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10 de abril de 2015

“NENHUMA MULHER VALE TANTO” (THE IRON MISTRESS) – NÃO VALE PARA SE CONHECER JIM BOWIE


O cowboy Alan Ladd.
Depois de se tornar um dos principais astros de Hollywood com uma carreira toda ela desenvolvida na Paramount, Alan Ladd se mudou para a Warner Bros. Guiado pela esposa-agente Sue Carol que orientava sua vida artística, o objetivo da mudança era, antes de tudo, ganhar mais dinheiro. E a Warner se dispôs a uma bem cuidada produção para a estreia de Alan Ladd na nova casa, com um filme à altura de seu prestígio, ainda que a carreira do ator, então aos 39 anos, estivesse em notório declínio. O filme em questão foi a biografia de Jim Bowie, cujas filmagens tiveram início em abril de 1952, durando dois meses e meio. O título do filme foi “The Iron Mistress”, que no Brasil recebeu o título “Nenhuma Mulher Vale Tanto”, lançado nos Estados Unidos em novembro de 1952 para azar de Alan Ladd e da Warner Bros. Antes de deixar a Paramount, Alan Ladd deixou três filmes prontos, um deles “Shane” (Os Brutos Também Amam), rodado em 1951 e que a Paramount demorou dois anos para lançar. George Stevens, o diretor passou 12 meses editando “Shane”, atrasando o lançamento do filme que quando finalmente lançado foi grande sucesso de bilheteria e fez renascer a carreira de Alan Ladd. Se “Nenhuma Mulher Vale Tanto” tivesse sido lançado depois de “Shane” teria sido sem nenhuma dúvida outro grande sucesso de Alan Ladd, na esteira daquele western clássico.


Virginia Mayo
A mulher que atrai a morte - O livro “The Iron Mistress”, de autoria de Paul I. Wellman foi adaptado e roteirizado de forma romanceada por James R. Webb, contando a vida de James Bowie. Nele a família Bowie composta por mãe viúva e três filhos mora em Bayou Sara, na Louisiana. O mais velho dos filhos é Jim Bowie (Alan Ladd) que vai a New Orleans tratar dos negócios da família e lá chegando se envolve com Judalon de Bornay (Virginia Mayo), mulher da sociedade local. No início do século XIX em New Orleans a honra ofendida era lavada com duelos, herança da colonização francesa, e Jim Bowie é obrigado a participar de alguns duelos. Expert no uso de facas, Bowie não é adepto de espadas ou pistolas e desenha uma faca especial que é fundida por um cuteleiro com material de um meteorito caído na Terra tempos atrás. Com essa faca Bowie resolve quase todas suas desavenças, menos os problemas com Judalon que se aproveita de Bowie que é apaixonado por ela. Direta ou indiretamente, Judalon leva à morte diversos homens, alguns deles vitimados pela letal arma branca criada por Bowie. Tentando esquecer Judalon, Jim Bowie retorna à Louisiana mas no caminho é atacado pelos homens de seu desafeto Studervant (Anthony Caruso). Ferido, Bowie é encontrado por Ursula de Varamendi (Phyllis Kirk), filha do vice-governador do Texas, ainda território mexicano. Ursula se enamora de Bowie e ambos se casam, não sem antes Bowie assistir Studervant e o marido de Judalon, Phillipe de Cabanal (Alf Kjellin) se matarem e Judalon ficar sozinha.

Alan Ladd
Um filme para Alan Ladd - Gordon Douglas talvez seja o diretor mais irregular da história de Hollywood pois tem em sua filmografia títulos excelentes como “Rio Conchos” e “Investida de Bárbaros” (The Charge at Feather River) e filmes horríveis como “O Semeador da Felicidade” e “Rififi no Safari”. “Nenhuma Mulher Vale Tanto” situa-se no meio termo e ao assisti-lo é inevitável imaginar que este drama biográfico poderia ter sido muito melhor se Douglas estivesse mais inspirado. Certo que o burocrático diretor teve que dirigir um filme feito para o astro Alan Ladd personificando a controvertida figura de Jim Bowie. E frise-se que Douglas extraiu de Ladd uma razoável interpretação, superior mesmo àquela em que o ator protagonizou Shane e que muitos consideram ‘sublime’, o que pode ser considerado um triunfo para qualquer diretor. O que Gordon Douglas não soube ou não conseguiu foi transformar o melodramático roteiro do normalmente ótimo James R. Webb em um filme mais denso e plausível. A personalidade forte de Jim Bowie, por ser considerado um herói regional, é por demais conhecida para que ele se deixasse enganar por uma mulher explicitamente frívola como Judalon de Bornay. Isto ainda que Bowie fosse vivido por Alan Ladd, ator adequadíssimo para interpretar homens de personalidade branda.

Jim Bowie se apaixonando pela
interesseira Judalon de Bornay.
As mágicas de um cinegrafista - A Gordon Douglas e ao cinegrafista John F. Seitz cabem os méritos pelas excepcionais sequências de duelos, uma delas num quarto escuro iluminado apenas pelos relâmpagos cuja luz passa por uma claraboia. E há ainda o duelo numa noite nevoenta, incrivelmente todo filmado em estúdio, assim como as tomadas da luta com facas entre Alan Ladd e Anthony Caruso. Tais sequências valorizam sobremaneira “Nenhuma Mulher Vale Tanto”, fazendo até com que se esqueça que Big Jim Bowie foi transformado em Alan Ladd. E sabe-se que o diminutivo ator ‘cresce’ com a ajuda de um hábil manejador da câmera como John F. Seitz, conforme demonstra a parceria do cinegrafista com Ladd em uma dúzia de filmes desde “Alma Torturada”, primeiro sucesso do ator. As boas sequências amorosas entre Alan Ladd e Virginia Mayo são atribuídas, segundo a atriz, à grande amizade que havia entre ambos e à profunda admiração que Virginia tinha por Ladd, para ela uma pessoa afável e doce. E percebe-se que Virginia Mayo mostra-se no filme bastante confortável nos braços de Alan Ladd, ainda que a recíproca não seja verdadeira.

Uma das melhores sequências do filme: a luta a facas numa sala escura.

Jim Bowie olhando ternamente para a
imagem da Madona.
Longe, bem longe da verdade - São muitos os exemplo de biografias romanceadas pelo cinema norte-americano e a de Jim Bowie é apenas mais uma delas. Assim como Lorenz Hart (Mickey Rooney em “Minha Vida é uma Canção”) e Cole Porter (Cary Grant em “Canção Inesquecível”) foram mostrados como sedutores de mulheres pelo cinema, escondidas sua preferências sexuais, Jim Bowie pouco tem em “Nenhuma Mulher Vale Tanto” do homem que foi em vida. Mesmo o especulador de terras é nesse filme mostrado como uma pessoa esperta e com apurado faro comercial. Jogador inveterado, Bowie chega às mesas de jogo quase que por acaso e em sequência de jogo para desmascarar um trapaceiro. Ainda bem que esta biografia se encerra antes do episódio do Álamo, no qual fontes divergentes dizem que Bowie teria contraído forte febre que o prostrou num leito, enquanto há quem garanta que ele passou os 13 dias de glória completamente embriagado. Esquecida a verdade histórica da personalidade de Jim Bowie, o filme de Douglas apresenta um personagem que, de fato, mereceria ser elevado á condição de vulto nacional, tamanha sua coragem e honradez. E como já foi dito acima, Alan Ladd convence nessa imagem com seu rosto de aparência angelical.

Alan Ladd e Virginia Mayo

Anthony Caruso
Destaque para Anthony Caruso - Quase que integralmente filmado nos estúdios da Warner Bros., “Nenhuma Mulher Vale Tanto” impressiona pela direção artística e cenários, exceto pela modesta recriação de uma rua de New Orleans. A suntuosidade dos sets onde ocorre o baile e a recriação de taberna, do salão de jogos e outros cenários são dignos dos tempos em que o estúdio dirigido por Jack Warner tinha entre seus contratados James Cagney, Humphrey Bogart, Errol Flynn, Bette Davis, Edward G. Robinson e outros gigantes da tela. Estranhamente o cast liderado por Alan Ladd tem em papéis importantes alguns atores pouco conhecidos como o sueco Alf Kjellin e o tcheco George Voskovec. O par central composto por Alan Ladd e Virginia Mayo atua bem consideradas as limitações dramáticas de ambos. Excepcionalmente bem fotografada, Virginia está mais bela que nunca. Antony Caruso, que já havia atuado com Alan Ladd em “A Dália Azul” iria se tornar um grande amigo pessoal de Ladd, participando de diversos dos filmes por ele estrelados. Neste Caruso está ótimo numa participação maior que de outras vezes. Joseph Calleia, por sua vez, é apenas uma bem caracterizada estampa. E vale ver em cena coadjuvantes sempre ótimos como Robert Emhardt, Jay Novello, George J. Lewis, Nick Dennis, Frank Ferguson e outros.

Alan Ladd e Anthony Caruso na sequência de luta de facas com as
mãos amarradas um ao outro.

Alan Ladd
Western, mas nem tanto - Max Steiner responde pela trilha sonora, menos rumoroso que de hábito e sem deixar para a posteridade um tema musical principal. Os fãs de Alan Ladd se deleitarão com “Nenhuma Mulher Vale Tanto”, especialmente ao vê-lo em ação e em alguns momentos dispensando o dublê (que por sinal percebe-se é muito maior que Ladd). Aqueles que gostam de uma boa história de amor com uma mulher fútil que nada vale e que faz sofrer um homem apaixonado ficarão felizes com as tantas leviandades de Judalon de Bornay. Mas o melhor mesmo deste filme são as sequências em que a famosa faca Bowie é utilizada fazendo de seu criador um ser quase invencível, o que tornou o filme um cult para os colecionadores de armas brancas. Já os fãs de faroestes certamente dirão que de western “Nenhuma Mulher Vale Tanto” tem bem pouco. Porém, como o lendário Jim Bowie está intrinsecamente ligado ao Texas, esta cinebiografia não pode ser ignorada pelos fãs do gênero.

Alan Ladd e Edward Colmans.
 
O cuteleiro, o meteorito e a faca Bowie.


6 comentários:

  1. Vou assistir a "Nenhuma mulher......." Virginia e Ladd são sempre bons para se rever !

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  2. Comentários mais do que adequados. O filme é ótimo como entretenimento, e, como bem lembrado, um "cult" para os cutelófilos. Mas não deve ser levado a sério como fidelidade histórica. Alguns fatos são colocados fora da ordem cronológica real. O duelo de Vidália, por exemplo, ocorreu antes de Bowie encomendar a faca a James Black. Nas cenas finais, aparecem pistolas Remington Derringer, que só surgiram mais de 40 anos depois.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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    1. Esqueci de colocar meu nome no comentário.É: Laert R. Mendes

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  4. Erros à parte (você tem razão, Erick), o filme conquistou milhares de fãs por todos os locais onde foi exibido. Como SOU FÃ DE WESTERNS, também acho que deste gênero ficou a dever um pouco. Achei Ladd (com quem tive o prazer enorme de conversar pessoalmente -ele de fato era uma pessoa muito bacana e atencioso, e também muito educado- muito bem neste papel, suplantando em alguns momentos sua atuação de SHANE. Assisti este filme quando criança e para achá-lo em dvd, deu o que fazer. Felizmente o achei e depois disso, assisti diversas vezes. Uma pena ter morrido como morreu. mas deixou legados para a posteridade.
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  5. Este formidável filme estrelado por Alan ladd, meu artista favorito, foi publicado em meu blog (Blog do Painho) há alguns anos. Estou trazendo à tona novamente, na postagem da próxima quarta-feira, dia 06.02.2019. Espero que os senhores leiam a postagem do blog, bem como se interessem pelo filme. Agradecido Asa.

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