29 de novembro de 2014

A LEI DA FRONTEIRA (FRONTIER MARSHAL) – RANDOLPH SCOTT É WYATT EARP


Capa de uma das muitas edições do livro de
Stuart Nathanael Lake;
George O'Brien como Wyatt Earp.
O livro do escritor Stuart N. Lake intitulado “Wyatt Earp: Frontier Marshal”, escrito em 1931 e biografando o lendário homem da lei, foi levado ao cinema pela primeira vez em 1934. O filme se chamou “Frontier Marshal” (no Brasil “O Último Favor”) e o personagem principal interpretado por George O’Brien recebeu o nome de ‘Michael Wyat’. A razão de não poder ser utilizado o nome do marshal de Dodge City e Tombstone deveu-se ao fato de Josephine Earp, a viúva de Wyatt, ter exigido o pagamento de 50 mil dólares. A Fox Films, produtora do filme, se recusou a fazer esse acordo e Wyatt Earp ‘desapareceu’ da película. Cinco anos depois a viúva Earp permitiu que a 20th Century-Fox realizasse o segundo filme baseado no livro de Lake, com o mesmo título “Frontier Marshal” (no Brasil “A Lei da Fronteira”), com Randolph Scott como Wyatt Earp. Ávida por dinheiro, a viúva Earp poderia muito bem ter ganho muito mais processando o estúdio pela distância do filme com a verdade histórica. E o grande responsável pelo conjunto de fatos inverídicos em “A Lei da Fronteira” é o autor Stuart N. Lake, mais ainda por declarar que teria conhecido Wyatt Earp e que este lhe teria relatado os acontecimentos principais de sua vida. John Ford ajudou a construir a lenda em torno de Wyatt Earp com seu western “My Darling Clementine” (Paixão dos Fortes), em 1946, também baseado no livro de Lake.


Cesar Romero (Doc Halliday disputado
por Binnie Barnes e por Nancy Kelly.
Wyatt Earp, conselheiro amoroso - Sam Hellman foi o autor do roteiro de “A Lei da Fronteira” que acaba sendo um filme sobre um pouco autêntico Waytt Earp (Randolph Scott) pois o personagem principal do filme é John ‘Doc’ Halliday (Cesar Romero). Isso mesmo, ‘Halliday’ e não Holliday como de fato era o nome do dentista que no filme é um médico com centenas de partos no currículo antes de contrair tuberculose. Pelo menos na doença de Doc a produção acertou... Halliday é um jogador, pistoleiro e namorador. Em Tombstone seu caso é a saloon-girl Jerry (Binnie Barnes) até que chega à cidade a enfermeira Sarah Allen (Nancy Kelly) para tentar reatar seu romance com Doc Halliday. Diante desse triângulo amoroso Wyatt Earp, como bom amigo, orienta Doc a ficar com a enfermeira mas o jogador-pistoleiro prefere a garota má. Porém nem com ela Doc fica pois é ferido mortalmente pelo bandido Curley Bill (Joe Sawyer) e não participa do celebrado duelo no Curral OK que no filme mais parece um estábulo. Sozinho Wyatt Earp se defronta contra Curley Bill e seus homens, liquidando-os todos.

Randolph Scott
Randolph Scott melhor que nunca - O leitor deve estar se perguntando a respeito dos irmãos de Earp, dos Clantons e dos McLauries. Esqueça pois eles não existem nesta versão da passagem de Wyatt Earp por Tombstone. Mas o descompromisso com a biografia do delegado (deputy) Wyatt Earp leva o espectador a ver “A Lei da Fronteira” apenas como um pequeno faroeste de 71 minutos que tem lá seus bons momentos. Com essa metragem este western dirigido pelo já veterano Allan Dwan (começou a dirigir filmes em 1911) era destinado a programas duplos e nessa categoria faz bonito. E como é bom ver Randolph Scott ainda jovem, ele que foi ficando cada vez mais displicente à medida que passou a produzir seus próprios filmes e, como é sabido, mais interessado em jogar golfe que se empenhar em lutas contra Lee Marvin, Ernest Borgnine, Claude Akins e outros durões. A entrada em cena de Scott em “A Lei da Fronteira” é marcante, descendo lépido de um balcão para acabar com o barulho promovido pelo desordeiro Indian Charlie (Charles Stevens), sequência que seria repetida quase na íntegra por Henry Fonda com o mesmo Charles Stevens em “Paixão dos Fortes”. Ainda que Doc Halliday tenha participação maior que a de Wyatt Earp, são do marshal os melhores momentos do filme, como a lição aplicada em Curley Bill, enfrentando os bandidos no Curral OK e fazendo valer sua autoridade contra a irriquieta saloon-girl Jerry jogando-a num cocho. Vale mencionar Randolph Scott disparando seu rifle sobre uma diligência em fuga, antecipando John Wayne em “No Tempo das Diligências” (Stagecoach), do mesmo ano de 1939.

Randolph Scott tranquiliza o bêbado Charles Stevens; Scott rendendo
Tom Tyler, Richard Alexsander e Harry Woods.

Lon Chaney Jr., John Carradine
e Joe Sawyer.
Pequeno filme, grande elenco - Satisfeita com o estrondoso sucesso obtido com a romanceada biografia de Jesse James no western do mesmo nome interpretado por Tyrone Power, a 20th Century-Fox não pensou duas vezes e produziu “A Lei da Fronteira”. Mesmo num filme de menor orçamento como este, o elenco é uma atração com a boa presença de Cesar Romero e das atrizes Binnie Barnes e Nancy Kelly. Binnie contracenara com Scott em “O Último dos Moicanos” (The Last of the Mohicans), em 1936; Nancy, por sua vez, acabara de estrelar o referido “Jesse James”, no qual Randolph Scott tem participação pequena. E o cinéfilo se delicia com a quantidade de rostos conhecidos como Ward Bond, John Carradine, Lon Chaney Jr., Chris-Pin Martin, Tom Tyler, Harry Woods, o bigodudo Hank Bell e até Richard Alexander (o príncipe Barin do seriado Flash Gordon). Eddie Foy Jr. interpreta o próprio pai Eddie Foy que se apresentava mesmo em casas de espetáculos do Velho Oeste. Ward Bond atuou nos três filmes baseados no livro de Stuart N. Lake, nos três fazendo papéis diferentes. Charles Stevens repetiria seu personagem no filme de John Ford, como já foi dito. Uma pena que os excelentes Ward Bond e John Carradine tenham sido pouco aproveitados pois seus personagens tiveram participação pequena. 

A quadrilha comandada por John Carradine e Joe Sawyer a cavalo.

Doc Halliday (Cesar Romero) confessando seus problemas à namorada.

Randy e Romero comparando suas armas.

Randolph Scott como Wyatt Earp.
Tombstone, uma cidade sem lei – Antecipando a clássica sequência de “Rio Vermelho” (Red River) em que Montgomery Clift e John Ireland comentam sobre suas pistolas, “A Lei da Fronteira” tem cena idêntica. É quando Randolph Scott e Cesar Romero manuseando suas armas comparam o tamanho das mesmas. E o mesmo Doc Halliday tentando se desvencilhar da namorada Sarah Allen afirma ambiguamente “ser um homem estranho”. Halliday acha tempo ainda para filosofar quando diz que “Os covardes morrem muitas vezes antes de sua morte” pois morrem a morte moral a cada ato de covardia. “A Lei da Fronteira” mostra como Wyatt Earp levou a lei e a ordem para Tombstone, cidade convulsionada com a chegada de aventureiros atraídos pela descoberta de ouro. É lembrado que o cemitério da cidade – Boot Hill – tinha tantos habitantes quanto a própria cidade, atestando como era perigoso viver (ou sobreviver) naqueles dias em Tombstone. A civilização um dia chegaria àquele tempestuoso lugar e isso seria mostrado magistralmente por John Ford em “Paixão dos Fortes” (My Darling Clementine), western que o cinema esperaria ainda sete anos para assistir e nunca mais esquecer. Este sim, um faroeste à altura da lenda criada em torno de Wyatt Earp, do Curral OK e da própria Tombstone.

Doc Halliday e Wyatt Earp em ação; Wyatt sozinho no tiroteio do OK Curral.

Binnie Barnes, Randolph Scott e Charles Stevens.



28 de novembro de 2014

AS MARAVILHOSAS ATRIZES QUE INTERPRETARAM AS HEROÍNAS DO VELHO OESTE


Empunhando rifles ou com revólver na cintura ou mesmo armadas apenas com a coragem, o western desfilou através tantos filmes as mais belas atrizes do cinema. Pioneiras ou coquetes, valentes ou frágeis, sedutoras ou apaixonadas, elas desviam os olhares presos dos fãs nos heróis destemidos ou bandidos inescrupulosos. Calamity Jane, Belle Starr, Annie Oakley, Etta Place, Kate Elder e outras jamais imaginaram que seriam revividas por tão belos rostos como os que estão no vídeo abaixo. A canção de fundo é a traditional “Oh Susanna!”, que Stephen Collin Foster compôs em 1847 e que foi publicada pela primeira vez em 1848. 



25 de novembro de 2014

HERÓIS DE BARRO (THEY CAME TO CORDURA), ÚLTIMO E BOM WESTERN DE GARY COOPER


Glendon Swarthout ao lado de Gary Cooper
durante as filmagens de "Heróis de Barro".
Glendon Swarthout foi um professor universitário que participou da II Guerra Mundial como observador e com a missão de recolher informações sobre atos de bravura dos soldados em batalha. Esses soldados, quase sempre mortos em combate, recebiam postumamente a Medalha de Honra do Congresso norte-americano. Swarthout escreveu os livros “7.ª Cavalaria” e “The Shootist”, que foram levados ao cinema em filmes estrelados respectivamente por Randolph Scott e John Wayne. “The Shootist” teve o título nacional “O Último Pistoleiro”. Em 1958 Glendon Swarthout escreveu “They Came to Cordura”, que se tornou imediatamente best-seller e teve os direitos de filmagem adquiridos pelo produtor William Goetz que pagou a Swarthout 250 mil dólares. Esse alto preço foi pago pela certeza que Goetz tinha que “They Came to Cordura” seria um sucesso de público. Sem poupar gastos o produtor contratou Gary Cooper, um dos atores mais bem remunerados de Hollywood. Cooper liderou um elenco com diversos nomes famosos, entre eles Rita Hayworth. A adaptação cinematográfica ficou a cargo de Ivan Moffat (produtor associado de “Os Brutos Também Amam/Shane”) e de Robert Rossen, roteirista e diretor, famoso pelos filmes “A Grande Ilusão” e mais tarde “Desafio à Corrupção”. Rossen foi o diretor de “They Came to Cordura”, que no Brasil recebeu o título “Heróis de Barro”.


Candidatos a heróis - A história de “Heróis de Barro” se passa em 1916 quando a Cavalaria norte-americana investiu contra as forças de Pancho Villa após sofrer um ataque em Columbus, Novo México. O major Thomas Thorn (Gary Cooper) é designado para observar a tomada de um reduto ocupado por villistas e relacionar soldados que tenham cometido atos de bravura para receberem a Medalha de Honra do Congresso. O próprio Thomas Thorn havia, na batalha de Columbus, se acovardado e se escondido durante a refrega. Cumprindo sua missão Thorn testemunha atos de heroísmo por parte do tenente Fowler (Tab Hunter), do sargento Chawk (Van Heflin), do cabo Trubee (Richard Conte), e do soldado Renziehausen (Dick York), indicando-os para a comenda. Outro indicado foi o soldado Hetherington (Michael Callan) por bravura em batalha anterior.  O coronel Rogers (Robert Keith) que comandou a investida contra os villistas pede a Thorn que o indique também para que o Congresso lhe conceda a medalha. Não atendido ordena a Thorn que conduza o grupo de cinco heróis até a base de Cordura. Junto com os militares irá também Adelaide Geray (Rita Hayworth), dona da pousada em Ojos Azules, onde estavam os guerrilheiros mexicanos e considerada prisioneira por ajudar os soldados de Pancho Villa. Durante o trajeto até Cordura o grupo sob as ordens de Thorn descobre a real finalidade da viagem e se revoltam contra o major pois tornar público seus atos de heroísmo contraria seus interesses pessoais. Thorn, no entanto, não abre mão de levá-los à base militar, mesmo com toda sorte de ameaças e agressões que passa a sofrer por parte do grupo. A árdua jornada termina com a chegada do extenuado grupo a Cordura.

Acima Rita Hayworth;
abaixo Gary Cooper e Edward Platt.
Fracasso de bilheteria - “Heróis de Barro” teve uma produção acidentada com mudança forçada de locação durante as filmagens, o que levou o custo do filme a ultrapassar os quatro milhões de dólares. Concluído após dez semanas que esgotaram todos que participaram da produção, o filme foi lançado com 148 minutos de duração em junho de 1959. O esperado êxito de bilheteria se transformou num dos grandes fracassos do ano, o que levou a Columbia a distribuir “Heróis de Barro” com a metragem reduzida para 123 minutos, reeditando o filme contra a vontade do roteirista-diretor Robert Rossen. Mesmo com a redução o público não se interessou pelo western épico que discutia os temas de coragem e covardia. “Heróis de Barro” praticamente desapareceu de circulação, sendo esquecida sua exibição até mesmo pela televisão e só depois de quase 40 anos foi lançado em VHS. Um triste destino para este que foi o 26.º e derradeiro western da carreira de Gary Cooper que viria a falecer em 1961, aos 60 anos de idade.

Acima Richard Conte, Dick York, Michael
Callan e Van Heflin;
abaixo Conte, York e Callan.
Covardia e coragem - No filme os militares que devem receber a comenda pelo heroísmo de suas ações confessam que agiram por impulso e não por se sentir com coragem suficiente. Nenhum deles se considera herói e à medida que passam pelas provações da jornada, parte dela a pé e por uma região árida, afloram as índoles reais de cada um. Revelam-se rancorosos, traiçoeiros e, com a presença de uma mulher entre eles, até mesmo estupradores. Por seu lado, o major Thorn, descoberta sua covardia em batalha passada e torturado por sua própria consciência é quem demonstra coragem. Thorn não só é um homem de inquebrantável fibra no cumprimento do dever, mas a cada ato e palavra demonstra caráter e dignidade diante de situação adversa e de consecução aparentemente impossível. A longa discussão no filme de Rossen a respeito do que é coragem e do que é covardia conclui que nem sempre os heróis são de fato homens de coragem. E que o verdadeiro heroísmo não é demonstrado durante o risco iminente e inerente das batalhas, mas sim em situações em que o moral psicológico e físico é colocado a prova em meio a inimigos que podem estar do mesmo lado.

Rita
Final piegas - A primeira meia hora de “Heróis de Barro” é bastante movimentada com a Cavalaria atacando os mexicanos na pousada de Adelaide Geary em Ojos Azules. É quando ocorre a denúncia da fabricação de heróis para estimular o alistamento de norte-americanos visando a inevitável entrada dos Estados Unidos na I Guerra Mundial. Esse início promissor para quem aprecia filmes de ação se dilui em sequências bastante dialogadas nas quais a tensão está presente nos conflitos entre os pseudos heróis e o major Thorn. A presença de Adelaide Geray é parte importante no aumento da crise entre os homens, espécie de estopim aceso prestes a explodir o desejo incontido. Adelaide é uma norte-americana acusada de traição por abrigar inimigos villistas que prisioneira tenta escapar e chega a se oferecer ao major Thorn. Este rejeita a companhia da mulher que no decorrer da jornada será a única pessoa a ajudá-lo e em quem o major confiará. O filme se torna mais dramático a cada conflito e com o crescente suplício do major Thorn, desaguando, infelizmente, num final piegas que compromete o bom trabalho de Robert Rossen. A intenção meio lírica, meio idealista em busca de uma inesperada singeleza seria emulada em 1960 com o igualmente caricato final de “O Passado Não Perdoa” (The Unforgiven), de John Huston.

O sofrimento de Gary Cooper, ajudado somente por Rita Hayworth.

Rita e Gary
Rita, uma atriz de verdade - Este tipo de filme é tudo que os atores normalmente desejam pois possibilitam criar personagens com aprofundamento psicológico e a exposição de deformidades morais. Van Heflin é o mais odioso dos personagens de “Heróis de Barro” e está ótimo como o sargento brutal que rejeita a medalha para não ser reconhecido por crime praticado quando vivia em Albuquerque. Richard Conte desempenha bem o cabo que propõe a troca do segredo da covardia do major Thorn para satisfazer sua avidez sexual com Adelaide. Tab Hunter que poderia ser o destaque entre os coadjuvantes desperdiça boa oportunidade para mostrar que não era só mais um galã em Hollywood. Dick York, Michael Callan e o excelente Robert Keith completam o elenco principal que tem ainda a presença de Edward Platt antes de se tornar o chefe dos atrapalhados Agentes 86 e 99 em “Get Smart”. Motivo de enorme contentamento é ver Rita Hayworth demonstrar a excelente atriz que era, ela que se celebrizou pela beleza e sensualidade. Adelaide Geray é um papel perfeito para Rita com certas semelhanças com a própria vida da atriz, no qual marcaram presença o álcool e a violência masculina. Aos 40 anos de idade e doze anos depois de “Gilda”, Rita havia perdido parte da fulgurante beleza, mas o poder de sedução se mostrava inalterado.

No alto Rita Hayworth e Van Heflin; Michael Callan e Rita Hayworth;
abaixo Rita com Tab Hunter e Richard Conte.

Gary Cooper
Gary Cooper para ninguém colocar defeito - Não são poucos aqueles que consideram Gary Cooper um ator de um único personagem: ele próprio. O método de atuar de Cooper não arrebata mas “Heróis de Barro” é outra prova do talento interpretativo de Gary. Certo que não foi uma escolha das melhores para o personagem do major Thorn, que no livro de Glendon Swarthout é homem de pouco mais de 30 anos. Por isso mesmo Cooper encontrou dificuldade para dar credibilidade ao personagem. Mais sofrido ainda que em sua criação como ‘Will Kane’, Cooper padeceu de terríveis dores nas costas durante toda a filmagem de “Heróis de Barro”, o que tornou mais realista sua interpretação como o major Thorn. E para os fãs de faroestes, seus últimos trabalhos no gênero mostraram Gary Cooper ainda melhor que em “Matar ou Morrer”. A suas grandes performances em “O Homem do Oeste” (Man of the West) e “A Árvore dos Enforcados” (The Hanging Tree) soma-se este épico sobre a coragem humana. Cooper e Rita se completaram brilhantemente sob a direção de Robert Rossen. Atenção para a trilha sonora que mesmo sinfônica resulta funcional e até agradável. A fotografia de Burnett Guffey é outro ponto de destaque deste filme que imerecidamente não fez sucesso.


A maravilhosa Rita Hayworth em momentos de "Heróis de Barro".

18 de novembro de 2014

COWBOYS EM DESFILE (TRAIL OF ROBIN HOOD) – WESTERN NATALINO DE ROY ROGERS


Mestre Clóvis Ribeiro e Lázaro Narciso Rodrigues assistiram a centenas de westerns-B, boa parte deles nos cinemas nos anos 50. E para esses dois cinéfilos “Cowboys em Desfile” (Trail of Robin Hood é o melhor de todos os faroestes-B. Estrelado por Roy Rogers e dirigido por William Witney, não há nenhuma surpresa em “Cowboys em Desfile” ser um filme com sequências de ação muito acima da média dos ‘bezinhos’ que naquele tempo eram ainda produzidos às dezenas. Witney dirigiu Roy Rogers 26 vezes, a partir de 1946, mudando a carreira do ‘Rei dos Cowboys’ ao reduzir os números musicais de seus filmes e torná-los mais movimentados, aproveitando esplendidamente a vitalidade e simpatia de Roy. “Cowboys em Desfile” é um faroeste que se assiste com grande prazer e enorme nostalgia, mas que também provoca admiração por seu quase onírico roteiro com situações inimagináveis em filmes do gênero. Certamente essa é uma das razões que levam Clóvis e Lázaro (vistos nas fotos à direita) a gostar tanto desse faroeste produzido em 1950 pela Republic Pictures.


Acima Clifton Young, Jack Holt e Roy
Rogers; abaixo James Magill e Young.
Pinheiros de graça para as crianças - O autor da história é Gerald Geraghty, que coloca Roy (como se tornara hábito) num western contemporâneo em que não falta automóvel. Roy Rogers é um agente de conservação florestal dos Estados Unidos que chega à cidade de Glenn Rock para verificar se está sendo respeitado o controle do corte de árvores. Roy surpreende alguns homens roubando pinheiros da propriedade de Jack Holt. Veterano mocinho (e bandido muitas vezes) de filmes desde o cinema mudo, Holt se aposentou e passou, neste esdrúxulo roteiro, a se dedicar ao plantio e corte de pinheiros para ornamentar as festas natalinas. O velho Holt vende as árvores abaixo do preço de custo para satisfazer as famílias pobres, especialmente as crianças. A benemerência de Jack Holt afeta os lucros do concorrente Aldridge (Emory Parnell) que inconformado com a prática não lucrativa de Holt tenciona atrapalhar suas simbólicas vendas. Toby (Penny Edwards), filha de Aldridge resolve apressar a vontade do pai e com o capataz Mitch McCall (Clifton Young) decide sabotar Holt e destruir seus pinheiros. McCall orienta a queima das árvores de Holt, o que só não acontece pela providencial ação de Roy Rogers. O agente governamental consegue sozinho dar conta de McCall e seus capangas, mas necessita de homens para conduzir as muitas carroças carregadas de pinheiros. Chamados pela menina Sis (Carol Nugent), um fantástico grupo de mocinhos do cinema surge em Glenn Rock para conduzir as carroças. A esta altura tanto Aldridge como sua filha Toby se sensibilizaram com o gesto humanitário de Holt e ajudam a tornar mais feliz o Natal das famílias modestas abrindo mão dos interesses financeiros.

As chegadas de Rocky Lane e Monte Hale;
o encontro de Roy e Gordon Jones com Rex Allen.
Roy Rogers cercado de mocinhos - Os executivos da Republic Pictures sabiam que os pequenos frequentadores das matinês elegiam seus ídolos e que Roy Rogers há tempos era, entre todos, o mocinho mais querido. Mas os engravatados não desconheciam o imaginário da garotada que sonhava ver os heróis juntos em algum filme. Só assim para comprovar que Rocky Lane era melhor que Roy Rogers ou vice-versa. Os fãs já haviam visto alguns mocinhos reunidos em “Out California Way”, faroeste estrelado por Monte Hale e com participação pequena de Roy Rogers, Rocky Lane e Don ‘Red’ Barry.  O chefão do estúdio Herbert J. Yates resolveu então dar um presentão no Natal de 1950 para a garotada e colocar num mesmo filme não só Rocky Lane e Roy Rogers, mas também outros mocinhos ‘top’ da Republic como Rex Allen e Monte Hale. Alguns, cuja fama declinara nos últimos anos como Tom Tyler e Ray ‘Crash’ Corrigan, também foram escalados; e mocinhos de menor expressão como Kermit Maynard e Tom Keene foram igualmente convocados. Dos tempos do cinema mudo foi lembrado William Farnum e até um notório bandidão – George Chesebro – se apresentou para ajudar Roy Rogers. Isso era muito mais que os pequenos fãs imaginavam ver, ainda que ação de verdade tenha ficado mesmo para o ‘Rei dos Cowboys’, seu cão Bullet e o cavalo Trigger.

Roy Rogers e os convidados de "Cowboys em Desfile": em pé vemos
Tom Tyler, Ray 'Crash' Corrigan, Allan 'Rocky' Lane, Monte Hale,
George Chesebro e Kermit Maynard; agachados estão Tom Keene,
Roy Rogers e William Farnun.

Gordon Jones e Carol Nugent
Duelo de roupas extravagantes - Se todos esses convidados se limitaram a pequenas aparições na tela, Roy Rogers está melhor que nunca, tanto nas lutas contra os vilões quanto mostrando sua elegância e galopando Trigger naquele que é um dos mais belos quadros do cinema western. Respeitando a ausência de Dale Evans, Roy não corteja a deliciosa mocinha Penny Edwards. Roy e Penny travam um extravagante duelo de pouco discretas vestimentas criadas pelos costureiros da Republic, duelo ainda mais acirrado que as lutas contra Clifton Young, James Magill e Lane Bradford. Em “Cowboys em Desfile” o boboca é Gordon Jones, ele que dez anos antes havia sido o herói ‘Besouro verde’ do seriado da Universal. E o simpático Jones não deixa ninguém sentir saudade de Smiley Burnette, ao fazer dupla com a garota esperta (sem ser chata) Carol Nugent. Com os belíssimos cenários do Lago e do Vale Big Bear no Parque Nacional de San Bernardino, com apenas três ou quatro canções executadas parcialmente por Roy com o auxílio de Foy Willing e os Riders of the Purple Sage, este é mesmo um western muito especial.

Os muitos trajes de Roy Rogers e Penny Edwards.

Jack Holt em "Dead Man's Gulch".
Na trilha de quem mesmo? - Neste western Penny Edwards chega sempre em um Lincoln Custom Convertible modelo 1950, mas quando há necessidade de se apagar um incêndio no filme, o carro de bombeiros parece ter saído de um short dos Comedy Capers, as comédias curtas do cinema mudo. Possivelmente pela primeira vez um western-B faz uso de imagens homenageando um antigo ídolo, quando Jack Holt aparece num excerto de um filme intitulado “Dead Man’s Gulch”. E no quarto onde Jack Holt convalesce há quadros com fotos suas, de outros mocinhos e até de seu filho Tim Holt. Como se sabe, Jack era pai também de Jennifer Holt, mocinha de muitos faroestes. Entre os ‘convidados especiais’, o que tem o melhor momento é o veterano George Chesebro, ignorado pela roda de mocinhos que se recusa a cumprimentá-lo devido à sua ‘folha corrida’ repleta de todo tipo de ato criminoso. Chesebro estica a mão e seu cumprimento é recusado, até ele lembrar que ele era facinoroso só no cinema, onde começara em 1915. Atraído pelo título original “Trail of Robin Hood” (Trilha de Robin Hood), o espectador espera qualquer ilação com o herói das florestas de Sherwood. Qual o que... Ninguém sequer lembra de Robin Hood em “Cowboys em Desfile”.

Carol Nugent olhando as fotos dos ídolos das matinês.

Publicidade inserida sobre os
rostos dos mocinhos.
A logomarca sem limites – Infelizmente a cópia em DVD de “Cowboys em Desfile” que circula no Brasil tem a chancela da empresa Cinetvnostalgia que coloca sua marca intrusivamente durante grande parte do filme. Isso mesmo sendo essa cópia em DVD extraída de forma precária de uma fita VHS. A pretexto de propaganda, Paulo Tardin entende que sua logomarca deva aparecer em todo lugar, mesmo sobre o rosto dos atores, preferencialmente nos momentos de dramaticidade. Esse é um verdadeiro atentado ao bom senso e que expressa desrespeito às obras cinematográficas. A Republic Pictures tinha entre seu grupo de técnicos os irmãos Howard e Theodore Lydecker, responsáveis pelos célebres efeitos especiais de filmes e seriados do estúdio. Verdadeiros experts do processo de miniaturização, em “Cowboys em Desfile” a arte dos Lydecker pode ser constatada na destruição de uma ponte que é queimada, tudo com pequena despesa graças à genialidade da dupla e seu econômico processo. Incontáveis foram as emoções que eles proporcionaram à privilegiada geração que dominicalmente via seus trabalhos especialmente nos seriados. Muitos DVDs com esses filmes em capítulos da Republic Pictures foram lançados no Brasil com excelente imagem e sem logomarcas abomináveis. Neles se comprova a criatividade de Howard e Theodore Lydecker.

Na primeira foto a ponte em tamanho natural; nas demais a
miniaturização dos irmãos Lydecker sendo destruída.

O Rei dos Cowboys do cinema.
A trilha que levou à TV – “Cowboys em Desfile” foi lançado no Natal de 1950 e Roy Rogers ainda atuaria em outros cinco filmes para a Republic Pictures, até seu contrato terminar, ele deixar de ser explorado e se libertar do jugo a que eram submetidos os contratados daquele estúdio. Em 1951 o ator criaria sua produtora e seria visto semanalmente na televisão, a grande inimiga dos westerns-B, com o “The Roy Rogers Show”. Por muitos anos Clóvis Ribeiro e Lázaro Narciso Rodrigues passariam a vibrar com as aventuras do Rei dos Cowboys em preto e branco numa tela de 20 polegadas. Mas assim como tantos outros fãs jamais se esqueceram de “Cowboys em Desfile”, o irresistível western-B filmado em Trucolor que reuniu os mocinhos dos tempos dourados das matinês.


Mocinhos conduzindo os pinheiros: Rocky Lane, Rex Allen e
Monte Hale; no centro Tom Tyler, Ray Corrigan e Tom Keene;
abaixo Kermit Maynard e Bill Farnum; Roy Rogers e Trigger.
O automóvel de Penny Edwards em "Cowboys em Desfile" e um
exemplar do mesmo modelo, Lincoln Custom Convertible 1950.

13 de novembro de 2014

OS MELHORES FAROESTES NA CLASSIFICAÇÃO DOS 50 PRIMEIROS TOP-TEN WESTERNS


A seção Top-Ten Westerns teve início despretensiosamente aqui no WESTERNCINEMANIA e logo passou a ser uma seção fixa. De postagem em postagem, geralmente uma a cada mês, o Top-Ten Westerns atingiu a 50.ª edição neste mês de novembro e dessa forma acabou se transformando numa enquete. Não, porém, uma enquete comum pois cada cinéfilo que tem sua lista de melhores faroestes publicada neste blog é alvo de uma minibiografia. Esse pequeno apanhado pessoal, muitas vezes escrito pelo próprio focalizado, faz com que os leitores conheçam um pouco de sua trajetória como apreciador de westerns e de cinema em geral. E com que time de  conhecedores o Top-Ten Westerns teve o prazer de fazer contato! Muitos desses conhecedores eram velhos amigos do editor mas a maior parte interagiu com o blog enriquecendo sobremaneira as postagens.


Todos os 50 cinéfilos que indicaram seus Top-Ten Westerns.

Enquetes para a escolha dos melhores faroestes existem às dezenas, em livros, revistas e espaços na Internet. Porém a enquete do WESTERNCINEMANIA é única não só pelo número de participantes que atinge agora o 50.º cinéfilo, mas principalmente pela transparência e pela possibilidade de diálogo entre os seguidores do blog. Todos os Top-Ten Westerns podem ser acessados na lista de postagens na coluna à direita, neste blog.
Diversos participantes desta enquete fizeram em algum momento e por conta própria contagens parciais da mesma e esta postagem publica uma totalização, também parcial, com as 50 listas indicadas até agora. O critério adotado para a pontuação dos filmes listados é o de 10 pontos para o primeiro colocado, 9 pontos para o segundo, seguindo a ordem descendente até um ponto para o 10.º colocado. Alguns autores da enquete entenderam que suas listas de Top-Ten Westerns não deveria obedecer ordem classificatória dos filmes. Para essas listas foi adotado o critério de cinco pontos para cada faroeste, exceção feita às listas que indicaram um filme como o melhor, seguidos de nove outros com idênticas qualidades. Algumas informações foram aduzidas à classificação, inclusive um quadro comparativo com a enquete elaborada em 2011.
O Top-Ten Westerns prosseguirá sendo publicado porque é grande o universo de fãs de faroestes. E esta postagem tem o objetivo de agradecer a todos que colaboraram com o WESTERNCINEMANIA. A ordem das fotos publicadas no álbum de cinéfilos acima obedeceu a ordem das postagens feitas pelos verdadeiros autores desta que é a mais importante seção do blog. 
 
Alan Ladd, o Shane de "Os Brutos Também Amam".

Nas fotos cenas dos demais faroestes mais bem votados: "Rastros de Ódio",
"Matar ou Morrer", "No tempo das Diligências", "O Homem que Matou o
Facínora", "Onde Começa o Inferno", "Era Uma Vez no Oeste",
"Meu Ódio Será Sua Herança", "Sete Homens e Um Destino" e "Rio Vermelho".

           
          CLASSIFICAÇÃO DAS 50 PRIMEIRAS POSTAGENS DE
TOP-TEN WESTERNS

  1.º)  Os Brutos Também Amam (Shane) - 244
  2.º)  Rastros de Ódio (The Searchers) - 222
  3.º)  Matar ou Morrer (High Noon) - 186
  4.º)  No Tempo das Diligências (Stagecoach) - 150
  5.º)  O Homem que Matou o Facínora (The Man Who Shot Liberty Valance) - 103
  6.º)  Onde Começa o Inferno (Rio Bravo) - 94
  7.º)  Era Uma Vez  no Oeste (C’Era Uma Volta Il West) - 93
  8.º) Meu Ódio Será Sua Herança (The Wild Bunch) - 85
  9.º)  Sete Homens e Um Destino (The Magnificent Seven) - 83
10.º)  Rio Vermelho (Red River) - 75
11.º)  Da Terra Nascem os Homens (The Big Country) - 62
12.º)  Três Homens em Conflito (Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo) - 60
13.º)  Paixão dos Fortes (My Darling Clementine) - 57
14.º)  Vera Cruz (Vera Cruz) - 50
15.º)  O Último Pistoleiro (The Shootist) - 42
16.º)  Butch Cassidy (Butch Cassidy and the Sundance Kid) - 40
17.º)  Consciências Mortas (The Ox-Bow Incident) - 39
18.º)  Johnny Guitar (Johnny Guitar) - 37
19.º)  Pistoleiros do Entardecer (Ride the High Country) - 36
20.º)  Os Imperdoáveis (Unforgiven) - 34

Considerando-se apenas os dez faroestes mais votados, com quatro westerns John Ford é o diretor com o maior número de filmes; Howard Hawks apareceu com dois, ficando os demais para George Stevens, Fred Zinnemann, Sergio Leone, Sam Peckinpah e John Sturges. Uma curiosidade da contagem das listas é a ausência de westerns de Anthony Mann entre os mais votados. Reputado como um dos maiores diretores do gênero da história do cinema, Mann obteve o maior número de pontos (26) com “O Preço de um Homem”. Mais estranho ainda é que Anthony Mann empatou com John Ford quanto aos diretores com o maior número de westerns nas 50 listas, ambos com 8 filmes; Budd Boetticher vem a seguir com 7 faroestes e Sergio Leone teve 5 citações de seus filmes, ou seja, todos os westerns que dirigiu. 

John Ford, Anthony Mann e Budd Boetticher.


Duas vezes
Vera Miles
John Wayne teve seis dos westerns em que atuou entre os votados neste Top-Ten parcial; nenhum outro ator conseguiu emplacar seu nome em dois faroestes desta classificação, exceto Ben Johnson que atuou em dois, ainda que como coadjuvante em um deles (“Shane”). E John Wayne é o líder absoluto de presenças nos filmes listados pelos 50 participantes da enquete, com um total de 13 presenças; a seguir aparecem James Stewart e Henry Fonda com 10; Randolph Scott com 8; e empatados Burt Lancaster, Kirk Douglas e Clint Eastwood com 6. Dos atores surgidos nas três últimas décadas Kevin Costner foi o mais lembrado, com quatro faroestes. A única atriz que atuou em mais de um western da lista de 20 filmes melhor classificados foi Vera Miles, que participou de “Rastros de Ódio” e de “O Homem que Matou o Facínora”.

John Wayne, James Stewart e Henry Fonda.


“Os Brutos Também Amam” foi o filme que obteve o maior número de primeiros lugares nas 50 listas, com um total de 8 primeiros lugares e 9 segundas colocações; “Rastros de Ódio” foi o melhor faroeste para 7 cinéfilos e outros 7 o escolheram como segundo melhor faroeste. Outros westerns que foram votados como melhores em suas respectivas listas foram: “Matar ou Morrer” que ficou 5 vezes em primeiro lugar; “No Tempo das Diligências” e “Era Uma Vez no Oeste”, 4 vezes cada um em primeiro lugar; “Três Homens em Conflito” e “Da Terra Nascem os Homens” duas vezes cada um em primeiro; “Pacto de Justiça”, “O Preço de um Homem”, “O Último Pistoleiro”,  “Rio Vermelho”, “Paixão dos Fortes”, “Johnny Guitar”, “Meu Ódio Será Sua Herança” e “Vera Cruz”, todos uma vez cada no posto de honra de diferentes listas. Dos westerns filmados nas últimas três décadas, os mais bem votados foram “Os Imperdoáveis” com 34 pontos; “Cavaleiro Solitário” (21), “Pacto de Justiça” (16), “Dança com Lobos” (27) e Tombstone (22).

Kevin Costner em "Pacto de Justiça" e Kurt Russell em "Tombstone".
RESULTADO FINAL DA ENQUETE DO BLOG WESTERNCINEMANIA
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