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12 de setembro de 2018

AMOR FEITO DE ÓDIO (THE MAN WHO LOVED CAT DANCING) – BURT REYNOLDS RUDE E SENTIMENTAL



Burt Reynolds
Burt Reynolds foi um daqueles poucos atores de seu tempo que percorreu uma a uma todas as etapas até se tornar o grande campeão de bilheterias entre meados de 1970 e 1980. Antes de, por cinco vezes seguidas, ser o ator mais rentável de Hollywood Reynolds atuou bastante na TV. De 1962 a 1965 ele interpretou o jovem cowboy ‘Quint’ na série “Gunsmoke”. Mesmo com o sucesso do personagem, que logo se tornou o preferido do público feminino, as oportunidades no cinema não eram as esperadas e, assim como ocorreu com Clint Eastwood, Burt Reynolds aceitou o aceno vindo de Cinecittà. Dirigido por Sergio Corbucci ele foi “Joe, o Pistoleiro Implacável” (Navajo Joe), de 1966, impressionando favoravelmente nesse excelente faroeste. Como os westerns spaghetti não eram exibidos nos Estados Unidos, o que somente passou a ocorrer após o estrondoso sucesso da Trilogia dos Dólares de Sergio Leone, o público norte-americano demorou a ‘descobrir’ que Burt Reynolds era não uma ‘prata da casa’, mas verdadeiramente (e assim como Clint) ‘ouro da casa’. Em Hollywood, depois de “Sam Whiskey, o Proscrito” (Sam Whiskey), de 1969 e outras produções menos expressivas, veio a oportunidade de atuar no filme que o transformou indiscutivelmente em grande astro, que foi “Amargo Pesadelo” (1972). Daí para a frente o nome de Burt Reynolds passou a ser sinônimo de sucesso, ele que se tornou o novo sex-symbol de Hollywood. Com esse status podia escolher seus papéis e decidiu fazer outro western contatado que foi para protagonizar “The Man Who Loved Cat Dancing”, baseado no livro de Marilyn Durham. Os produtores vislumbraram que esse primeiro trabalho da escritora resultaria num filme bem sucedido e para fazer o par romântico com Reynolds foi chamada a atriz inglesa Sarah Miles, em evidência após o êxito de “A Filha de Ryan”.


Sarah Miles e Burt Reynolds
O amor por Cat Dancing - Intitulado no Brasil “Amor Feito de Ódio”, o western conta a história de Wesley Jay Grobart (Burt Reynolds) que foi casado com a índia Cat Dancing, com quem teve dois filhos. Cat Dancing foi estuprada por um homem e Grobart, acreditando que ela tenha sido adúltera, vinga-se assassinando a ambos, sendo preso e condenado. Libertado Grobart reúne um bando formado por Dawes (Jack Warden), Billy Bowen (Bo Hopkins) e o mestiço Charlie Bent (Jay Varela). O bando assalta um trem roubando cem mil dólares e na fuga os bandidos são forçados a levar junto Catherine Crocker (Sarah Miles), mulher que vagava a cavalo após ter abandonado o marido Willard Crocker (George Hamilton). Catherine passa a ser um estorvo por retardar a fuga do bando e ainda por ser assediada por Dawes e Billy, sendo protegida por Grobart, o líder do bando e por quem Catherine se apaixona sem ser correspondida pois Grobart nunca esqueceu Cat Dancing. Uma patrulha sob o comando do xerife Harvey Lapchance (Lee J. Cobb) segue na captura da quadrilha e à patrulha se junta Willard que procura pela esposa acreditando ter sido ela sequestrada. O bando se desentende e ao final apenas Grobart permanece vivo. Grobart corresponde enfim ao amor de Catherine justamente quando são alcançados pela patrulha. Willard percebe que sua esposa agora pertence a Grobart e este é ferido no confronto com os homens de Lapchance. Willard se prepara para desferir o tiro fatal no desafeto quando Catherine alveja o marido matando-o. Lapchance recupera o dinheiro roubado e deixa Grobart seguir livre com Catherine.

Marilyn Durham
Problemas sem fim - Quando um filme tem tudo para dar errado dificilmente ele dará certo e foi o que aconteceu com este western. Inicialmente Brian G. Hutton deveria ser o diretor, chegando até a colaborar no roteiro, desistindo porém da empreitada; foi então sondado o nome de um jovem diretor chamado Steven Spielberg que também não gostou da história e recusou a proposta. Richard C. Sarafian, diretor egresso da TV e que ainda saboreava o inesperado pequeno sucesso de “Corrida Contra o Destino”, filme que se tornara instantaneamente ‘cult’, aceitou dirigir “Amor Feito de Ódio”. A história de Marilyn Durham já havia passado por diversas mãos de roteiristas, sendo então definida a versão de Eleanor Perry para ser filmada. Ocorre que Sarah Miles exigiu que seu marido Robert Bolt reescrevesse os seus diálogos. Bolt era o premiado roteirista de “Lawrence da Arábia”, “Doutor Jivago”, “O Homem que Não Vendeu Sua Alma” e “A Filha de Ryan” e trabalhou sem crédito. Iniciadas as filmagens em Gila Bend, no Arizona, ocorreu a morte de David Whiting, secretário de Sarah Miles, morte jamais devidamente esclarecida, ainda que tenha se falado em suicídio e também overdose por drogas. Whiting e Sarah eram amantes e o rapaz desconfiou que Sarah e Burt Reynolds estavam tendo um caso. Como não poderia deixar de ser a imprensa sensacionalista explorou ao extremo a tragédia. Mesmo com um stuntman renomado como Al Needham comandando a equipe de substitutos, Burt Reynolds e Jack Warden dispensaram dublês para a brutal sequência de luta entre seus personagens e como resultado Reynolds passou uma semana no hospital após ganhar uma hérnia com o esforço despendido, atrasando as filmagens. Mas nada do que aconteceu foi pior que o equívoco de ter a inglesa Sarah Miles como a mulher independente faz o rude homem do Oeste esquecer Cat Dancing.

Sarah Miles e Burt Reynolds; Jack Kruschen e Burt Reynolds

Sarah Miles e George Hamilton
Escolhas equivocadas - Marilyn Durham era uma escritora feminista e quando seu livro foi publicado, em 1972, chamou a atenção justamente por ter como protagonista uma mulher liberada que não vacila em abandonar o repressivo marido abastado. No decorrer da história é essa mulher quem enlouquece componentes do bando a ponto de ser currada por um deles, momento chave do filme que no entanto resultou inconvincente por não possuir Sarah Miles a necessária sensualidade para atrair e a tenacidade para resistir. A confusa (no filme) passagem da morte da índia Cat Dancing, passagem à qual apenas se faz referências, seria uma analogia com o estupro posteriormente cometido por Dawes. Nada funciona porque Sarah é delicada demais e sua languidez a impede de emanar o erotismo que a personagem exigia. Tivesse a atriz inglesa uma pequena dose da lascívia que Claudia Cardinalle exibe em “Os Profissionais” (The Professionals) e a narrativa seria crível, mais ainda porque a história de Marilyn Durham guarda certas semelhanças com a trama do filme de Richard Brooks de 1966. Voltando ao escândalo que envolveu os bastidores de “Amor Feito de Ódio”, especulou-se sobre a possível relação amorosa entre Reynolds e Sarah Miles, que pode ter ocorrido de fato já que o ator era então o homem mais desejado do cinema. Mas no filme não se vê a menor química entre ambos e aí que o faroeste decai. Além de Sarah Miles, George Hamilton também foi um escolha errada como o vingativo marido abandonado, a não ser que o espectador acredite ser o simpático ator capaz de brutalidades inenarráveis.

Sarah Miles e Burt Reynolds
Inesperado ‘happy end’ - “Amor Feito de Ódio” caminha bem em sua primeira metade mesmo com Sarah Miles destruindo sua personagem. Entre os bons momentos filmados por Sarafian está a ótima sequência do assalto ao trem, que é seguida pelos esperados desentendimentos entre o bando. Bo Hopkins repete o jovem idiotizado de “Meu Ódio Será Sua Herança” (The Wild Bunch) e Jack Warden vai pouco a pouco se revelando um bandido assustador pela violência. Depois de quebrar as costelas de Hopkins em uma luta corporal, se defronta em outro momento brutal desta vez contra Burt Reynolds e como este é o herói da história abate o opositor. Com o bando exterminado e restando apenas o amargurado e introspectivo Jay Grobart (Reynolds) a história perde o rumo com Grobart visitando a tribo onde estão seus dois filhos. Tem lugar então cansativas reflexões e revelações por parte dos amigos índios de Grobart, bem como a pretensa justificativa da razão que o teria levado a assaltar um trem. Catherine (Miles) torna-se amável e submissa e a patrulha comandada por Lee J. Cobb não se esforça muito para encontrar o casal remanescente da fuga até o desfecho inesperadamente feliz.

Burt Reynolds
Reynolds pré-‘Bandit’ - O melhor deste western é a presença de Burt Reynolds como o homem ríspido que se revela amargurado pelo passado trágico. Jack Warden igualmente está ótimo como o mais agressivo bandido, enquanto Lee J. Cobb aparece sem oportunidade de exibir sua característica exasperação, o que o torna um ator menos interessante. Sarah Miles chega até a exibir parte de sua nudez e mesmo nisso é pouco natural; fazê-la andar a cavalo segurando uma sombrinha lembrando a protagonista de “A Filha de Ryan” é risível. Jay Silverheels quase irreconhecível como um envelhecido chefe índio com uma vasta cabeleira branca. A cinematografia de Harry Stradling Jr. é eficiente e o mesmo não se pode dizer da trilha sonora musical de John Williams. Originalmente Michel Legrand havia composto a trilha musical para este western, trabalho que foi inteiramente vetado, sendo suas composições substituídas pelas de Williams. Burt Reynolds, que como poucos retratava com perfeição um cowboy, aduziu a esse tipo uma dose grande de cinismo e irreverência e conquistou Hollywood como o ‘Bandido’ da série de aventuras que começou com “Agarre-me se Puderes” e fez dele um astro de primeiríssima grandeza nem sempre reconhecido por seu talento interpretativo. “Amor Feito de Ódio” possibilita ver esse Burt Reynolds.

Bo Hopkins e Sarah Miles; Jay Silverheels; Sarah Miles e Jack Kruschen

Um comentário:

  1. Como encontrar este filme para baixar. Não encontro em nenhum site.

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