William A. Wellman foi o diretor do
western clássico “Consciências Mortas” (The Ox-Bow Incident), filme de 1943
baseado em livro de Walter Van Tilburg Clark. Em 1954 Wellman foi contratado
pela Wayne-Fellows, a então produtora de John Wayne, para dirigir “Dominados
pelo Terror” (Track of the Cat), baseado também em história de Van Tilburg
Clark. A elaboração do roteiro foi entregue a A.I. Bezzerides e Wellman
percebeu a possibilidade de realizar um filme bastante diferente, um
western-terror. Em seus primeiros contatos com o co-produtor Robert Fellows,
Wellman disse que tencionava fazer um filme colorido em preto e branco. Fellows
que confiava no talento do diretor o informou que havia conseguido Robert
Mitchum, por empréstimo junto à RKO, para estrelar “Dominados pelo Terror”. Melhor
impossível para aquela história estranha passada numa região castigada pela
neve.
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O monocromatismo quebrado pelo casaco de Mitchum. |
Preto e branco em cores - William A. Wellman era também
conhecido pelo apelido de ‘Wild Bill’ devido às histórias que contava nos
tempos em que pertenceu à ‘Esquadrilha Lafayette’ na 1.ª Guerra Mundial. ‘Wild
Bill’ conversou longamente com o cinegrafista William H. Clothier e lhe
explicou como queria que fossem as imagens de “Dominados
pelo Terror”. A Warner Bros. que também colocaria dinheiro na produção e faria
a distribuição do filme, exigiu que a película fosse filmada no novo processo
Cinemascope. E claro, em cores! Logo ao início do filme o espectador é
surpreendido pelas imagens em preto e branco e durante quase todo o filme o que
se vê na tela é justamente o preto e branco e os muitos tons de cinza prevalecendo sobre o colorido.
Sobressai-se nas cenas exteriores somente o vermelho do casaco de Robert
Mitchum. Jack Warner ao ver o filme depois de pronto ficou à beira da apoplexia
gritando: “Eu gasto 500 mil dólares no processo WarnerColor e o que vejo é uma
porcaria de filme em preto e branco! E ainda em Cinemascope!” Jack Warner
exagerou ao chamar “Dominados pelo Terror” de porcaria devido a sua fotografia
estilizada em tons predominantemente escuros pois o que há de melhor no filme
de Wellman é justamente o trabalho de William H. Clothier.
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O bom aproveitamento do Cinemascope com quase todos os atores em cena, como se fosse um palco de teatro; abaixo Beulah Bondi. |
Drama
familiar - “Dominados pelo Terror” tem apenas oito personagens
confinados no rancho dos Bridges, rancho localizado em meio a uma floresta. Alguns
desses personagens saem da casa principal apenas para caçar um felino que está
dizimando o gado. Segundo o índio Joe Sam (Carl ‘Alfafa’ Switzer), com a chegada
da primeira nevasca da estação reaparece também a pantera negra assassina não
só de animais mas também de seres humanos. Assim como os cavalos, Joe Sam
pressente a proximidade do grande gato negro (Black Cat). Porém muito pior que
se expor ao perigo de ser atacado pelo felino é permanecer dentro do rancho dos
Bridges. Quem manda na casa é a matriarca 'Ma' Bridges (Beulah Bondi), espécie de
beata que determina o que cada um pode fazer naquela casa. 'Ma' Bridges não
admite que o filho caçula Harold (Tab Hunter) se case com Gwen Williams (Diana
Lynn), filha de um rancheiro vizinho. Vendo pecado em tudo, 'Ma' Bridges faz
vistas grossas para a maneira obscena com que Curt (Robert Mitchum), seu outro
filho, olha para Gwen. 'Ma' Bridges entende que quem deve se casar com Gwen é o
prepotente Curt. Assim também pensa 'Pa' Bridges (Philip Tonge), isto quando sua
embriaguez permite que ele consiga raciocinar e falar. E 'Pa' Bridges é ainda
mais libidinoso que Curt em seus constrangedores agrados a Gwen. Arthur, o mais
velho dos irmãos é o único que tem respeito pela moça. Diferente de Curt, Arthur
é educado, leitor de poesia e em desacordo constante com a intimidação que Curt
impõe a todos com seu comportamento sórdido e agressivo.
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Acima a morte de Arthur (William Hopper); abaixo Bob Mitchum. |
Mortes
na neve - A oitava personagem presente na casa é Grace (Teresa
Wright), irmã solteira e frustrada pela vida que leva. Grace quer não apenas
que Harold se case com Gwen, como também que Curt deixe de se imaginar como sendo o senhor
absoluto da propriedade. Com tantas questões familiares a serem resolvidas, Joe Sam, que
com mais de cem anos de idade se esqueceu de morrer, alerta para o perigo do
felino assassino e, de fato, algumas cabeças de gado são encontradas trucidadas.
Curt e Arthur saem para caçar a pantera negra e Arthur é morto pelo invisível
animal. Curt traz o corpo do irmão para o rancho e retorna para a caçada, menos
preocupado com a morte do irmão que pelo risco que corre seu rebanho. Mesmo com
sua experiência e conhecimento da região, Curt desliza na neve e cai do alto de um penhasco. Após
descobrir Curt morto, o tímido Harold é tomado por súbita coragem e consegue fazer o
que o destemido irmão não conseguiu: matar o felino a tiros sob o olhar e a
expressão feliz de Joe Sam. Harold faz então por merecer o amor de Gwen, mesmo
porque já não há mais o despótico Curt para diminui-lo com o imoral assédio a
Gwen.
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O místico índio de Joe Sam (Carl 'Alfafa' Switzer). |
Terror
inconsequente e incoerente - Dos 102 minutos que é a metragem de
“Dominados pelo Terror”, a maior parte desse tempo é passada na sala do rancho,
espécie de palco no qual são expostos os conflitos de cada um dos Bridges. Pode-se
imaginar até que o texto seja de Tennessee Williams de tão sexualmente
provocante que é. Curt assedia a namorada do irmão; esta por sua vez sente-se
atraída por Curt enquanto o pai reencontra a vontade de viver com a presença da
jovem que será sua nora. Fora do teatro filmado dentro da casa ronda, qual em
conto de Edgar Allan Poe, o aterrorizante animal negro. Mas as duas situações
nunca se integram e a narrativa não é capaz de prender a atenção enquanto as
mortes ocorrem de forma inconvincente. Se a intenção do filme é a de assustar
com as interpretações possíveis do significado do grande felino negro e da
figura mística do índio Joe Sam, nada funciona a contento. Com seus simbolismos
o filme de Wellman acaba se transformando num exercício de terror inconsequente
e incoerente, com direito a uma sequência risível de grosseiro erro de continuidade em que a neve cai em Bob
Mitchum e não em William Hopper a seu lado.
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Criativas tomadas feitas a partir da visão do morto dentro do túmulo aberto.
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Acima o excessivo Philip Longe e a ótima Beulah Bondi; abaixo Teresa Wright e Diana Lynn. |
Teresa
Wright mal aproveitada - Robert Mitchum se impõe
em “Dominados pelo Terror” criando aquele tipo de personagem que levaria à
perfeição em seu filme seguinte “O Mensageiro do Diabo” e anos mais tarde em “O
Círculo do Medo” e que o ajudaram a se transformar em um dos melhores atores de
Hollywood. Beulah Bondi está ótima como a matriarca religiosa fanática, ao
contrário da atuação do inglês Philip Longe, aqui um bem acabado exemplo de
overacting. William Hopper discreto e seguro, enquanto Tab Hunter e Diana Lynn
fazem aquilo que poderia esperar deles. A lamentar que a brilhante Teresa
Wright tenha seu desempenho limitado a um irrelevante personagem secundário.
Completa o elenco o infeliz ex-ator infantil Carl ‘Alfafa’ Switzer, com pesada
maquiagem para transformá-lo, aos 27 anos de idade, no centenário índio Joe Sam. Carl Switzer viria a falecer quatro anos depois, aos 31 anos. Diana Lynn viveria até
os 45 anos e William Hopper, filho da colunista Hedda Hopper, morreria aos 55
anos de idade. Nada a ver, claro, com a maldição do felino negro de “Dominados
pelo Terror”. Além da excepcional fotografia de William H. Clothier, merece
destaque a música de Roy Webb, destaques insuficientes para tornar o filme de Wellman
memorável. Esse filme esteve durante mais de 50 anos fora de circulação e faz
parte do lote de filmes que a Batjac finalmente lançou em DVD.
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Teresa Wright, excelente e pouco lembrada atriz norte-americana. |
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