O filme noir marcou época em Hollywood
e, mesmo após o fim do gênero, ecos das tramas difíceis de ser acompanhadas
pelos espectadores mais atentos perduraram em muitas produções, inclusive em
westerns. “De Arma em Punho” (The Man Behind the Gun), rodado em fins de 1952 e
lançado em janeiro de 1953 é um desses filmes com trama intrincada digna de um
bom e complicado noir. E o autor da história original, Robert Buckner, entre
dezenas de trabalhos para o cinema, não se notabilizou por escrever argumentos
para o gênero que consagrou Humphrey Bogart, mas sim roteiros mais simples,
muitos deles westerns. São de autoria de Buckner as histórias originais e roteiros
de “Uma Cidade que Surge” (Dodge City), “Caravana do Ouro” (Virginia City), “A
Estrada de Santa Fé” (Santa Fé Trail), todos grandes sucessos coincidentemente
estrelados por Errol Flynn. Os últimos trabalhos de Robert Buckner nos
faroestes foram os roteiros de “Ama-me com Ternura” (Love-me Tender) e “Caçada
Humana” (From Hell to Texas), respectivamente de 1956 e 1958. Nenhum desses
westerns, no entanto, exigem tanto a atenção para ser entendido, como “De Arma
em Punho”, fugindo do padrão dos faroestes de Randolph Scott.
Acima Patrice Wymore e Randolph Scott; abaixo a autorização do Major Cullicut. |
Separatismo
ao Sul da Califórnia - O Major do Exército Ransome Callicut
(Randolph Scott) chega a Los Angeles, por volta de 1850, designado para uma
missão secreta disfarçado como professor.
Com o ‘professor estão, igualmente disfarçados, o Sargento ‘Monk’ Walker
(Dick Wesson) e o Cabo Olaf Swenson (Alan Hale Jr.). A missão do Major Cullicut
consiste em descobrir quem são os responsáveis por um movimento separatista no
Sul da Califórnia, sufocar o movimento e apaziguar Los Angeles. As tropas do
Exército estão sob o comando do Capitão Roy Giles (Philip Carey), cuja noiva
Lora Roberts (Patrice Wymore) chega à cidade na mesma diligência que o Major
disfarçado de professor. O Capitão Giles mantém um caso com Chona Degnon (Lina
Romay) a cantora que se apresenta no Buckley’s Palace e que participa da causa
separatista. O Major Callicut e Lora Roberts se atraem reciprocamente mas o
Major se aproxima também de Chona Degnon, um pouco como parte de sua estratégia
e outro tanto por não resistir aos encantos da sensual Chona. Um Senador
chamado Mark Sheldon (Roy Roberts) é contra o separatismo e simula a própria
morte, forma de poder agir pelo domínio da distribuição de água da cidade. Em
meio às intrigas o jovem bandido salteador e traficante de armas Joaquim
Murieta (Roberto Cabal) alia-se ao Major Cullicut. Em dado momento é revelada a
identidade de Cullicut e reaparece o Senador Sheldon que mata sua ex-cúmplice
Chona Degnon, mas é desmascarado e dominado pelo Major. Este, abafada a
rebelião no Sul da Califórnia, fica com a professora Lora Roberts.
Acima Patrice Wymore e Randolph Scott; abaixo Dick Wesson. |
Reviravoltas
contínuas - Randolph Scott está ótimo em “De Arma em Punho”, fato
surpreendente pois sabe-se que Randy sempre deu mais importância ao seu hobby
pessoal (jogo de golfe) que a seu trabalho como ator. E num filme difícil de
ser compreendido o normal seria uma maior displicência de Randy que não gostava de
participar das sequências de luta e menos ainda de beijar a mocinha. Scott,
porém, beija mais de uma vez Patrice Wymore, então senhora Errol Flynn na vida
real, e corteja Lina Romay. As reviravoltas se sucedem em “De Arma em Punho” e,
a partir da metade do filme, quando se torna possível compreender a trama, aí
então temos um daqueles faroestes agradáveis ao gosto do público menos
exigente. E com Randolph Scott dominando o filme com sua persona, ao lado de
dois ‘sidekicks’, há até momentos engraçados proporcionados por Dick Wesson e
Alan Hale Jr. Assim como ocorreria em “Ardida Como Pimenta” (Calamity Jane),
também de 1953, Dick Wesson traveste-se de mulher, desta vez para enganar não o
público como no clássico estrelado por Doris Day, mas para ludibriar bandidos.
E Phil Carey, que disputa a maravilhosa ‘Calamity Jane’ com Howard Keel em
“Ardida Como Pimenta”, é vencido em rivalidade semelhante, agora por Randolph
Scott.
Philip Carey e Randolph Scott; à direita Lina Romay. |
Sequências 'emprestadas' de "Cidade Sem Lei". |
Cenas
de arquivo - Como todo bom enredo puxado para o noir, “De Arma em
Punho” tem muitos diálogos em sua primeira metade, quando os momentos de ação
são raros. A parte final, no entanto, compensa com trocas de tiros,
perseguições e uma violenta briga entre mulheres (Lina Romay e Patrice Wymore)
que chega a lembrar a memorável sequência de “Atire a Primeira Pedra” (Destry),
entre Marlene Dietrich e Una Merkel. Certo que a economia prevalece neste
faroeste da Warner Bros. dirigido por Felix E. Feist, exibindo a rua principal
de Los Angeles (San Antonio) e cenas da casa de show sempre lotada e mais tarde
com uma enorme confusão, cenas ‘emprestadas’ sem o menor acanhamento de “Cidade
Sem Lei” (San Antonio) e montadas com perfeição no filme de Feist. Também de
“Cidade Sem Lei”, filme de 1945, foi extraída a famosa sequência em que Errol
Flynn persegue Paul Kelly, caindo ambos, espetacularmente, no mesmo cavalo, num
rio. Por falar em água, uma curiosidade é o vilão Roy Roberts desejar o
monopólio da água da cidade e ter sua cabeça afogada por Randolph Scott que lhe
diz: “Você não queria água? Não queria
água?” Roy Roberts interpretaria 21 anos depois o prefeito de Los Angeles
em “Chinatown”, obra-prima de Roman Polanski que aborda o tema da corrupção do
suprimento municipal de água, como acontece em “De Arma em Punho”. Mas neste
filme não há nenhum nariz rasgado a canivete num reservatório, como fez o ator
Polanski com o narina de Jack Nicholson.
Mais uma sequência de "Cidade Sem Lei' utilizada em "de Arma em Punho". |
A luta entre Lina Romay e Patrice Wymore. |
Robert Cabal |
Um
caricato Joaquim Murieta - A produção deste western, que não é
da safra da Scott-Brown, se descuidou um pouco e a inexatidão no uso das armas chega
a ser escandalosa pois o filme se passa em 1850 e os revólveres são todos Colts
Peacemakers, cuja fabricação começaria a ocorrer anos após finda a Guerra
Civil. O mesmo vale para os rifles que ainda não eram de repetição quando se
esboçaram os movimentos separatistas na Califórnia. O roteiro de “De Arma em
Punho” coloca em cena a figura não muito lembrada de Joaquim Murieta, que
Warner Baxter havia interpretado em “O Bandoleiro do El Dorado” (Robin Hood of
El Dorado). Murieta que foi morto aos 24 anos de idade, é vivido caricatamente
por Robert Cabal, rindo de tudo o tempo todo. Randolph Scott fez um único filme
com Felix E. Feist, ao contrário de diversos outros diretores com quem Randy
repetiu a parceria, entre eles Budd Boetticher e Edwin L. Marin (sete vezes
cada), André De Toth (seis vezes), Ray Enright (quatro vezes), Joseph E. Lewis e
Tim Whelan (duas vezes).
Scott duas vezes com Lina Romay. |
Lina
Romay encantando - Randolph Scott usa diversos trajes
em “De Arma em Punho”, um deles o famoso traje preto que melhor o caracterizava
e que fascinava seus estusiasmados admiradores. Randy deixa de lado a sisudez
num de seus personagens mais alegres que é o Major Ransome Callicut. Patrice
Wymore foi uma atriz sem maiores ambições e demonstra isso neste western em que
Lina Romay é a grande atração feminina despertando o desejo dos personagens
masculinos principais. Entre uma conquista e outra a linda Lina ainda encontra
tempo para cantar duas canções latinas no mesmo palco onde Alexis Smith também
cantou em “Cidade Sem Lei”. Phil Carey é o apático capitão, não se conformando
em coadjuvar Scott. Dick Wesson comprova mais uma vez que merecia maiores
chances no cinema, carreira que praticamente deixou de lado para se dedicar a
escrever roteiros para séries de televisão. Absoluto desperdício dos atores
Morris Ankrum e Tony Caruso em papéis insignificantes. Atenção para a pequena
participação de Cliff Lyons, baleado numa escada por Randolph Scott, caindo sensacionalmente,
ele que foi um dos grandes stuntmen de Hollywood. Apreciadores de westerns não
se desapontarão com “De Arma em Punho” e os admiradores de Randolph Scott se
deliciarão com mais este bom faroeste do inesquecível cowboy.
Randolph Scott e os trajes utilizados em "De Arma em Punho". |
À esquerda Roy Roberts; no centro Morris Ankrum e Dick Wesson; à direita Anthony Caruso. |
Esta cópia do western "De Arma em Punho" foi gentilmente cedida pelo
cinéfilo e colecionador Marcelo Cardoso.
PREZADO DARCY,
ResponderExcluirÓTIMO COMENTÁRIO. QUE RANDY SCOTT E OUTROS GRANDES COWBOYS CONTINUEM POR MUITO TEMPO VIVO NOS DVD E NA MEMÓRIA DOS SEUS ADMIRADORES.
MARIO PEIXOTO ALVES
Lendário Randolph Scott!
ResponderExcluirAlguém saberia dizer se o Clint Eastwood chegou a conhece-lo?
Outra dúvida e curiosidade: Randolph e Audie Murphy se davam bem? Será que alguma vez foi cogitada a chance de ambos fazerem um filme juntos?
Ontem e hoje assisti mais dois faroestes, ambos de 1953, de um dos reis do gênero, Randolph Scott:
ResponderExcluir“Torrentes de Vingança” e “De Arma em Punho”!
O 1º é razoável, melhora mesmo é na segunda metade, e vale pela trilha, pelas locações e pela presença do Fess, futuro "Daniel Boone", e tb pela presença de um dos ex-Tarzans, o Lex, porém dos que fez com o diretor André De Toth, é o que menos gostei!
Já o 2º embora seja bem enfadonho ainda sim é assistível. até por causa da boa ação dos últimos cinco minutos!
Enfim, nenhum dois estão entre os obrigatórios do RS, mas vale a conferida, claro!
Estou para rever vários, daí atualizarei o meu ranking e postarei aqui!