15 de fevereiro de 2014

O CADERNO DE MOCINHO DO PRIMEIRO ANO DO GRUPO ESCOLAR DA MENINA JANETE


Caderno espiral com os Cartwrights
na capa.
Os garotos crescidos nas décadas de 40 a 60 gostavam de se identificar com seus heróis preferidos. Esses heróis eram geralmente um dos mocinhos dos faroestes produzidos em série no cinema ou mais tarde seriados de TV. Roy Rogers era o preferido, seguido de perto por Rocky Lane, Hopalong Cassidy e Durango Kid. A geração da TV gostava de Bat Masterson (Gene Barry), Bret Maverick (James Garner), Josh Randall (Steve McQueen), Lucas McCain (Chuck Connors) e o clã dos Cartwrights (Lorne Greene, Dan Blocker, Michael Landon e Pernell Roberts). Além do cinturão que imitava o do mocinho, havia uma série de itens que levavam os meninos a se imaginar como se fossem seus próprios heróis. Nos Estados Unidos empresas especializadas na fabricação de brinquedos produziam, além das vestes e cinturões ‘dos heróis’, canivetes, lanternas, relógios, canecas, pratos, bicicletas, patinetes, máquinas fotográficas, kits para montar e muitos itens mais. Na hora de ir para a escola o estojo, a lancheira e a garrafa térmica traziam igualmente as imagens dos mocinhos (*) . Aqui no Brasil esses objetos de desejo não eram encontrados, com exceção dos cinturões e das lancheiras. Mesmo cadernos evocando o faroeste não eram comuns, mas eles existiam e certamente privilegiados meninos neles faziam suas lições. E uma certa menina também...

Acima o aluno Amácio Mazzaropi;
abaixo a EE Amadeu Amaral.
A escola de Mazzaropi - Janete Félix Palma viveu a primeira infância no bairro Cangaíba, vizinho da Penha, na capital de São Paulo. Quando Janete estava em idade escolar a família se mudou para o Belém, bairro também da Zona Leste, onde a menina brincava, entre outras brincadeiras, de mocinha e bandida com as amiguinhas (**). Janete estudou no Grupo Escolar Amadeu Amaral, um dos mais tradicionais colégios da Zona Leste, fundado em 1905 e localizado no Largo São José do Belém. O belo edifício que ainda mantém em algumas áreas os originais ladrilhos portugueses ali assentados há mais de um século é tombado pelo Condephaat (Conselho do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo). Esse colégio possui três andares e dezenas de salas de aula, num terreno de aproximadamente cinco mil metros quadrados. De 1919 a 1922 o Grupo Escolar Amadeu Amaral teve um aluno chamado Amácio Mazzaropi que se tornaria muito famoso através do personagem imortal que criou no cinema nacional. Como se vê na foto em que o menino Mazzaropi está em destaque, o então Grupo Escolar do Largo de São José do Belém (o colégio receberia o nome de ‘Amadeu Amaral’ em 1932), não exigia uniforme dos alunos.

Meninos e meninas bem separados - Porém nas décadas seguintes meninos e meninas deviam comparecer às aulas devidamente uniformizados. Os meninos com camisa branca e calça azul e as meninas vestidas com saia azul, blusa branca e muitas portavam uma fita também branca com laço na cabeça. Janete era uma das alunas do Grupo Escolar Amadeu Amaral, tendo como Professora no primeiro ano Dona Francisca. Carinhosamente chamada pelo alunos de ‘Dona Francisquinha’, a mestra de pequena estatura, magra e delicada era muito querida pela aluna Janete que jamais esqueceu da enorme paciência da professora com os alunos. A classe mista tinha os meninos de um lado da sala e as meninas de outro, bem divididos, assim como no recreio quando uma servente (hoje inspetora de alunos) postava-se estrategicamente mantendo a criteriosa divisão. Meninos ficavam de um lado do pátio e as meninas do outro sob a severa vigilância da servente e muitos alunos não disfarçavam a inveja que tinham por um dos cadernos da aluna Janete.

Tradicional foto de recordação do 1.º ano de Janete Félix Palma.

Cadernos comuns e o caderno da menina Janete.
Caderno muito especial - Cumprido o primeiro semestre, um dos cadernos de Janete estava terminando e sua irmã Jacira a levou a uma papelaria do bairro para adquirir um novo. Foram mostrados diversos cadernos para que a menina escolhesse um deles e quase todos tinham na capa desenhos de flores, árvores, paisagens e outros figuras que as meninas gostavam. Mas Janete percebeu um caderno diferente e foi esse que ela separou para comprar. O escolhido tinha cowboys montados em seus cavalos e até um carroção, tudo muito parecido com os filmes e seriados de TV do gênero western que Janete adorava assistir. E toda feliz levou para casa seu novo caderno para nele escrever as lições passadas por Dona Francisquinha. A mestra talvez pudesse perceber que o desenho lembrava a figura lendária do mocinho Buck Jones montando seu cavalo branco Tarzan. E o cowboy mais novo que seguia atrás parecia bastante com Tim Holt, outro mocinho famoso. A escolha desse caderno foi um prenúncio da importância do cinema na vida de Janete, ela que ama a sétima arte, tanto que seu esposo Renato é Professor de Cinema. Única mulher a ter seu Top-Ten Westerns publicado aqui no WESTERNCINEMANIA, essa lembrança carinhosamente guardada por Janete Félix Palma comprova que desde cedo ela gostava de faroestes. E mais de 50 anos depois Janete assiste a muitos faroestes e, para a alegria do editor, é leitora constante das postagens que relembram tantos faroestes que a emocionaram. Desde menina.

A cinéfila Janete Félix Palma, única mulher a postar um Top-Ten Westerns
no blog WESTERNCINEMANIA.



3 comentários:

  1. Querido Darci

    Estou muito feliz de ver o artigo sobre meu caderno e minha escola primária!
    Amei o artigo. Fiquei até emocionada por você ter colocado tantos detalhes.
    Voltei no tempo! Senti saudades da dona Francisquinha! Dos azulejos, que eu reparava também. Eram vistosos.
    Às vezes, em dias de eleições, eu vou lá na escola para visitá-la.
    Estou orgulhosa de ainda ser a única mulher que postou o Top-Ten, mas gostaria que outras companheiras também mostrassem seus gostos pelos faroestes. Quem sabe, ainda aparece!
    Obrigada por esse lindo artigo!
    Abraços!!!!

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    1. Olá, Janete
      O Westerncinemania é quem agradece por você ter, mais uma vez, colaborado com o blog. Suas lembranças são as lembranças de todos que viveram esse tempo maravilhoso em que a escola pública ensinava tantos ou mais que as particulares, deixando orgulhosos pais e alunos.
      Torço também para que outras mulheres imitem seu destemido Top-Ten.
      Grande abraço do Darci

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  2. Que bela matéria !! Gostei ! Abraços à Janete !!

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