9 de novembro de 2024

TERRA SAGRADA (THE TALL TEXAN)

 

        Encontrar uma valiosa pepita de ouro é motivo de alegria e este western é como achar uma pequena pedra preciosa após garimpar na aridez artística que é a maioria dos faroestes de baixo orçamento, procura que pode resultar em agradáveis surpresas. “Terra Sagrada” (The Tall Texan), 1953, é um desses casos. Certo que os nomes de Lee J. Cobb e Marie Windsor formam uma boa recomendação e o filme ser dirigido pelo quase desconhecido Elmo Williams desperta curiosidade. “Matar ou Morrer” (High Noon), 1952, dispensa comentários e fãs do gênero o reputam como um dos melhores westerns de todos os tempos, sendo do conhecimento dos cinéfilos que esse clássico, depois de pronto, não agradou ao produtor Stanley Kramer quando da exibição privada. Coube então ao editor Elmo Williams fazer nova edição dando ao filme outra dinâmica. O trabalho de Williams foi premiado em 1953 com o Oscar de Melhor Edição e nesse mesmo ano ele decidiu se aventurar pela direção. A Lippert Production financiou “The Tall Texan” que foi rodado inteiramente no Novo México em oito dias e, claro, teve a edição feita pelo próprio Elmo Williams. Além de Lee J. Cobb, estão no elenco Luther Adler e Lloyd Bridges, atores que aceitaram receber baixos salários em razão de estarem semidesempregados sob investigação do HUAC, o comitê de atividades antiamericanas, suspeitos de simpatia pelo comunismo. Lloyd Bridges ainda saboreava o enorme sucesso alcançado por “Matar ou Morrer”, no qual tivera destacada participação e Lee J. Cobb, um ano depois, entraria para a galeria dos maiores vilões do cinema por sua impressionante atuação em “Sindicato de Ladrões” (On the Waterfront).

 

        Um carroção com seis pessoas a bordo passa pelo lugarejo de nome Gila e se dirige ao sudeste dos Estados Unidos quando encontram um índio com uma pepita de ouro. O índio indica que a pedra veio de uma região habitada pelos nativos ‘membraños’, o que desperta o interesse de todos os viajantes. São eles: Laura Thompson (Marie Windsor) e o marido Jerome Niblett (Dean Train), o capitão navegador Theodore Bess (Lee J. Cobb) e o xerife Chadborune (Samuel Herrick). O xerife leva algemado Ben Trask (Lloyd Bridges), acusado de ter assassinado o próprio irmão e que será entregue às autoridades de El Paso para ser julgado. Carney (Syd Saylor) é o cocheiro do carroção e como os demais concorda em se desviar até o território dos índios membraños. No caminho são atacados por comanches e Jerome é morto, mas mesmo assim, obcecados pela possibilidade de encontrar ouro, prosseguem na viagem, quando encontram o comerciante ambulante Josh Tinnen (Luther Adler), que também é tomado pela cobiça. Os índios membraños não impedem a passagem do brancos por seu território, mas tomam-lhes as armas e Ben Trask, que é o único a falar o idioma dos nativos avisa que não devem entrar no cemitério dos membraños, local sagrado para eles e onde se encontra o veio principal de ouro. Porém a ambição já havia dominado inteiramente o grupo, exceto Ben Trask e os homens, um a um, vão morrendo sob as flechas indígenas. Somente Ben Trask e Laura conseguem escapar.

O grupo na desconfortável viagem: Lloyd Bridges, Dean Train, Marie Windsor
e Samuel Herrick; abaixo Lloyd Bridges e Lee J. Cobb

         Desde “Ouro e Maldição” (Greed), 1924, passando por “O Tesouro de Sierra Madre”, (1948) e “Escravos da Ambição” (Lust for Gold), 1949, Hollywood produziu filmes sobre a cobiça provocada pelo ouro e haveria ainda “O Ouro de Mackenna” (Mackenna’s Gold), 1969. “Terra Sagrada” retoma o tema e em seus 84 minutos de duração mostra que a ganância é capaz de dominar o ser humano expondo-o mesmo ao risco de morte. Do grupo de seis pessoas apenas o suposto fora-da-lei Ben Trask não se deixa tomar pela cobiça uma vez que seu intuito é provar que é inocente da acusação que o levaria a El Paso. Laura Thompson é, dentre o grupo, a mais ávida por enriquecer, razão maior de sua vida e ao se envolver amorosamente com Ben Trask, muda seu procedimento. A história de “Terra Sagrada” permite que o casal sobreviva, ele por sua índole e Laura por se redimir e perceber que o amor é um bem mais valioso que a riqueza, tudo sem a pieguice característica de Hollywood. Para um western, “Terra Sagrada” tem pouca ação pois o que mais interessa é o estudo psicológico de cada um dos personagens e a transformação pela qual cada um passa: a cupidez do comerciante Josh Tinnen e do simplório Carney; o xerife hesitante entre enriquecer e cumprir seu trabalho de conduzir o prisioneiro; o capitão Theodore, de passado obscuro, que assedia Laura e no clímax do confronto com os índios age altruisticamente pois sabe que não terá chance de ter ouro e nem o amor de Laura.

Marie Windsor com Lee J. Cobb e com Sud Saylor;
Samuel Herrick e Lloyd Bridges

        O carroção com diferentes personalidades que se revelam através da viagem lembra “No Tempo das Diligências” (Stagecoach), 1939, não faltando sequer o fora-da-lei (Ben Trask) que como Ringo Kid se apaixona por Dallas naquela obra-prima de John Ford. E se Laura Thompson não é uma adorável prostituta como Dallas, seu temperamento forte se impõe aos homens do grupo, algo pouco comum aos westerns. “Terra Sagrada” é um daqueles filmes que comprova que um grande orçamento não é suficiente para se realizar um bom filme e com isso criou a expectativa (não confirmada) que Elmo Williams entraria para o rol dos melhores diretores. Não há um único momento de desinteresse neste western sombrio com ótimos diálogos que devem ser creditados a Elizabeth Reinhardt pois o próprio Elmo Williams afirmou que ao mostrar o roteiro original aos atores, numa sexta-feira, todos o acharam insípido. O roteiro foi enviado a Elizabeth Reinhardt que adicionou diálogos que modificaram esplendidamente, o roteiro, devolvido na segunda-feira quando se iniciaram as filmagens. Exemplar é a frase de Laura Thompson que diz: “Ninguém deveria dar ordens a qualquer pessoa ao seu redor, ao menos que seja o dono dele, mas penso que a guerra (de secessão) resolveu essa questão”, ou quando a mesma Laura afirma que mesmo sendo mulher faz questão absoluta de ser ouvida nas decisões daquele grupo. E há a ótima sequência do ataque comanche ao carroção, a surra que o capitão Thedore dá em Josh Tinnen, surra aplicada com uma cascavel morta, e o ataque final dos índios em meio às rochas, tudo editado economicamente, no que William era mestre. Some-se a isso a surpreendente ótima atuação de Lloyd Bridges e do contido Lee J. Cobb, enquanto Luther Adler não perde o hábito de tentar roubar todas as cenas. Mas quem domina o filme é a excelente Marie Windsor, belissimamente fotografada e exalando sensualidade em meio àquele grupo de homens cegos pela cobiça.

Acima Luther Adler, Syd Saylor, Lee J. Cobb, Samuel Herrick e
Lloyd Bridges; no centro Luther Adler e Lee J. Cobb;
abaixo Marie Windsor e Lloyd Bridges

Acime L. J. Cobb, Marie Windsor e Lloyd Bridges;
Lloyd Bridges e Marie Windsor

O produtor Robert L. Lippert à esquerda;
Elmo Williams e o Oscar recebido por "Matar ou Morrer"


Nenhum comentário:

Postar um comentário