James Arness, Dennis Weaver e Raymond Burr em suas séries de sucesso na TV. |
Um dos melhores dentre os atores de
Hollywood revelados nos anos 40, Robert Ryan nunca chegou a ser considerado
verdadeiro astro, isto apesar de demonstrar filme após filme suas qualidades
como excelente intérprete. Com estilo sóbrio bastante parecido com o de Gary
Cooper, faltou a Ryan justamente o carisma natural dos grandes astros como o
próprio ‘Coop’. Em “Rancor”, drama-noir de 1948, Robert Ryan já demonstrara seu
talento dramático, comprovado no ano seguinte com “Punhos de Campeão”, filme
sobre boxe dirigido por Robert Wise, com estupenda atuação de Ryan como o
sofrido pugilista decadente vítima da máfia que dominava a chamada ‘nobre
arte’. Em “Império do Pavor” (Horizons West), de 1952, Robert Ryan voltou a ser
o principal nome do elenco, antes de definitivamente passar à condição de ator
coadjuvante, como no admirável “O Preço de um Homem” (The Naked Spur), filmado
no ano seguinte. Enquanto Robert Ryan prosseguia em sua carreira pelos
próximos 20 anos, invariavelmente como coadjuvante, até falecer em 1973 aos 63
anos de idade, diversos atores de “Império do Pavor” se tornariam nomes
bastante conhecidos devido ao sucesso na televisão. Assim foi com James Arness
(“Gunsmoke”), Dennis Weaver (“McCloud”), Raymond Burr (“Perry Mason”) e, mais
que todos Rock Hudson, um dos maiores astros do cinema e sex-symbol dos anos 50
e 60. Consagração nos anos seguintes após “Império do Pavor” também receberia
seu diretor Budd Boetticher que, com este western, indicava ser um dos bons
realizadores naquelas produções em que o reduzido orçamento não impedia a
evidente qualidade artística.
James Arness, Rock Hudson e Robert Ryan como soldados confederados. |
Carreira
criminosa - “Império do Pavor” é uma história de autoria do escritor russo,
radicado nos Estados Unidos, Luis Stevens, história que começa com o retorno
dos dois irmãos Hammond da Guerra Civil. São eles os texanos ex-major
confederado Dan (Robert Ryan) e Neil (Rock Hudson), que voltam da guerra
acompanhados do amigo Tiny McGilligan (James Arness). Os três chegam à pequena
fazenda dos Hammond que é administrada por Ira Hammond (John McIntire), pai de
Dan e Neil. Dan se depara com as mudanças ocorridas na cidade de Austin, onde o
dinheiro permite a ostentação de pessoas como o casal Hardin, formado pela
elegante Lorna (Julie Adams) e por seu marido, o jogador Cord Hardin (Raymond
Burr). Dan Hammond logo descobre que a vida difícil e cansativa de rancheiro
não fará dele, em curto espaço de tempo, um homem bem sucedido financeiramente.
Dan decide organizar um bando e praticar roubos de gado que permita que ele
salde uma dívida de jogo com Cord Hardin. Em seguida, com a ajuda de
autoridades locais, Dan Hammond se apossa ilegalmente de terras de pequenos
sitiantes. Dan se interessa também pela esposa do jogador Cord Hardin e este
sequestra e tortura Neil Hammond para que ele confesse os crimes do irmão. Dan se
defronta com Hardin, a quem mata em legítima defesa. Rapidamente Dan Hammond
constrói um pequeno império na região, fruto dos delitos cometidos. Acostumada
com uma vida de riqueza, Lorna passa a viver com Dan, enquanto a cidade de
Austin se revolta com o domínio crescente e a sucessão de crimes do ex-major.
Dan termina preso mas consegue escapar da prisão e mata o ex-amigo Tiny
McGilligan. Indignados com a ação de Dan, seu irmão Neil e seu pai Ira o
enfrentam pondo fim ao terror instalado por Dan Hammond na região de Austin.
Rock Hudson; James Arness e Hudson de arma em punho. |
John Mcintire, Frances Bavier e Robert Ryan: pais e filho. Abaixo Ryan. |
Sulista
frustrado e ambicioso - A guerra deixa sequelas de várias
espécies, inclusive psicológicas, que podem afetar igualmente vencidos ou
vencedores. Os dias que se seguiram à Guerra Civil foram difíceis especialmente
para os sulistas e mais ainda para seus oficiais responsáveis maiores pela
derrota dos Estados Confederados. Enquanto oficiais do Norte ganharam importância sendo alçados
inclusive a cargos políticos, aos perdedores sobrava apenas encontrar um meio
decente de sobrevivência. Mas havia a opção de trilhar o caminho de fora-da-lei
que podia trazer enriquecimento rápido. Foi o que fez o ex-major confederado
Dan Hammond, em “Império do Pavor”, contrariando os princípios de sua humilde
mas honesta família. Como espécie de Caim no gênesis bíblico, Hammond carrega a
maldade que é despertada pela conjuntura social do pós-Guerra Civil. E à medida
que aumenta seu poder Hammond se deixa dominar pela cobiça de criar um império
não faltando nem mesmo uma bela mulher a seu lado, roubada de um desafeto que
Hammond afasta de seu caminho. O tema da cobiça desenvolvido excepcionalmente
nas obras-primas “Ouro e Maldição” de Eich von Stroheim, e em “O Tesouro de Sierra
Madre” de John Huston, ganha contornos de tragédia familiar neste western de
Budd Boetticher. Preocupado apenas em contar uma boa história com muita ação em
81 minutos, Boetticher não aprofunda as questões que levam Hammond a se
autodestruir. O que enriquece sobremaneira “Império do Pavor” é a performance
de Robert Ryan que dá a seu personagem os necessários tons de frustração e
ambição.
A voz da cobiça. |
O
crime organizado no Velho Oeste - “Império do Pavor” denuncia a
estrutura corrupta do poder que permite que alguém inescrupuloso como Hammond
se torne poderoso dono de terras. Fazem parte da malta subornada ou intimidada por Hammond o cartorário escroque que frauda escrituras, o advogado que defende criminosos com a conivência de juíz e o habitual xerife a
soldo do poderoso. Um
dos episódios de “Império do Pavor” se passa numa região mexicana chamada Zona
Livre, dominada por um megalomaníaco general corrupto interpretado por Rodolfo
Acosta. A citação dessa ‘Zona Libre’ ajuda a
compreender como se construía grandes fortunas de origem criminosa na fronteira
Estados Unidos-México. Esse quadro do Velho Oeste é o pano de fundo da história
de Louis Stevens levada à tela com competência por Budd Boetticher, ainda que o
que sua intenção tenha sido realizar simplesmente um bom faroeste. E “Império do Pavor”
é mais que um bom faroeste, assim como “Sangue por Sangue” (The Man from the
Alamo) do próprio Boetticher, antecipando a série da Ranow com Randolph Scott
roteirizada por Burt Kennedy.
O cartaz alerta sobre o perigo de se invadir a 'Zona Libre', comadada pelo corrupto general mexicano interpretado por Rodolfo Acosta, na foto à direita com Alberto Morin. |
Robert Ryan e John McIntire. |
Pai e filho em lados opostos da lei - Nenhuma surpresa na excelente
interpretação de Robert Ryan que, aos 43 anos de idade, interpreta o filho de
John McIntire, então com 45 anos. Com os cabelos grisalhos McIntire convence
inteiramente como personagem pelo menos 20 anos mais velho, distante dos tão
conhecidos ‘atores característicos’ que se repetem a cada filme. McIntire é
desses atores a quem não se faz reparo algum às interpretações. Rock Hudson,
que demorou para ser reconhecido como bom ator, se esforça para não destoar
diante de Ryan e McIntire. Julie Adams foge do padrão de atuações pelas quais
ficaria conhecida, como a moça meiga e honesta incapaz de uma leviandade, vivendo até que bem uma mulher
sensual e que escolhe seus próprios caminhos. Raymond Burr menos excessivo que
em “Um Lugar ao Sol” e menos contido que em “Janela Indiscreta” consegue
despertar a antipatia do espectador, o que seu personagem requeria. James
Arness é ironicamente chamado de ‘Tiny’ (Pequenino) e Dennis Weaver é ‘Dandy’
(Almofadinha), num elenco de muito rostos conhecidos como Alberto Morin,
Rodolfo Acosta, Walter Reed, John Hubbard, Peter Mamakos e Dan White. Peter
Mamakos, vale recordar, é o comerciante que dá informações a Ethan Edwards (John
Wayne), Martin Pawley (Jeffrey Hunter) e Mose Harper (Hank Worden) sobre o
chefe Cicatriz em “Rastros de Ódio” (The Searchers).
Robert Ryan, Julie Adams e Raymond Burr; Julie e Robert. |
Julie Adams |
Economia
e prodigalidade - A Universal Pictures realizava pequenos westerns economizando no
elenco, composto em parte por suas descobertas sob contrato, como Julie Adams,
Rock Hudson e Dennis Weaver (em sua estreia no cinema); ou atores confiáveis
como John McIntire e Tom Powers; e um ator principal cujo salário não
assustava, como Robert Ryan. E o estúdio economizava muito na trilha sonora, como em "Império do Pavor" que, sob a direção de Joseph Gershenson, utilizou trechos de ‘stock music’
composta por maestros como Miklós Rózsa e Frank Skinner, contando ainda com a
criatividade de um certo jovem e talentoso maestro chamado Henry Mancini. O
belo Technicolor completa a produção de “Império do Pavor” que não economiza
num aspecto técnico notável: a direção de arte com decoração de cenários
perfeita. E chama a atenção também o guarda-roupa usado por Julie Adams, de
fazer inveja à própria Scarlett O’Hara de David O. Selznick. “Império do Pavor”
é daqueles pequenos westerns que agradam em cheio aos fãs do gênero, tornando-se
imprescindível aos que querem conhecer melhor a obra de Oscar ‘Budd’ Boetticher
Jr..
Os muitos modelos desenhados por Rosemary Odell para o personagem de Julie Adams; na foto abaixo à direita Julie e Walter Reed. |
John McIntire e Robert Ryan. |
Os charutos personalizados de Rodolfo Acosta; o aviso da 'Zona Libre'. |
Robert Ryan. |
FERNANDO MONTEIRO escreveu:
ResponderExcluirBela homenagem a um dos grandes realizadores de Westerns autênticos: Mestre BUDD BOETTICHER, talento & instinto, força e imprevisibilidade de um homem [muito] fora do comum... e, talvez até hoje, incompreendido como o foi, em vida.
Neste Domingo de Páscoa, gostaria de tornar isso mais do que uma frase de cumprimento, e, por isso, solicitar que vc me envie -- pelo e-mail -- o seu atual endereço, amigo DARCI FONSECA, para lhe fazer presente de um "card" autografado por BOETTICHER (com Certificado Original de Autenticidade, naturalmente).
Abraço,
FERNANDO MONTEIRO
Feliz Páscoa também para você, Fernando.
ResponderExcluirAbraço do Darci
Oi, Darci!
ResponderExcluirInfelizmente, ainda não tive a oportunidade de assistir esse, mas pelo seu diretor e seu astro, o filme poderia ter o subtítulo “O Filme dos Subestimados”. Do diretor Boetticher somente conheço a clássica série com Randolph Scott, ”Revolta do Desespero” e “Seminole”, ou seja, o que passou na TV e os raros DVDs lançados, mas neste pouco que conheço de sua obra, se nota o diretor fantástico que ele era, onde de uma falsa simplicidade o cara fazia obras de camadas complexas, mas sem perder o alvo do entretenimento, muitas vezes com poucos recursos, como visto em obras como “Resgate de Bandoleiro” e o “Homem que Luta Só”, onde somente com 4 ou 5 personagens e o deserto como maior parte do cenário, realizou clássicos inesquecíveis. Pena, a ingrata Hollywood, considerá-lo um “diretor arriscado e antiquado”, depois de sua obsessiva luta para realizar ”Arruza”. Já Robert Ryan pra mim é um dos grandes do western e da história do cinema . Infelizmente não conseguiu o reconhecimento de um John Wayne, de um Gary Cooper, de um James Stewart e outros, uma por não ter tantas obras-primas no currículo como os citados e outra, é que geralmente ele era protagonista em filmes de menor orçamento, e coadjuvante de luxo nos Classe A. Mas em termos de talento, rivalizava de igual, quando não superava aqueles astros, roubando a cena em muitos filmes. Era daqueles atores, que sem precisar de recursos como maquiagens elaboradas, somente de cara limpa, podia num filme ser um vilão racista (como você citou em “Rancor”, de Edward Dmytryk), noutro um digno profeta (João batista em “Rei dos Reis”, de Nicholas Ray) e até um ingênuo patriarca caipira (em “O Pequeno Rincão de Deus”, de Anthony Mann). Acho que seus faroestes mais conhecidos são o ”Preço de Um Homem”, onde interpreta o inesquecível vilão manipulador Ben Vandergroat, “Meu Ódio Será sua Herança”, como o conflituoso Deke Thornton, e o especialista em cavalos de “Os Profissionais”. Mas com o próprio Darci já demonstrou aqui, ele tem muitas outras obras que precisam ser descobertas, como este “Império do Pavor” e “Quadrilha Maldita”. Não sei precisar o que faltou em sua carreira para ele realmente “explodir”, pode ser uma falta de carisma maior, como citou o Darci, pode ser que faltou “aquele filme”, que muda tudo na vida de um ator, ou será que foi por ele ser um sujeito simplesmente interessado em cumprir seu trabalho para o qual foi contratado? Pois, pelo que li no Wikipédia, ele foi um dos sujeitos mais simples e decentes de Hollywood, que realmente amava interpretar. Características como essas, num mundo de egos inflados como Hollywood, podem ser desvantajosas, haja visto, as infinitas histórias de guerras de vaidades dosa astros, algumas, inclusive, contadas neste blog. Uma pena! Ah, Darci, falando também em James Arness, na biografia do ator, há quase 3 anos atrás, o senhor escreveu: “... a extraordinária história da série “Gunsmoke” na televisão norte-americana, programa de tal forma importante que merecerá em breve uma matéria especial de CINEWESTERNMANIA". Além de dessa biografia do Arness, só achei uma outra matéria de como ele foi “male agradecido” (como diz minha vó) com John Wayne, mas não vi a prometida matéria especial sobre “Gunsmoke”. Ou eu me perdi no blog e não vi, ou senhor esqueceu de postá-la. Qual dos dois? Abraços
Robson
Olá, Robson
ResponderExcluirFilme dos subestimados... De fato, Ryan e Boetticher nunca tiveram por parte da imprensa maior atenção. Boetticher, ainda em vida chegou a ver o reconhecimento da crítica. Ryan é, entre os tantos 'Roberts' da tela é um dos menos conhecidos do grande público.
Abraço do Darci
PS - Entre em contato por e-mail, por favor.
Que excelente comentário sobre Robert Ryan você fez. Estou devendo não apenas a matéria sobre Gunsmoke mas também sobre Bonanza e outras séries westerns de TV. Espero, a partir de maio, voltar a publicar mensalmente postagens sobre séries de TV,
Eu esperava mais deste filme !! Apesar do Boetticher e grandes astros,parece que faltou algo mais forte,um roteiro mais consistente,talvez!!
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