Oriundo da televisão, Ralph Nelson teve
um promissor início de carreira em Hollywood com “Réquiem para um Lutador” e
“Uma Voz nas Sombras”. Confirmou seu talento de diretor com “Duelo em Diablo
Canyon” (Duel at Diablo) e “Os Dois Mundos de Charly”. Em 1970, no ápice da
Guerra do Vietnã, impressionado com atrocidades cometidas pelas tropas
norte-americanas, especialmente o massacre de Mi Lay, Nelson decidiu filmar o
livro “Arrow in the Sun”, de autoria de Theodore V. Olsen. Autor especializado
em histórias de faroeste (escreveu mais de 40), apenas dois livros de Olsen
chegaram ao cinema: “A Noite da Emboscada” (The Stalking Moon), otimamente
filmado por Robert Mulligan e “Arrow in the Sun” que se transformou em “Soldier
Blue”. Ao contrário de “A Noite da Emboscada”, “Soldier Blue” que recebeu o
absurdo título nacional de “Quando é Preciso Ser Homem”, resultou num western
que em nada engrandece a filmografia de Ralph Nelson, por mais que suas
intenções sejam edificantes.
À direitaTheodore Victor Olsen (acima),
John Gay e Ralph Nelson.
Candice Bergen |
Fugindo
para o inferno - Um destacamento de soldados acompanha um capitão
tesoureiro do Exército (Dana Elcar) que conduz, além de um cofre com dinheiro,
também a noiva de um tenente da Cavalaria. Ela é Cresta Marybelle Lee (Candice
Bergen), que capturada pelos Cheyennes viveu dois anos como esposa do chefe
Spotted Wolf (Jorge Rivero), conseguindo afinal fugir da tribo. Os Cheyennes
liderados por Spotted Wolf atacam o destacamento e apenas Cresta e o soldado
Honus Gant (Peter Strauss) escapam com vida. Iniciam então um longo percurso
para alcançar o Fort Reunion distante 150 kms e acabam por se envolver
amorosamente apesar da resistência do respeitoso soldado. Entre as dificuldades
pelas quais os dois passam estão o encontro com o contrabandista de armas Isaac
Q. Cumber (Donald Pleasence) que fere Honus com um tiro e ainda com índios
Kiowas. Extenuados encontram um batalhão liderado pelo Coronel Iverson (John
Anderson) que se prepara para atacar os Cheyennes. Cresta foge do acampamento
militar e avisa Spotted Wolf do ataque iminente. O chefe Cheyenne tenta
parlamentar com o Coronel Iverson mas este ordena o ataque à tribo dizimando-a
por completo. Cresta assiste desolada ao massacre sem nada poder fazer por seus
amigos Cheyennes.
Candice Bergen com Peter Strauss |
Romance
entre batalhas - Ao final de “Soldier Blue” um narrador lembra que,
igualmente ao que se viu no filme que se passa no ano de 1877, em 1864 ocorreu
o massacre de Sand Creek, no Colorado, onde os índios viviam pacificamente
confinados que foram pelo Governo norte-americano. Os Cheyennes da história de
Olsen também acreditavam no tratado de paz e Spotted Wolf ao tentar dialogar
carrega, além de uma bandeira branca, a bandeira dos Estados Unidos que
recebera quando foram obrigados a viver naquela reserva. A referência explícita
à dizimação cometida em Sand Creek e ainda mais a alusão à Guerra do Vietnã
confessada pelo diretor necessitariam de um bom enredo para transformar esse
fato em longa-metragem. E entre dois momentos maiores de ação no início e final
de “Soldier Blue” ocorre o romance entre o soldado com a mulher branca que fora
amante do chefe Cheyenne.
Aurora Clavel |
O
mais selvagem dos filmes - A chamada nos cartazes diz que “Soldier
Blue” é o mais selvagem dos filmes. O ataque ao destacamento no início não
chega a impressionar pela violência, ao menos na versão lançada oficialmente
nos cinemas com duração de 112 minutos. Sabe-se que o filme tinha 135 minutos
na versão original que foi vetada pelos distribuidores e reduzida em 23
minutos, o que não é pouco, devido à selvageria exposta na tela. Ainda assim,
na parte final quando há o ataque da Cavalaria ao acampamento Cheyenne, índias
são curradas, cabeças são decepadas, membros mutilados e uma índia tem seus
seios extirpados em repugnantes sequências. Se alguém imaginava que com Sam
Peckinpah a violência no cinema havia chegado ao seu limite, assistindo a
“Soldier Blue” verifica-se que muita crueldade ainda podia ser filmada. Mas o
que sob a direção e edição de Sam Peckinpah virava quase sempre pura arte
cinematográfica, neste filme de Ralph Nelson se torna repulsivo, estridente,
desnecessário. O contraponto poderia ser o romance entre Cresta e o soldado
Honus. Poderia...
Candice Bergen |
A irresistível
mulher branca - A escolha de bons intérpretes muitas vezes salva um filme
enquanto a errada seleção de atores pode comprometer todo um trabalho, por mais
que o diretor se esforce para deles extrair razoáveis atuações. Quando surgiu
no cinema aos 20 anos, Candice Bergen (filha do ventríloquo Edgar Bergen),
impressionou pela beleza e mesmo pela classe que possuía. Além disso revelou-se
engajada politicamente sendo uma crítica ao envolvimento norte-americano no
Vietnã. Cedo, no entanto, percebeu-se que como atriz os predicados artísticos
de Candice não correspondiam a seus traços extraordinariamente perfeitos. Pois
é Candice, com toda sua formosura, que passa neste filme por mulher que sofre
percalços em sua vida e se torna oportunista, interessando-se pela própria
sorte, o que a leva a fugir da tribo que a sequestrou dois anos antes. Claro
que o jovem cacique Cheyenne logo a fez sua esposa pois como resistir aos
encantos de Candice? O ‘Soldier Blue’ (Honus Gant) da história resistiu até
onde pode, ele que na longa odisseia até o Forte Reunion pretendia entregar
cresta ‘intocada’ ao seu noivo, o Tenente McNair (Bob Carraway). Na prolongada
caminhada o casal tem, entre outras intimidades forçadas, que dormir sob o
mesmo e único agasalho de Honus resiste,
até que sucumbe pois apesar de casto e devotado ao regimento é preciso ser
homem, como diz o ridículo título nacional.
Candice Bergen com Peter Strauss |
Contraponto
à irracionalidade - Se Candice é atraente vestida,
coberta apenas por um traje curto e mais nada no corpo ela se torna
irresistível, menos para o zeloso ‘Soldier Blue’, como Cresta chama Honus.
Ralph Nelson e o roteiro de John Gay optaram por mostrar tudo que fosse
possível da bela Candice que só é substituída por um dublê de corpo numa
sequência em que suas nádegas estariam à mostra. Nelson talvez tenha esquecido
que a sugestão é sempre mais forte que a exposição, além de visivelmente querer
dar a seu western um cunho fortemente erótico. Insistir no lirismo do idílio
entre Cresta e Honus com a insipidez do par central seria mesmo perda de tempo
e o romance que poderia ser o contraponto à irracionalidade da guerra não
consegue emocionar. Mesmo fugindo do modo de vida dos Cheyennes Cresta admira
os índios e faz tudo para salvá-los do iminente massacre. Honus só enxerga a
bestialidade dos homens de túnica azul quando os vê em ação dizimando a tribo
Cheyenne até que nenhum índio respire mais.
Donald Pleasence e John Anderson |
“Por
quê?” - Donald Pleasence é o contrabandista de armas Isaac Q.
Cumber, que ri do próprio nome (‘Pepino’) enquanto municia os Cheyennes com
rifles. O ator repete o tipo desvairado sem que consiga impressionar como em
outros filmes. John Anderson com um chapéu típico do exército britânico em suas
conquistas na Índia é uma réplica de George Armstrong Custer, tanto em sua
excentricidade quanto na egolatria. A música de Roy Budd tenta diversos
estilos, desde Elmer Bernstein até Ennio Morricone, não desprezando nem mesmo
uma soprano a la Edda Dell’Orso, claro, sem o brilho dos imitados. A cantora
canadense Buffy Sainte-Marie, conhecida por sua canções de protesto compôs a
canção-título que, ao contrário de “Up Where You Belong”, também composição
sua, fez enorme sucesso e recebeu o Oscar e Melhor Canção em 1982. O que não
falta nas sequências de batalha são as características quedas de cavalos mas
sem o know-how de um diretor de segunda unidade do calibre de um Cliff Lyons.
As lutas são inconvincentes, assim como as mortes violentas durante a chacina
comandada pelo Coronel Iverson. O fecho exato para este western são os
patéticos gritos do soldado Honus ao final exclamando: “Por quê? Por quê?”
indicando total falta de inspiração de roteiro e direção.
Discordo de tudo q foi analisado aqui. O filme poderia ter menos violência explícita, sim, mas a mensagem pacifista e de respeito aos nativos, se sobrepõe! E, em 2022, Cresta deve ser vista como uma autêntica feminista, uma mulher q tem a posse das suas atitudes nas mãos. Na época e até agora isso passou batido.
ResponderExcluirTambém discordo inteiramente dessa análise descabida e desprovida de qualquer fundamento. Em todos os aspectos, principalmente sobre roteiro, direção e protagonistas. Realmente viu o filme ? É credenciado para fazer análises de filmes ?
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