Henry Hathaway (acima); John Ford dirigindo Carroll Baker e George Peppard; George Marshall |
Na década de 50 o cinema perdia
celeremente terreno para a televisão e como saída passou então a buscar formas
de atrair o público que preferia o conforto da poltrona em casa mesmo que
diante da pequena e ainda chuvisquenta telinha. Foram criados então o
Cinemascope e a 3.ª Dimensão sendo que antes deles havia aparecido o Cinerama,
em 1952. Utilizado inicialmente para documentários, em 1961 ocorreu a
experiência de se fazer um filme com história e atores quando a MGM realizou na
Europa “O Mundo Maravilhoso dos Irmãos Grimm”. A mesma MGM que vinha apostando
em grandes produções como “Ben-Hur” e “Cimarron” para levar mais espectadores
ao cinema, decidiu produzir um western utilizando o processo Cinerama que não
era mais uma novidade, a não ser para os diretores e cinegrafistas de cinema
que desconheciam os pesados equipamentos necessários para o processo. O projeto
da MGM recebeu o título “How the West Was Won” (A Conquista do Oeste) e era tão
ambicioso que nada menos que três diretores foram contratados para dirigir o
filme que seria dividido em partes. Esses diretores eram os conceituados John
Ford, Henry Hathaway e George Marshall, todos acostumados com o gênero. O
elenco reunido para esse western era praticamente metade da constelação de
astros e estrelas de Hollywood, tudo para contar a saga da família Rawlings que
se estende por meio século, de 1839 a 1889, o período em que o Oeste foi
conquistado, como sugere o título. James R. Webb, roteirista dos bem sucedidos
comercialmente “Vera Cruz” e “Da Terra Nascem os Homens” (The Big Country)
escreveu o roteiro dividido em cinco segmentos: ‘Os Rios’, ‘As Planícies’, ‘Os
Bandidos’ (os três dirigidos por Henry Hathaway), ‘A Guerra Civil’ (John Ford)
e ‘A Estrada de Ferro’ (George Marshall). Como a intenção era realizar o’
faroeste definitivo’ o projeto foi orçado em 12 milhões de dólares, chegando
aos 15 milhões, mas o filme rendeu mais de 50 milhões de dólares quando de seu
lançamento, transformando-se em grande sucesso.
Debbie Reynolds, Karl Malden, Carroll Baker e Agnes Moorehead; centro: George Peppard, Debbie Reynolds e Carolyn Jones; Rodolfo Acosta, Jack Lambert, Harry Dean Stanton e Eli Wallach |
Dos
pioneiros aos bandidos - Os cinco segmentos de “A Conquista
do Oeste” procuram contar como se deu o heroísmo dos pioneiros narrando inicialmente
o encontro de Zebulon Prescott (Karl Malden) com Linus Rawlings (James
Stewart). Zebulon leva a família da Nova Inglaterra para o Oeste em uma barcaça
lotada com outras famílias através do Erie Canal. Linus, um caçador de peles,
se casa com Eve Prescott (Carroll Baker), uma das filhas de Zebulon e o casal
adquire uma fazenda onde se estabelece. Lilith (Debbie Reynolds), a irmã de Eve
vai para São Francisco onde se exibe como cantora e dançarina nos palcos da
cidade. Lilith é cortejada pelo jogador Cleve (Gregory Peck) e pelo chefe de
caravanas Roger (Robert Preston), preferindo o primeiro. Em 1862 Linus
participa como Capitão do Exército da União da sangrenta Batalha de Shiloh,
morrendo durante o combate. Seu filho Zeb (George Peppard) parte então para a
Guerra Civil onde evita uma tentativa de assassinato do General Grant (Harry
Morgan). Finda a Guerra Civil Zeb, agora como Tenente é destacado para
acompanhar a implantação da ferrovia Central Pacific que atravessa terras dos
índios, que se rebelam e atacam a ferrovia. Zeb desliga-se do Exército e se
torna xerife, defrontando-se com o fora-da-lei Charlie Gant (Eli Wallach) e seu
bando quando estes atacam um trem que carrega passageiros e valores.
Debbie Reynolds e Gregory Peck |
A
técnica prejudicando a história - Um filme dividido em episódios e
dirigido por diferentes diretores teria uma dificuldade inicial a superar que seria
a própria unidade da história, mais ainda quando ela abrange meio século e
focaliza eventos importantes da ‘conquista do oeste’. Porém não foi esse o
maior obstáculo para que este arrojado projeto cinematográfico resultasse em um
bom filme e sim o uso da técnica diferente que mais que beneficiar a produção lhe
trouxe prejuízos. Quanto mais as revoluções tecnológicas ganham importância na
produção de filmes mais perde espaço a arte interpretativa e o aspecto humano
que ela transmite. Muito se escreveu sobre o incômodo dos três diretores e dos
atores com os pesados equipamentos que eram as câmeras do processo Cinerama. E
se as empolgantes imagens de ação (sempre com dublês substituindo os atores) e
as espetaculares tomadas panorâmicas impressionam, o filme cai verticalmente quando
ocorrem as sequências dialogadas. O admirável elenco reunido, com atores do
porte de Henry Fonda, Richard Widmark, Gregory Peck, Agnes Moorehead e muitos
outros, têm seus personagens mal desenvolvidos, entrando e saindo da história
sem praticamente nada acrescentar a ela. E parte da culpa cabe ainda a James R.
Webb, responsável pelos diálogos que formam um grande conjunto de frases feitas,
algumas vezes insossas e que pouco dizem.
Henry Fonda |
Segmentos
fracos - Um episódio da maior importância, por sinal o único historicamente
real que foi a Guerra Civil, teve como diretor o aclamado John Ford. Deixa esse
segmento a impressão de ter sido feito às pressas e sem a marca poética,
característica de Ford, mesmo em se tratando de um drama familiar passado no encarniçado
conflito. E sabe-se que sequências de combate que surgem na tela foram tirados
de cenas não utilizadas em “O Álamo” (The Alamo) e em A Árvore da Vida
(Raintree County), de 1957. Outro episódio que deixa a desejar é o que trata da
ferrovia e no qual os personagens de Henry Fonda e Richard Widmark parecem
perdidos entre os confusos diálogos. Compensa nesse episódio o estouro da
manada de búfalos promovido pelos índios no ataque ao canteiro de obras da
Central Pacific. É neste episódio que melhor se nota a dificuldade dos atores em
relação à câmera central (eram três câmeras no processo Cinerama), situada
muito próxima do ator.
Richard Widmark; John Wayne e Harry Morgan |
Sequências perigosas com George Peppard e dublês. |
Embate
emocionante - Os demais segmentos ficaram a cargo de Henry Hathaway que
se saiu melhor não só porque contou com um roteiro mais plausível como também
por sua reconhecida competência. Nada razoável é James Stewart passar por um
caçador capaz de manter um romance com a jovem Carroll Baker, o que é esquecido
com a ótima sequência em que a jangada com os Prescotts é levada pela
correnteza. Em seguida é Debbie Reynolds que centraliza o episódio em que é
disputada pelo ótimo Robert Preston e por Gregory Peck, triângulo que se
prolonga e dá espaço à presença de Thelma Ritter. Esta, nos poucos momentos em
que está na tela, demonstra que bem poderia ser melhor aproveitada pela graça
que incute à personagem. É nesse episódio que ocorre outra ótima sequência (de
ação) com o ataque dos índios à caravana. Se um nome do elenco pudesse ter
maior destaque em razão da importância de seu personagem este seria George
Peppard que transita por três episódios, inclusive o segmento final denominado
‘Os Foras-da-Lei’, como xerife. É essa parte que apresenta o ponto alto do
filme com o embate entre o bando de Charlie Gant e o xerife Rawlings, este ao
lado do delegado Lou Ramsey (Lee J. Cobb), com o trem em movimento. Esta é
daquelas sequências que vistas em tela pequena não atingem a dimensão com que
foram concebidas mas ainda assim impressiona sobremaneira. O realismo exigido
por Hathaway mostra George Peppard em situações de grande risco, pendurado por
uma corrente em toras prestes a rolar do vagão. Peppard teve como dublê Bob
Morgan (então marido de Yvonne De Carlo) e foi nessa sequência que Morgan
sofreu um acidente e teve a perna decepada.
Debbie Reynolds e Thelma Ritter |
Atores
mal aproveitados - Eli Wallach repete os trejeitos do
bandido ‘Calvera’ que criou em “Sete Homens e um Destino” (The Magnificent Seven),
ele que ficaria célebre como outro bandido, o ‘Tuco’ pelas mãos de Sérgio
Leone. Se Wallach teve realce, Lee Van Cleef, que interpreta um pirata dos
rios, não era ainda nome merecedor de maior atenção. Poucos anos depois, assim
como ocorreu com Eli Wallach, Lee Van Cleef se tornaria grande atração por
atuações em westerns spaghetti. Mesmo com quase três horas de duração “A
Conquista do Oeste” não permite que bons atores apareçam por mais tempo ou
mesmo tenham alguma fala, caso de Harry Dean Stanton e do menos conhecido Jack
Lambert. Raymond Massey não faz mais que uma ponta no episódio dirigido por
John Ford e Walter Brennan quase irreconhecível como um pirata dos rios.
Spencer Tracy deveria atuar mas por problemas de saúde foi apenas o narrador,
enquanto Richard Thorpe não recebeu crédito pelas sequências de transição entre
os segmentos. sequências que ele dirigiu.
Filme
para tela grande – Foi grande o sucesso deste épico,
especialmente nos Estados unidos e na Inglaterra. Em Londres o filme permaneceu
123 semanas em cartaz no mesmo cinema que o exibia no processo Cinerama.
Assistido em telas pequenas perde-se, inevitavelmente como acontece com muitos
filmes de concepção monumental, muito da grandeza épica que “A Conquista do
Oeste” pretendeu ter com a exuberância das imagens feitas nos magníficos
cenários do Oeste norte-americano. As versões lançadas em VHS e DVD foram
apresentadas em formatos que prejudicaram enormemente o impacto do filme. Foi
lançada há pouco tempo uma versão em Blu-Ray que mantém, segundo o cinéfilo
Sebá Santos, as incômodas faixas dividindo a tela em três. No entanto há
comentários que atestam que esse é um dos melhores filmes para serem assistidos
em Blu-Ray. Confesso que não vi essa versão.
Nunca
o ‘western definitivo’ - As imponentes imagens capturadas por
quatro cinegrafistas são realçadas pela música inspirada ainda que um tanto
suntuosa e intrusiva de Alfred Newman. Indicado em oito categorias para o
Oscar, entre elas a de Melhor Filme e Melhor Score Musical, “A Conquista do
Oeste” abiscoitou somente os prêmios de Melhor Edição, Melhor Som e Melhor
Roteiro (escrito diretamente para o cinema). Longe de ser um western ruim, “A
Conquista do Oeste” não consegue ser o filme definitivo sobre o gênero como
pretendia sua produção. E o meio termo dá razão àqueles que defendem a tese que
um western, quanto mais simples melhor.
Debbie Reynolds e Carroll Baker |
James Stewart e Eli Wallach |
Indiscutivelmente o western mais completo e visualmente deslumbrante já feito e, certamente, entre os 20 melhores do gênero americano por excelência!
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