UMA REVISTA ELETRÔNICA QUE FOCALIZA O GÊNERO WESTERN

6 de setembro de 2011

HISTÓRIAS DO ÁLAMO - KIRK DOUGLAS DERROTANDO JOHN WAYNE


"O Álamo” e “Spartacus” foram as duas superproduções que mobilizaram Hollywood em 1959 pois foram rodadas simultaneamente. Tudo começou durante a pré-produção que incluía as formações dos elencos. John Wayne queria Laurence Olivier para interpretar o Coronel Travis, não só para conquistar mais facilmente o mercado britânico, mas principalmente porque Olivier daria o necessário tom aristocrático imaginado para Travis. Quando Michael Wayne, em nome da Batjac (produtora de John Wayne), entrou em contato com o agente de Laurence Olivier soube que o prestigiado ator inglês já estava comprometido com a Bryna, produtora de Kirk Douglas, para interpretar Marcus Licinius Crassus em “Spartacus”. John Wayne pensou então em Peter Ustinov, outro afamado ator britânico e Michael Wayne ficou sabendo pelo agente de Ustinov que ele iria atuar num filme norte-americano produzido por Kirk Douglas. Claro que o filme era também “Spartacus”, em que Ustinov interpretou Lentius Batatius, o dono da academia que treinava os escravos para serem mortos em lutas para divertir os nobres romanos. Alguém lembrou a John Wayne que ele poderia contratar Charles Laughton, mas Duke rejeitou a idéia dizendo que Laughton era gordo e velho demais para interpretar o Coronel Travis. Mal sabia ele que Kirk Douglas contratara também Charles Laughton.

Peter Ustinov, Charles Laughton, Laurence Olivier e
Jean Simmons, todos com Kirk Douglas

Laurence Harvey, como Coronel Travis
UM INGLÊS DA LITUÂNIA – Parece que não havia mais nenhum ator inglês renomado como Olivier, Ustinov ou Laughton, todos já contratados para o elenco de “Spartacus”. Outras opções seriam Trevor Howard, excelente ator britânico mas que sequer foi lembrado e Richard Burton, já bastante conhecido por ter atuado em “O Manto Sagrado” e “Alexandre, o Grande”. Porém foi sugerido a Wayne o nome de um ator ‘inglês’ que havia chamado a atenção por sua atuação em “Almas em Leilão’, tanto que foi até indicado para o Oscar por esse filme. Seu nome era Laurence Harvey. O agente de Harvey levou-o até o escritório de John Wayne, na United Artists. Nesse dia coincidentemente John Ford estava ‘visitando’ Duke, o que vinha fazendo quase que diariamente para contrariedade do Duke. Quando Laurence Harvey começou a falar de sua experiência como ator teatral na Inglaterra, Wayne o interrompeu dizendo: “Eu sei que vocês atores ingleses, todos têm larga experiência interpretando Shakespeare. Mas aqui a história é outra. Preciso de alguém falando com sotaque texano.” O que Wayne queria era despachar o ator 'inglês’. Ford, calado, assistia a tudo fumando seu charuto. Foi então que Laurence Harvey disse: “Mr. Wayne, preciso lhe dizer que não sou inglês pois nasci na Lituânia mas vivi a maior parte da minha vida na África do Sul.” Wayne fechou o semblante lembrando que Kirk Douglas estava ganhando de três a zero dele quanto aos atores ingleses. Isto sem falar em Jean Simmons, que ainda disputava o papel de Varinia com Ingrid Bergman (sueca), Jeanne Moreau (francesa) e Elsa Martinelli (italiana). Ganhou Jean Simmons, outra inglesa no cast de “Spartacus”. Vendo que não conseguiria o papel de Travis, Laurence Harvey olhou para John Ford e lhe disse: “Me dê um desses seus charutos”. Incrédulo e surpreso com a ousadia, Ford deu um charuto a Harvey. O lituano acendeu o charuto, colocou na boca, deu um baforada em direção a John Wayne e declamou, com o mais puro sotaque do Texas esta frase de “Romeu e Julieta”: “But soft, what light through yonder window breaks. It is the east, and Juliet is the Sun...”. John Wayne não conseguiu conter seu espanto e admiração e John Ford, mais experiente, tomou a dianteira como se o “O Álamo” fosse seu e falou: “Olha, nós estamos muito ocupados hoje. Você vai assinar logo o contrato pois nós temos muito o que fazer.”

Chill Wills ficou sem o Oscar
“SPARTACUS” NOCAUTEIA “O ÁLAMO” - John Wayne se entendeu bastante bem com Laurence Harvey durante as filmagens, diferentemente do que aconteceu com Richard Widmark. E Harvey foi quem fez o melhor trabalho entre os astros principais de “O Álamo”, o que foi observado por John Wayne que afirmou que Harvey merecia muito mais ser indicado ao Oscar que Chill Wills, que foi indicado ao Oscar de Melhor ator Coadjuvante, concorrendo com Peter Ustinov. Ganhou Ustinov para tristeza de John Wayne. E “Spartacus” ainda arrebatou outros três prêmios da Academia na premiação de 1961, que foram Direção de Arte (Alexander Golitzen), cinematografia (Russell Metty) e Costumes. “O Álamo” ganhou apenas o Oscar de Melhor Som. Ainda bem que “Spartacus” não concorreu ao prêmio de Melhor Roteiro, que foi escrito por ninguém menos que Dalton Trumbo. Depois de amargar quase dez anos sendo proibido de assinar roteiros por ter sido vítima da odiosa Caça às Bruxas do Macarthismo, Kirk Douglas corajosamente deu trabalho a Trumbo, acabando com a mais nefasta perseguição já ocorrida em Hollywood. E John Wayne, que odiava comunistas, apoiou incondicionalmente o expurgo de Dalton Trumbo e outros escritores.

Laurence Harvey vendo o Oscar pela luneta
FILMES SOBRE A CORAGEM - Mas a maior derrota que seria impingida a John Wayne nessa batalha surda entre “O Álamo” e “Spartacus” foi nas bilheterias. Em valores corrigidos, ambos os filmes teriam custado 92 milhões de dólares (tiveram o mesmo custo de 12 milhões de dólares cada um, isto em 1960). “Spartacus” no ano de seu lançamento arrecadou 476 milhões de dólares, enquanto “O Álamo” arrecadou 110 milhões de dólares, menos de um quarto do que Kirk Douglas faturou. Essas quantias referem-se à arrecadação no mundo inteiro. Enquanto “Spartacus” é um filme sobre a coragem individual de um homem e sobre a liberdade dos oprimidos pelos tiranos, “O Álamo” é sobre um grupo de homens determinados a morrer por uma causa até hoje discutida que foi a apropriação do Texas.


8 comentários:

  1. Surpreendente esta batalha de titãs, Darci. Não sabia desta concorrência entre estas duas superproduções, e muito embora reconheça o talento de Laurence Olivier, não imagino ele como Travis. Se não fosse Laurence Harvey (que morreu ainda bem jovem, de câncer aos 45 anos em 1973) iria sugerir Richard Burton para o papel. Entretanto, parece que "O Álamo" não conseguiu o êxito tão esperado, tornando mesmo um "Alamo" para o Duke. A refilmagem em 2001 com Billy Bob Thorton foi ainda mais desastroso. Abraços, ótima matéria.

    PS- Tentei comentar anteriormente, mas não sei o que houve não publicava em sua página de comentários

    ResponderExcluir
  2. Paulo, a batalha foi assim meio surda, não declarada. Pelo que deduzi de algumas fontes John Wayne ficou mesmo enciumado com a inglesada que Kirk Douglas conseguiu. Depois os filmes concorreram a vários Oscars e foram lançados simultaneamente, aí sim uma guerra para conquistar o espectador. Tive sorte de ver os dois, em tela grande, quando lançados aqui em São Paulo,"O Álamo" no Cine Normandie e "Spartacus' no Cine Rio Branco. Considero "O Álamo" um bom filme, melhor que a versão recente com Billy Bob Thorton que fracassou nas bilheterias.

    ResponderExcluir
  3. Darci, de longe SPARTACUS é bem melhor que O ÁLAMO. Além disso, o Harvey é muito enfadonho.

    Cumprimentos cinéfilos!

    O Falcão Maltês

    ResponderExcluir
  4. Nahud, cada um tem seu épico preferido. Mesmo sem corrida de quadrigas, "Spartacus" é o meu favorito. Elenco espetacular com atuações incríveis de Ustinov e Laughton. Não era a praia de Kubrick, mas ele acertou a mão.

    ResponderExcluir
  5. Uma briga silenciosa de titãs e ganha em todos os aspectos pelo melhor, Spartacus.
    O que não entendi foi Duke andar fulo pela constante presença de seu tutor Ford. Afinal, pelo que sei, eram bons amigos. Além de Ford poder ser um alento e uma força para o novo diretor.
    Mas hoje, conhecendo melhor a personalidade e caráter de Duke, é possivel avaliar seu embirramento.
    O Alamo não foi lá estas coisas, pelo menos visto hoje, enquanto Spartacus sempre foi considerado uma das melhores coisas que Hollywood fez no gênero, pela critica e por mim.
    Kirk Douglas não fez um filme para ele, o que não aconteceu com Duke, haja visto que O Alamo era quase que "ele apenas".
    jurandir_lima@bol.com.br
    jurandir_lima@bol.com.br

    ResponderExcluir
  6. Jurandir, John Wayne não queria que depois dissessem que foi John Ford quem dirigiu "O Álamo". Há uma história muito boa da presença de Ford nas filmagens lá em Brackettville que merece ser contada aqui no CINEWESTERNMANIA.

    ResponderExcluir
  7. ALAMO fracassou devido ser rejeitada pela opinão publica liberal americana, a idéia que o Duke tentou fazer valer que a conquista do Texas foi um ato de heroismo. Quando na verdade como cita nosso editor a apropriação do Texas é um assunto até hoje discutido e polemico. Duke foi o maior cawboy de todos os tempos, mas como homem era um conservador radical. Kirk Douglas
    em SPARTACUS passa por defensor dos fracos e oprimidos, uma posição bem mais confortável perante a critica e a opinião. SC

    ResponderExcluir
  8. Sidney, o nome do homem que colocou a opinião dos Estados Unidos contra O Álamo de John Wayne era Russell Birdwell. Qualquer dia vamos contar mais essa pequena história acontecida n'O Álamo...
    Darci

    ResponderExcluir