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Acima Martha Hyer, Hal B. Wallis e John Wayne; abaixo Katharine Hepburn e Hal B. Wallis |
Ao receber o Oscar de Melhor Ator por
sua atuação em “Bravura Indômita” (True Grit), John Wayne declarou que se
soubesse teria usado um tapa-olho anos antes. O sucesso desse filme foi tão
grande que o produtor Hal B. Wallis teve a ideia (óbvia) de ressuscitar o
personagem do xerife beberrão interpretado novamente pelo Duke, encomendando a
Charles Portis, autor da história original de “True Grit”, não uma sequência,
mas sim uma nova aventura com Rooster Cogburn. John Wayne gostou da nova
história em que o envelhecido xerife se junta a uma missionária para capturar
um bando de foras-da-lei e pediu a Hal B. Wallis que contratasse Ingrid Bergman
para coestrelar o novo western com ele. A atriz sueca não pode aceitar o
convite que acabou nas mãos de Katharine Hepburn e esperava-se que John Wayne,
que tinha a prerrogativa de aprovar a ‘leading-lady’, recusasse a participação
de Kate, como havia feito com o diretor Richard Fleischer, escalado
inicialmente para dirigir. Wayne nunca esqueceu e não perdoou Fleischer por
este ter declinado da direção de “Fúria no Alasca” (North to Alaska), 15 anos
antes. Katharine Hepburn, detentora (ante então) de três prêmios Oscar e oito
outras indicações, sempre foi conhecida por sua visão política liberal,
antagônica à do radical de direita John Wayne. Mas Wayne lembrou que Kate havia
sido nos anos 30 uma grande paixão de seu amigo e mentor John Ford (falecido há
menos de dois anos). Ora, se Ford gostara tanto de Kate, porque ele John Wayne
não haveria de gostar de atuar ao lado dela? E a equipe, com a direção entregue
ao novato Stuart Millar foi para o Oregon filmar “Justiceiro Implacável”, que
em Inglês deveria se chamar “Rooster Cogburn and the Lady”, mas cujo título foi
reduzido simplesmente para “Rooster Cogburn”.
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John Wayne e Katharine Hepburn |
O
xerife e a missionária - Rooster Cogburn (John Wayne) perde
seu cargo de xerife porque o juiz Parker (John McIntire) o considera violento
demais, o que prejudica a imagem da cidade. Parker teve que reconsiderar sua
decisão e recontratar Cogburn quando um bando liderado por Hawk (Richard
Jordan) e Breed (Anthony Zerbe) assaltam uma patrulha que transportava caixas
de nitroglicerina e uma metralhadora Gatling dizimando todos os soldados. De
passagem pelo rancho onde a missionária Eula Goodnight (Katharine Hepburn)
mantém uma escola para jovens índios, os bandidos promovem desordem e Hawk mata
friamente o pai da missionária. Em seguida chega ao local Rooster Cogburn, que
está no encalço do bando e que relutante tem de aceitar que Eula o acompanhe na
busca aos bandidos. Eula, acompanhada pelo jovem índio Wolf (Richard Romancito)
quer ajudar a prender os malfeitores e levá-los a julgamento. Rooster, Eula e
Wolf surpreendem os bandidos e recuperam a perigosa carga, passando a ser
perseguidos pelo bando de Hawk. Cogburn vê como única possibilidade de fuga
escapar por um rio, em uma jangada, levando os explosivos e a metralhadora. O
enfrentamento se dá dentro do rio com o velho xerife, a missionária e o índio
levando a melhor sobre os bandidos.
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John Wayne e Katharine Hepburn |
Plágio
de um clássico? - Se Charles Portis escreveu a
história da nova aventura de Rooster Cogburn, desta vez ao lado de uma evangelizadora
com sequência culminante de ação passada em um rio, e a contratação de
Katharine Hepburn se deu posteriormente, isso é o que pode chamar de grande
coincidência. A formidável atriz havia, em 1951 filmado “Uma Aventura na
África”, no qual desempenha uma missionária que acompanhada pelo capitão dono
de um barco enfrentam e vencem inimigos alemães em tempo de I Guerra Mundial.
Coincidência ou mera cópia trocando o Leste da África pelo Velho Oeste
norte-americano e o raramente sóbrio capitão pelo xerife beberrão, o fato é que
“Justiceiro Implacável” tem além das notórias semelhanças, a presença de
Katharine Hepburn e John Wayne se não faz esquecer Humphrey Bogart, chega
próximo dele como ninguém poderia suspeitar. “Justiceiro Implacável” é um western
que foge da rotina pelos ingredientes inusitados a um filme do gênero mas que,
mais importante que isso, possibilita um dos mais encantadores encontros do
cinema. E certamente isso se deve em grande parte ao roteiro escrito por um
certo ‘Martin Julien’, pseudônimo de Martha Hyer, atriz esposa do produtor Hal
B. Wallis, revelando inesperados dotes como roteirista. Brilhantes, engraçados
e por vezes hilariantes mesmo os diálogos travados entre Rooster Cogburn e Eula
Goodnight em seus embates recheados de citações bíblicas e observações
sarcasticamente humoradas entre um e outro. Até o emocionante diálogo final:
Rooster –
Irmã, se um dia precisar de um oficial de
paz caolho...
Eula – Reuben, preciso dizer isto: viver com você
foi uma aventura que qualquer mulher prezaria para sempre. Eu olho para você,
para este rosto queimado, essa barriga imensa, essas patas de urso e esses
olhos brilhantes e preciso dizer que você é um exemplo para o sexo masculino. E
que tenho orgulho de ser sua amiga.
Rooster
– A última palavra tinha que ser dela de novo.
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John Wayne e Katharine Hepburn |
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John Wayne |
Meu
nome é Reuben - Acostumada a atuar ao lado de atores
renomados e famosos por seus predicados artísticos, Katharine Hepburn não
intimidou John Wayne neste filme pois o Duke está totalmente à vontade ao lado
de Kate como se esta fosse a própria Maureen O’Hara. Perfeito e interpretando a
ele próprio, como de hábito, mas num dos momentos mais felizes de sua carreira,
resultado da plena interação com Katharine Hepburn, ambos aos 68 anos de idade.
No filme tem menos importância a perseguição e confrontos com os bandidos que a
terna história de amizade que nasce entre os dois envelhecidos personagens que
cativam e conquistam irremediavelmente o espectador. Rooster confessar
constrangido seu verdadeiro nome (‘Reuben’) a Eula é uma situação jocosa que
ela minimiza amorosamente lembrando ser ‘Reuben’ um personagem bíblico. Quase
30 anos mais tarde, em “Pacto de Justiça” (Open Range), Robert Duvall confessa
ao atordoado Kevin Costner seu incomum nome (‘Bluebonnet”), numa lembrança a
este diálogo de “Justiceiro Implacável”. Ao final, Rooster e Eula se separam,
não sem antes demonstrar mutuamente o respeito e a admiração que se apossou de
ambos depois de intermináveis e nem sempre amáveis discussões.
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John Wayne e Strother Martin (acima); Katharine Hepburn e Richard Romancito |
Filme
de Duke e Kate - “Justiceiro Implacável” foi dirigido por Stuart Millar, mais
lembrado como produtor que pelos dois filmes que dirigiu (o outro foi o western
“Quando Morrem as Lendas”, com Richard Widmark). John Wayne, como de hábito
merecia ser creditado como co-diretor, tantas foram as ‘sugestões’ feitas
durante as filmagens. As sequências de ação não chegam a empolgar, ainda que
bem dirigidas, especialmente a difícil descida da jangada carregada de
explosivos em meio às pedras do rio durante a forte correnteza. Tudo com bela
fotografia de Harry Stradling Jr. Richard Jordan se esforça para dar impressão
de sadismo ao seu personagem enquanto Anthony Zerbe mesmo discreto é muito mais
amedrontador como o bandido que ao final se redime. Pequenas participações de
Strother Martin e John McIntire num filme todo ele da dupla Katharine Hepburn e
John Wayne neste único e inesquecível encontro na tela. Wayne ainda atuaria em
“O Último Pistoleiro” (The Shootist), sua magnífica despedida do cinema,
enquanto Katharine Hepburn ainda teria tempo para abiscoitar mais um Oscar por
“Num Lago Dourado”, em 1981. A grande atriz com esta interpretação transformou a
missionária numa das mais marcantes personagens femininas dos faroestes, gênero
onde as mulheres são pouco mais que meros enfeites.
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Richard Jordan e Anthony Zerbe |
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John Wayne e Katharine Hepburn |
Mais
que perfeito Rooster Cogburn - Mesmo demonstrando em “Justiceiro
Implacável” sinais da aparente enfermidade que sempre refutou ser Mal de Parkinson,
a carreira de Katharine prosseguiria por mais 18 anos, com a atriz vindo a
falecer aos 96 anos de idade, em 2003. Uma curiosidade é que o ator Richard
Jordan declarou que durante as filmagens tinha a impressão que Kate poderia morrer
a qualquer momento, dado seu suposto estado de debilidade. Mal sabia o ator que
ele viria a falecer dez anos antes dela, em 1993, aos 56 anos de idade, logo
após concluir sua participação em “Anjos Assassinos” (Gettysburg). “Bravura
Indômita” teve uma sequência nada desabonadora e em certos aspectos até
superior pois John Wayne está em “Justiceiro implacável” muito melhor como
Rooster Cogburn que no filme que lhe valeu o Oscar. Imprescindível para os fãs
do Duke e mais ainda pela presença da extraordinária Katharine Hepburn.
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John Wayne e Katharine Hepburn que se tornaram grandes amigos após filmarem juntos. |
Oi, Darci!
ResponderExcluirTambém acho este "JUsticeiro Implacável" quase tão bom quanto "Bravura Indômita", que só considero superior devido as vibrante, apesar de poucas, cenas de ação, principalmente o inesquecível embate de Wayne (Rooster) cavalgando e atirando contra o vião Robert Duvall e seu bando.
Agora que você já fez artigos sobre as duas versões mais conhecidas de "Bravura Indômita", a de 1968 e 2010, faz uma também da versão televisiva de 1978 que era exibida na saudosa "Sessão Bang-Bang" com o título "Valente Até a Morte" com Warren Oates interpretando o xerife Rooster.
Abraço.
Robson