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Burt Reynolds |
Burt Reynolds foi um daqueles poucos
atores de seu tempo que percorreu uma a uma todas as etapas até se tornar o
grande campeão de bilheterias entre meados de 1970 e 1980. Antes de, por cinco
vezes seguidas, ser o ator mais rentável de Hollywood Reynolds atuou bastante
na TV. De 1962 a 1965 ele interpretou o jovem cowboy ‘Quint’ na série
“Gunsmoke”. Mesmo com o sucesso do personagem, que logo se tornou o preferido
do público feminino, as oportunidades no cinema não eram as esperadas e, assim
como ocorreu com Clint Eastwood, Burt Reynolds aceitou o aceno vindo de
Cinecittà. Dirigido por Sergio Corbucci ele foi “Joe, o Pistoleiro Implacável”
(Navajo Joe), de 1966, impressionando favoravelmente nesse excelente faroeste.
Como os westerns spaghetti não eram exibidos nos Estados Unidos, o que somente
passou a ocorrer após o estrondoso sucesso da Trilogia dos Dólares de Sergio
Leone, o público norte-americano demorou a ‘descobrir’ que Burt Reynolds era
não uma ‘prata da casa’, mas verdadeiramente (e assim como Clint) ‘ouro da
casa’. Em Hollywood, depois de “Sam Whiskey, o Proscrito” (Sam Whiskey), de
1969 e outras produções menos expressivas, veio a oportunidade de atuar no
filme que o transformou indiscutivelmente em grande astro, que foi “Amargo
Pesadelo” (1972). Daí para a frente o nome de Burt Reynolds passou a ser
sinônimo de sucesso, ele que se tornou o novo sex-symbol de Hollywood. Com esse
status podia escolher seus papéis e decidiu fazer outro western contatado que
foi para protagonizar “The Man Who Loved Cat Dancing”, baseado no livro de
Marilyn Durham. Os produtores vislumbraram que esse primeiro trabalho da
escritora resultaria num filme bem sucedido e para fazer o par romântico com
Reynolds foi chamada a atriz inglesa Sarah Miles, em evidência após o êxito de
“A Filha de Ryan”.
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Sarah Miles e Burt Reynolds |
O
amor por Cat Dancing - Intitulado no Brasil “Amor Feito de
Ódio”, o western conta a história de Wesley Jay Grobart (Burt Reynolds) que foi
casado com a índia Cat Dancing, com quem teve dois filhos. Cat Dancing foi
estuprada por um homem e Grobart, acreditando que ela tenha sido adúltera, vinga-se
assassinando a ambos, sendo preso e condenado. Libertado Grobart reúne um bando
formado por Dawes (Jack Warden), Billy Bowen (Bo Hopkins) e o mestiço Charlie
Bent (Jay Varela). O bando assalta um trem roubando cem mil dólares e na fuga
os bandidos são forçados a levar junto Catherine Crocker (Sarah Miles), mulher
que vagava a cavalo após ter abandonado o marido Willard Crocker (George
Hamilton). Catherine passa a ser um estorvo por retardar a fuga do bando e
ainda por ser assediada por Dawes e Billy, sendo protegida por Grobart, o líder
do bando e por quem Catherine se apaixona sem ser correspondida pois Grobart
nunca esqueceu Cat Dancing. Uma patrulha sob o comando do xerife Harvey
Lapchance (Lee J. Cobb) segue na captura da quadrilha e à patrulha se junta
Willard que procura pela esposa acreditando ter sido ela sequestrada. O bando
se desentende e ao final apenas Grobart permanece vivo. Grobart corresponde
enfim ao amor de Catherine justamente quando são alcançados pela patrulha.
Willard percebe que sua esposa agora pertence a Grobart e este é ferido no
confronto com os homens de Lapchance. Willard se prepara para desferir o tiro
fatal no desafeto quando Catherine alveja o marido matando-o. Lapchance
recupera o dinheiro roubado e deixa Grobart seguir livre com Catherine.
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Marilyn Durham |
Problemas
sem fim - Quando um filme tem tudo para dar errado dificilmente ele
dará certo e foi o que aconteceu com este western. Inicialmente Brian G. Hutton
deveria ser o diretor, chegando até a colaborar no roteiro, desistindo porém da
empreitada; foi então sondado o nome de um jovem diretor chamado Steven
Spielberg que também não gostou da história e recusou a proposta. Richard C.
Sarafian, diretor egresso da TV e que ainda saboreava o inesperado pequeno
sucesso de “Corrida Contra o Destino”, filme que se tornara instantaneamente
‘cult’, aceitou dirigir “Amor Feito de Ódio”. A história de Marilyn Durham já
havia passado por diversas mãos de roteiristas, sendo então definida a versão
de Eleanor Perry para ser filmada. Ocorre que Sarah Miles exigiu que seu marido
Robert Bolt reescrevesse os seus diálogos. Bolt era o premiado roteirista de
“Lawrence da Arábia”, “Doutor Jivago”, “O Homem que Não Vendeu Sua Alma” e “A
Filha de Ryan” e trabalhou sem crédito. Iniciadas as filmagens em Gila Bend, no
Arizona, ocorreu a morte de David Whiting, secretário de Sarah Miles, morte
jamais devidamente esclarecida, ainda que tenha se falado em suicídio e também
overdose por drogas. Whiting e Sarah eram amantes e o rapaz desconfiou que
Sarah e Burt Reynolds estavam tendo um caso. Como não poderia deixar de ser a
imprensa sensacionalista explorou ao extremo a tragédia. Mesmo com um stuntman
renomado como Al Needham comandando a equipe de substitutos, Burt Reynolds e
Jack Warden dispensaram dublês para a brutal sequência de luta entre seus
personagens e como resultado Reynolds passou uma semana no hospital após ganhar
uma hérnia com o esforço despendido, atrasando as filmagens. Mas nada do que
aconteceu foi pior que o equívoco de ter a inglesa Sarah Miles como a mulher
independente faz o rude homem do Oeste esquecer Cat Dancing.
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Sarah Miles e Burt Reynolds; Jack Kruschen e Burt Reynolds |
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Sarah Miles e George Hamilton |
Escolhas
equivocadas - Marilyn Durham era uma escritora feminista e quando seu
livro foi publicado, em 1972, chamou a atenção justamente por ter como
protagonista uma mulher liberada que não vacila em abandonar o repressivo
marido abastado. No decorrer da história é essa mulher quem enlouquece
componentes do bando a ponto de ser currada por um deles, momento chave do
filme que no entanto resultou inconvincente por não possuir Sarah Miles a
necessária sensualidade para atrair e a tenacidade para resistir. A confusa (no
filme) passagem da morte da índia Cat Dancing, passagem à qual apenas se faz
referências, seria uma analogia com o estupro posteriormente cometido por
Dawes. Nada funciona porque Sarah é delicada demais e sua languidez a impede de
emanar o erotismo que a personagem exigia. Tivesse a atriz inglesa uma pequena
dose da lascívia que Claudia Cardinalle exibe em “Os Profissionais” (The
Professionals) e a narrativa seria crível, mais ainda porque a história de
Marilyn Durham guarda certas semelhanças com a trama do filme de Richard Brooks
de 1966. Voltando ao escândalo que envolveu os bastidores de “Amor Feito de
Ódio”, especulou-se sobre a possível relação amorosa entre Reynolds e Sarah
Miles, que pode ter ocorrido de fato já que o ator era então o homem mais
desejado do cinema. Mas no filme não se vê a menor química entre ambos e aí que
o faroeste decai. Além de Sarah Miles, George Hamilton também foi um escolha
errada como o vingativo marido abandonado, a não ser que o espectador acredite
ser o simpático ator capaz de brutalidades inenarráveis.
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Sarah Miles e Burt Reynolds |
Inesperado
‘happy end’ - “Amor Feito de Ódio” caminha bem em sua primeira metade
mesmo com Sarah Miles destruindo sua personagem. Entre os bons momentos
filmados por Sarafian está a ótima sequência do assalto ao trem, que é seguida
pelos esperados desentendimentos entre o bando. Bo Hopkins repete o jovem
idiotizado de “Meu Ódio Será Sua Herança” (The Wild Bunch) e Jack Warden vai
pouco a pouco se revelando um bandido assustador pela violência. Depois de
quebrar as costelas de Hopkins em uma luta corporal, se defronta em outro
momento brutal desta vez contra Burt Reynolds e como este é o herói da história
abate o opositor. Com o bando exterminado e restando apenas o amargurado e
introspectivo Jay Grobart (Reynolds) a história perde o rumo com Grobart
visitando a tribo onde estão seus dois filhos. Tem lugar então cansativas
reflexões e revelações por parte dos amigos índios de Grobart, bem como a
pretensa justificativa da razão que o teria levado a assaltar um trem.
Catherine (Miles) torna-se amável e submissa e a patrulha comandada por Lee J.
Cobb não se esforça muito para encontrar o casal remanescente da fuga até o
desfecho inesperadamente feliz.
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Burt Reynolds |
Reynolds
pré-‘Bandit’ - O melhor deste western é a presença de Burt Reynolds como
o homem ríspido que se revela amargurado pelo passado trágico. Jack Warden igualmente
está ótimo como o mais agressivo bandido, enquanto Lee J. Cobb aparece sem
oportunidade de exibir sua característica exasperação, o que o torna um ator menos
interessante. Sarah Miles chega até a exibir parte de sua nudez e mesmo nisso é
pouco natural; fazê-la andar a cavalo segurando uma sombrinha lembrando a
protagonista de “A Filha de Ryan” é risível. Jay Silverheels quase
irreconhecível como um envelhecido chefe índio com uma vasta cabeleira branca.
A cinematografia de Harry Stradling Jr. é eficiente e o mesmo não se pode dizer
da trilha sonora musical de John Williams. Originalmente Michel Legrand havia composto
a trilha musical para este western, trabalho que foi inteiramente vetado, sendo
suas composições substituídas pelas de Williams. Burt Reynolds, que como poucos
retratava com perfeição um cowboy, aduziu a esse tipo uma dose grande de
cinismo e irreverência e conquistou Hollywood como o ‘Bandido’ da série de
aventuras que começou com “Agarre-me se Puderes” e fez dele um astro de
primeiríssima grandeza nem sempre reconhecido por seu talento interpretativo. “Amor
Feito de Ódio” possibilita ver esse Burt Reynolds.
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Bo Hopkins e Sarah Miles; Jay Silverheels; Sarah Miles e Jack Kruschen |
Como encontrar este filme para baixar. Não encontro em nenhum site.
ResponderExcluirUm belo western na época de crise do gênero, onde tanto o modelo original ,norteamericano, como o subgênero básico, spaghetti Western estavam esgotados, sendo liquidado, ao menos momentaneamente, no início da década de oitenta, com o fracasso do Portal do Paraíso. Sarah Miles, no auge de sua beleza, foi uma das minhas paixões, na adolescência, a ponto de para vê-la, revi o filme duas vezes em um programa duplo do antigo cinema Marabá, de Porto Alegre. Luiz Armando Xavier Appel
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