17 de maio de 2015

RIFLES APACHES (APACHE RIFLES) – AUDIE MURPHY DIRIGIDO POR WILLIAM WITNEY


O diretor William Witney.
Em 1964 Audie Murphy chegava aos 40 anos e deixara a Universal onde desfrutara de grande prestígio. Antes disso Audie tentara a televisão com a fracassada série “Whispering Smith” e iniciara a luta contra o declínio de sua carreira como ator. Nesse mesmo ano o celebrado herói da II Guerra Mundial já havia atuado nos westerns “Pistoleiro Relâmpago” (The Quick Gun) e “Balas para um Bandido” (Bullet for a Badman), dirigidos respectivamente por Sidney Salkow e R.G. Springsteen. Reunido mais uma vez com o produtor Robert E. Kent, da pequena Admiral Pictures, o terceiro western de Audie Murphy em 1964 foi “Rifles Apaches” (Apache Rifles). A boa notícia é que o diretor escolhido foi William Witney, veterano dos tempos da Republic Pictures e mestre de filmes de ação. “Rifles Apaches” seria mais um western sobre a cruel ação da Cavalaria norte-americana sobre os índios não só fosse a abominável mudança do desfecho do filme. Os estúdios algumas vezes usam a estratégia de filmar finais alternativos submetendo-os a teste junto a pequenas plateias. Outras vezes alteram brutalmente o desfecho da história, como ocorreu em “A Face Oculta” (One-Eyed Jacks), com final alternativo filmado dois meses depois de encerrada a produção, forçando um final feliz. Nesta primeira reunião da dupla Murphy-Witney, sabe-se lá por imposição de quem, um final trágico é transformado em risível epílogo.


Joseph Vitale como o chefe  ApacheVictorio.
Apaches traídos - O capitão Jeff Stanton (Audie Murphy) recebe a missão de levar uma mensagem do General Crook a Victorio (Joseph Vitale), chefe dos renegados Apaches Mescaleros. O General quer que Victorio e seus bravos retornem à reserva e que o tratado de paz seja cumprido. Porém justamente na reserva indicada é descoberto ouro, o que desperta a cobiça de mineiros e oportunistas aos quais interessa a sublevação dos Apaches e consequente uso da força pela Cavalaria, exterminando os renegados. Um agente federal é morto pelos mineiros, o que provoca a troca de comando na unidade da Cavalaria, com o Capitão Stanton dando lugar ao Coronel Perry (John Archer). Ao contrário de Stanton, o Coronel Perry não tenciona obedecer às ordens de Washington e vê no confronto com os Apaches uma oportunidade de exercitar sua sanha sanguinária. Victorio é morto e seu filho Red Hawk (Michael Dante) o sucede no comando dos Apaches. Red Hawk que confiou no Capitão Stanton se sente traído pela Cavalaria e vinga-se atacando mortalmente o Capitão.

Audie Murphy
Racismo predominante - A ótima história de autoria de Kenneth Gamet e Richard Schayer, roteirizada por Charles B. Smith apresenta uma série de conflitos entre os personagens principais. O Capitão Stanton é filho de um oficial que por seu respeito aos índios acabou levando um pelotão à derrota, sendo destituído com desonra da Cavalaria. Stanton carrega esse trauma do qual não consegue se livrar pois sempre há quem, maledicentemente ou não, o lembre dessa triste passagem envolvendo seu pai. Ao entrar pela primeira vez no reduto dos Apaches Mescaleros, como parte de sua missão, o Capitão Stanton descobre que há uma mulher branca – Dawn Gillis (Linda Lawson) – entre os índios. Dawn é uma mestiça filha de um homem branco com uma índia Comanche e se tornou missionária. O Capitão Stanton e Dawn sentem-se atraídos um pelo outro, até que o oficial descobre que Dawn tem sangue índio. Stanton é racista e fala mais alto sua incapacidade de superar seu preconceito. Paralelamente a isso o jovem e belicoso Red Hawk também se interessa pela missionária, o que causa ainda maior hostilidade entre ele e Stanton. O Capitão é um oficial cumpridor de ordens e mesmo diante de seu espírito segregador e da lembrança humanista do pai leva a cabo a missão que lhe foi designada. O homem branco surge na história nas figuras do ganancioso comerciante Owens (Charles Watts) e de seus asseclas Greer (L.Q. Jones) e Hodges (Ken Lynch). Completa o grupo de personagens principais o Coronel Perry, impiedoso e não cumpridor da palavra empenhada.

Michael Dante e Linda Lawson; Linda Lawson.

Micahel Dante
Verdes campos da nova terra - Em “Rifles Apaches” William Witney tenta conduzir a história até onde pode com a coerência possível, ainda que o Capitão Stanton seja um personagem inteiramente contraditório. Stanton sente um certo orgulho pela hombridade do pai, ao mesmo tempo que sofre com a mácula que pesa sobre o nome herdado. Respeita e conhece bem os índios, mesmo não tendo simpatia por eles, não perdendo a oportunidade para demonstrar isso, como quando amarra Red Hawk exposto ao sol para que ele confesse onde está Victorio. O entusiasmo inicial de Stanton pela mulher branca se dissipa ao constatar ser ela mestiça, atitude reprovada pelo Capitão médico (J. Pat O’Malley) que chama Stanton de verdadeiro cabeça dura. Todas as incongruências de personalidade, porém, seriam superadas com a mensagem principal do filme que é a insensibilidade e o barbarismo do qual foram vítimas os nativos norte-americanos. E o que se tem com o ridículo final é a conversão do racista Capitão Stanton que movido pelo amor supera sua rejeição à branca-comanche, sendo abençoado ainda pelo... guerreiro Red Hawk. Este, num insulto à inteligência do espectador diz que a reserva para onde será mandado com seus bravos (no Texas) é um ótimo lugar para se viver com os rios e montanhas verdejantes.

Acima o corpo de Victorio; abaixo
Audie Murphy e John Archer.
Uma lança no coração - Alfred Hitchcock chegou a dizer que quem quiser encontrar ‘plausibilidade’ não deve ir ao cinema. E Hollywood nunca levou em consideração o aspecto crível de histórias levadas às telas. Comumente heróis passam a ter poderes quase sobrenaturais, sobrevivendo a toda sorte de flagelo e de situações adversas. Em “Rifles Apaches” o Capitão Stanton é perfurado pela lança de Red Hawk que com a força do ódio de quem é traído, lhe acerta o coração. Com uma lança, repita-se. Mesmo sem os necessários cuidados hospitalares, três semanas depois Stanton reaparece com o braço na tipoia e pronto para recuperar seu comando e receber os abraços da missionária que em determinado momento da história havia sido dada como morta. “Rifles Apaches” é um filme de pequeno orçamento, realizado por uma produtora independente e distribuído pela 20th Century-Fox, daí a ‘cirurgia necessária’. Aparentemente nenhum dos envolvidos – Murphy, Witney e o produtor Robert E. Kent – comentaram as modificações que destruíram aquele que poderia ser lembrado como mais um libelo contra o maior genocídio da história mundial.

Sequência em que Red Hawk 'mata' o Capitão Stanton.

Audie Murphy
Audie Murphy em boa interpretação - Reconhecido como um dos mestres das sequências de ação, William Witney não tem em “Rifles Apaches” oportunidades maiores de exercitar suas habilidades. Poucos e até mesmo tímidos e nada inspirados são os rotineiros momentos de confrontos. Por outro lado é grande a satisfação em ver a ótima atuação de Audie Murphy como o sofrido Capitão Stanton. Longe da figura eternamente juvenil que o marcou, Murphy é um convincente e atormentado oficial. Michael Dante, que viveria Crazy Horse em série de televisão e “Em os Bravos Nunca Morrem” (The Legend of Custer) é um índio tipo galã que se esforça para superar seus limitados recursos interpretativos. Linda Lawson pouco tem a fazer no filme, ao contrário dos eficientes J. Pat O’Malley e Robert Brubaker, este como o fiel Sargento Cobb. As melhores interpretações entre os coadjuvantes ficam para os vilões Charles Watts, Ken Lynch e L.Q. Jones. Este último, um daqueles tipos marcantes tantas vezes sob as ordens de Sam Peckinpah, como na antológica disputa pelas botas de defuntos em “Meu Ódio Será Sua Herança” (The Wild Bunch).

Audie Murphy e L.Q. Jones

Visão distorcida - “Rifles Apaches” não faz jus à reputação de Audie Murphy como astro de bons faroestes e menos ainda à importância de William Witney. Decididamente é um filme menor na filmografia de ambos quando poderia ter representado um marco artístico em suas carreiras. Mas o que fazer diante do poder do dinheiro e da necessidade de agradar o grande público que jamais aceitaria ver o ídolo Audie Murphy ser morto sem ter conseguido a vitória moral em sua missão neste filme? Personagens históricos como Custer morreram de forma gloriosa no cinema, até que o revisionismo cinemtográfico mostrasse a verdade dos fatos. Murphy, um verdadeiro herói norte-americano jamais poderia vestir a farda azul da Cavalaria norte-americana e morrer estático pelas mãos de um índio. Situação inaceitável para a visão distorcida dos homens engravatados de Hollywood.

Audie Murphy




Um comentário:

  1. Darci, gostei, filme difícil de resenhar, um pouco frio, previsível, além de ter que cumprir certas vontades da história do ator Murphy. Lembrei do filme, Passagem do Diabo, com Robert Taylor, em que morre fardado na cena final, sem maiores explicações. Parabéns, belo trabalho. Paulo...mineiro.

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