22 de agosto de 2011

LEE J. COBB, O MAIS VELHACO DOS VILÕES


Seu olhar penetrante, sobrancelha arqueada, boca com o mais cruel dos risos
e figura corpulenta e ameaçadora fizeram de Lee J. Cobb um dos mais
admirados vilões do cinema. Memorável como o gângster Johnny Friendly
em “Sindicato de Ladrões” ou como o Jurado n.º 3 em “Doze Homens e
uma Sentença”, para os fãs de westerns Lee J. Cobb foi igualmente
marcante como Dock Tobin em “O Homem do Oeste” (Man of the West).
Três filmes da década de 50, a década cinematográfica mais importante
na carreira desse ator que se tornou famoso em Hollywood
depois de grandes trabalhos no teatro.

Lee J. Cobb com o mocinho Hopalong
Cassidy e o sidekick Gabby Hayes
SERIADOS E HOPALONG CASSIDY - Nascido em 8 de dezembro de 1911, em Nova York, Leo Jacoby foi um menino-prodígio que tocava violino como verdadeiro virtuose. Porém um acidente em que quebrou o punho colocou fim à sua carreira como músico. Leo cursava Engenharia Aeronáutica, mas decidiu tentar a sorte no cinema, indo para Los Angeles. Sua estréia ocorreu em 1934 no seriado da Universal “A Sombra Misteriosa” (The Vanishing Shadow). Depois dessa primeira experiência como ator, Lee J. Cobb retornou a Nova York e se juntou ao Group Theatre, grupo que reunia a vanguarda teatral na Broadway, subindo ao palco pela primeira vez na peça “Crime e Castigo”, de Dostoievsky. Depois de participar da encenação de inúmeras outras peças Lee voltou à capital do cinema agora para atuar em “Vingança de Irmão” (North of Rio Grande) e “O Fim da Quadrilha” (Rustlers’ Valley), ambos estrelados por Hopalong Cassidy, em 1937. Lee J. Cobb havia deixado excelente impressão na Broadway e a turma do Group Theatre o chamou novamente, desta vez para atuar na peça “Golden Boy”. O elenco de “Golden Boy” era formado por nomes que mais tarde ficariam bastante famosos como Luther Adler, Howard Da Silva, Frances Farmer e os futuros diretores de cinema Elia Kazan, Martin Ritt e Michael Gordon. Devido ao sucesso de “Golden Boy” a peça virou filme com Barbara Stanwyck e William Holden, recebendo o título nacional de “Conflito de Duas Almas”. Lee J. Cobb havia impressionado tanto nessa encenação que foi contratado para interpretar o papel do Sr. Bonaparte, pai de Joe Bonaparte (William Holden) no filme com Barbara Stanwyck. Lee J. Cobb era apenas sete anos mais velho que Holden, mas possuía uma incrível capacidade de compor personagens mais velhos, característica que o cinema aproveitaria muito bem.

"A Morte do Caixeiro Viajante", com
Arthur Kennedy e Cameron Mitchell
SUCESSO IGUAL AO DE MARLON BRANDO - Mesmo depois do sucesso de “Conflito de Duas Almas”, Lee J. Cobb ainda atuou em filmes de pequeno orçamento como “Lá no Texas” (Down Rio Grande Way), western B da Columbia com Charles Starrett e “Buckskin Frontier”, com Richard Dix e o os bandidões Albert Dekker e Victor Jory também no elenco. O ano de 1943 seria decisivo para Lee J. Cobb pois sua atuação em “A Canção de Bernardette” (com Jennifer Jones) chamaria definitivamente a atenção para seu talento de ator. Lee atuou a seguir numa série de bons filmes como o drama “Anna e o Rei do Sião” (com Rex Harrison), que mais tarde viraria musical da Broadway e filme estrelado por Yul Brynner; “O Justiceiro”, com Dana Andrews e dirigido por seu amigo Elia Kazan; o capa-e-espada “O Capitão de Castela”, com Tyrone Power. O tipo durão de Lee J. Cobb era perfeito para o gênero mais em voga no pós-guerra que era o filme noir, o que possibilitou que Lee atuasse em “Dama, Valete e Rei” (Johnny O’Clock), com Dick Powell; “Passado Tenebroso” (Dark Past), com William Holden; “Mercado de Ladrões” (Thieves Highway), de Jules Dassin, estrelado por Richard Conte; “Sublime Devoção” (Call Northside 777), com James Stewart. Mas a consagração de Lee J. Cobb como ator seria mesmo nos palcos, em 1949, sob a direção de Elia Kazan na peça de um jovem autor chamado Arthur Miller que recebeu o estranho título de “A Morte do Caixeiro Viajante”. Willy Loman era o personagem principal da peça, interpretado por Lee J. Cobb. A reunião desses três talentos (Kazan, Miller e J. Cobb) foi um marco do teatro norte-americano. No elenco de “A Morte do Caixeiro Viajante” estavam também Mildred Dunnock, Arthur Kennedy, Cameron Mitchell e Constance Ford. Lee J. Cobb arrebatou o mundo teatral com sua interpretação, algo muito parecido com o que havia feito Marlon Brando dois anos antes sob a direção do mesmo Elia Kazan em “Um Bonde Chamado Desejo”.

Interprtetações inesquecíveis:
Lee J. Cobb e Marlon Brando
DELATOR COMO ELIA KAZAN - Lee J. Cobb voltou a filmar já na década de 50 como ator principal de “Por Uma Mulher Má” (The Man Who Cheated Himself), de Felix E. Feist. Atuou em seguida com Humphrey Bogart em “Sirocco”, mas os papéis que lhe eram oferecido estavam longe do seu talento e da fama que havia adquirido como ator de teatro. Exatamente nesse período ocorreu a nefasta “Caça às Bruxas” em Hollywood, como se chamou a tentativa dos reacionários políticos norte-americanos de eliminar os comunistas do mundo cinematográfico. Assim como fez Elia Kazan, Lee J. Cobb também depôs diante da famigerada comissão no Senado e acabou denunciando os possíveis comunistas que conhecia. Cobb ficou marcado na comunidade artística e amargou um período de ostracismo em que teve que aceitar até um papel de Sultão em “Escravas do Harém”, escapismo estrelado por Jeff Chandler e Rhonda Fleming. Nesse período apareceu em um western de menor expressão mas que merece ser lembrado por ter sido dirigido por Elmo Williams, o famoso montador de “Matar ou Morrer”. Foi “The Tall Texan”, com Lloyd Bridges. Em "A Besta Negra" Lee J. Cobb contracenou com outro Lee, o Marvin, que viria a ser um dos grandes bandidos do cinema em todos os tempos. Lee J. Cobb teria que esperar até 1954 para brilhar novamente no cinema e isso ocorreu em nova reunião com Elia Kazan na obra-prima “Sindicato de Ladrões”. Esse excepcional filme brilhantemente interpretado possibilitou que quatro de seus coadjuvantes fossem indicados ao Oscar: Lee J. Cobb, Karl Malden, Rod Steiger e Eva Marie Saint, sendo que esta acabou levando o prêmio de Melhor Coadjuvante Feminina na premiação de 1955. Brando e Kazan também foram premiados como Melhor Ator e Melhor Diretor por “Sindicato de Ladrões”. Entre os imortais momentos do cinema certamente está a desesperada tentativa de Johnny Friendly (Lee J. Cobb) de manter o controle sobre os trabalhadores do cais de Nova York e a realística luta entre Friendly e Terry Malloy (Brando).

Os jurados Lee J. Cobb com Henry Fonda
e Papai Karamazov
GANGORRA ARTÍSTICA - Apesar do reconhecimento por sua atuação em “Sindicato de Ladrões”, Hollywood se vingava de Lee J. Cobb fechando-lhe as portas para melhores papéis. Cobb atuou no western “The Road to Denver”, com John Payne; interpretou um chinês em “Do Destino Ninguém Foge”, com Humphrey Bogart, dirigido pelo também delator Edward Dmytryk; interpretou um italiano em “Caminhos sem Volta” (The Racers), com Kirk Douglas; foi um juiz em “O Homem do Terno Cinzento”, estrelado por Gregory Peck. Um dos pontos mais baixos de sua carreira foi ao ser dirigido por Fred F. Sears, no policial B “Miami Expose”. Como não há mal que sempre dure, a segunda metade da década de 50 representaria a redenção artística para Lee J. Cobb que atuaria em uma dezena de excelentes produções. Lee J. Cobb foi o terrível e intransigente Jurado N.º 3 em “Doze Homens e Uma Sentença”; lutou novamente contra trabalhadores em “Clima de Violência”, num elenco em que fez o papel principal e contracenou com Richard Boone, Joseph Wiseman, Robert Loggia e Harold J. Stone; foi o psicanalista de Joanne Woodward em “As Três Máscaras de Eva”; interpretou o libidinoso pai de Yul Brynner em “Os Irmãos Karamazov”, que lhe valeu a segunda indicação ao Oscar de Ator Coadjuvante; sob a direção de Nicholas Ray foi o gângster Rico Angelo em “A Bela do Bas-Fond”; novamente gângster em “Armadilha Sangrenta”, com Richard Widmark; Lee J. Cobb foi o avô da maravilhosa Audrey Hepburn em “A Flor Que nâo Morreu”; fez com Clark Gable a comédia “Beijos que não se Esquecem” e fecharia a década auspiciosamente atuando na superprodução “Êxodus”. Entre esses filmes Lee J. Cobb foi dirigido por Anthony Mann em “O Homem do Oeste”.

Lee J. Cobb em "O Homem do Oeste"
com Julie London e Gary Cooper
VELHACO HOMEM DO OESTE - Para os fãs dos faroestes, o trabalho mais importante de Lee J. Cobb nos anos 50 foi sem dúvida como o velhaco facínora Dick Tobin, chefe da quadrilha que aterroriza Gary Cooper e Julie London no soberbo “O Homem do Oeste”. Secretamente costumamos torcer para os bandidos nos filmes, mas neste western sombrio que mais parece um pesadelo, torcemos para Gary Cooper liquidar o maléfico personagem de Lee J. Cobb. “O Homem do Oeste” foi a comprovação que com Lee em cena, mesmo grandes intérpretes como Gary Cooper passavam para um inevitável segundo plano, o que levava muitos atores a sentir caláfrios quando tinham que contracenar com ele. Nos anos 60 Lee J. Cobb participou da produção em Cinerama “A Conquista do Oeste” (How the West Was Won), desta vez do lado da lei, interpretando um xerife. Outra superprodução em que atuou foi no malfadado “Os Quatro Cavaleiros do Apocalípse”, com Glenn Ford. Lee J. Cobb atuou muitas vezes na TV e para a telinha foi produzida a versão de “A Morte do Caixeiro Viajante” em que ele repetiu sua criação como Willy Loman tendo novamente Mildred Dunnock como sua esposa Linda Loman. E a televisão reservou para Lee J. Cobb um lugar na série “O Homem de Virginia” (The Virginian), em que viveu o personagem do Juiz Henry Garth em 120 episódios semanais. Lee voltou a fazer comédia desta vez com Frank Sinatra em “O Bem Amado”. Na onda dos filmes de agentes secretos interpretou por duas vezes o chefe do Serviço de Inteligência em “Flint Contra o Gênio do Mal” e “Flint, Perigo Supremo”, ambos com James Coburn. Como muitos outros atores norte-americanos, Lee J. Cobb foi filmar na Itália, mas não no gênero spaghetti-western e sim no policial “O Dia da Coruja”, com Cláudia Cardinalle e Franco Nero. No retorno para a América Lee J. Cobb voltaria também para os faroestes.

Na TV (série "O Homem de Virgínia") e no teatro,
sempre um grande ator
O EXORCISTA E A MORTE - Quase um néo-western, “Meu Nome é Coogan” teve Lee J. Cobb como o Tenente McElroy, chefe de Clint Eastwood. Depois Lee apareceu em “A Pistola da Morte” (Day of the Evil Gun), estrelado por Glenn Ford. Lee esteve no superelenco liderado por Gregory Peck em “O Ouro de McKenna” (McKenna’s Gold), dirigido por J. Lee Thompson. Lee J. Cobb emprestou seu respeitado nome ao fraco western “Macho Callahan” e se defrontou com Burt Lancaster em “Mato em Nome da Lei” (The Lawman), de Michael Winner, ao lado de Robert Duvall e Robert Ryan. O próximo western de Lee J. Cobb foi “Amor Feito de Ódio” (The Man Who Loved Cat Dance), com Burt Reynolds e que se tornou um cult movie com muitos admiradores. Lee havia chegado aos 60 anos de idade e desapontado com a falta de oportunidades em Hollywood, foi atuar em diversos filmes na Europa, todos eles irrelevantes para sua filmografia. Até que em 1973 o veterano ator foi convidado para interpretar o Tenente William Kinderman em “O Exorcista”, que se tornou uma das maiores bilheterias do cinema em todos os tempos. O sucesso foi tão grande que em 1976 entrou em produção “O Exorcista II – O Herege”, sequência que deveria ter Lee J. Cobb novamente como o policial Kinderman. Porém Lee J. Cobb viria a falecer em 11 de fevereiro de 1976, aos 65 anos, vítima de um ataque cardíaco, deixando sua segunda esposa Mary Hirsch. Em dezembro próximo ocorre o centenário de nascimento de Lee J. Cobb. Uma frase de Lee J. Cobb que ficou famosa foi: “O teatro é o veículo artístico do ator; o cinema é o veículo artístico do diretor; a televisão não é veículo artistico nenhum.” Respeitado e vitorioso ator teatral e cinematográfico, os grunhidos de Lee J. Cobb e seu olhar devastador sob sua sobrancelha arqueada jamais serão esquecidos por quem o viu atuar.

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