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26 de maio de 2013

HISTÓRIAS DO ÁLAMO - O TIRANO QUE ROUBOU O SONHO DE JOHN WAYNE


As primeiras versões da história do
Álamo para o cinema.

A defesa da missão transformada em forte em San Antonio, no Texas, mais conhecida como Álamo, é um dos fatos históricos que mais orgulho traz aos norte-americanos. Como não poderia deixar de ser aquela passagem histórica foi levada algumas vezes ao cinema antes da mais famosa versão dirigida por John Wayne. A primeira delas foi em 1911, com o curta “The Immortal Alamo”, estrelado por Francis Ford, irmão de John Ford. Em 1915, desta vez como longa-metragem, David W. Griffith produziu “Mártires do Alamo”, dirigido por Christy Cabanne. O nome mais famoso do elenco era o de Douglas Fairbanks interpretando um soldado texano. Esse filme foi relançado cinco anos depois com o título “O Nascimento do Texas”. Em 1926 Robert N. Bradbury (pai de Bob Steele) filmou “Davy Crockett e a Queda do Álamo”, protagonizado pelo ator Cullen Landis e com Bob Steele no elenco. Em 1939 Richard Dix interpretou Sam Houston em “A Grande Conquista”, filme que contou com as participações de Joan Fontaine, Victor Jory, Robert Barrat, George ‘Gabby’ Hayes e Robert Armstrong, entre outros. O próximo filme sobre o Álamo com personagens que participaram das batalhas de três dias foi “A Última Barricada”, western épico que tem uma longa história.

O jovem John Wayne.
O início da paixão pelo Álamo - O primeiro filme que John Wayne assistiu sobre o Álamo foi “O Nascimento do Texas”, que despertou seu fascínio pelo assunto. Mais tarde John Wayne assistiu ao filme dirigido por Robert N. Bradbury, de quem viria a ser amigo anos depois. Wayne foi se apaixonando pelos acontecimentos ocorridos em San Antonio, paralelamente à medida que crescia sua ideologia política pendendo para a ala mais radical do Partido Republicano. John Wayne era contratado da Republic Pictures quando soube, em 1939, que o estúdio iria produzir “A Grande Conquista”. Wayne pediu a Herbert J. Yates, o dono da Republic, para participar de “A Grande Conquista”, mas Yates lhe disse que ele ainda era “muito fraco” como ator, isto apesar dos mais de 60 filmes que o Duke fizera depois de “A Grande Jornada”, em 1930. E Yates sabia que Wayne havia acabado de filmar um certo faroeste sob a direção de John Ford, filme chamado “No Tempo das Diligências”. A partir de então duas coisas aconteceram: John Wayne passou a sonhar em filmar uma versão definitiva daquele episódio histórico; e John Wayne se tornou um dos grandes astros do cinema. Ser grande astro não significava ganhar bem pois Yates dirigia um pequeno estúdio mas era tão sovina quanto Jack Warner (Warner Bros.), Harry Cohn (Columbia), ou qualquer outro diretor dos grandes estúdios .

Herbert J. Yates e Vera Helena Hruba
A primeira promessa de Yates - Após a II Guerra Mundial o desejo de John Wayne de fazer o filme de seus sonhos era conhecido de todos, inclusive de Herbert J. Yates. Querendo tirar proveito disso, Yates fez uma promessa ao Duke. Se John Wayne assinasse novo contrato com a Republic Pictures, Yates iria produzir o ‘Álamo’ que o ator tanto queria. Por esse novo contrato de sete anos Wayne deveria fazer pelo menos um filme por ano para a Republic, podendo atuar também em produções de outros estúdios. Depois do contrato assinado o tratante Yates não falou mais do assunto 'Álamo' com John Wayne. No início dos anos 40 Yates se enamorou por uma jovem patinadora tcheca chamada Vera Helena Hruba e decidiu fazer da moça uma estrela de cinema, uma nova Sonja Henie. Mas Yates acabou criando uma nova Marion Davies, a paixão de William Randolph Hearst que disfarçadamente Orson Welles mostrou em “Cidadão Kane”. A patinadora Vera era 39 anos mais nova que Yates, o que não impediu o produtor de cortejá-la abertamente, isto apesar de ainda ser casado e ter netos. A moça patinava razoavelmente, mas como atriz era péssima. Para ajudar a tchecoslovaca mal sabia falar algumas palavras em Inglês. Para impulsionar a carreira de atriz da namorada, cujo nome artístico passou a ser Vera Ralston, Yates decidiu que John Wayne deveria ser seu partner em alguns filmes.

John Wayne e Vera Ralston em "Dakota".
Duke e as cenas de amor com Vera Ralston (e Herb Yates) - Em meados da década de 40 John Wayne era o grande astro da Republic Pictures e, exercitando seu notório mau caráter, Herbert J. Yates quis se aproveitar da fama do Duke, chantageando-o.  Yates prometeu a John Wayne que se ele filmasse com Vera Ralston a Republic faria sim o filme sobre o Álamo. Wayne mais uma vez acreditou em Yates e teve Vera Ralston como leading-lady em “Dakota”, filme de 1945. Pior ainda que contracenar com Vera era ter que aguentar a presença constante de Yates nos sets de filmagem, atrapalhando com seu ciúme doentio as cenas de amor. Terminado o filme Wayne cobrou de Yates a promessa sobre o Álamo. Yates desconversou, o que faria todas as vezes que Wayne entrava em seu escritório para cobrá-lo. O prestígio de John Wayne não parava de crescer com filmes como “Sangue de Heróis” e “Rio Vermelho”. Outro filme de sucesso de John Wayne foi “O Anjo e o Malvado”, em 1947, escrito e dirigido por James Edward Grant. Wayne e Grant tornaram-se amigos particulares, inclusive porque ambos tinham as mesmas idéias políticas e gostavam de uma boa bebedeira. Grant era escritor e roteirista e Wayne pediu a ele que começasse a pesquisar e escrever um roteiro para o filme sobre o Álamo. Os dois foram até San Antonio, no Texas para conseguir maiores informações nos museus locais. Já com um pré-roteiro em mãos, Wayne mais uma vez procurou Yates.

Juntos pela segunda vez Duke e Vera Ralston
em "O Lutador do Kentucky".
O ‘muquirana’ mentiroso – A história se repetiu e Yates disse que só produziria o filme que Wayne queria se o ator trabalhasse mais uma vez com sua querida Vera Ralston. Se o Duke não desistia de seu filme, Yates também não desistia de fazer de Vera Ralston uma estrela. Outra vez Wayne acreditou na promessa até porque, apesar de má atriz, Vera era boa pessoa. E foi feito então “O Lutador do Kentucky” (Estranha Caravana) com Wayne e Vera Ralston. Nem bem terminou o filme e lá estava Wayne cobrando a promessa de Yates que, como sempre, desconversava sobre o assunto. Foi nesse tempo que, para tapear John Wayne, Herbert J. Yates contratou James Edward Grant como roteirista para que Grant produzisse novo roteiro sobre o Álamo.  Yates sabia que Wayne queria fazer um filme caro para os padrões da Republic e ‘mão-de-vaca’ como só ele, não iria gastar tanto com um único filme, quando podia fazer três ou quatro com o mesmo volume de dinheiro. Longe do Duke Yates dizia que jamais iria produzir um filme no qual o público sabe que “todos morrem no fim”.

John Wayne e Maureen O'Hara
em "Depois do Vendaval".
O ‘Sim’ de Herbert J. Yates - John Wayne perdeu de vez a paciência com Yates quando levou seu amigo John Ford para a Republic, onde Ford fez alguns filmes. Se Wayne tinha o sonho de filmar “O Álamo”, Ford tinha o sonho de filmar “Depois do Vendaval” na Irlanda. Ford e Yates se associaram para fazer esse filme, que era a produção mais cara da Republic. “Depois do Vendaval” ganhou Oscars e se transformou em um enorme sucesso de bilheteria e de crítica. Na hora de dividir os lucros, porém, Yates deu um cheque de 50 mil dólares a John Ford que teve que entrar na Justiça para receber o que tinha direito. Ford culpou John Wayne por tê-lo apresentado àquele biltre chamado Herbert J. Yates. Para agradar John Wayne e John Ford, Yates contratara Patrick Ford, filho do diretor para que este refizesse o roteiro de “O Álamo”. O pobre Patrick Ford escrevia, escrevia, escrevia e nada de prático acontecia com seus roteiros. Wayne achou então que era hora de decidir as coisas com o chefão da Republic, até porque com “Depois do Vendaval” Wayne havia cumprido o último filme do contrato com a Republic. Yates queria renovar o contrato com Wayne mas o ator deu o ultimato: “Só se o filme sobre o Álamo for feito imediatamente”. Sem saída Yates teve que ceder para a Republic Pictures não perder sua maior (e única) grande estrela. Quando tudo parecia resolvido e começaram os entendimentos para “O Álamo”, Yates deixou claro que o filme seria rodado com pequeno orçamento, em Trucolor e nos estúdios da Republic. Outra condição imposta por Yates era que Vera Ralston participasse do filme. João Wayne queria fazer o maior de todos os filmes e Yates apenas mais um filmeco no estilo do estúdio.

O dono da Republic Pictures, Herbert J. Yates.
O tiranete da Republic - Herbert J. Yates tinha pouco mais de 1,60m de altura mas era temido por todos no estúdio. A única pessoa que enfrentara Yates havia sido Gene Autry que se rebelou contra o tiranete e saiu da Republic. Agora era a vez de John Wayne fazer o mesmo. Sem chegar a um acordo com Yates, Wayne cumpriu sua promessa e abandonou o estúdio onde trabalhava há 15 anos. Yates vingou-se do Duke despedindo Patrick Ford e guardando bem guardadinho o roteiro que moralmente pertencia a John Wayne. Começou então a epopéia de John Wayne para conseguir fazer o filme que queria. O primeiro passo do Duke foi criar sua própria produtora para poder ter controle total sobre seu projeto. Em sociedade com Robert fellows, Wayne fundou a Wayne-Fellows Productions. Wayne associou sua produtora com a Warner Bros. que ficaria responsável também pela distribuição dos filmes produzidos pela Wayne-Fellows. Mas Jack Warner não queria nem ouvir falar daquele sonho de John Wayne chamado “O Álamo”. O Duke, porém, não desistia de seu projeto e enquanto guardava dinheiro para produzir seu filme, procurava investidores para ajudá-lo no projeto. O roteiro de James Edward Grant já estava pronto e até mesmo as locações já haviam sido definidas, e “O Álamo” seria filmado no Panamá ou em Durango, no México. John Wayne estava atuando em “Um Fio de Esperança” quando foi avisado que Herbert J. Yates decidira finalmente, como vingança, produzir um filme sobre o Álamo.

Sterling Hayden e J. Carroll Naish em
"A Última Barricada".
A vingança do dono da Republic - O roteiro do filme da Republic seria basicamente aquele rascunhado por James Edward Grant e revisto tantas vezes por Patrick Wayne. John Wayne queria processar Yates mas desistiu quando soube que perderia a questão pois o roteiro pertencia, por direito, à Republic Pictures, uma vez que Patrick Ford e Jim Grant eram contratados de Yates no tempo em que trabalharam no roteiro. O desespero tomou conta de John Wayne que não podia aceitar a idéia de um acontecimento tão importante como a defesa do Álamo ser filmado por alguém tão mesquinho como Yates. Só restava a Wayne praguejar contra Herbert J. Yates por ter roubado seu sonho e aguardar para ver como ficaria o filme da Republic. Yates mudou o título para “The Last Command” (A Última Barricada) e para atazanar ainda mais John Wayne o filme seria rodado no Texas, num lugar chamado Brackettville. “A Última Barricada” não foi bem nas bilheterias e apenas se pagou e logo foi esquecido pelo público, sem dar lucro a Yates. A Republic Pictures fechou as portas em 1958 e o tirano que comandava o estúdio faleceu em 1966, aos 85 anos, deixando viúva Vera Ralston, com quem se casara em 1952. Ter visto seu sonho ser roubado por Herbert J. Yates deu ainda mais força a John Wayne que após desfazer a parceria com Fellows, fundou sua Batjac e em 1960 legou ao cinema “O Álamo”, do jeito que queria. Seu algoz Yates viveu o suficiente para ver John Wayne realizar a superprodução que só mesmo um gigante como Wayne poderia fazer.

Poster da Republic Pictures feito para enganar John Wayne por mais algum
tempo. O título do filme seria "O Álamo", como o Duke queria.
À direita o poster de "A Última Barricada".

5 comentários:

  1. Darci, esse belo texto necessita de uma revisãozinha. Afinal, é Patrick Ford ou Patrick Wayne? Tem também um "dom" no lugar de "com" e mais uma bobaginhas prá acertar.

    Assisti A Última Barricada e quer saber? Até que achei legal. Sterling Hayden não nega fogo, não é? Já o Álamo do John Wayne ficou a dever, me parece, apesar do elenco estelar.

    Abraços
    José Tadeu

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  2. Olá, Tadeu
    Quando fui ler o texto depois de pronto descobri o equívoco com o nome do Patrick. E na linha seguinte estava correto 'Patrick Ford'. Claro que Pat Wayne não tinha idade ainda para escrever roteiros rsrsrs. Creio que deva estar tudo OK e sei que o amigo é professor de Português.
    Obrigado e um abraço do Darci

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  3. Olá Darci

    Parece que os grandes estúdios de Hollywood, cresceram sob a batuta de vilões que não se importaram em usar seus astros até o limite da escravidão. Ser advogado nas cercanias desses estúdios, com certeza, era um grande negócio, um capitalismo doentio destes, produz demandas intermináveis. Pena que este Yates teve razão em relação ao filme não fazer sucesso e lamento mais ainda por John Wayne, não ter logrado o êxito esperado, este filme fez uma enorme cratera na sua trajetória, que ainda hoje persiste.
    Ótima postagem, traçando este perfil de um dirigente inescrupuloso, que nós mortais pouco sabemos. Hollywood nunca foi só diversão.

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  4. Prezado Darci,

    Como todos os "tycoons" da indústria cinematográfica americana, além de visarem somente o lucro eram, também, tiranos contratando atores, atrizes, diretores, técnicos etc. no mínimo por sete anos pagando baixos salários e às vezes acabavam com a carreira de muitos.

    Herbert J. Yates foi astuto quando fundou a Republic que na verdade era a fusão de três ou quatro pequenas produtoras, entre elas a Mascote e a Monogram, que tinham grandes débitos com a Consolidated Film Laboratories de Yates.

    Gene Autry foi o primeiro a rebelar-se contra o dono da Republic, seguido de John Wayne sua maior estrela, Roy Rogers com processo na Justiça e Monte Hale que em 1950 preferiu pedir rescisão do contrato antes de vencer os sete anos.

    No início da década de '50 os seriados e B westerns estavam mortos devido a concorrência da TV. As pequenas produtoras apelidadas de Poverty Row, após o sucesso dos filmes de Hopalong Cassidy e The Lone Ranger exibidos nas telas pequenas venderam pacotes de filmes contendo antigos westerns.

    Mr. Yates só querendo promover sua estrela Vera Ralston gastou milhares de dólares em produções acima do padrão da Republic, estrelados por ela e por outros conhecidos atores e não aceitava produzir filmes para a TV, quando concordou entrar para a nova mídia produzindo "Fu Manchu", "Frontier Doctor" com Rex Allen e "Stories of the Century" com Jim Davis vencedor de um Emmy, mas já era tarde. Assim, em 1959 a Republic fechou o seu portão como produtora de filmes. Nos anos '60 alugava o estúdio e depois foi vendida para a CBS onde hoje funciona o CBS Center em Studio City, Los Angeles.

    Em 2000 estive no local e só resta da Republic a entrada e os palcos de som que eram considerados melhores que os dos grandes estúdios.

    O pequeno estúdio do Vale, como era conhecido, deixou grandes lembranças àqueles que puderam ver os seus filmes e seriados nos cinemas.

    Quanto ao filme "A Última Barricada" (The Last Command) foi um dos melhores da última fase da Republic e consta com um elenco de "cobras" dos westerns.

    Terminei me alongando no comentário.

    Mario Peixoto Alves

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  5. Olá, Mário
    Você tem razão. O elenco de A Última Barricada é, de fato, muito bom, o que ajudou bastante na qualidade do filme. Mas, como comentei na resenha, os técnicos foram os grades responsáveis. Especialmente William Witney, de tantos e tantos seriados e pequenos faroestes.
    Seus comentários são sempre bem-vindos, muito informativos e jamais excessivos.
    Um abraço do Darci

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