John Ford |
Há nos Estados Unidos uma série de
organizações sindicais criadas com o intuito de proteger os profissionais
ligados ao cinema de possíveis prejuízos que possam vir a sofrer em suas
carreiras. A mais conhecida delas é o Screen Actors Guild (SAG), que associa os
atores. Por sinal essa entidade fundada em 1933 passou a existir em 2012 com
outro nome, a SAG-AFTRA, reunindo também atores de televisão e rádio. Também
criada em 1933 foi a Screen Writers Guild que em 1954 dividiu-se em Writers Guild
of America West e Writers Guild of America East, passando igualmente a
concentrar escritores de cinema, televisão e rádio. Criada em 1936, a Screen
Directors Guild, é uma entidade que associa diretores e que em 1960 teve o nome
mudado para Directors Guild of America. A DGA conta com mais de 14 mil
associados, todos diretores de cinema, rádio e televisão. Talvez a mais famosa
reunião do Screen Directors Guild tenha sido aquela ocorrida em 1950 e na qual
John Ford fez a célebre declaração iniciada com “My name is John Ford anda
I make westerns...”, calando a boca de reacionários como Cecil B. DeMille que
estava a serviço do macarthismo. Em 1985 a Directors Guild of America alterou
seu estatuto, após reunião de seus associados, com uma emenda que ganhou o nome
de “The Clint Eastwood Amendment”.
Philip Kaufman |
Diretores
conquistadores - Quando foi iniciada em 1975 a produção de “Josey Wales, o
Fora-da-Lei” (Outlaw Josey Wales) a Warner Bros., associada à Malpaso (a
produtora de Clint), indicou para dirigir esse western Philip Kaufman. O último
filme de Kaufman, diretor então com 39 anos havia sido “Sem Lei e Sem
Esperança” (The Great Northfield Minnesota Raid), abordagem sobre os últimos dias de Jesse James muito bem recebida
pelos críticos. Para esse filme Kaufman
havia também escrito o roteiro. E foi o mesmo Kaufman quem escreveu o roteiro
de “Josey Wales, o Fora-da-Lei”. A escolha da atriz Sondra Locke, contratada
para interpretar ‘Laura Lee’ foi feita por Clint Eastwood à revelia de Kaufman.
Desde que Clint havia conhecido rapidamente Sondra naquele mesmo ano, não a
esquecera e nasceu entre ambos um romance que o casal não teve preocupação de
esconder, em que pese Clint estar casado desde 1953 com sua esposa Maggie
Johnson. Acontece que Kaufman, que também era casado, se interessou igualmente
por Sondra Locke. A jovem atriz de 31 anos deu um ‘chega pra lá’ em Kaufman mas
o diretor insistiu no assédio à protegida de Clint que, finalmente, decidiu
acertar as contas com Kaufman.
Robert Wise |
Robert
Wise intervém - O lema de Clint Eastwood como produtor (e diretor) sempre
foi ‘under the budget and under the schedule’, ou seja, filmar em menos tempo
do que o previsto e com economia. O estilo de Philip Kaufman era exatamente o
oposto pois esse diretor filmava de modo meticuloso, sem pressa, prendendo-se a
inúteis detalhes, inúteis na concepção artística de Clint. Numa certa sequência
em que Kaufman tinha que aproveitar o pôr-do-sol, ele demorou tanto para
filmar que o sol acabou se escondendo, levando ao desespero o produtor
Eastwood. Foi a gota d’água e Clint demitiu Kaufman, assumindo ele próprio a
direção do western. Toda Hollywood tomou conhecimento do fato e Kaufman foi se
queixar ao Directors Guild of America, que era presidido por Robert Wise. O
premiado diretor de “Amor Sublime Amor” e “A Noviça Rebelde” mandou um ofício
para Clint Eastwood dizendo que ele não poderia substituir Kaufman pois além de dono do filme como produtor, ele era também o ator principal.
Marlon Brando |
Famosos
diretores dispen-sados - Muitos diretores foram dispensados
por ‘ordem expressa’ de atores que se julgavam mais importantes que o próprio
filme. Anthony Mann foi dispensado da direção de “A Passagem da Noite” (The
Night Passage) por James Stewart, em 1957, com James Neilson assumindo a
direção. Em 1960 o também produtor (Bryna Productions) Kirk Douglas dispensou o mesmo Anthony
Mann da direção de “Spartacus” substituindo-o por Stanley Kubrick. Até aí nada
demais, a não ser a prática do poder dos produtores falando mais alto, atitudes
aceitas pelo sindicato dos diretores. Mas eis que em 1960 Stanley Kubrick foi
dispensado da direção de “A Face Oculta” (One-Eyed Jacks) por Marlon Brando e o
próprio Marlon, ator e produtor associado (Pennebaker Productions) desse western tomou a
direção. A atitude de Brando deu o que falar mas não resultou em nada, uma vez
que Brando agira como ‘produtor’, ainda que seu inflado ego o levasse a crer
que dirigiria melhor que Kubrick. E não é que Brando fez um belíssimo western!
Em 1975 os diretores já não eram mais contratados dos estúdios como em outras
décadas e o Directors Guild of America estava muito mais forte e atuante.
Clint Eastwood |
A
Emenda Clint Eastwood – O ator-produtor-diretor resolveu a
questão criada na produção de “Josey Wales, o Fora-da-Lei” à maneira do
‘estranho sem nome’ e com poucas palavras deu uma indenização a Philip Kaufman,
que aceitou prontamente, até porque a situação entre ambos tornara-se
insustentável. E Robert Wise aplicou uma multa de 50 mil dólares a Clint pela
desobediência à recomendação do Director Guild of America. Wise reuniu o
conselho do DGA e foi proposta e votada uma regra segundo a qual nenhum
ator-produtor poderia dispensar um diretor depois de as filmagens iniciadas e
tomar, esse ator-produtor, o lugar do diretor dispensado. Diretores somente poderiam ser substituídos por diretores. E no caso de Clint
Eastwood, era ele também membro da DGA pois já havia dirigido cinco filmes,
mais até que Kaufman que contava com quatro filmes dirigidos em sua filmografia
como diretor. A regra criada pelo DGA ficou conhecida como ‘The Clint Eastwood
Amendment’. Para evitar novos problemas com diretores, Clint passou a dirigir
praticamente todos os filmes que produzia e atuava. Quando não dirigia Clint
colocava homens de sua inteira confiança como James Fargo, Buddy Van Horn e mesmo
Don Siegel. Clint se desentendeu com Siegel em “Alcatraz, Fuga Impossível”, com
ambos não mais voltando a se falar, para desgosto de Don Siegel. Mas Clint não
esqueceu o amigo pois dedicou “Os Imperdoáveis” (Unforgiven) a Sergio (Leone) e
a Don (Siegel).
Sondra Locke |
Clint e a Warner Bros. pagam indenizações - Com Sondra Locke o comportamento de
Clint Eastwood foi ainda pior pois após viver com ela por oito anos e
tê-la como atriz principal em cinco de seus filmes, Clint simplesmente decidiu
apagá-la de sua vida, sem direito algum aos anos de vida em comum. Inconformada
Sondra acionou Clint na Justiça de Los Angeles. Vingativo como seus
personagens, Clint fez com que a Warner Bros., com quem Sondra assinara um
acordo para dirigir três filmes, a impedisse de trabalhar atuando ou dirigindo
filmes. Mais uma vez a pequenina Sondra, feito Davi, denunciou na Justiça de
Los Angeles, por fraude e não cumprimento de contrato, o gigantesco Golias que
era o estúdio e, foi reconhecido pela corte o seu prejuízo e nova indenização veio
a se somar àquela paga a Sondra por Eastwood. O montante recebido pela
atriz-diretora foi mantido em segredo conforme acordado entre as partes, mas
especulou-se que a quantia ficou entre 15 e 30 milhões de dólares. Após o
desfecho dos processos Sondra ainda ganhou mais um pouco de dinheiro com a
publicação do livro de sua autoria intitulado “The Good, the Bad and the Very Ugly”,
cujo título (e texto) deve ter provocado a ira de Clint Eastwood.
O último western de Clint Eastwood, na foto ao lado de Morgan Freeman. |
Clint
filmando sem parar - A carreira de Sondra acabou, mas a de Clint prosseguiu. Clint teve filhos
com quatro mulheres diferentes e casou-se em 1996 com Dina Eastwood, sua segunda
esposa. Dina entrou há alguns meses com pedido de divórcio do ator de 83 anos. Como
diretor Clint consolidou sua carreira como um dos mais prestigiados diretores
de cinema de seu tempo e como produtor ganhou muito dinheiro com seus filmes
rodados ‘under the budget and under the schedule’. Dois dos filmes de Clint
Eastwood receberam prêmios Oscar de Melhor Filme do Ano, respectivamente “Os
Imperdoáveis” (Unforgiven) e “Menina de Ouro” (Million Dollar Baby). Incansável,
Clint Eastwood não tem planos de aposentadoria e concluiu recentemente “Jersey Boys”,
biografia do grupo vocal ‘The Four Seasons’ e trabalha da pré-produção de “American
Sniper”, com lançamento previsto para 2015. Pena que Eastwood não mais tenha
retornado ao faroeste, ele que, como personagem do gênero western só fica atrás
de John Wayne que é um autêntico ‘hors concours’ nessa categoria.
Sondra Locke e a capa de seu livro; à direita Sondra em "Bronco Billy". |
Clint Eastwood com a primeira esposa Maggie Johnson; abaixo Clint com Dina, sua segunda esposa. |
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