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Samuel Fuller |
Trabalhando com pequenos orçamentos no
início de carreira, Samuel Fuller construiu uma invejável reputação como
diretor e como roteirista de seus filmes. Ganhando a confiança dos produtores,
Fuller realizou mais tarde o admirado “Dragões da Violência” (Forty Guns) e o
superestimado “Renegando Meu Sangue” (Run of the Arrow), ambos de 1957. Do que
Samuel Fuller nunca abriu mão foi de criar alguma polêmica com seus filmes e
isso pode ser comprovado já em sua estreia como diretor, em 1949, quando
dirigiu “Eu Matei Jesse James” (I Shot Jesse James). Tendo assinado contrato com
a produtora de Robert L. Lippert para dirigir três filmes (todos por ele
próprio roteirizados), Fuller em apenas dez dias de filmagens e com elenco e
técnicos que o orçamento podia pagar entregou este western que se interessa
menos por Jesse James e mais por aquele que passou para a história como seu ‘covarde
assassino’.
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Barbara Britton com John Ireland (acima) e com Preston Foster. |
Tudo
por uma mulher - Após um frustrado assalto comandando sua quadrilha, Jesse
James (Reed Hadley) reassume sua vida disfarçado como o pacato Tom Howard,
homem casado e pai de filho que vive em St. Joseph, no Missouri. Abrigam-se na
casa de James seu irmão Frank (Tom Tyler) e os irmãos Ford - Robert (John
Ireland) e Charles (Tommy Noonan) - seus amigos. Robert Ford pretende se casar
com a atriz Cinthy (Barbara Britton) e vê na recompensa de 10 mil dólares
estipulada pela captura ou morte de Jesse James a possibilidade do matrimônio e
início de uma vida honesta. Mais ainda depois de o governador declarar anistia
a todos os bandidos, menos aos irmãos James. Robert Ford executa Jesse James
mas não obtém a recompensa esperada e sim adquire a fama de covarde, o que faz
com que Cinthy repense a ideia de se casar com ele. Surge então Kelley (Preston
Foster) que também se interessa por Cinthy. Robert enriquece descobrindo prata
em Creede, no Colorado, ao mesmo tempo que perde Cinthy para Kelley. Os dois
homens duelam em frente ao saloon Silver King e Robert Ford é morto.
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Reed Hadley |
Insólita
narrativa - No início de “Eu Matei Jesse James” um letreiro informa
sobre as liberdades que o roteiro de Samuel Fuller tomou com os fatos
históricos envolvendo Robert Ford. A partir daí pode-se esperar por qualquer
coisa e Fuller não deixa por menos surpreendendo com sua insólita narrativa. Esqueça-se
a lembrança do formoso Jesse James de Tyrone Power pois o lendário bandido
agora interpretado por Reed Hadley está mais para Abraham Lincoln, faltando
apenas a cartola para completar o personagem. E este Jesse James nunca se cansa
de praticamente pedir para ser alvejado pelas costas por seu amigo Robert Ford,
mesmo após ter discutido com este as vantagens desse assassinato. Fuller
transforma seu western num melodrama ao trazer para a história um certo Kelley que
viria a formar um triângulo amoroso entre Robert Ford e sua amada Cinthy. Porém
antes desse bem declarado triângulo, houve outro sugerido pelo provocador
Fuller.
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Reed Hadley e John Ireland |
‘Eu
matei quem eu amava’ - Se a consciência de Bob Ford não
permitiu que ele tivesse um minuto de paz após seu ato covarde, não é menos
verdade, ao menos neste “Eu Matei Jesse James”, que seu coração também esteve
dividido entre a namorada e seu chefe, o esposo de Zee James (Barbara Woodell).
Após o malogrado assalto a banco no início do filme, Jesse procura cuidar do
ferimento de Robert Ford, um tiro que trespassa o ombro e do qual não se vê
sangue pela pobreza da produção. Pressentindo perigo, Zee pede para o marido se
afastar dos irmãos Ford, mas ao invés disso é Bob Ford quem esquenta e traz
água e ajuda Jesse James durante o banho deste. É quando Jesse entrega um
reluzente Colt 45 para o amigo avisando que a arma é linda e tem um cabo
moderno. O mesmo John Ireland viveu cena parecida com Montgomery Clift em “Rio
Vermelho” quando ambos trocaram e admiraram mutuamente seus revólveres com
evidente simbolismo. Enquanto Bob Ford acaricia o revólver, Jesse James oferece
suas costas para o amigo esfregar. E Jesse observa que “quando dou um presente, dou completamente”. A tentação é grande e
afinal Ford assassina o amigo, ficando com a indesejável fama que acaba por lhe
dificultar o casamento com Cinthy. Após cansativas idas e vindas com portas que
nunca se cansam de abrir para compor o triângulo Kelley-Cinthy-Bob Ford, eis
que o ‘covarde assassino’ é finalmente morto por Kelley (O’Kelley na história
real e não na rua, mas dentro do saloon e com um tiro no pescoço). Antes de
morrer nos braços de Cinthy, Bob Ford confessa à perplexa moça que “amava Jesse James”. Samuel Fuller em
seu estado mais puro.
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Barbara Britton e John Ireland |
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John Ireland; Preston Foster |
Participações
pouco interessadas - Este singular western poderia
funcionar bem, não fosse o roteiro pouco claro, desconexo mesmo em alguns
diálogos e que compromete toda a criativa versão do delirante Fuller. Some-se a
isso a não disfarçada pobreza da produção, isto quando se sabe que o que faz a glória
de cineastas como Samuel Fuller, Edgar D. Ulmer e Phil Karlson, entre outros, é
a capacidade de superar com criatividade a falta de recursos. Há em “Eu Matei
Jesse James” um excesso de planos fixos o que dá ao filme uma estaticidade que
os muitos e prolongados close-ups pouco ajudam. Sem falar que, por estarem
participando de um filme de diretor estreante e certamente por estarem recebendo
ínfimos salários por suas participações, Preston Foster e John Ireland não
dissimulam a má vontade. Foster vivia o declínio de sua carreira e Ireland, que
no ano anterior se destacara no clássico “Rio Vermelho” (Red River), interpretaria
em 1949 o repórter de “A Grande Ilusão”, atuação que lhe valeu uma indicação ao
Oscar de Melhor Ator Coadjuvante.
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Tom Tyler |
Três
momentos bilhantes - Em se tratando de Samuel Fuller, felizes
imprevistos são perfeitamente previsíveis e eis que o diretor nos dá três
grandes momentos neste pequeno faroeste. O primeiro é quando Bob Ford está em
cena revivendo num teatro o já famoso assassinato e seu remorso o impede de
repetir seu ato fatal, mesmo que numa encenação. Em seguida há a sequência em
que um trovador (Robin Short) canta, diante de Bob Ford a balada que fala do
assassinato de Jesse James, momento brilhante pelas excepcionais participações
do cantor e também de John Ireland, aqui num raro momento de maior
comprometimento com o filme. E outra sequência marcante e própria do diretor é
quando Bob Ford aparentemente atira em direção ao velho garimpeiro Soapy
(Victor Kilian), dando a impressão de tê-lo matado e na sequência seguinte é dito
que Ford atirara num puma que estava atrás de Soapy e não no minerador. Três
belos momentos, dignos da fama de Fuller, que não conseguem sustentar um roteiro
inconsistente.
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Robin Short; Victor Kiliam |
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John Ireland |
O
incansável John Ireland - Creditado em primeiro lugar nos
letreiros, Preston Foster faz o que se espera dele com sua presença forte. John
Ireland era então, aos 35 anos, um dos mais fortes candidatos à condição de
astro em Hollywood, com excelentes participações especialmente em policiais
noir onde se sentia bem à vontade. Entre 1948 e 1949 Ireland participou de nada
menos que 13 filmes, sempre em papeis relevantes. No entanto Ireland não
atingiu o estrelato como, por exemplo, seus contemporâneos Kirk Douglas e Burt Lancaster.
A linda Barbara Britton é do trio principal quem parece levar este western a
sério. No elenco ainda o conhecido Victor Kiliam e Tom Tyler e Reed Hadley,
ambos astros de seriados da Republic Pictures. Robin Short, que interpreta “A
Balada de Jesse James” era um cantor de folksongs que se acompanha ao violão,
exatamente como é mostrado neste western. Curioso que Jesse James ficaria
marcado no cinema pela imagem de Tyrone Power, mesmo após tantos e tantos
filmes (e seriados) sobre o bandido. E não foi desta vez que a lenda sobre Jesse
foi desfeita, mesmo sob o enfoque de um diretor abusado como Samuel Fuller.
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A cena real do assassinato, com John Ireland e Reed Hadley. |
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O assassinato encenado em um teatro, com John Ireland (Bob Ford) e um ator |
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