Produção econômica e descuidada - A Republic Pictures, conhecida como ‘A Casa dos Seriados’ e onde foram produzidos alguns dos grandes clássicos desses filmes, usou até onde pode a figura de El Zorro, até que a Disney se apropriou do personagem criado por Johnston McCulley. Mas se havia algo que a Republic sabia fazer melhor que ninguém, além de bons seriados, era resolver as dificuldades a seu modo. Se não era mais possível usar o El Zorro, que se criasse outro mocinho com as mesmas características e foi assim que nasceu ‘El Látego’, que a criançada falava ‘El Latêgo’. Ronald Davidson elaborou o roteiro e Franklin Adreon produziu e dirigiu com a costumeira economia que o estúdio não abria mão de praticar. A começar pelo traje do herói, em tudo parecido com o que foi usado por Linda Stirling em “O Chicote do zorro” (Zorro’s Black Whip), de 1944. Sequências de arquivo foram utilizadas em profusão, como era prática comum nos seriados, mas neste há até uma sequência de flash-back ocupando boa parte de um episódio. Seriados westerns eram mais baratos porque as externas eram filmadas logo ali em Alabama Hills ou no Iverson Ranch, mas percebe-se neste “A Vingança do Látego” que a maior parte das externas, quando não de arquivo, foram feitas mesmo no terreno do estúdio, sem o menor cuidado com o cenário que se altera durante uma mesma sequência.
Nos mais de 40 anos em que Hollywood
produziu seriados o gênero western raramente deixou de ter pelo menos um
exemplar anual para alegria dos fãs de aventuras passadas no Velho Oeste. Buck
Jones foi, entre os mocinhos famosos, o que mais estrelou seriados westerns,
num total de seis e Johnny Mack Brown o seguiu de perto com quatro desses
filmes em capítulos. Este blog faz pela primeira vez uma resenha de um seriado
e o escolhido foi o último do gênero faroeste produzido pela Republic Pictures:
“A Vingança do Látego”, de 1954. Como se sabe os seriados da década de 50 são
considerados dos mais fracos, mas para mim este que é focalizado tem um
significado muito especial pois foi o último que assisti nas matinês dominicais
do Cine Marconi, situado à Rua Correa de Melo, no Bom Retiro, em São Paulo. O
ano muito distante era o de 1955. Foi o útimo porque a partir de então não mais
aquele pequeno cineminha com cadeiras de madeira exibiu outro seriado, para
tristeza da garotada que os adorava e não perdia um episódio desse tipo de
filme. O amigo Sebá Santos me providenciou uma cópia de “A Vingança do Látego”
e matei a saudade das aventuras daquele cavaleiro mascarado que parecia mas não
era o Zorro, imagens que nunca saíram da minha lembrança e que não poderiam
deixar de ser comentadas aqui no Westerncinemania.
Mocinho que monta bem e briga mehor - A economia se estendeu na escolha do elenco com os principais personagens sendo interpretados por nomes pouco conhecidos do público, à exceção de Roy Barcroft que tem pequena participação, desta vez como sheriff, aparecendo apenas no 8.º capítulo e depois no 10.º e 12.º. O herói mascarado foi vivido por Dick Simmons (foto ao lado), ator então com quase 20 anos de carreira e que só viria a se tornar mais conhecido ao interpretar o ‘Sargento Preston’, da série de TV “O Rei da Polícia Montada” (1955/1958), atuando como Richard Simmons. Dick montava bem, brigava melhor ainda, tinha ótima voz e isso bastava para compensar sua total falta de carisma. Barbara Bestar foi a mocinha, com pouco a fazer na aventura. O trio de vilões foi interpretado por Dale Van Sickel, Lane Bradford e Mauritz Hugo, sendo que nas sequências de ação em que Van Sickel e Bradford travavam luta corporal com Dick Simmons, eram eles próprios que lutavam, dispensando os dublês. Tom Steele, além de fazer figuração como membro da quadrilha, vestia a roupa do Látego e enfrentava os bandidos com sua excepcional forma atlética.
De olho nas terras dos índios - Produzido em 12 episódios, “A Vingança do Látego” narra o interesse de Barnett (Mauritz Hugo, na foto ao lado), dono do saloon, em se apropriar das terras da reserva onde vivem os índios. Para isso tenta instigar os habitantes da cidade contra os nativos. Barnett sabe que nessas terras há ouro e daí o seu interesse, contando com o trabalho de seu capanga Crane (Dale Van Sickel) e de Tosco (Lane Bradford), um índio renegado. Barnett não contava era com a interferência de Jerry Randall (Dick Simmons) que se posiciona a favor dos índios protegendo-os. Para ganhar a simpatia dos pele-vermelhas Randall faz reviver a figura lendária de 'El Latego' que no passado teria sido grande amigo dos índios. Crane e Tosco dão trabalho a Randall durante todos os doze capítulos. Randall conta com as informações de Nancy Cooper (Barbara Bestar) a professora da escola local, mas enfrenta os criminosos sozinho, ou melhor, armado com seu Colt e chicote. Ao final a quadrilha é desbaratada e a paz volta a reinar entre brancos e índios. (Nas fotos abaixo vemos Dale Van Sickel com Mauritz Hugo e Lane Bradford com Hugo)
Ricochete no feno - Uma curiosidade é o título deste seriado que diz que o chicote seria de aço quando de fato, e não poderia ser diferente, ele é feito de couro. E muito bem manuseado por Dick Simmons. “A Vingança do Látego” foi filmado em inacreditáveis 18 dias, entre 2 e 22 de março de 1954 (excluídos os domingos), ao custo exíguo de 175 mil dólares. Mesmo contando com técnicos de reconhecida qualidade como o cinegrafista Bud Thackery e os irmãos especialistas em efeitos especiais Howard e Theodore Lydecker, há uma sequência que provoca risos. É quando El Látego troca tiros com os bandidos dentro de um celeiro e um dos tiros acerta um monte de feno e ouve-se nitidamente o ricochetear da bala. Pela primeira vez no cinema um tiro ricocheteou no feno, ótima gag para uma comédia dos Três Patetas, mas não para um western sério, ainda que para um público menos exigente. (Nas fotos vemos Lane Bradford em luta contra El Látego; abaixo El Látego rendendo Lane Bradford e Dale Van Sickel; Van Sickel tentando matar El Látego com um enorme garfo de feno).
65 anos depois El Látego em ação - Embora a história resvale na violência contra os nativos, sempre motivada pela ganância dos brancos, não há crítica alguma direta à questão, mesmo o cinema já tendo apresentado westerns como “O Caminho do Diabo” (Devil’s Doorway) e “Flechas de Fogo” (Broken Arrow). Afinal seriados não se propunham a discutir temas como esse. Os seriados, quando assistidos em contexto diferente daqueles para o qual foram propostos, as matinês para crianças e jovens, sempre funcionam de modo diferente. E nem poderia ser de outra maneira. Mas a criatividade, excelentes sequências de ação e alta qualidade técnica continuam admiráveis mesmo aos olhos de adultos, inevitavelmente mais críticos. Porém este “A Vingança do Látego”, mesmo com a carga emotiva da nostalgia de quem o assistiu no cinema há 65 anos, não resiste e ao revê-lo torci para que chegasse logo ao fim. Até porque há tantos e melhores seriados westerns para serem assistidos, como por exemplo “A Tribo Misteriosa” (Daredevils of the West), também da Republic Pictures e estrelado pelo grande Allan ‘Rocky’ Lane. (Na foto Dick Simmons como El Látego).
Pat Hogan e Roy Barcroft
Grande presente de ano novo a volta do blog e vem com um resumo de um seriado coisa que eu assisti muito e gostava (mas já quando passava na tv nos anos 60). Parabéns pela postagem e bom retorno
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