Dean Martin, um ator que irradiava
simpatia por todos os poros, jamais havia interpretado um homem mau no cinema e
isto veio a acontecer em 1967, no western “A Noite dos Pistoleiros” (Rough
Night in Jericho). A história de autoria de Marvin H. Alpert teve roteiro do próprio
Alpert em parceria com Sidney Boehm, de quem se poderia esperar boa dose de
violência. Boehm foi o roteirista de “Os Corruptos” e “Sábado Violento”, dois
filmes marcantes por suas cenas de extrema violência, isto quando Hollywod,
ainda sob o Código Hays, evitava chocar as plateias. Mas não é o vilão Dean
Martin quem participa da mais brutal sequência deste western e sim Slim Pickens
em luta com George Peppard. Mesmo Peppard nunca teve no cinema a imagem de homem
agressivo e parece que tanto Martin quando Peppard estão fora de seus personagens
costumeiros. O western norte-americano começava a mudar e “A Noite dos
Pistoleiros”, dirigido por Arnold Laven, indica essa direção que Sam Peckinpah
norteava com seus filmes. Vale lembrar que o faroeste anterior de Laven foi “Assim
Morrem os Bravos” (The Glory Guys), com roteiro de Peckinpah.
Dean Martin; George Peppard |
51%
de tudo - Alex Flood (Dean Martin) e Dolan (George Peppard) são
dois ex-homens da lei que cansados de arriscar a vida a troco de um salário
irrisório decide mudar de vida. Flood se instala em Jericho onde passa a dominar
a vida local sendo sócio de tudo que gere dinheiro. Contenta-se com 51% de
qualquer coisa, o suficiente para ser respeitado por todos, inclusive pelo
bando que comanda. Flood enforca sumariamente seus desafetos e muda o xerife
que não o obedece, tencionando ser sócio majoritário da companhia de
diligências da viúva Molly Lang (Jean Simmons). Dolan chega a Jericho numa
diligência da empresa de Molly em companhia de Ben Hickman (John McIntire),
outro ex-homem da lei, sendo no caminho intimidado por Flood, que dispara
várias vezes contra a diligência. Dolan se interessa por Molly e para piorar as
coisas ganha de Flood no pôquer, o suficiente para que seja intimado a deixar a
cidade. Tudo muda quando Flood destrói o armazém de Ryan (Richard O’Brien), o
que faz com que Dolan convença alguns homens a enfrentar o poderoso pequeno
exército de Flood. Emboscado este vê seu bando ser dizimado e foge, sendo
perseguido por Dolan que o enfrenta num confronto mortal.
Violência
exacerbada - “A Noite dos Pistoleiros” não é um western com muita
ação, resumindo-se a três sequências os momentos de maior emoção, uma delas
excepcionalmente bem filmada. É quando Yarbrough (Slim Pickens), braço direito
de Flood e que faz uso de um chicote quando necessário, enfrenta Dolan. Ao contrário
das lutas travadas com punhos, os dois homens usam o que estiver à mão e a
morte de Yarbrough é animalesca com Dolan extravasando sua fúria incontida.
Yarbrough apertando o pescoço de Molly com um seus enormes braços diz que
poderá quebrar o pescoço da mulher com mais um mínimo aperto. Mesmo a sequência
em que Flood dá uma lição a um provocador em seu saloon, bate com a cabeça do
infeliz várias vezes contra o balcão, algo poucas vezes visto no western e
menos ainda porque é Dean Martin quem comete a brutalidade. Flood querendo
saber se Molly dormiu ou não com Dolan e não obtendo resposta, desfere
violentos tapas na mulher em mais uma sequência de selvageria.
George Peppard em luta Slim Pickens |
Jean Simmons e Dean Martin |
Sensação
de ‘já vi esse filme’ - O roteiro repete lugar comum de
tantos e tantos westerns com a chegada de um forasteiro que provoca uma
sublevação contra o tirânico opressor. A inferioridade numérica é compensada
pela astúcia do herói, aqui um profissional de pôquer que considera todas as
probabilidades, conforme repete várias vezes. A disputa pela mesma mulher, uma bela
e arrojada viúva como sempre, completa o quadro que leva ao previsível
desfecho. Salvaria o filme diálogos que fossem mais divertidos uma vez que a
ironia perpassa todas as conversas travadas entre Dolan e Flood. O que se vê,
no entanto, são colóquios maçantes na maior parte do filme. Ben Hickman é quem faz
subir a qualidade não só interpretativa como, coincidentemente dos diálogos. E
claro, a presença do violento Yarbrough.
Jean Simmons |
A
beleza madura de Jean Simmons - Fora de seu padrão interpretativo,
Dean Martin faz o que pode para tornar o abusivo Flood convincente como vilão.
George Peppard tenta interpretar um jogador elegante ao estilo daqueles que ninguém
melhor que Henry Fonda era capaz de compor. Jean Simmons já sem o frescor de
sua beleza tantas vezes vista no cinema sempre agrada, boa atriz que era. Em
uma sequência Jean entorna garrafa e meia de whisky com George Peppard, ela que
na vida real teve sérios problemas com a bebida. Em nenhum filme do qual participa,
John McIntire deixa de impressionar e neste, mais uma vez, ele mostra que era
um dos grandes característicos do cinema norte-americano. Slim Pickens desta
vez menos espalhafatoso tem marcante participação como capanga de Dean Martin.
Dean Martin |
Centenário
de nascimento - Realizado no período de transição que precedeu a
inequívoca influência dos westerns-spaghetti, “A Noite dos Pistoleiros” é um
faroeste que guarda a influência do modelo que Hollywood consagrou ao mesmo
tempo em que busca renovar a linguagem do gênero com uma dose maior de
violência. Nada memorável, seja na filmografia de Arnold Laven ou na dos principais
intérpretes, este filme recebeu uma única indicação nas dezenas de Top-Ten
Westerns publicados neste blog. Quem o listou foi o cinéfilo José Correia
Dantas que admirava o estilo de atuar de Dean Martin, tanto que procurava, nas
reuniões da confraria paulistana de westernmaníacos, se trajar como esse grande
astro nascido no dia 7 de junho de 1917. Exatamente na data da publicação desta
postagem transcorre portanto o centenário de nascimento do querido ator-cantor
nascido como Dino Paul Crocetti.
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