|
Rudolph Maté |
Nem bem encostou o cajado e o manto usados
por Moisés em “Os Dez Mandamentos” Charlton Heston rumou para Tucson, Arizona
para interpretar um cowboy no western “Trindade Violenta” (Three Violent
People). Anne Baxter, a Nefretiri do filme de Cecil B. DeMille se reuniu com Heston
pois a Paramount entendeu que isso seria ótimo para atrair o público. Para
dirigir esse faroeste melodramático passado no Texas foi escalado o
austro-húngaro Rudolph Maté que dois anos antes havia realizado o vigoroso
western “Um Pecado em Cada Alma” (The Violent Men). Maté começou no cinema como
cinegrafista, na Áustria, ainda no cinema mudo, tendo sido o responsável pelas
imagens de “O Martírio de Joana D’Arc”, o célebre filme de Carl Theodor Dreyer
de 1928. Em Hollywood Rudolph Maté foi diretor de fotografia de dezenas de
filmes, alguns deles clássicos como “Gilda” e “A Dama de Shanghai”, passando
para a direção em 1947 sendo um de seus primeiros trabalhos como diretor o
western “A Marca Rubra” (Branded). “Trindade Violenta” foi roteirizado por
James Edward Grant, roteirista preferido de John Wayne e a bela cinematografia
ficou a cargo de Loyal Griggs que três anos antes recebera um Oscar pela
fotografia de “Os Brutos Também Amam” (Shane). Charlton Heston gostou do
roteiro deste filme que encerraria seu contrato com a Paramount, especialmente
porque seu personagem se distanciava em muito da bondade e dignidade de Moisés.
|
Charlton Heston e Tom Tryon; Heston e Anne Baxter |
Irmão
contra irmão - Finda a Guerra Civil o Capitão Confederado Colt Saunders
(Charlton Heston) retorna para o Texas para reassumir o comando do ‘Bar S’, sua
fazenda. Chega também ao Texas, vinda de New Orleans a ex-prostituta Lorna
Hunters (Anne Baxter), por quem Saunders se encanta e pede em casamento
desconhecendo o passado da mulher. O Texas está sob as ordens de um governo
provisório e o comissário Harrison (Bruce Bennet) é um dos muitos oportunistas
que se aproveitam da devastação em que se encontra o Sul para se apropriar
ilegalmente de terras dos sulistas. Antes do retorno de Saunders, havia se
instalado na fazenda seu irmão Beauregard Saunders, apelidado de ‘Cinch’ (Tom
Tryon), desafeto do irmão e a quem nunca perdoara pela perda acidental do braço
direito. Cinch reivindica seus direitos no ‘Bar S’ e entra em conflito com
Colt. Um dos homens de Harrison reconhece Lorna Hunters que tem seu passado
revelado, ao mesmo tempo em que Cinch se alia ao comissário. Lorna dá à luz um
filho e Colt lhe oferece 30 mil dólares para que ela desapareça de sua vida
deixando-lhe a criança. Em conluio com Harrison Cinch trama matar Colt desafiando-o
para um duelo, porém muda de ideia e permite que Colt ajudado pelo capataz
Innocencio Ortega (Gilbert Roland) derrote o grupo armado de Harrison. Cinch é
baleado mortalmente por Cable (Forrest Tucker), capanga do comissário e Colt
descobre que ama Lorna, que havia recusado sua proposta, que merece ser
perdoada por seu passado e continuar sendo sua esposa.
|
Charlton Heston e Tom Tryon |
Onde
as pessoas violentas? - Originalmente este western deveria
se chamar “Maverick”, isto porque o personagem principal (Colt Saunders) é aquele
tipo de homem que obedece seus próprios princípios e se comporta de modo
diferente do costumeiro. No entanto a Paramount decidiu alterar o título para o
inadequado “Three Violent People”, mesmo com a história girando em torno do
antagonismo entre dois irmãos. Os cartazes de publicidade criam a falsa
impressão que Lorna Hunters seria a terceira personagem brutal formando a
trindade do título em Português. Certo que Lorna é uma impostora que se agarra
à chance de ser uma ex-prostituta, mas a esperta moça revela possuir princípios
morais que o soberbo Colt desconhece. “Trindade Violenta” é mais um western contrapondo
irmãos inimigos sem que sejam eles o Caim e Abel de tantas outras histórias. O
próprio Cinch que se diz a ovelha negra da família nada mais é que um homem
revoltado e amargurado com seu único braço, não escondendo o ódio que nutre
pelo irmão, aquele que se entende dono absoluto da propriedade familiar. Humilhado
pelo aleijão e mais ainda pela altivez de Colt, Cinch redime-se de seus erros
antes de morrer defendendo o ‘Bar S’ que havia traído. Quanto a Colt, ter
passado “quatro anos perdendo uma guerra”,
ainda que dela saindo como herói, não fez dele um homem exatamente nobre.
Arrogante e brigão, mesmo Colt não pode também ser chamado de violento.
|
Charlton Heston e Anne Baxter |
Roteiro
falho - A discórdia familiar é a trama principal e mais interessante
do filme de Rudolph Maté, embora possua alguns buracos no roteiro. Um deles é o
mal explicado acidente de Cinch que teve o braço preso numa engrenagem e
amputado por Colt, como se algum cowboy fosse capaz disso. E um homem com a
personalidade de Colt Saunders se apaixonar perdidamente por uma astuta prostituta
e pedi-la em casamento sem nada saber da vivaz mulher é também difícil de se
aceitar. E a história se transforma num autêntico dramalhão com o nascimento do
filho de Colt e Lorna, parto que ocorre abruptamente, rápido demais, imprevisto
demais, forçado demais. Porém essas incoerências apenas demonstram que o
roteirista James Edward Grant não estava em momento muito inspirado e Rudolph
Maté não desenvolveu melhor a história. Consegue, no entanto o diretor delinear
a contento os três personagens pseudoviolentos e um dos melhores momentos do
filme é quando Lorna faz ver ao altivo Colt a pequenez de seu caráter, o que
afinal permite que o casal se abrace e se beije ternamente antes do ‘The End’.
|
Charlton Heston e Anne Baxter; Anne Baxter |
|
Gilbert Roland |
Duelo
psicológico - A trama secundária que é a sanha dos ‘carpetbaggers’
nortistas aproveitando-se da fragilidade dos sulistas nada mais é que uma
variante dos métodos dos poderosos afligindo os mais fracos. Os vilões ao
encontrar resistência sempre usam a força e neste filme a conjuntura política do
pós-Guerra Civil coloca até mesmo o Exército a serviço dos ardilosos carpetbaggers,
numa denúncia de autêntica pilhagem revestida de legalidade. Esse confronto resulta
em alguns momentos movimentados em meio ao drama familiar de “Trindade
Violenta”. Aí o western de Rudolph Maté melhora com Charlton Heston imponente
como nenhum outro ator consegue ser e Tom Tryon cínico, provocante e
misterioso. Há ainda a presença forte de Gilbert Roland não perdendo
oportunidade para filosofar poeticamente em meio a seu quinteto de filhos.
Forrest Tucker infelizmente aparece minimamente no filme, ele que personifica
como poucos um homem mau. Maté criou um inusitado duelo com uma garrafa
escoando o licor, sinal para o sacar dos revólveres para os dois irmãos, o que
não acontece, ficando-se com um duelo apenas psicológico que precede o autêntico showdown final.
|
O duelo entre Charlton Heston e Tom Tryon |
|
Charlton Heston e Anne Baxter |
Anne
Baxter de cabeça para baixo - Reunir Charlton Heston e Anne Baxter
deu certo pois ambos estão bem nos momentos dramáticos e nos românticos e
melhor ainda nas altercações. Se “Trindade Violenta” fosse lembrado por uma
única sequência seria quando Heston vira Anne de cabeça para baixo mostrando
suas anáguas sob o elegante vestido. Consta que Heston não se entendeu muito
bem com Tom Tryon durante as filmagens e talvez por essa e por outras razões
Tryon abandonou cedo a carreira de ator tornando-se bem sucedido escritor. Além
dos ótimos Gilbert Roland e Forrest Tucker, o elenco tem ainda a presença de
Bruce Bennett, ator que como Herman Brix (seu nome verdadeiro), fez seriado
como Tarzan e foi um dos cinco Lone Rangers do seriado “O Guarda Vingador” (The
Lone Ranger), de 1938. Outro nome que posteriormente se tornou bastante
conhecido do público é Robert Blake que interpreta um dos filhos de Gilbert
Roland.
|
Forrest Tucker; Robert Blake e Anne Baxter; Tom Tryon |
|
Charlton Heston |
Trilogia
melodramática - Rudolph Maté, como lembrado no primeiro parágrafo, foi um
cinegrafista requintado e por isso mesmo muito requisitado. Tendo Loyal Griggs com as câmeras e mais o processo
Vistavision da Paramount, Maté fez deste western um filme muito bonito capturando as
belas paisagens do Arizona. O mesmo não pode ser dito da música bombástica e
impessoal de Walter Scharf. Com “Trindade Violenta” Maté fez uma trilogia de
westerns melodramáticos (“Um Pecado em Cada Alma”/1955 e “A Marca Rubra”/1950 são os
outros dois). Pouco citado de modo geral este faroeste com Charlton Heston é
daqueles que não deixarão de agradar aos fãs do gênero e deste grande ator em
especial.
|
Charlton Heston e Anne Baxter; o pôster do filme; Tom Tryon |
Darci, gostei pouco da história, muitas dúvidas,ou seja, cheio de momentos bons e ruins. Mesmo assim, você garante que vale a pena. Acredito que vou procurar, na oportunidade. Abraços, amigo.
ResponderExcluirGostei, excelente.
ResponderExcluirGostei,excelente.
ResponderExcluirO filme é bom e Anne baxter como sempre uma gata
ResponderExcluirMuito boa a matéria, com uma abordagem interessante, mas o western, sem dúvida, é apenas mediano. Aqui podemos ver a falta que faz um bom diretor. Rudolf Maté pode ter sido excelente profissional de fotografia, mas como diretor, nunca chegou lá !!! E temos aqui um time respeitável, apenas citando alguns, desde o aclamado roteirista James Edward Grant (que tb fez boas direções), Lloyal Griggs gênio da fotografia, Charlton Heston, um ATOR com todas as letras maiúsculas e a bela e experiente Anne Baxter ... tudo isso, nas mãos de um diretor como Anthony Mann ou John Sturges, certamente produziria outro resultado e muito melhor !!!. Enfim, considero este western apenas uma boa diversão. Obrigado, abrs.
ResponderExcluir