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12 de agosto de 2015

A TABERNA DOS PROSCRITOS (BORDER RIVER) – WESTERN POLITICAMENTE INCORRETO


São raros, mas Hollywood vez ou outra produzia westerns simpáticos à causa sulista e um dos mais famosos é “Caravana do Ouro” (Virginia City), de 1940. Quatorze anos depois (1954) a Universal filmou “A Taberna dos Proscritos” (Border River) que pende para o lado sulista. A Guerra Civil norte-americana foi a maior tragédia vivida pelo país e qualquer filme que aponte no sentido de estimular o prosseguimento do conflito vencido pela União, que durou cinco anos, pode ser visto como politicamente incorreto. A história de Louis Stevens roteirizada por ele próprio e por William Sackheim não se baseia em fatos históricos e o final otimista pró-Sul de “A Taberna dos Proscritos” não nega que o Norte é aqui visto como vilão a ser enfrentado por idealistas confederados.


'El Gallo': território neutro.
Todo mundo vai ao ‘El Gallo’ – Clete Mattson (Joel McCrea) é um oficial sulista que, perseguido por um grupo de soldados da União se refugia num local situado na fronteira com o México, denominado ‘Zona Libre’. Mattson havia roubado dois milhões de dólares em barras de ouro pertencentes ao governo nortista e sua intenção é trocar o carregamento por armamentos para as forças confederadas. Nos estertores da guerra civil o exaurido Sul necessita de armas e munição para prosseguir lutando. Quem controla a ‘Zona Libre’ é o General Calleja (Pedro Armendáriz), caudilho neutro na guerra travada entre o imperador Maximiliano e Benito Juárez. O General, que tem conhecimento do ouro roubado por Mattson e pretende se apossar do carregamento, se interessa também por Carmelita Carias (Yvonne De Carlo), bela mulher que, por sua vez, se sente atraída por Mattson. Este descobre que, assim como ele próprio, Carmelita é uma idealista na luta pela independência do México. O valioso carregamento é escondido por Mattson próximo à ‘Zona Libre’ e o local é descoberto pelo caudilho. Após um confronto entre Calleja e Mattson, este leva a melhor e consegue seu intento, além de ficar também com a bela Carmelita.

Howard Petrie (acima);
Lane Chandler e Charles Horvath.
Casablanca na fronteira – O intrincado roteiro de “A Taberna dos Proscritos” tem como cenário a Guerra de Secessão, mas poderia ser ambientado em um cenário marroquino bastante conhecido dos cinéfilos. ‘Zona Libre’ é uma espécie de Casablanca dos tempos da II Guerra Mundial e a taberna ‘El Gatto’, de propriedade de Carmelita Carias, é onde tudo acontece como se fosse o ‘Rick’s’ do clássico de Michael Curtiz. E não falta a este western toda sorte de interessados em se apossar do carregamento roubado por Clete Mattson. Newlund (Howard Petrie) é um homem de origem indecifrável mas que tem como objetivo também querer se apossar do ouro (mais tarde descobre-se que Newlund é um detetive que está na trilha do ouro roubado). Os mal-encarados Anderson (Lane Chandler) e Crowe (Charles Horvath) menos sutilmente usam da violência contra Mattson para chegarem ao tesouro. Não falta à história sequer um barão prussiano – Von Holliden (Ivan Triesault) – contrabandista de armas, igualmente de olho no carregamento escondido por Mattson. Quem domina ‘Zona Libre’ é o General Callejas, que sabe que seu pequeno império está próximo do fim e quer sair dois milhões de dólares mais rico daquele local que é um paraíso para qualquer homem mau. E se Clete Mattson está longe de ser um autêntico fora-da-lei, é a enigmática Carmelita – não por acaso dona do ‘El Gallo’ – uma idealista disfarçada sob a aparência de quem quer somente desfrutar da boa vida que a taberna lhe permite. Carmelita chega a dizer a Mattson que “ideais são um luxo que ela não aprova”.

Joel McCrea, Yvonne De carlo e Pedro Armendáriz

Joel McCrea
Lutando até o fim – “A Taberna dos Proscritos” é, no entanto, um pequeno western e o diretor George Sherman não demonstra maior interesse em jogar com os elementos típicos de um filme noir que o roteiro oferece. Preocupa-se, isto sim, apenas em manter o ritmo com muitos momentos de ação enquanto desvenda, a cada sequência, as intrigas e mistério contidos no enredo. Ninguém melhor que Joel McCrea para dar integridade a um personagem como Clete Mattson, um obstinado que não aceita a derrota do exército comandado por Robert E. Lee, de quem foi oficial. E afinal, a confederação sulista já fragorosamente derrotada terá forças para prolongar um pouco mais o conflito e assim, inevitavelmente aumentar o número de vítimas da guerra fratricida. Mattson chega a dizer que morrem 200 soldados sulistas em cada dia de guerra. “A Taberna dos Proscritos” não discute o mérito e nem as origens da guerra civil, mas indisfarçadamente faz de Clete Mattson um herói, merecedor do amor da igualmente sonhadora dona da taberna ‘El Gallo’. Se as razões de Carmelita são justificadas por querer o México para os mexicanos destituindo o imperador estrangeiro (Maximiliano), para Mattson é apenas uma questão de honra continuar lutando até o fim em sua obstinada hombridade.

Luta na areia movediça – Política à parte, “A Taberna dos Proscritos” agrada pela boa ambientação de ‘Zona Libre’ e por fugir da rotina dos westerns em que o México serve apenas como esconderijo para foragidos da lei. O caudilho explica a Mattson que “inclusive onde não há lei e ordem, é preciso ter lei e ordem”, ditadas por ele, claro. Quando é lembrado ao Capitão Vargas (Alfonso Bedoya) a necessidade de um governo autêntico, ele responde ironicamente “assim como vocês americanos que tem o governo do Senhor Lincoln e o Governo do Senhor Jefferson Davis”. Western de pequeno orçamento, com 80 minutos de duração, “A Taberna dos Proscritos” tem boas cenas de ação, com eficiente uso de dublês, ainda que claramente perceptíveis como nas duas vezes em que McCrea luta corporalmente com Lane Chandler e Charles Horvath. Outros bons momentos do filme são aqueles passados na areia movediça, com o salvamento do cavalo e a luta final entre McCrea e Pedro Armendáriz.
Sequências na areia movediça.

 
Pedro Armendáriz e Alfonso Bedoya
A deslumbrante Yvonne De Carlo – Joel McCrea é o cowboy respeitável de sempre, um tanto tímido diante de Yvonne De Carlo deslumbrantemente bela esbanjando um luxuoso guarda-roupa que mais ainda realça sua beleza. O elenco tem conhecidos atores mexicanos, como Pedro Armendáriz como o autoritário e apaixonado caudilho; Alfonso Bedoya repetindo com exagero o marcante bandido mexicano de “O Tesouro de Sierra Madre”; Martin Garralaga, um dos ex-Panchos, sidekick de Cisco Kid; e ainda Nacho Galindo. Lane Chandler e George J. Lewis têm presenças na tela maiores que de costume, o mesmo acontecendo com Charles Horvath, enquanto Howard Petrie completa o elenco. Filmado em sua maior parte nos estúdios da Universal, “A Taberna dos Proscritos” tem locações no Rio Colorado, em Utah. A trilha sonora musical merece atenção especial pois um jovem compositor chamado Henry Mancini era contratado do estúdio, criando anonimamente temas para todo gênero de filme, inclusive westerns como este, um dos melhores da série que Joel McCrea filmou nos anos 50.

Yvonne De Carlo

A cópia de "A Taberna dos Proscritos" foi gentilmente cedida pelo cinéfilo Marcelo Cardoso.

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