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20 de outubro de 2024

O JUIZ ENFORCADOR (LAW OF THE LAWLESS)

  


    A.C. Lyles foi um produtor que teve uma estrela na Calçada da Fama de Hollywood e nada mais merecido para quem produziu uma série de 13 westerns, todos com pequeno orçamento, filmados em sempre menos que 15 dias e com elencos recheados de veteranos esquecidos pelos estúdios. Lyles começou no cinema na Paramount, ainda nos anos 20 e ao invés de se aposentar depois de 40 anos de trabalho nos escritórios do estúdio decidiu se tornar produtor. O primeiro filme da série foi “O Juiz Enforcador” (Law of the Lawless), com elenco formado por uma dúzia de artistas que viram cessar seus dias de fama, elenco encabeçado por Dale Robertson e Yvonne De Carlo. Os westerns B da Poverty Row produzidos às dezenas nos anos 30, 40 e início dos anos 50, com John Wayne, Roy Rogers, Rocky Lane, Bill Elliott, Charles Starrett, Tim Holt e outros tinham cronogramas de filmagens com no máximo seis dias, utilizavam muitas sequências de arquivo, seus enredos pouco se diferenciavam uns dos outros e duração por volta de 60 minutos. Esses pequenos westerns exibidos nas matinês foram substituídos por séries melhor produzidas e estreladas por Audie Murphy, Randolph Scott, Rory Calhoun, George Montgomery, Guy Madison e o próprio Dale Robertson, quase todos com hora e meia de duração. Já os westerns da série de Lyles tinham todos 80 minutos ou pouco mais, eram filmados em cores e produção bem cuidada como “O Juiz Enforcador”. Este western B é uma grata surpresa para os fãs de faroestes, comparável mesmo aos melhores da série de Randolph Scott.

 


    Na cadeia de Kansas City o preso Pete Stone (John Agar) aguarda para ser julgado e seu poderoso pai ‘Big’ Tom Stone (Barton MacLane) se movimenta para que o filho saia livre do julgamento. Para isso contrata Rand MacDonald (Kent Taylor) o melhor advogado do Kansas e que jamais perdeu uma causa. Big Stone sabe que está para chegar à cidade o juiz Clem Rogers (Dale Robertson), conhecido como ‘The Hanging Judge’ (juiz enforcador) devido a mandar para a forca assassinos que ele tem que julgar. Big Stone contrata, além do advogado, o pistoleiro Joe Rile (Bruce Cabot) para matar Clem Rogers, isto além de outros pistoleiros que chegam à cidade porque têm contas a acertar com o juiz por discordar de suas sentenças. Clem Rogers decidiu estudar Direito e se tornar juiz depois que seu pai foi morto em um duelo, justamente com Joe Rile. Pete Stone será julgado por ter matado num suposto duelo um vaqueiro cuja esposa mantinha um caso com Pete e é certo que será condenado à morte pois Clem Rogers entende que a única maneira de acabar com a prática dos duelos é condenando quem deles participa e sobrevive. Antes do julgamento o juiz sofre um atentado por parte do grupo de pistoleiros, que são liquidados. Clem recebe apoio da garota de saloon Ellie Irish (Yvonne De Carlo) e conta ainda com a imparcial promotoria no tribunal que será feita pelo xerife Ed Tanner (William Bendix). Ao final do julgamento Pete Stone é condenado à forca, Joe Rile desiste de assassinar Clem Rogers que parte de Kansas City para cumprir sua missão de exterminar com os duelos e consequentemente novas condenações.

 

Dale Robertson (acima); Dale com John Agar

    A história de “O Juiz Enforcador” é de autoria de Steve Fisher, que também escreveu histórias para diversos westerns da série produzida por A.C. Lyles, série toda distribuída pela Paramount. William Claxton dirigiu conduzindo este western que prende o espectador do princípio ao fim, mesmo com poucos momentos de ação e tendo dois quintos do filme passados dentro de uma sala do tribunal. Muito da qualidade de “O Juiz Enforcador” se deve às interpretações dos veteranos atores que, em cada sequência, demonstram o quanto eram bons e mereciam continuar a ser melhor aproveitados. Porém o destaque deste filme fica mesmo com o roteiro que discute temas inusitados, especialmente a filosofia do juiz, ideal que ajudou a civilizar o Velho Oeste. Nos duelos quem sobrevivia era o vencedor, imune a qualquer acusação, o que o livrava de acertar contas com a justiça mas não de vir a ser perseguido por alguém que se julgava mais rápido, como em “O Matador” (The Gunfighter), 1950, de Henry King. Ou ainda da ira de familiares ou amigos do morto em duelo, todos em busca de vingança. O Juiz Clem Rogers discorre sobre o que acontece com a família de quem é morto em duelo, viúva e filhos privados do pai e que encontram dificuldade para sobreviver. Essa teoria correta de acabar com os duelos tão comuns só poderia mesmo ser concebida com a ajuda da Justiça, como mostra “O Juiz Enforcador”.

 

Lon Chaney Jr. e Yvonne De Carlo;
Barton MacLane e William Bendix

    Detém-se ainda o roteiro na discussão do preconceito contra as saloon girls, sinônimo de meretrizes, como foi chamada Ellie Irish pelo advogado de defesa, na tentativa de ter seu depoimento no julgamento desacreditado em contraponto ao testemunho de uma esposa leviana mas vista com respeito pela cidade. É ainda o juiz enforcador Clem Rogers quem demonstra que a viúva Ellie, cujo marido foi morto em duelo, não teve alternativa para sobreviver senão trabalhar num saloon para cantar, dançar entretendo os frequentadores. Esse arraigado preconceito, infelizmente, sobreviveu ao Velho Oeste, diferentemente dos duelos. E o filme de William Claxton aborda aspectos psicológicos como o do jovem assistente de xerife querendo demonstrar coragem e competência, e sempre obstado pelo veterano homem da lei; ou ainda o cansado pistoleiro de aluguel que odeia o poderoso que o paga para matar mas aceita o trabalho para poder se aposentar e ter um final de vida tranquilo. Sua consciência o leva a alterar todos os planos, inclusive o ambicionado caminho para a paz que quer encontrar.

 

Yvonne De Carlo; Bruce Cabot

    A longa sequência do julgamento excelentemente conduzida chega a ser emocionante como nos melhores filmes de tribunal, com reviravoltas pelas falas do promotor rebatidas pelo advogado de defesa, mais as testemunhas e, por fim, com a orientação do juiz para o corpo de jurados julgar. Toda essa sequência, sem ação, apenas com as falas dos personagens, leva a pensar como, em tão poucos dias de filmagem, o diretor Claxton extraiu as ótimas performances para as quais seriam necessário muitos ensaios. Os destaques do elenco são Barton MacLane, Bruce Cabot, Richard Arlen e Lon Chaney Jr., este como um brutamontes a serviço do ricaço Big Stone. John Agar fica abaixo dos citados. A excelente Yvonne De Carlo enche a tela com sua beleza e exuberância, enquanto a Dale Robertson falta maior expressividade, mesmo considerando que um juiz deve ser alguém contido no comportamento. Ainda no elenco em pequenos papeis Don ‘Red’ Barry, Jody McCrea (filho de Joel McCrea), Rod Lauren e um bastante jovem Roy Jenson. Dale Robertson substituiu Rory Calhoun, inicialmente escalado como Clem Rogers porque Calhoun adoeceu quando “Law of the Lawless” teve início. Robertson havia deixado a série de TV “Tales of Wells Fargo”, que estrelou por seis temporadas. E Yvonne De Carlo a seguir passaria a viver a adorável ‘Lily Monster’ na série de TV “Os Monstros”. “O Juiz Enforcador” é considerado o melhor dos 13 westerns que A.C. Lyles produziu entre 1964 e 1968. Imperdível também para rever a pleiade de veteranos.

 

Sequências do julgamento: acima Kent Taylor; Barton
MacLane e Laurel Goodwin; no centro Barton
MacLane e John Agar; John Agar e Dale
Robertson; abaixo o final do julgamento.

Dale Robertson como o juiz enforcador em ação;
Dale surpreendido no banho por Yvonne De Carlo


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