26 de setembro de 2011

FÚRIA ABRASADORA (RAMROD), CLÁSSICO WESTERN NOIR


Nos anos 40 foi criado o gênero cinematográfico denominado filme noir que resultou em obras-primas irretocáveis como “Pacto de Sangue”, “O Terceiro Homem” e “Relíquia Macabra”. E tanto a fórmula de roteiro e diálogo quanto a estética do filme noir influenciaram até mesmo os westerns e os exemplos mais lembrados são “Sangue na Lua” (Blood on the Moon), de Robert Wise, “Sua Única Saída” (Pursued) e “Golpe de Misericórdia” (Colorado Territory), estes dois dirigidos por Raoul Walsh. Menos conhecido mas não menos importante é “Fúria Abrasadora” (Ramrod), também conhecido por “A Abrasadora”, dirigido por André De Toth em 1947, baseado em história original de Luke Short que é ainda o autor da história de “Sangue na Lua”.


Don DeFore e Arleen Whelan
AMBIÇÃO DESMEDIDA - Em “Fúria Abrasadora” Connie Dickason (Veronica Lake) tenciona se casar com Walt Shipley (Ian MacDonald) um criador de ovelhas. Com isso Connie contraria a vontade de seu pai Ben Dickason (Charles Ruggles) pois este quer que a filha se case com o poderoso criador de gado Frank Ivey (Preston Foster). Com medo de Ivey, o acovardado Walt Shipley abandona a região deixando sua propriedade para Connie Dickason que passa a enfrentar Frank Ivey contando para isso com a ajuda do cowboy Dave Nash (Joel McCrea) e de seu amigo Bill Schell (Don DeFore). Connie Dickason é não só uma mulher ambiciosa mas também fria e manipuladora, procurando enredar Schell e Nash conforme seus interesses. A ambição desmedida de Dickason leva à morte alguns homens que para ela trabalham, bem como componentes do bando de Frank Ivey. Ao final Connie fica sozinha pois Dave Nash descobre toda a maldade que domina Connie Dickason. A história de “Fúria Abrasadora” é bastante complexa na melhor linha dos filmes noir, ainda que os personagens sejam bastante bem delineados, quase todos distantes de um caráter exemplar. Ben Dickason, o pai de Connie é repulsivamente interesseiro e sua filha mais ainda, porém dotada de invulgar determinação de enriquecer. Frank Ivey, o barão de gado, é o personagem menos complexo usando seu poder para exercer a dominação completa da região. O xerife Jim Crew (Donald Crisp) é a autoridade imparcial, justa e até mesmo paternal objetivando manter a paz em sua cidade. Dave Nash (McCrea), é um cowboy que procura na bebida esquecer sua vida repleta de desgraças familiares; Bill Schell é um pistoleiro misterioso e amado pela doce costureira Rose Leland (Arleen Whelan), no entanto a amizade entre Nash e Schell é estranha, ambígua, intrigante e acima de tudo leal, a ponto de Schell sacrificar a própria vida pelo amigo. Dave Nash sabe que apenas Rose Leland pode lhe trazer a paz que ele tanto busca. Pairando acima de todos, submetendo-os aos seus desígnios está Connie Dickason, insinuante, pérfida e maligna, mulher cuja única derrota é não conseguir o amor de Dave Nash, o que para ela seria apenas um complemento de sua ilimitada ambição.


Veronica Lake
FASCINANTE MULHER FATAL - Este foi o primeiro western do húngaro André De Toth que passaria a dirigir na década de 50 uma série de faroestes medianos muitos deles estrelados por Randolph Scott e nenhum com a mesma dramaticidade de “Fúria Abrasadora”. Este western e os citados anteriormente neste artigo formam um conjunto de filmes de certa forma responsável pela vertente psicológica que dominaria irreversivelmente o gênero nos anos seguintes. Casado à época com Veronica Lake, De Toth fez um filme para a estrela e surpreendentemente Veronica se sai esplendidamente como Connie Dickason, personagem que em tudo lembra a Phyllis Dietrichson (Barbara Stanwyck) de “Pacto de Sangue”. Connie leva inúmeros homens à morte em sua insidiosa trajetória de realização pessoal. Diferentemente de Barbara Stanwyck, Veronica Lake surge na tela como uma mulher insegura, e frágil, mas à medida que o filme se desenvolve cresce a fúria abrasadora de sua personagem, certamente uma das mulheres mais fascinantes dos faroestes dos anos 40, até porque louras fatais eram encontradas mais facilmente nos filmes noir como ela própria apareceu diversas vezes formando a famosa dupla ‘Ladd-Lake’, com Alan Ladd. As muitas tomadas noturnas acentuam o tom dark de “Fúria Abrasadora” magnificamente fotografado por Russell Harlan e marcado pela música de Adolph Deutsch que foge das trilhas convencionais dos faroestes. Uma curiosidade deste western de André De Toth é ter sido ele produzido por Harry Sherman, nome bastante conhecido dos fãs de faroestes como produtor da série Hopalong Cassidy.

Veronica Lake com Joel McCrea nos braços
lança provocante olhar a Don DeFore;
DeFore e McCrea com Veronica;
Sarah Padden, de camisola, esconde dois
homens do violento Preston Foster
VIOLÊNCIA INCOMUM - “Fúria Abrasadora” tem um inusitado componente de violência raramente visto no gênero western nos anos 40, exemplificado com as cenas em que Don DeFore queima a mão de Ed Burma (Ray Teal) com um charuto, o espancamento de Curley (Nestor Paiva) e o confronto final entre Nash (McCrea) e Ivey (Foster) em que Nash alveja Ivey com uma espingarda de grosso calibre. Por outro lado há uma sequência engraçadíssima em que a semi-despida Sarah Paddden esconde Nash e Schell atrás de uma porta, protegendo-os de Frank Ivey e seus homens. John Ford sempre soube criar momentos cômicos em seus westerns e De Toth usou magnificamente esse expediente num filme intensamente dramático. Além da admirável atuação de Veronica Lake, “Fúria Abrasadora” tem a costumeira e convincente sobriedade de Joel McCrea, um dos maiores e nem sempre reverenciados mocinhos do cinema de todos os tempos. Os veteranos Donald Crisp e Charles Ruggles estão bastante bem, especialmente Ruggles desempenhando um personagem (pusilânime) incomum em sua carreira de tantos pais e avôs simpáticos. Preston Foster, notório vilão, é outro destaque com ótima presença. Quem fica com o mocinho McCrea ao final é Arleen Whelan, bonita e boa atriz de carreira pouco marcante. Muito boa a atuação de Don DeFore, galã que prometia muito nos anos 40, mas que a exemplo de Arleen Whelan não atingiu maior sucesso. O elenco de apoio de “Fúria Abrasadora” é uma festa para o espectador que gosta de reconhecer não só os astros do filme, trazendo Ray Teal, Nestor Paiva, Lloyd Bridges, Ian MacDonald, Trevor Bardette, Jeff Corey, Hal Taliaferro e Lane Bradford, entre outros rostos comuns aos faroestes. “Fúria Abrasadora” é um filme fundamental e certamente admirado pelos fãs dos filmes noir.




6 comentários:

  1. Tenho esse western, Darci, mas ainda não o assisti. Jurava que era coisa tola, com uma Lake em final de carreira. Vou assisti-lo ainda esta semana. Obrigado.

    O Falcão Maltês

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  2. Veronica Lake foi uma estrela a qual jamais vi trabalhando. Aquele filme dela com Allan Ladd, Alma Torturada, incendeia minha imaginação. A imagino linda, loira, formosa, ao lado de Ladd, num dos mais comentados filmes do ator, que li ter feito muitos filmes com a mesma.
    Quanto a Andre de Toth foi um diretor que passou por mim sem muita pontuação, não fazendo qualquer filme que despertasse minha atenção.
    jurandir_lima@bol.com.br

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  3. Nahud, se eu conheço seu gosto sei que você vai gostar.
    Jurandir, você não pode deixar de assistir "Alma Torturada". 1.º, para conhecer a gracinha da V.L.; 2.º, para ver a melhor atuação da carreira de Alan Ladd; 3.º) para ver como Laird Cregar era um incomparável ator; 4.º, porque é um dos melhores policiais noir.

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  4. Oi Darci!!!
    Post indicado aos leitores do Grupo de Blogs de Cinema Clássico:
    http://blogsdecinemaclassico.blogspot.com/2011/10/links-da-semana-de-26-de-setembro-2-de.html

    Boa semana!

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  5. Olá, Darci!
    Vejo a personagem Connie mais ambiciosa do que maligna, que agia da forma que agia em grande parte por frustração, em conseqüência às atitudes erradas do pai que tentara forçar seu casamento com o influente Frank Ivey. Apesar de ter 'mexido os pauzinhos' para tentar ficar com Dave Nash, não planejou diretamente as mortes ocorridas, apesar de estas estarem sim ligadas à sua irresponsabilidade (como o stampede proposital do gado para incriminar de vez Ivey, ocasionando na morte do justo e sereno xerife Jim Crew). Porém, Connie não era provida da mesma maldade extrema de Phyllis Dietrichson.
    Outro importante exemplar de western noir é "O Matador" (1950), com roteiro do próprio André De Toth.
    Um abraço!

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  6. Gostei (direção, fotografia e cenários), mas longe de ter adorado!

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