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4 de agosto de 2011

DUELO NA CIDADE FANTASMA (The Law and Jake Wade) – DRAMA HOMOAFETIVO NO WESTERN


“Duelo na Cidade Fantasma” antecedeu “Minha Vontade é Lei” em quase um ano. Estranho que o filme estrelado por Henry Fonda-Anthony Quinn seja apontado como o primeiro western a abordar o assunto da homossexualidade entre homens do Velho Oeste, enquanto praticamente ninguém tenha se reportado a “Duelo na Cidade Fantasma” (The Law and Jake Wade), lançado em junho de 1958. “Warlock”, o filme de Edward Dmytryk, foi lançado em abril de 1959 e é até discreto se comparado com os diálogos explicitos do tema homossexual desdobrado em “Duelo na Cidade Fantasma”. O Mestre A.C. Gomes de Mattos, é o único autor que conheço a fazer ligeira menção a essa questão em seu livro “A História do Western”, quando cita de passagem a ‘amizade ambígua’ entre os personagens interpretados por Robert Taylor e Richard Widmark. Porém o que se assiste em “Duelo na Cidade Fantasma” é muito mais que uma simples ‘amizade ambígua’.

Clint Hollister - Jake Wade
LIBERDADE PARA A VINGANÇA - Jake Wade (Robert Taylor) e Clint Hollister (Richard Widmark) são dois ladrões de banco. Depois um assalto ao banco de Morganville, Hollister é preso enquanto Wade escapa com os 20 mil dólares roubados, conseguindo mudar de vida e se tornar xerife da cidade de Cold Stream. Sabendo que o ex-companheiro foi condenado à morte em Morganville, Jake Wade invade a prisão e liberta Hollister, acreditando então estar quites com ele. Hollister, porém, nunca perdoou Jake Wade por ter desfeito a parceria e o seqüestra para que este o leve até onde se encontra o dinheiro roubado no assalto ao banco. Hollister lidera um bando formado por Ortero (Robert Midletton), Rennie (Henry Silva), Wexler (DeForest Kelley) e Burke (Eddie Firestone) que também seqüestram Peggy (Patricia Owens), a noiva de Jake Wade. O alforje com o dinheiro está enterrado em uma cidade fantasma e quando todos chegam ao local são atacados por índios comanches. Ao final Jake Wade e Clint Hollister sobrevivem e travam duelo mortal. Peggy e Ortero também escapam dos índios e juntamente com Wade deixam a cidade fantasma onde foram enterradas as diferenças entre os ex-amigos de crimes.

AMIZADE E TRAIÇÃO - “Duelo na Cidade Fantasma” é antes de tudo um filme sobre a amizade e traição entre dois homens. Jake Wade e Clint Hollister foram não só companheiros de assaltos mas também particulares amigos e Clint jamais perdoou ter sido traído por Wade que o abandonou após o roubo ao banco. Clint quer o dinheiro que ele entende que lhe pertence, porém mais que o dinheiro quer se vingar por ter sido abandonado por Wade. Enquanto Wade decidiu abandonar a antiga forma de vida, passando para o lado da lei e mais que isso, tencionando se casar com Peggy, Clint continua o mesmo malfeitor. E depois de libertado por Wade, Clint intenta unicamente liquidar o ex-amigo. O produto do assalto parece sempre ser apenas um pretexto para Clint dominar Wade, mantendo-o amarrado o tempo todo, numa evidente metáfora de forçada dominação. À exceção de Wade, nada nem ninguém interessa a Clint Hollister, seja os bandidos que lidera ou Peggy, a quem mantém prisioneira. Sua aversão pela moça (e pelas mulheres) é demonstrada quando diz a Wade: “Você tem uma preocupação que eu nunca tive: aquela garota...” e “Uma mulher sempre atrapalha um homem...” O bando de Clint Hollister é composto por Wexler (DeForest Kelley), que nutre ódio inexplicável por Jake Wade, querendo insistentemente matá-lo. Wexler se comporta igual a Clint quando diz a Peggy, referindo-se a seu noivo Jake Wade: “Garotas cometem tantas loucuras...” Outro membro do bando é Ortero (Robert Middleton) que já foi amigo de Wade em outros tempos e é o único que lhe é simpático. Diferentemente Rennie (Henry Silva) assedia Peggy, ouvindo Clint ironicamente lhe dizer: “Você vai se divertir muito com a garota...”. Clint é cruel e sarcástico e exercita sua vingança, perguntando a Peggy diante de Wade que está amarrado: “Ele já lhe contou como ele foi se meter com alguém como eu?” Clint sabe que terá que matar Jake Wade, mas saboreia sadicamente todos os momentos em que este ainda está vivo. Nem mesmo o ataque índio altera seu comportamento. A amizade transformou-se em ódio para o bandido amoral para quem o único valor é a vingança pela traição sofrida.


TENSÃO E EMOÇÃO - A história de “Duelo na Cidade Fantasma” foi a primeira escrita por Marvin H. Albert e o roteiro de autoria de William Bowers lembra a história de “A Face Oculta” (One-Eyed Jacks), em que o personagem de Marlon Brando tem como único objetivo na vida vingar-se de um ex-companheiro de roubos. A diferença entre as histórias é que em “Duelo na Cidade Fantasma”, a relação entre os dois homens não é paternal como no filme de Brando (Dad Longworth/Rio). O forte aspecto psicológico de “Duelo na Cidade Fantasma” faz com que o filme seja lento em sua maior parte, lembrando o andamento de “A Fera do Forte Bravo” (Escape from Fort Bravo) outro western de John Sturges que concentra a ação na meia hora final com o engenhoso ataque dos índios. “Duelo na Cidade Fantasma” é desenvolvido tensamente durante sua maior parte, mas com diálogos mais terríveis que tiros e mais cortantes que flechas ou lanças. E reserva os momentos de ação para o final do filme que culmina com o torturante ataque dos índios e a visão incessante de suas flechas, tacapes e facas lançados em direção à câmara, após o que ocorre o inevitável duelo entre o Hollister e Wade. Antes do duelo Wade diz a Hollister: “Você gosta mais de mim que eu de você!” Rodado em locações no Vale da Morte (Califórnia), em Alabama Hills e em Lone Pine, “Duelo na Cidade Fantasma” foi filmado em Cinemascope com cinematografia de Robert Surtees e em Metrocolor. Recomendo que se assista à cópia lançada no Brasil em Widescreen (1.85:1), ainda que o original do cinema fosse em Cinemascope (2.35:1). Circula no Brasil uma cópia da TV dublada e reduzida para 1.33:1, roubando bastante da originalidade do filme.

DUELO ENTRE BOB E DICK - “Duelo na Cidade Fantasma” é também um duelo entre Robert Taylor e Richard Widmark. Colocar dois atores famosos encabeçando o elenco de um filme sempre foi uma temeridade devido à inevitável guerra surda para ver quem se sai melhor. E “Duelo na Cidade Fantasma” é um western, gênero em que Widmark sente-se inteiramente à vontade como perfeito cowboy com seu riso sinistro. Robert Taylor muito menos homem do Oeste tem atuação sóbria como é seu personagem envolto em tristeza, amargura e arrependimento. As melhores cenas são de Widmark, mas Taylor expressa brilhantemente a angústia e a dor resultantes da amizade. E a justaposição dos dois atores é um dos pontos altos deste western da Metro Goldwyn Mayer. No elenco os excelentes Henry Silva e Robert Middleton e a surpresa agradável que é Patricia Owens, lembrada sempre por suas participações em “A Mosca da Cabeça Branca” e “Sayonara”. DeForest Kelley e Eddie Firestone completam o elenco deste filme verdadeiramente imperdível, um dos menos famosos, porém dos melhores westerns de John Sturges.



5 comentários:

  1. Preciso rever esses filmes, Darci. Não sabia nada disso. Muito bom post.
    Abração


    O Falcão Maltês

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  2. Lamento ter de dar meu parecer em total oposição ao ponto de vista de nosso editor.
    Verdadeiramente não existe qualquer pista que vá atingir o ponto tocado, e com insistencia, neste post. Todas as frases, falas, diretas ou indiretas de Widmarck ou outro para com Taylor, tem unicamente a ver com o conteudo de um filme onde impera o odio entre dois homens. O que um puder fazer para denegrir a imagem do outro ou atingi-lo no seu ponto mais fraco, ele fará. E nada melhor que a presença de uma mulher para o jogo ficar ainda mais afogueado e arisco.
    Entretanto, tiradas sarcasticas ou maliciosas com vibração para o lado do homossexualismo, sinceramente, jamais observei isto nesta fita.
    Acho até um absurdo se tentar fazer de uma ou outra frase que as mesmas tenham sentido duplo. Claramente elas são ditas com o intuito exclusivo de ofensa, de pisoteio, de maltrato ou degradação ao inimigo, que o traiu e este fará de um tudo para vingar revoltante ato.
    Ao contrário de Warlock, onde a explicidade dos sentimentos de Quinn por Fonda não medem quilates para afluir. Vi Warlock com 15 anos e, já ali, eu percebi que existia este contorno no filme. Vendo agora, a coisa ficou mais clara ainda. Coisa que nunca ocorre em Duelo na Cidade Fantasma. Aliás, um filme apenas médio dentro da simpática cinematografia de Sturges. O assisti há poucos dias e, dentro de minha visão, apenas dentro dela, este é um trabalho menor seu. Joe Kid, que também vi há pouco, sobe em qualidade a Duelo na,,,
    O que não quer dizer que é um filme sem qualquer mérito. Bom filme? Um filme aceitável. Ruim? Não. Não é um filme ruim. Sturges nunca faz nada que não mereça ser visto. Mas é uma obra sem a qualidade de um Sete Homens e Um Destino, de um Duelo de Titãs ou mesmo de um Sem Lei e Sem Alma.
    jurandir_lima@bol.com.br

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  3. Jurandir, revi esse filme para homenagear Robert Taylor. Fiquei surpreso com o que descobri no filme pois o havia assistido há 15 anos e não percebi a intenção do roteiro. Depois de revê-lo, assisti novamente e confirmou-se aquilo que percebi só na revisão. Como citei, apenas Gomes de Mattos parece ter percebido essa leitura de Duelo na Cidade Fantasma. Assista novamente e depois falamos. Darci.

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  4. Acho que concordo com o Falcão Maltês. Acho que a questão é a época em que se ve o filme. Darci. Tu mesmo diz que quando viste 15 anso atrás não notaste nada...porque nada havia. Hoje fomos treinados para olhos maldosos. São outros tempos. Também acho que em Minha Vontade é a Lei não ha nada. Não da para esquecer que os americanos levam, ou levavam a questão de aizada a sério. Minha Vontade é a Lei é uma crítica a exacerbação dos Vigilantes contratados na época para limpar as cidades de bandidos. Depois leva para o lado psicológico , também exacerbado. Senão, vamos chifre em cabeça de cavalo em cada cena ou papo...acho. Repetindo, a questão amizade é um forte fator cultural norte americano.

    Evaldo

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  5. Além do que a história foi escrita sobre 2 jovens e não 2 quarentões. Aí a coisa, a cobrança diminuiria.

    Evaldo

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