John Ford se iniciou no cinema como diretor na Universal,
em 1917, dirigindo 35 filmes nesse estúdio, boa parte deles os westerns em
parceria com Harry Carey como ator. Em 1920 John Ford, que usava o nome
artístico de ‘Jack Ford’, conseguiu arrancar um aumento do sovina alemão dono
da Universal, Carl Laemmle, passando de 150 dólares para 300 dólares por semana.
Enquanto isso Harry Carey viu também seu salário dobrar só que de 1.250 dólares
para 2.500 dólares semanais. A insatisfação de John Ford com a enorme diferença
salarial entre ele e Harry Carey fez com que não só os dois deixassem de fazer
filmes juntos, mas com que o diretor se mudasse para a Fox, com um contrato que
lhe garantia 600 dólares toda semana. Na Fox, John Ford dirigiria mais de 50
filmes, tornando-se um dos mais admirados e premiados diretores do cinema
norte-americano.
Carl Laemmle, William Fox, Jack (John) Ford e Harry Carey |
Buck,
diferente de Harry e de Tom - William S. Hart foi o primeiro verdadeiro
grande mocinho do cinema e reinou absoluto até ver-se ameaçado pelo trio
formado por Tom Mix, Harry Carey e Buck Jones. Após a I Guerra Mundial ocorreu
o declínio da carreira de William S. Hart e o público espectador se dividia
entre o extravagante Tom Mix, o sisudo Harry Carey e Buck Jones. Mais atlético
que Carey e menos aprumado que Mix, Buck Jones era contratado da Fox, assim
como o próprio Tom Mix. Com a chegada de John Ford ao estúdio, William Fox
pensou em impulsionar ainda mais a carreira de Buck Jones confiando a ‘Jack’ a
direção dos seus dois próximos filmes. Realizados ambos em 1920, o primeiro
deles foi “Camaradas” (Just Pals), comédia dramática que não chega a ser um
western autêntico, ainda que permita a Buck Jones mostrar suas habilidades como
exímio cavaleiro. Buck também exibe a força de seus punhos e mais que isso,
revela-se nas mãos de Ford um muito bom ator, o que os westerns rotineiros
certamente não permitiam deixar perceber.
Buck Jones, Tom Mix e William S. Hart |
Buck Jones e Georgie Stone |
De
vagabundo a herói - Com roteiro de Paul Schofield
baseado em história de John Mcdermott, “Camaradas” tem Buck Jones como Bim, o
vagabundo da cidade que sente um brutal cansaço apenas vendo pessoas
trabalhando. Mas apesar de desprezado por todos, o indolente Bim tem bom
coração e se condói quando vê o menino Bill (Georgie Stone) ser maltratado pelo
guarda da estrada de ferro. Bill é um pequeno hobo (vagabundo que viaja
escondido nos trens) que desperta em Bim uma inusitada responsabilidade e
desejo de abandonar o ócio. Quem também contribui para isso é Mary Bruce (Helen
Ferguson), a professora da escola local, por quem Bim se sente atraído. Mary Bruce
namora Harvey Cahill (William Buckley), um desonesto funcionário que dá um
desfalque na empresa em que trabalha. Descoberto, Cahill recorre então a Mary
Bruce pois sabe ela guarda o dinheiro do fundo da escola, quantia que acaba nas
mãos do embusteiro namorado. Cahill trama com bandidos um roubo ao banco da
cidade, assalto que é evitado por Bim que ainda consegue resolver o sequestro
de um rico menino. Por sua coragem Bim é recompensado com dez mil dólares e
também com a admiração de Mary, com quem inicia uma nova vida.
Georgie Stone e Buck Jones. |
Forma-se
o estilo de Ford - “Camaradas” é uma das raras películas
da fase inicial de John Ford que sobreviveram ao tempo, tornando-se por isso
mesmo indispensável para os que estudam a obra do diretor ou simplesmente gostam
seus filmes. Nos 50 minutos de duração de “Camaradas” é perceptível o estilo
que Ford desenvolveria poucos anos depois, assim como a influência inevitável
dos dramas de David W. Griffith. Estão presentes a narrativa simples e concisa e
a direção de atores segura. E que não se pense que o filme de Ford copia
Chaplin na relação entre o vagabundo e uma criança pois “Camaradas” foi filmado
um ano antes de “O Garoto”, do genial Carlitos. Ao contrário deste, o
sentimentalismo em “Camaradas” é mais contido e a mão de Ford para a comédia é muito pesada se comparada à graça de Chaplin. As gags do filme de Ford são
explicadas através dos letreiros pois visualmente elas não funcionam a
contento. A obra de John Ford é comumente chamada de ‘Americana’, ou seja, é um
conjunto de fatos, histórias e folclore que perfazem a cultura e comportamento
do povo norte-americano. Em “Camaradas” Ford começa a penetrar no delicioso
universo do cidadão simples que desenvolveria esplendidamente nos filmes que
fez com Will Rogers e que teria sua culminância dramática com o Tom Joad de
“Vinhas da Ira”.
Duke R. Lee, Helen Ferguson e Buck Jones. |
Buck
Jones, mais que um valente cowboy - Primeiro filme de John Ford contando
com George Schneiderman como cinegrafista, parceria que teve o apogeu com “O Cavalo
de Ferro” (The Iron Horse), em 1925 e em “Três Homens Maus” (3 Bad Men), em
1926. Buck Jones está excelente como o desleixado e vadio personagem que se
torna herói. E Buck é uma agradável surpresa para quem se acostumou vê-lo
apenas como o destemido defensor da lei e da ordem distribuindo sopapos nos
bandidos. O menino Georgie Stone, então um veterano do cinema aos 11 anos de
idade, parece um pouco crescido para o desafortunado personagem infantil. A
mocinha é Helen Ferguson e como era comum nos filmes da época, frágil e
graciosa. Em praticamente todos os filmes silenciosos, as caracterizações são caricatas
e “Camaradas” não foge à regra, sendo o melhor exemplo o xerife que não perde
uma só oportunidade para afirmar que “A
lei vai se encarregar do problema”. Ressalte-se a qualidade da cópia e a trilha
musical adicionada a esta edição de 2007 do filme de Jack (John) Ford.
Cenas de "Camaradas", vendo-se Buck Jones; Buck e Georgie Stone; o assalto ao banco e bandidos em disparada. |
Oi!
ResponderExcluirRealmente uma delícia de filme, o primeiro que assisti com o lendário e carismático Buck Jones.É muito prazeroso assistir essa aventura, dos primórdios da carreira do grande Ford, de clima saborosamente inocente. Quem quiser conhecer essa pérola, o filme tá disponível no Youtube.
Abraco, Darci!
Robson
Olá, Darci!
ResponderExcluirInspirado pelo seu artigo, acabei de rever esta pérola em média-metragem. É o típico cinema que gosto de ver. Sem mais.
Abraço!