21 de setembro de 2016

TRINDADE VIOLENTA (THREE VIOLENT PEOPLE) – CHARLTON HESTON EM BOM WESTERN


Rudolph Maté
Nem bem encostou o cajado e o manto usados por Moisés em “Os Dez Mandamentos” Charlton Heston rumou para Tucson, Arizona para interpretar um cowboy no western “Trindade Violenta” (Three Violent People). Anne Baxter, a Nefretiri do filme de Cecil B. DeMille se reuniu com Heston pois a Paramount entendeu que isso seria ótimo para atrair o público. Para dirigir esse faroeste melodramático passado no Texas foi escalado o austro-húngaro Rudolph Maté que dois anos antes havia realizado o vigoroso western “Um Pecado em Cada Alma” (The Violent Men). Maté começou no cinema como cinegrafista, na Áustria, ainda no cinema mudo, tendo sido o responsável pelas imagens de “O Martírio de Joana D’Arc”, o célebre filme de Carl Theodor Dreyer de 1928. Em Hollywood Rudolph Maté foi diretor de fotografia de dezenas de filmes, alguns deles clássicos como “Gilda” e “A Dama de Shanghai”, passando para a direção em 1947 sendo um de seus primeiros trabalhos como diretor o western “A Marca Rubra” (Branded). “Trindade Violenta” foi roteirizado por James Edward Grant, roteirista preferido de John Wayne e a bela cinematografia ficou a cargo de Loyal Griggs que três anos antes recebera um Oscar pela fotografia de “Os Brutos Também Amam” (Shane). Charlton Heston gostou do roteiro deste filme que encerraria seu contrato com a Paramount, especialmente porque seu personagem se distanciava em muito da bondade e dignidade de Moisés.


Charlton Heston e Tom Tryon;
Heston e Anne Baxter
Irmão contra irmão - Finda a Guerra Civil o Capitão Confederado Colt Saunders (Charlton Heston) retorna para o Texas para reassumir o comando do ‘Bar S’, sua fazenda. Chega também ao Texas, vinda de New Orleans a ex-prostituta Lorna Hunters (Anne Baxter), por quem Saunders se encanta e pede em casamento desconhecendo o passado da mulher. O Texas está sob as ordens de um governo provisório e o comissário Harrison (Bruce Bennet) é um dos muitos oportunistas que se aproveitam da devastação em que se encontra o Sul para se apropriar ilegalmente de terras dos sulistas. Antes do retorno de Saunders, havia se instalado na fazenda seu irmão Beauregard Saunders, apelidado de ‘Cinch’ (Tom Tryon), desafeto do irmão e a quem nunca perdoara pela perda acidental do braço direito. Cinch reivindica seus direitos no ‘Bar S’ e entra em conflito com Colt. Um dos homens de Harrison reconhece Lorna Hunters que tem seu passado revelado, ao mesmo tempo em que Cinch se alia ao comissário. Lorna dá à luz um filho e Colt lhe oferece 30 mil dólares para que ela desapareça de sua vida deixando-lhe a criança. Em conluio com Harrison Cinch trama matar Colt desafiando-o para um duelo, porém muda de ideia e permite que Colt ajudado pelo capataz Innocencio Ortega (Gilbert Roland) derrote o grupo armado de Harrison. Cinch é baleado mortalmente por Cable (Forrest Tucker), capanga do comissário e Colt descobre que ama Lorna, que havia recusado sua proposta, que merece ser perdoada por seu passado e continuar sendo sua esposa.

Charlton Heston e Tom Tryon
Onde as pessoas violentas? - Originalmente este western deveria se chamar “Maverick”, isto porque o personagem principal (Colt Saunders) é aquele tipo de homem que obedece seus próprios princípios e se comporta de modo diferente do costumeiro. No entanto a Paramount decidiu alterar o título para o inadequado “Three Violent People”, mesmo com a história girando em torno do antagonismo entre dois irmãos. Os cartazes de publicidade criam a falsa impressão que Lorna Hunters seria a terceira personagem brutal formando a trindade do título em Português. Certo que Lorna é uma impostora que se agarra à chance de ser uma ex-prostituta, mas a esperta moça revela possuir princípios morais que o soberbo Colt desconhece. “Trindade Violenta” é mais um western contrapondo irmãos inimigos sem que sejam eles o Caim e Abel de tantas outras histórias. O próprio Cinch que se diz a ovelha negra da família nada mais é que um homem revoltado e amargurado com seu único braço, não escondendo o ódio que nutre pelo irmão, aquele que se entende dono absoluto da propriedade familiar. Humilhado pelo aleijão e mais ainda pela altivez de Colt, Cinch redime-se de seus erros antes de morrer defendendo o ‘Bar S’ que havia traído. Quanto a Colt, ter passado “quatro anos perdendo uma guerra”, ainda que dela saindo como herói, não fez dele um homem exatamente nobre. Arrogante e brigão, mesmo Colt não pode também ser chamado de violento.

Charlton Heston e Anne Baxter
Roteiro falho - A discórdia familiar é a trama principal e mais interessante do filme de Rudolph Maté, embora possua alguns buracos no roteiro. Um deles é o mal explicado acidente de Cinch que teve o braço preso numa engrenagem e amputado por Colt, como se algum cowboy fosse capaz disso. E um homem com a personalidade de Colt Saunders se apaixonar perdidamente por uma astuta prostituta e pedi-la em casamento sem nada saber da vivaz mulher é também difícil de se aceitar. E a história se transforma num autêntico dramalhão com o nascimento do filho de Colt e Lorna, parto que ocorre abruptamente, rápido demais, imprevisto demais, forçado demais. Porém essas incoerências apenas demonstram que o roteirista James Edward Grant não estava em momento muito inspirado e Rudolph Maté não desenvolveu melhor a história. Consegue, no entanto o diretor delinear a contento os três personagens pseudoviolentos e um dos melhores momentos do filme é quando Lorna faz ver ao altivo Colt a pequenez de seu caráter, o que afinal permite que o casal se abrace e se beije ternamente antes do ‘The End’.

Charlton Heston e Anne Baxter; Anne Baxter

Gilbert Roland
Duelo psicológico - A trama secundária que é a sanha dos ‘carpetbaggers’ nortistas aproveitando-se da fragilidade dos sulistas nada mais é que uma variante dos métodos dos poderosos afligindo os mais fracos. Os vilões ao encontrar resistência sempre usam a força e neste filme a conjuntura política do pós-Guerra Civil coloca até mesmo o Exército a serviço dos ardilosos carpetbaggers, numa denúncia de autêntica pilhagem revestida de legalidade. Esse confronto resulta em alguns momentos movimentados em meio ao drama familiar de “Trindade Violenta”. Aí o western de Rudolph Maté melhora com Charlton Heston imponente como nenhum outro ator consegue ser e Tom Tryon cínico, provocante e misterioso. Há ainda a presença forte de Gilbert Roland não perdendo oportunidade para filosofar poeticamente em meio a seu quinteto de filhos. Forrest Tucker infelizmente aparece minimamente no filme, ele que personifica como poucos um homem mau. Maté criou um inusitado duelo com uma garrafa escoando o licor, sinal para o sacar dos revólveres para os dois irmãos, o que não acontece, ficando-se com um duelo apenas psicológico que  precede o autêntico showdown final.

O duelo entre Charlton Heston e Tom Tryon

Charlton Heston e Anne Baxter
Anne Baxter de cabeça para baixo - Reunir Charlton Heston e Anne Baxter deu certo pois ambos estão bem nos momentos dramáticos e nos românticos e melhor ainda nas altercações. Se “Trindade Violenta” fosse lembrado por uma única sequência seria quando Heston vira Anne de cabeça para baixo mostrando suas anáguas sob o elegante vestido. Consta que Heston não se entendeu muito bem com Tom Tryon durante as filmagens e talvez por essa e por outras razões Tryon abandonou cedo a carreira de ator tornando-se bem sucedido escritor. Além dos ótimos Gilbert Roland e Forrest Tucker, o elenco tem ainda a presença de Bruce Bennett, ator que como Herman Brix (seu nome verdadeiro), fez seriado como Tarzan e foi um dos cinco Lone Rangers do seriado “O Guarda Vingador” (The Lone Ranger), de 1938. Outro nome que posteriormente se tornou bastante conhecido do público é Robert Blake que interpreta um dos filhos de Gilbert Roland.

Forrest Tucker; Robert Blake e Anne Baxter; Tom Tryon


Charlton Heston
Trilogia melodramática - Rudolph Maté, como lembrado no primeiro parágrafo, foi um cinegrafista requintado e por isso mesmo muito requisitado. Tendo Loyal Griggs com as câmeras e mais o processo Vistavision da Paramount, Maté fez deste western um filme muito bonito capturando as belas paisagens do Arizona. O mesmo não pode ser dito da música bombástica e impessoal de Walter Scharf. Com “Trindade Violenta” Maté fez uma trilogia de westerns melodramáticos (“Um Pecado em Cada Alma”/1955 e “A Marca Rubra”/1950 são os outros dois). Pouco citado de modo geral este faroeste com Charlton Heston é daqueles que não deixarão de agradar aos fãs do gênero e deste grande ator em especial.

Charlton Heston e Anne Baxter; o pôster do filme; Tom Tryon

5 comentários:

  1. Darci, gostei pouco da história, muitas dúvidas,ou seja, cheio de momentos bons e ruins. Mesmo assim, você garante que vale a pena. Acredito que vou procurar, na oportunidade. Abraços, amigo.

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  2. O filme é bom e Anne baxter como sempre uma gata

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  3. Muito boa a matéria, com uma abordagem interessante, mas o western, sem dúvida, é apenas mediano. Aqui podemos ver a falta que faz um bom diretor. Rudolf Maté pode ter sido excelente profissional de fotografia, mas como diretor, nunca chegou lá !!! E temos aqui um time respeitável, apenas citando alguns, desde o aclamado roteirista James Edward Grant (que tb fez boas direções), Lloyal Griggs gênio da fotografia, Charlton Heston, um ATOR com todas as letras maiúsculas e a bela e experiente Anne Baxter ... tudo isso, nas mãos de um diretor como Anthony Mann ou John Sturges, certamente produziria outro resultado e muito melhor !!!. Enfim, considero este western apenas uma boa diversão. Obrigado, abrs.

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