura destinados a um público menos exigente e deu continuidade ao filme iniciado pelo diretor húngaro. Como na história “The Man from Colorado” havia um segundo papel masculino importante, a Colúmbia conseguiu o ‘empréstimo’ de William Holden junto à Paramount. No Brasil o novo western foi lançado como “No Velho Colorado”. (Nas fotos à direita vemos Ben Maddow e Borden Chase; abaixo Henry Levin e Harry Cohn)


Glenn Ford com William Holden na foto
do centro.
Um oficial desvairado – Nos estertores da Guerra Civil um destacamento sulista se rende às tropas da União acenando com uma bandeira branca. O Coronel Owen Devereaux (Glenn Ford) com binóculos é o único a ver o pedido de rendição mas ordena que os confederados sejam dizimados com tiros de canhão, relatando posteriormente seu procedimento em um diário particular. De retorno a Glory Hill, sua cidade, Devereaux que tinha formação como advogado é recebido com festas, honras de herói e é nomeado Juiz Federal, casando-se com Caroline Emmet (Ellen Drew). Seu companheiro no Exército, o Capitão Del Stewart (William Holden) que com ele disputa a simpatia de Caroline, é convidado para ser o Delegado Federal de Glory Hill. Stewart, no entanto, suspeita que Devereaux tenha algum tipo de distúrbio psicológico contraído durante a guerra, o que se confirma com sua primeira decisão como juiz. Chega à corte o caso de diversos ex-soldados que perdem suas possessões de mineração por terem passado mais de três anos a serviço do Exército, do que se aproveita o empresário dono da mineradora Great Star que reivindica junto ao Juiz a posse de toda a área. O Juiz Devereaux segue a lei à risca e dá ganho de causa à empresa, o que revolta os mineradores. Entrementes o ex-soldado Jerico Howard (James Millican) forma um grupo de revoltados, assalta e rouba a Great Star. Em consequência disso alguns mineradores são presos e condenados à forca por Devereaux. Diante da crescente loucura do Juiz, cada vez mais sádico, Stewart deixa o cargo e passa para o lado dos mineradores. Caroline também abandona o marido após descobrir e ler seu diário e, tomado pelo desvario, Devereaux exige que a população de Glory Hill informe onde se escondem os mineradores fugitivos. Ao não ser atendido Devereaux ordena que seja queimada a cidade e num confronto com Jerico ambos sucumbem em meio aos escombros em chamas.

William Holden e Glenn Ford;
Holden e Ellen Drew
O Juiz Devereaux e sua antítese – O roteiro de “No Velho Colorado” só não é perfeito por deixar de discutir mais amplamente a origem do distúrbio de Owen Devereaux que, modernamente, seria diagnosticado como insanidade produzida pela tensão vivida nos campos de batalha. Seja como soldado ou na condição de Juiz, Devereaux é cruel e desumano e sabe-se impotente quanto a essa sua natureza que não o abandona e contra a qual ele não esboça reação, apenas descrevendo-a em seu diário. Como o filme se inicia com o Coronel já exercitando seu desvario ao dizimar um destacamento rendido, imagina-se que sua desordem mental seja fruto da crueldade da guerra. No entanto, após seu retorno à vida civil, casado e empossado num cargo de grande distinção continua ele atormentado pelas contradições de sua personalidade. Borden Chase argutamente coloca ao lado de Devereaux um personagem – Del Stewart – que em tudo dele difere. Stewart é o Capitão íntegro, Delegado escrupuloso e concorrente leal na disputa pelo amor de Caroline, a antítese de Devereaux. As leis ditadas por Washington protegendo o capitalismo é um clamoroso libelo diante de tantas injustiças sociais legitimando a revolta dos mineradores. Aspecto interessante também é o triângulo amoroso que não se define com o casamento de Devereaux com Caroline. O roteiro de Ben Maddow evita os clichês do gênero culminando com o fim trágico não apenas do grande vilão da história bem como o fim de Jerico Howard, o bandido simpático.

Glenn Ford, William Holden
e abaixo James Millican
O talento de Glenn Ford – Filmado inteiramente em Corriganville, em longos 90 dias, prazo mais que extenso para a média das produções norte-americanas, “No Velho Colorado” é um western com pouca ação o que não significa que não prenda a atenção do espectador. A Henry Levin, o mesmo diretor da hoje clássica aventura “Viagem ao Centro da Terra” cabe o mérito de dar ao filme o ritmo ideal com aproveitamento exemplar do ótimo elenco de coadjuvantes. O jovem e então desconhecido Denver Pyle tem boa participação, assim como James Millican e os mais conhecidos Ray Collins e Edgar Buchanan. Ray Teal é o barmen em papel menor que sua presença exige. Ellen Drew é a única personagem feminina de destaque e deixa a desejar com atuação que não empolga. William Holden, que esperaria ainda mais dois anos até atingir plenamente a condição de astro com “Crepúsculo dos Deuses”, vê Glenn Ford demonstrar seu talento nem sempre reconhecido. Ford, que em “Gilda” fez o tipo durão, interpreta esplendidamente o psicopata megalomaníaco e sádico que ao final incendeia parte da cidade. Não se deixe trair pelos títulos (Inglês e nacional) pouco originais pois este é um dos melhores westerns do ano de 1948. Nesse ano foram exibidos o já referido “Rio Vermelho”, “O Tesouro de Sierra Madre” (The Treasure of Sierra Madre) e John Ford nos deu “Sangue de Heróis” (Fort Apache), cujo personagem principal é, igualmente, um oficial irascível e que tem ainda outra coincidência com “No Velho Colorado”: ambos os oficiais psicóticos atendem pelo prenome ‘Owen’.

William Holden e Edgar Buchanan; Holden, Buchanan, Ellen Drew e Glenn Ford

Denver Pyle e Glenn Ford; William Holden e Ray Teal; James Millican

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