Anthony Mann foi o diretor que mais se
destacou no gênero western na década de 50. A partir de 1950 Mann realizou nada
menos que 11 faroestes, alguns deles clássicos e pelo menos duas obras-primas -
“O Preço de um Homem” (The Naked Spur) e “Um Certo Capitão Lockhart” (The Man
from Laramie). “Cimarron” (1960) foi o derradeiro e o menos pessoal dos westerns
de Anthony Mann que, em 1958 filmara “O Homem do Oeste” (Man of the West). A célebre
parceria do diretor com James Stewart já havia sido desfeita e após dirigir
Victor Mature em “O Tirano da Fronteira” (The Last Frontier) e Henry Fonda em
“O Homem dos Olhos Frios” (The Tin Star), Anthony Mann teve a oportunidade de
contar com Gary Cooper como astro de “O Homem do Oeste”. No entanto não é
Cooper quem protagoniza o personagem-título e sim Lee J. Cobb como um tirânico
homem mau representativo do fim daquele tipo de bandido.
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Acima Gary Cooper; abaixo Robert J. Wilke, Lee J. Cobb, Jack Lord e Royal Dano. |
Retorno
forçado ao crime - Com roteiro de Reginald Rose baseado
no livro “The Border Jumps” de Will C. Brown, “O Homem do Oeste” narra um
episódio violento na vida de Link Jones, um ex-fora-da-lei que casualmente se vê
às voltas com criminosos que ele já conhecia. Link Jones (Gary Cooper)
encontra-se na cidade de Crosscutt com a intenção de contratar uma professora
para a pequena cidade onde vive como cidadão respeitável. O trem em que viaja é
assaltado por bandidos e Link, acidentalmente, acaba ficando fora do trem que
parte sem ele e mais dois passageiros, a cantora de saloon Billie Ellis (Julie
London) e o jogador Sam Beasley (Arthur O’Connell. Os três se refugiam num
rancho abandonado onde já se encontram escondidos os assaltantes do trem e mais
Dock Tobin (Lee J. Cobb), o chefe do bando. Link Jones é sobrinho de Tobin,
tendo feito, há mais de dez anos, parte do bando do tio. Para proteger Billie
Ellis da sanha carnal do bando, Link diz a Tobin que a mulher é sua esposa,
enquanto Sam Beasley é morto numa desavença entre homens do grupo chefiado por
Tobin. Ainda como parte de um plano para conseguir escapar da quadrilha que os
faz prisioneiros, Link aceita voltar a fazer parte do bando para assaltar um
banco num lugarejo chamado Lassoon, em região que explora minério. Nenhum deles
sabe que Lassoon se transformou numa cidade fantasma e durante o assalto Link
mata três dos bandidos. No retorno ao esconderijo Link se defronta com Dock
Tobin, matando-o também e vendo-se livre e libertando Billie Ellis, para
retornar à sua vida de homem do bem.
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Gary Cooper |
Gary
Gooper, velho demais - “O Homem do Oeste” é um filme tenso
com sequências de grande dramaticidade, próximo dos melhores trabalhos de
Anthony Mann. Isso, no entanto, não acontece plenamente em razão de um erro
capital que foi a escolha de Gary Cooper para interpretar Link Jones. Ótimo
ator que impõe a própria persona aos tipos que vive nos filmes em que atua, Link
Jones é um personagem inadequado a Cooper. O velho bandido Dock Tobin foi quem
introduziu o sobrinho Link na vida criminosa, assim como o fez com os outros
dois sobrinhos Claude (John Dehner) e Coaley (Jack Lord), ambos bem mais jovens
que o primo Jones. Mesmo envelhecido pela barba e cabelos grisalhos e voz
gutural, Lee J. Cobb não parece mais idoso que Gary Cooper, dez anos mais velho
que Cobb na realidade. Cooper não conseguindo disfarçar os sérios problemas de
coluna que o acometeram no início dos anos 50 e que os levaram a transformar todos
seus personagens em homens cansados e desgastados, isto desde o Will Kane de “Matar Ou Morrer” (High
Noon). O problema seria menor se fosse unicamente a comparação de Link/Cooper
com Tobin/J. Cobb. Mas, além de Julie ser igualmente muito jovem para
compor par romântico com Cooper, há a luta corporal entre Coaley/Jack
Lord e Link. Sequência muito bem filmada, com uso perfeito de dublês, que acaba
com a pouco realista vitória de Link sobre o muito mais jovem e forte Coaley
com a inaceitável incapacidade deste de impedir que Link o deixe de ceroulas
tirando-lhe as vestes. Por fim Gary Cooper não convence como vilão que por sua
brutalidade fora o braço direito do extremadamente venal Dock Tobin.
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Lee J. Cobb e Gary Cooper |
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Gary Cooper com Jack Lord e com Julie London. |
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Lee J. Cobb |
Crepúsculo
de um facínora - Com “O Homem do Oeste” Anthony Mann criou o supremo
facínora de seus westerns, ele que expressou a maldade dos homens com atores como
o excepcional Robert Ryan e com os magníficos Dan Duryea, Arthur Kennedy e John
McIntire, sem esquecer a extraordinária Barbara Stanwyck de “Almas em Fúria”
(The Furies). Mann soltou as rédeas para que Lee J. Cobb, ator conhecido por
seus excessos interpretativos, compusesse um desvairado homem mau, mórbido e
repulsivamente lascivo. Mesmo a estudada teatralidade dos gestos e reações que
Cobb impõe ao personagem não tiram dele a asquerosa bestialidade. Homens como
Dock Tobin viviam seus derradeiros dias nas cidades do Velho Oeste que
começavam a mudar e o vetusto malfeitor sabia que o fechamento de seu ciclo era
iminente. Escolhe para último ato um assalto a uma cidade que, como ele, se
transformou num fantasma do que fora em outros tempos. E assim como Lassoon é só
uma lembrança, suja, empoeirada e triste, o mesmo ocorre com o velho homem do
oeste em seus últimos dias.
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Lee J. Cobb |
Confronto
na cidade-fantasma - O momento culminante de muitos
westerns de Anthony Mann se passa em montanhas, com homens se defrontando num
grande palco rochoso natural com balas ricocheteando em todas as direções. Em
“O Homem do Oeste” o diretor preferiu o anticlímax com a ação mais vigorosa antecipando
o embate entre as escarpas íngremes das montanhas. Este se passa entre Link
Jones e Dock Tobin e é decepcionante, com Tobin atirando para cima e pedindo
para ser morto, provocando o sobrinho dizendo a ele “Você perdeu seu apetite de matar”, enquanto Link responde a frase
insípida “Vou te pegar, Dock”, no final menos inspirado entre tantos filmados
por Anthony Mann. Ainda que não memorável, o confronto entre Link enfrentando
Claude, Ponch (Robert J. Wilke) e Trout (Royal Dano) na cidade-fantasma de
Lassoon supera aquele que deveria ser o grand finale entre Link e Dock Tobin. E
Anthony Mann junta aos muitos antológicos momentos de violência de seus
westerns a luta encarniçada entre Link e Coaley, apesar de a sequência apresentar de modo inverossímil, o personagem de Gary Cooper como vencedor.
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Jack Lord e o dublê de Gary Cooper; Gary Cooper despindo Jack Lord. |
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Jack Lord, Gary Cooper e Julie London. |
Estupro
moral - Neste penúltimo western de Anthony Mann a personagem
feminina Billie Ellis tem invulgar importância, algo pouco comum nos westerns
de modo geral. Billie (Julie London) é uma cantora que se apresenta de cidade
em cidade sendo alvo por onde passa do assédio de homens que não resistem à sua
beleza. Link não a vê como objeto sexual, o que a intriga. Diz ela a Link Jones
ser ele é o primeiro homem, desde que ela tinha 14 anos, que olha para seus pés
e não para outras partes de seu corpo. O roteiro reserva para a personagem uma
sequência de erotismo perverso brilhantemente concebida por Mann quando Billie,
mulher experiente mas ainda belíssima, sofre um estupro moral ao ser forçada a
um strip-tease dentro da cabana onde está com Link, cena assistida pelos cinco
bandidos. Mais tarde Billie se vê forçada a passar a noite com Link, ambos
simulando serem casados. Após a humilhação a que foi submetida e depois da
inesperada noite de amor com Link, Billie se apaixona pelo redimido bandido.
Para má sorte da mulher, Link confessa estar casado, que sua esposa é bonita,
tendo com ela dois filhos. Encontrar o amor de sua vida só faz de Billie uma
mulher mais sofrida, acrescentando-se ainda a violação que sofre por parte do
alucinado Dock Tobin, isto quando Link e os demais bandidos estão em Lassoon. E
o filme se encerra tristemente com Billie aceitando seu destino, agradecida
pelos melhores momentos que teve na vida, justamente ao lado de seu protetor Link.
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Acima e abaixo Julie London. |
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Julie London, Lee J, Cobb, Robert J. Wilke e Royal Dano |
Tocante
desempenho de Julie London – Mesmo inadequado como Link Jones,
Gary Cooper tem boa atuação, lutando estoicamente contra o incômodo personagem
que teve que desempenhar e contra as dores que o forçam a andar alquebradamente. Lee J. Cobb se impõe de maneira impressionante, ator
intenso que apesar do impulsivo over-acting cresce na tela como trágica figura
paterna, fazendo dos demais atores meros coadjuvantes, inclusive Cooper. Julie
London como Billie Ellis tem, provavelmente, seu melhor e mais tocante
desempenho no cinema. Cantora excepcional, Julie não entoa nenhuma canção neste
filme, num desperdício incompreensível, mais ainda porque a canção-tema, sem
letra, foi composta por seu marido Bobby Troup. Arthur O’Connell é o escroque
que não engana ninguém e que se sai bem quando tem de mostrar covarde. John
Denher como o cético sobrinho, Jack Lord como o bandido impetuoso, Royal Dano
como o psicopata mudo e Robert J. Wilke como o idiotizado Ponch, estão perfeitos
como os bandidos que são chamados de ‘porcos’ por Dock Tobin. Chuck Roberson e
Jack Williams, que atuam também como stuntmen, têm participações na sequência
de assalto ao trem, ambos se mostrando merecedores da chance recebida.
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Gary Cooper e Jack Lord. Jack Lord atirando |
O
talento de Anthony Mann - Considerado por alguns críticos
(entre eles Jean-Luc Godard) como o melhor dos westerns de Anthony Mann, “O
Homem do Oeste” carrega o pecado da escolha errada de Gary Cooper como ator
principal. Sabe-se que James Stewart (oito anos mais novo que Cooper) queria o
papel, mas sequer foi considerado por Mann, com quem havia brigado no ano
anterior. Outro ator cogitado para viver o personagem foi Stewart Granger, que
teria o desafio de ser um ex-bandido. Imagina-se que grande filme teria sido “O
Homem do Oeste” com Robert Mitchum como Link Jones. Admirável exercício de
violência e sadismo este western de Anthony Mann com contornos de tragédia é
obrigatório por sua força e aspectos psicológicos que o diretor desenvolve com
invulgar domínio e precisão.
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John Dehner com Lee J. Cobb; Jack Lord e John Dehner. |
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Lee J. Cobb; Gary Coper e Arthur O'Connell. |
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John Dehner; Robert J. Wilke. |
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Pôsteres norte-americano, italiano e francês de "O Homem do Oeste". |
Grande Darci! Como vai? Comprei esse western por acaso há muito tempo nas lojas americanas. Me surpreendi com a qualidade do filme. Concordo com o que você escreveu, sobre o erro do diretor em escalar Cooper para o papel. É visível que sua idade não "combinou" com o personagem. Mas em suma, realmente, trata-se de um ótimo filme. Ontem assisti AUDAZES E MALDITOS, ótimo filme de Ford que está no box "Cinema Faroeste" lançado pela versátil. Achei o filme sensacional. No mais, é isso, grande abraço mestre!
ResponderExcluirOlá, Jefferson. 'Audazes e Maldito' está na fila para ser resenhado pois afinal é um western do maior diretor do gênero. Né não? - Abraço do Darci.
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