15 de agosto de 2011

GALANTE E SANGUINÁRIO (3:10 to YUMA) TEM GLENN FORD NUM DUELO PSICOLÓGICO


Delmer Daves formou juntamente com Anthony Mann, Budd Boeticher e John Sturges o quarteto de diretores responsáveis por a década de 50 ter sido a Década de Ouro do faroeste. Delmer Daves dirigiu seu primeiro western em 1950, que foi o importante “Flechas de Fogo” (Broken Arrow). A seguir dirigiu “Fugindo do Passado” (Returno of the Texan), “Rajadas de Ódio” (Drum Beat), “Ao Despertar da Paixão” (Jubal), “A Última Carroça” (The Last Wagon), “Como Nasce um Bravo” (Cowboy), “O Homem das Terras Bravas” (The Badlanders), “A Árvore dos Enforcados” (The Hanging Tree). Foi porém em 1957 que Delmer Daves realizaria “Galante e Sanguinário” (3:10 to Yuma) aquele que é considerado não só seu melhor western, mas possivelmente o melhor dos 30 filmes que dirigiu em sua carreira. Em 2007 foi filmada uma nova versão de “3:10 to Yuma”, o que deu margem ao relançamento do original de Delmer Daves em cinemas de algumas cidades dos Estados Unidos e em DVD. O fato chamou à atenção e possibilitou que “Galante e Sanguinário”, de há muito considerado um western clássico, fosse reavaliado comparativamente com a recente versão.

Van Heflin, o rancheiro corajoso

ARRISCANDO A VIDA POR 200 DÓLARES - Elmore Leonard foi um prolífico escritor bastante aproveitado pelo cinema norte-americano que entre outras de suas histórias filmou “Hombre”, “O Retorno de Valdez” (Valdez is Coming), “Resgate de Bandoleiros” (The Tall T), “Joe Kidd” e “Galante e Sanguinário”, este último roteirizado por Halsted Welles. Neste western o perigoso bandido Ben Wade (Glenn Ford) é capturado na cidade de Bisbee e o xerife local (Ford Rainey) deve levá-lo até Contention, onde há uma estação em que para, às 15:10 o trem com destino a Yuma, onde Wade será julgado pelos seus numerosos crimes. O xerife recruta dois homens completamente despreparados para acompanhar o bandido na arriscada missão pois o bando de Wade interinamente liderado por Charlie Prince (Richard Jaeckel) tentará de todas as formas libertar o chefe. Esses dois homens são Dan Evans (Van Heflin), um rancheiro que precisa desesperadamente de dinheiro para saldar uma dívida e salvar seu rancho e Alex Potter, um bêbado que quer provar ao povo de Bisbee que não é um inútil. Eles farão a escolta de Ben Wade por meros 200 dólares para cada um. Conseguem chegar a Contention com o bandido e após horas de angustiante espera em um hotel são atacados por Charlie Prince e seu bando. A luta termina com Ben Wade sendo embarcado no trem das 3:10 para Yuma.

DUELO PSICOLÓGICO - “Galante e Sanguinário” tem um dos mais emocionantes duelos dos faroestes. Duelo sem armas mas com palavras e manipulação psicológica. Poucas vezes no cinema se viu alguém ser levado aos limites de sua honra e dignidade humana como Dan Evans. O prisioneiro Ben Wade esgota seu arsenal de propostas torpes de suborno. Diante da recusa de Evans, tenta então demolir a resistência do humilde rancheiro mencionando a medíocre vida de sua esposa Alice Evans (Leora Dana) e como ela é merecedora de atenções. Dan Evans, o homem pobre porém íntegro vence o estranho duelo conseguindo converter o malfeitor Wade, senão para o bem, ao menos para que este possibilite sua recompensa maior que é ser reconhecido como homem de verdade pela esposa Alice e pelos filhos. O roteiro nitidamente se assemelha a “Matar ou Morrer” quando mostra o homem leal, de fibra e coragem ficar sozinho diante do temido bandido que, numa inversão, não chega num trem mas nele deve partir. A chegada a Contention expõe a covardia dos homens da lei da cidade que, desesperados com a aproximação dos bandidos desaparecem balbuciando suas fraquezas de caráter, remetem diretamente à obra-prima de Fred Zinnemann. E como em “Matar ou Morrer” um relógio cria a mesma atmosfera de agonia e desespero de um homem só. Dan Evans tinha menor motivação que Will Kane para cumprir sua missão, mas tal qual o personagem de Gary Cooper, Evans tem que lutar contra a própria consciência. Coincidentemente o mesmo Van Heflin que foi atormentado em “Os Brutos Também Amam” pelo fascínio que Shane despertava em seu filho e mulher, vê como Dan Evans seus filhos admirarem o insinuante bandido Ben Wade. Mais galante que sanguinário Wade conquista o amor da triste e desesperançosa Emmy (Felicia Farr) e faz Alice, a esposa de Dan Evans, sonhar com o que nunca teve.

Richard Jaeckel
e Henry Jones
WESTERN CLAUSTROFÓBICO - Delmer Daves fez de “Galante e Sanguinário” um filme intenso e emocionante. Angustiantemente claustrofóbico nas sequências internas e brilhantemente filmadas nas locações em Sedona e Tucson (Arizona). Charles Lawton Jr. foi o responsável pela cinematografia com o uso insistente de gruas com tomadas ascendentes e posicionamentos inusitados da câmara proporcionando beleza plástica ao filme rodado em preto e branco. O tema musical “3:10 to Yuma” de autoria Ned Washington (letra) e George Duning (música) é excepcionalmente bem arranjado tornando-se vibrante quando necessário ou pungente como quando executado por um singelo violão como na cena entre Wade (Ford) e Emmy (Felicia Farr). Clint Eastwood faria o mesmo em “Os Imperdoáveis” com os acordes do músico brasileiro Laurindo de Almeida. Chamo a atenção do leitor pois há duas versões da canção “3:10 to Yuma”: a que se ouve na abertura de “Galante e Sanguinário” cantada por Frankie Laine (There’s a lonely train called the 3:10 to Yuma...) e uma mais romântica (I want to ride again on the 3:10 to Yuma / That’s where I saw my Love, the girl with the golden hair...). Irrepreensível em sua concepção técnica, se há um pecado em “Galante e Sanguinário” é o final inesperado com a incongruente colaboração de Ben Wade e sua aceitação em ser conduzido a Yuma sem que tenha sido bem desenvolvida essa conversão do bandido. Certo que Ben sabe que cedo obterá a liberdade, mas o final compromete o western de Delmer Daves.


Leora Dana e
Felicia Farr
ELENCO IMPECÁVEL - Van Heflin vs. Glenn Ford, proporcionam um grande duelo de interpretações! O feioso Heflin, que alguém já disse ter uma cabeça que lembra uma batata, comprovou em cada filme o excelente ator que era e está perfeito em “Galante e Sanguinário”. Perfeito e comovente. Glenn Ford, por ter um estilo de interpretação discreto, normalmente era tido como um ator mediano, o que é desmentido por sua brilhante interpretação como Ben Wade. Cínico, frio, quase diabólico na crueldade cortante de suas insinuações. O elenco feminino traz a suave Felicia Farr em seu terceiro western com Delmer Daves (“Ao Despertar da Paixão” e “A Última Carroça” foram os outros), num papel pequeno mas de encantadora simplicidade. A senhora Dan Evans é Leora Dana, atriz pouco conhecida por ter se dedicado mais à TV em sua carreira. Longe de ser uma mulher linda, Leora rouba todas as cenas em que participa com a força de sua expressão e enigmático charme de mulher simples. Completam o elenco principal o engraçado Henry Jones, o explosivo Richard Jaeckel, Robert Emhardt (Mr. Butterfield), Sheridan Comerate (Bob Moons) e Ford Rainey (Marshal de Bisbee). “Galante e Sanguinário” é um magnífico exemplo de como um faroeste pode magnetizar a atenção do espectador com um roteiro em que há mais palavras que ação, assim como nos melhores dramas, com os quais muito se assemelha, sendo um western com nuances de filme noir.

6 comentários:

  1. Obra prima inquestionável. Glenn Ford - e Robert Mitchum - são os meus mocinhos favoritos. Gostaria de conhecer um pouco mais sobre o Guy Madison nesse gênero, Darci. O que sugere?

    O Falcão Maltês

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  2. Olá, Antonio. Guy Madison merece mesmo ser lembrado. E você lembrou o Bob Mitchum que está em outro patamar, no mais alto. Preciso escolher um filme para falar dele, mas a bio poderia ser matéria do Falcão Maltês. Penso que os melhores filmes de Mitchum não foram westerns. E é difícil classificálo. Por pouco ele não entra na lista dosa bandidos...

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  3. Gostei muitos dos dois filmes. No original o grande destaque é a vilão interpretado por Glenn Ford, além do competente e hoje esquecido Van Heflin.

    Na versão recente a dupla principal (Christian Bale e Russell Corwe) também estão competentes, além do ótimo coadjuvante Ben Foster.

    Abraço

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  4. Em Galante e Sanguinário temos; Glenn Ford, Van Heflin, Felicia Farr e ainda o ótimo diretor Dalmer Daves, um especialista em faroeste e que nos deu coisas como; A Arvore dos Enforcados, A Ultima Carroça e Homens das Terras Bravas, apenas para citar uns poucos. E nestes filmes dá claramente para se ver seu talento para dirigir o gênero. Quanto o Mangold apenas faz sua estreia, apesar de não ter se dado tão mal assim.
    Mas são dois filmes que, mesmo ambos saindo de uma unica base de criação, não tem como se fazer comparações entre a qualidade, dentro genero, de um e de outro.
    Galante... é um filme sombrio, um western que pode ser classificado como psicológico,com um cinico, mordaz e talentoso trabalho de Glenn Ford, que consegue mostrar ali o grande ator que foi e não apenas o mocinho que somente sabia sacar uma arma e acionar o gatilho. Ele era muito mais que isso e mais ainda até.
    Van Heflin foi um ator que sempre se saiu perfeito em qualquer papel que lhe caisse nas mãos (Shane, A Ultima Vez que Vi Paris, Os Tres Mosquiteiros). Um ator magnifico! E a jovem Felicia Farr, mulher de uma beleza quase nobre, criatura de um ar sereno e leve, cujas atuações se misturavam às suas suaves caracteristicas fisicas, sempre dando como resultado interpretações boas, convincentes e quase que sem despertar, senão em atenciosos cinéfilos, tais qualidades.
    E em Galante...ela, mesmo não tendo um momento dilatado como em A Ultima Carroça, por exp., se nota visivelmente sua graça de presença.
    Completanto, Galante e Sanguinário, muito mais que um western, é um exercicio de interpretação para os atores escolhidos para a confeção desta boa fita. E observem; ela tem muito a ver, em genero e atmosfera, a um outro filme, também com Glenn Ford e, também dirigido por Delmer Daves, intitulado Como Nasce um Bravo.
    São detalhes e verdades os quais, mesmo que queiramos, não dá para esconder, melhor, não citar.
    jurandir_lima@bol.com.br

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  5. Olá, Darci!
    Tive a sorte de encontrar há pouco um exemplar original e lacrado deste DVD lançado no Brasil em 2003, 4 anos antes do lançamento do remake nos cinemas. Richard Jaeckel, aquele que desafiou Jimmy Ringo, aparece mais uma vez como um dos malfeitores do oeste.
    Notei bastante semelhança entre este filme e os spaghettis que vieram na década seguinte, inclusive a belíssima trilha sonora lembra a de "À Sombra de um Revólver" (1965), além da história com aspecto psicológico e movimentos envolventes da grua.
    Na abertura, a diligência ao longe percorre todos os cantos da tela widescreen, portanto quem assistir à versão 4:3 vai perder esta pequena notável particularidade.
    Aquele abraço!

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  6. Depois de 18 anos, o revi hoje, apenas gosto!

    Boas atuações, bem dirigido, etc, mas não está entre os meus favoritos, não mesmo!

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