Sergio Leone dirigindo Rory Calhoun em "O Colosso de Rodes". |
É bastante conhecido o início da
trajetória de Clint Eastwood como ator. Apesar de sua boa estampa não foi bem
aproveitado pelo cinema em seu país, tendo mais sorte na televisão onde coestrelou a série
“Rawhide” ao lado de Eric Fleming. Após alguns anos interpretando Rowdy Yates
nessa série a insatisfação começou a tomar conta de Eastwood que sabia que
séries produzidas para a televisão marcavam negativamente um ator, reduzindo
enormemente suas chances de vencer no cinema. Lá na Itália, encerrado o ciclo
chamado ‘Sandália e Espada’ os produtores passaram a explorar um novo filão
iniciado timidamente nos anos 60, o western. Os italianos sempre gostaram muito
do gênero e prova disso eram as histórias em quadrinhos que desde os anos 40
eram produzidas na Itália, chegando inclusive ao Brasil, entre elas “O Pequeno
Xerife” (Il Picollo Sceriffo) e “Tex Willer”, este publicado na revista
‘Júnior’, ambas semanais. Sergio Leone, foi um dos diretores que migraram dos
épicos para o western com um projeto próprio, ele que adorava os clássicos
norte-americanos do gênero. Conseguido o financiamento de 200 mil dólares,
Leone começou a busca pelo ator principal de seu primeiro faroeste, que deveria
ser um ator norte-americano para ser um homem do oeste autêntico.
Acima Clint Eastwood e Eric Fleming; abaixo Clint com sua Ferrari 275 GTB. |
O
início da Trilogia - Os produtores contataram, pela
ordem, Henry Fonda, James Coburn, Charles Bronson, Richard Harrison e Eric
Fleming, o companheiro de Clint Eastwood na série “Rawhide”. Fleming também não
aceitou a proposta mas sugeriu o nome de Clint Eastwood. O salário oferecido
foi de 15 mil dólares e o filme seria rodado aproveitando o interregno entre
uma temporada e outra de “Rawhide”. Clint aceitou a aventura italiana,
principalmente porque teria oportunidade de conhecer a Itália (e parte da
Espanha), de graça. O resto é história bastante conhecida. “Por um Punhado de
Dólares” (Per un Pugni di Dollari) fez um enorme sucesso na Itália e uma
continuação era inevitável. E veio “Por Uns Dólares a Mais” (Per Qualche
Dollaro in Più), com o salário de Clint Eastwood passando para 50 mil dólares
para praticamente repetir o personagem criado no filme anterior. Novo sucesso
estrondoso de bilheteria, não só na Itália, mas praticamente em toda Europa. A
esta altura, os westerns italianos rodados no Sul da Espanha eram contados às
dezenas, mas não se comparavam àqueles dirigidos por Sergio Leone. Isso levou
ao terceiro filme da série que se convencionou chamar de ‘Trilogia dos Dólares’,
novamente com Clint Eastwood como astro, mas ao preço de 250 mil dólares, além
de uma novíssima Ferrari 275 GTB. Com os também norte-americanos Lee Van Cleef e Eli
Wallach no elenco e com Leone cada vez mais criativo e com orçamento de um
milhão de dólares, “Três Homens em Conflito” (Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo)
superou em bilheteria os filmes anteriores. Verdadeiro fenômeno de público,
Clint Eastwood se tornou um nome equivalente ao de Marcello Mastroianni, mas
frustrado pois em Hollywood ele continuava um ilustre ninguém.
A
Trilogia chega aos States - Era impossível ignorar os sucesso da
‘Trilogia dos Dólares’ que segundo números divulgados havia levado mais de 50
milhões de espectadores aos cinemas só na Itália. A United Artists adquiriu
então os direitos de exibição de “Por um Punhado de Dólares” nos Estados
Unidos, lançando o western no dia 18 de janeiro de 1967. Ao contrário da
crítica que detestou o filme de Sergio Leone, o público o transformou no
western de maior sucesso daquele ano, rendendo 3,5 milhões de dólares. Os mais
renomados críticos cinematográficos dos Estados Unidos, sem mencionar os
nomes de Leone e Eastwood, escreveram resenhas nada simpáticas ao filme como
estas:
Bosley Crowter (New York Times) – A
melhor definição para este filme é um Western brega.
Judith Christ
(World Journal Tribune) – Inteiramente horrendo. Homens
e mulheres são espancados, queimados, pisoteados e esfolados até a morte.
Philip K. Scheuer (Los Angeles Time) – Filmado
na Espanha, uma pena que esse filme não tenha sido enterrado lá mesmo.
Newsweek – Filme terrivelmente estúpido.
Críticas
desprezíves - Aproveitando o sucesso de “Por um Punhado de Dólares”,
sem perda de tempo a United Artists lançou “Por uns Dólares a Mais” nos Estados
Unidos em maio de 1967. O público ávido por conhecer mais daquele novo estilo
de faroestes lotou os cinemas como havia feito com o lançamento anterior. Este
segundo western europeu de Clint Eastwood rendeu em seu lançamento na América
4,3 milhões de dólares. Clint já havia deixado de ser um estranho e passou a
ser cobiçado por produtores de Hollywood espantados com o carisma daquele ator
que nunca havia chamado a atenção anteriormente. Já a crítica redobrou os
vitupérios tanto sobre “Por uns Dólares a Mais” quanto a Clint Eastwood, a quem
decididamente detestava. Escreveram então coisas assim:
Bosley Crowther (The New York Times) – O matador
interpretado por Clint Eastwood é uma máquina de matar sem nenhum
arrependimento. Mr. Leone encena violência sobre violência e enche a tela com
hediondas fantasias mortais.
Judith Christ (NBC Today Show) – Um tratado
para necrófilos. O diretor deveria ser açougueiro.
Tanto Crowther quanto Judith sabiam que
havia ainda um terceiro western a ser lançado...
‘Uma
boa surra em Leone’ - O crítico Andrew Sarris do ‘Village
Voice’ destoava de seus colegas pois havia percebido o talento de Sergio Leone.
Sarris, defensor ardente da teoria do diretor como ‘autor’ de seus filmes,
sabia que Leone era um artista criativo e original, imprimindo a seus filmes um
estilo que faria escola. Referindo-se a “Três Homens em Conflito”, Sarris
escreveu esta frase lapidar: “O western, como a água, ganha sabor com as
impurezas”. Antes que “Três Homens em Conflito” fosse lançado nos
Estados Unidos, Andrew Sarris já havia assistido ao filme na Europa e ficara
admirado com o que vira. Já outros críticos não pouparam resenhas negativas como
estas:
Charles
Champlin (Los Angeles Times) – Não posso resistir ao trocadilho de chamar
este filme de ‘O Mau, o Enfadonho e o Interminável’, porque é isso que ele é.
Pauline Kael (The New Yorker) – Filme
estúpido e macabro que não merece ser classificado como western.
Time – Sergio Leone merece uma boa surra
por se atrever a invadir o solo sagrado do western norte-americano.
Renata Adler (The New York Times) – O Carbonizado,
o Logrado e o Destroçado, esse seria o título mais apropriado para o mais repelente
filme da história do gênero western. Duas horas e meia de filme inteiramente
sem sentido.
Clint
entre os grandes de Hollywood - O público, como era de se esperar,
fez os donos de cinemas e a United Artists ainda mais felizes com as
bilheterias extraordinárias que superaram as dos dois outros westerns,
atingindo a expressiva soma de 6,3 milhões de dólares. Clint Eastwood, que fora
para a Itália sem nenhuma esperança de ter oportunidade em Hollywood, era, aos
37 anos de idade, um ator tão cobiçado quanto John Wayne, Lee Marvin, Paul
Newman, Sidney Poitier, Steve McQueen, Sean Connery, Paul Newman e a então
campeã de bilheterias Julie Andrews. A Colúmbia iria produzir o western “O Ouro
de Mackenna” (Mackenna’s Gold) ao custo de sete milhões de dólares e queria Eastwood
no papel principal. Mas Clint tinha outros planos para seu
retorno à capital do cinema e, ainda bem, não participou dessa artisticamente
fracassada superprodução.
Aniversário de John Wayne e ao redor do Duke que corta um bolo estão Lee Marvin, Clint Eastwood, Rock Hudson, Fred MacMurray, James Stewart, Ernest Borgnine, Michael Caine e Laurence Harvey. |
A criação da
Malpaso - Contatado também por Warner Bros., Paramount, Universal e United
Artists, Clint Eastwood acabou firmando parceria para seu primeiro filme nos
Estados Unidos com a United Artists. Era um tempo em que todos os grandes
astros possuíam sua própria produtora atuando em parceria com os estúdios
distribuidores. Clint Eastwood fundou então a Malpaso, sua companhia produtora,
cujo escritório era uma espaçosa sala com apenas três funcionários (Malpaso
significa em Espanhol ‘passo mal dado’). O contrato com a United Artists
determinava que Clint Eastwood receberia o salário de 400 mil dólares e ainda
metade dos lucros do filme, deduzidas as despesas de distribuição. O roteiro
escolhido por Clint Eastwood denominava-se “Hang ‘Em High”, título do filme que
no Brasil foi chamado de “A Marca da Forca”. Bem sucedido nas bilheterias, este
western foi o primeiro de uma série de filmes com Clint Eastwood como astro,
muitos deles dirigidos pelo próprio Clint que já em 1968 foi o 5.º ator da
lista do Top-Ten Money Making Stars daquele ano.
Os prêmios Oscar de Melhor Diretor e Melhor Filme por "Os Imperdoáveis". |
Premiado
produtor-diretor - Por outros 20 anos Clint Eastwood esteve sempre
presente à lista dos atores que mais faturavam nas bilheterias, com as seguintes colocações: 5.º/1969; 2.º/1970; 2.º/1971; 1.º/1972; 1.º/1973; 2.º/1974; 6.º/1975; 4.º/1976; 3.º/1977; 5.º/1978; 2.º/1979; 3.º/1980; 2.º/1981; 2.º/1982; 1.º/1983; 1.º/1984; 3.º/1985; 7.º/1986; 8.º/1992; 1.º/1993. Os
antigos críticos morreram ou se aposentaram e os novos se renderam ao talento
de Clint Eastwood reconhecendo o muito bom ator que ele sempre foi, candidato
por duas vezes ao prêmio Oscar de Melhor Ator. Clint recebeu o Oscar de Melhor
Diretor por “Os Imperdoáveis” e dois dos filmes que dirigiu foram premiados com
o Oscar de Melhor Filme do Ano: “Os Imperdoáveis” e “Menina de Ouro”. Às outras
duas indicações para Melhor Filme do Ano (“Sobre Meninos e Lobos”, “Cartas de
Iwo-Jima”) veio a se juntar uma quinta indicação em 2015 com “Sniper Americano”.
Prestes a completar 85 anos de idade, Clint Eastwood deve estar rindo de quem
duvidava que ele venceria em Hollywood após se tornar astro do western spaghetti.
Pobres críticos...
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